Cecília Meireles - Um Convite à Liberdade



 

Antônio Cândido, em "A vida ao rés-do-chão" considera a crônica um gênero menor, o que a deixa mais perto da realidade do leitor, ajustando-se à sensibilidade do dia-a-dia. Em sua despretensão, humaniza e é essa humanização que lhe confere certa profundidade de significado. A crônica está sempre ajudando a estabelecer ou restabelecer a dimensão das coisas ou das pessoas. É amiga da verdade e da poesia nas suas formas mais fantásticas e diretas (CÂNDIDO, 1992: 13-14).

São vários os significados da palavra crônica. Todos, porém, implicam na noção de tempo, presente no próprio termo que procede do grego chronos. Arrigucci chama nossa atenção para esse vínculo de origem que liga o texto a um registro de vida, a um fato histórico que pode não ser percebido pelo leitor, mas que está sempre presente na crônica (ARRIGUCCI, 1979: 51).

Ao nos propormos, então, a refletir sobre crônicas que determinados autores escreveram, é importante situarmos no tempo e no espaço as circunstâncias que provocaram aquelas palavras. Caso contrário, a crônica perde o sentido e passa a ser entendida com base em experiências próprias do leitor, numa compreensão muitas vezes distante de seu objetivo principal.

Cecília Meireles passou a maior parte de sua vida diante de uma máquina de escrever. Embora seja mais conhecida por sua obra em verso, a pastora das nuvens que fala da transitoriedade da vida, do efêmero e do subjetivo em suas poesias mostra outra face em sua numerosa obra em prosa. De 1920 a 1964, quando sua última crônica foi publicada na Folha de S.Paulo, a escritora escreveu cerca de 2.500 crônicas. Sua estréia na redação de um jornal se deu em 1930, década marcada pela transição de duas grandes guerras e, no Brasil, pela revolução de outubro.

Na imprensa pipocavam jornais de adesão ao novo regime. Assim surgiu o "Diário de Notícias", em junho de 1930. Mais do que um simples matutino, o jornal trazia uma seção diária dedicada à educação e à política, a "Página de Educação", cuja diretora era Cecília Meireles. Jornalista liberal, crítica, engajada, partidária incansável das liberdades individuais, lutava pela instauração de uma república democrática, bem diferente daquela regida pelo populismo autoritário do regime que se descortinava após a revolução. Acreditava na liberdade e na criatividade contra a opressão e a massificação da educação.

Os acontecimentos da época eram tratados por Cecília em suas crônicas pois, como nos aponta Massaud Moisés, o cronista sente realmente o que exprime. As crônicas em geral são breves e seu estilo direto, espontâneo e jornalístico, reagindo de imediato ao acontecimento (MOISÉS, 1982: 104). As idéias e críticas de Cecília, no entanto, foram recebidas com resistência e perseguições por motivos ideológicos, políticos e estéticos.

Era partidária dos princípios da Escola Nova, a escola moderna do filósofo norte-americano John Dewey e assistiu à ascensão de um estado autoritário e de uma Igreja Católica que tentava recuperar seu poder após quarenta anos de uma república laica, com ares positivistas. Se a história da literatura desconhece a Cecília Meireles da luta política, desconhece também a que sofreu perseguições da censura de Vargas, dos católicos e em concursos literários.

 


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