Economistas Voláteis e Juízes Malucos: dois males do Brasil contemporâneo



Economistas Voláteis e Juízes Malucos: dois males do Brasil contemporâneo (II)
Fazendo Justiça com as próprias mãos

 

I. Os males do Brasil: do simples ao desnecessariamente prolixo

Nos tempos de Monteiro Lobato e de Mário de Andrade, os males do Brasil pareciam mais simples e eram, talvez, até mesmo mais prosaicos: as saúvas, a febre amarela, o bicho do pé e, quem sabe, aquela preguiça macunaímica que nos distanciava da ética calvinista do trabalho. Aparentemente era um número reduzido de questões a serem resolvidas, quando, na verdade, elas constituíam por si sós, todo um programa de governo – que digo. um imenso problema de Estado – capaz de assustar qualquer candidato a Hércules em busca de novos trabalhos impossíveis.

Nos tempos modernos, depois de décadas de saneamento, de progressos na industrialização, de avanços na educação do povo e até mesmo, acreditem, de melhorias reais no funcionamento das instituições - com uma democracia plena, de ampla participação, ainda que de má qualidade, em substituição ao voto de cabresto e ao poder dos coronéis –, os males do Brasil também se sofisticaram e apresentam hoje maior complexidade técnica. Eles constituem, em todo caso, males de uma qualidade superior àqueles prosaicos problemas do nosso subdesenvolvimento clássico.

Hoje temos, por exemplo, o crime organizado, a fuga de capitais, a corrupção (esta, aliás, desde sempre), a insegurança pública nos grandes centros urbanos, a deterioração ambiental (como os desmatamentos incontrolados e a poluição industrial), os desequilíbrios regionais e sociais mais graves do que nunca, as supostas ameaças dos transgênicos e das células-embrionárias, a instabilidade cambial e, até mesmo, acreditem, a tal de teologia da prosperidade, um imenso e abrangente mecanismo de captação das poupanças privadas, um imenso sorvedouro dos recursos dos mais humildes por uma pujante e empreendedora ação religiosa, mais ativa, por certo, em determinados ramos e especialidades dessa florescente indústria do que em outras, mais tradicionais.

Esses problemas atuais são graves, sem dúvida alguma, e a eles vêem agregar-se uma série de outros, de tipo estrutural ou conjuntural, como o desemprego, o aumento do custo de vida – nos tempos de Lobato se falava de carestia –, as mensalidades da escola privada, o peso dos impostos e taxas, o nível dos juros e, até mesmo, acreditem, a falta de bons programas na televisão aberta. Não pretendo tratar, contudo, inclusive por uma questão de falta de competência, de todos esses problemas. Mas gostaria, tanto por deformação econômica como por vício sociológico, de abordar dois problemas que considero cruciais para o sucesso continuado dos processos de estabilização macroeconômica e de diminuição de riscos sistêmicos e institucionais no Brasil contemporâneo.

O título deste ensaio já terá revelado ao leitor a que tipo de problema eu me refiro, mas os dois adjetivos que anexei às nobres categorias dos economistas e dos juízes merecem certamente uma qualificação mais detalhada, de molde a não induzir esse mesmo leitor a pensar que eu considero todos os economistas voláteis por natureza e todos os juízes malucos potenciais. Longe disso: a maior parte dos representantes dessas duas categorias profissionais é constituída de pessoas normalmente bem formadas, sendo de ordinário sensatas e reputadas por um natural reservoso, típico daqueles que encaram sua profissão como um sacerdócio, não como um laboratório público, propenso a todo tipo de teste, para fins de melhorias sociais ou de reformas experimentais.

Desejo, no entanto, tratar de dois espécimes particulares dessas famílias mais amplas que, como todo ramo da especiação darwiniana, são capazes de abrigar tipos "desviantes", seja por deriva genética seja por inclinação lamarckiana. A esses tipos especiais da espécie eu chamo de "economista volátil" e de "juiz maluco", e já explico por que. Ambos têm por missão perturbar o habitat em que vivem, introduzindo custos de oportunidade social – isto é, um uso alternativo dos recursos caracterizado por uma má alocação de fatores – que são, no geral, mais elevados do que os retornos produzidos por sua participação na divisão social do trabalho. Ambos pretendem representar o conjunto da família, quando na verdade são elementos sui generis dentro da espécie, assim como eles nunca se assumem pelo que realmente são, já que pensam combater os mesmos males que ocasionalmente criam, com suas propostas heterodoxas e sentenças arbitrárias.

Não estou exagerando nas acusações, pois pretendo trazer provas do que afirmo, em cada um dos casos representativos. A única coisa que eles não fazem é atuar de comum acordo, embora possa ocorrer que juizes malucos tendam a se apoiar em propostas igualmente malucas de economistas voláteis e estes, por sua vez, podem aplaudir sentenças que eles julgam conforme o sentido da história ou pelo menos orientada para a correção das imensas desigualdades que mancham o nosso país. Vejamos esses casos mais de perto. Pretendo tratar, neste primeiro ensaio, dos economistas voláteis, deixando os juízes malucos para um segundo ensaio, certamente tão iconoclástico quanto este.

 


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