Partes: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12

 

Deste modo, o plano estratégico, sendo um trabalho de avaliação de potencialidades e objectivação de oportunidades, tem de ser público, debatido e referendado pela ‘massa crítica’ da cidade, além de exposto a nível nacional e internacional como instrumento forte, clarificador das intenções e propósitos da cidade, das novas linhas orientadoras/opções e das oportunidades para os que pretendem aí investir, visitá-la ou trabalhar.

Em concreto, o PECG, propõe alguns aspectos que devem reger o respectivo plano de divulgação [MANUAL/CMG, 1996]:

  • Adaptabilidade de linguagem em relação aos diversos sectores e segmentos da população;
  • Sistematização das acções em função dos calendários da cidade e das agendas dos destinatários;
  • Competitividade aberta na comunicação social em relação aos timings e conclusões dos planos estratégicos das cidades;
  • O reforço da ideia de capacidade de concretização;
  • A divulgação, "agarrada ao terreno", da existência e disponibilização do plano estratégico.

Por seu lado, o PEC-CB sugere uma componente editorial e uma componente de comunicação social por forma a divulgar o exercício de planeamento

O processo de comunicação é um elemento estratégico para romper com imagens negativas, nomeadamente ao contrariar os efeitos nefastos de alguns acontecimentos através de uma comunicação a vários níveis: nacional, nos media e imprensa especializada; local, à escala da cidade; dos bairros, através de agentes locais ou profissionais de comunicação. Esta comunicação visa não só informar os habitantes, mas é uma condição da apropriação dos próprios projectos pela população, sendo a palavra-chave de todos os projectos para antecipar ou gerir os conflitos e construir uma imagem mais consensual, no momento em que as realidades urbanas conhecem e produzem os mesmos efeitos de fragmentação social e territorial.

Os media são imprescindíveis neste processo, pois, podem popularizar os problemas, encorajar o debate das soluções para esses mesmos problemas e difundir as soluções. Além disso, poderão conceder legitimidade aos resultados, enaltecer quem os alcançou e, mesmo, monitorizar o processo, ao evitar actos fraudulentos e afastar os obstrucionistas [SAMPFORD, 2002]. Por outro lado, os media podem desempenhar um papel importante no envolvimento dos cidadãos. No entanto, a sua utilização tem riscos, pois normalmente estão mais interessados numa "boa história" do que no que se refere a questões de substância e o seu resultado é frequentemente imprevisível e incerto.

Neste sentido, a imagem de marca e as imagens de produtos específicos devem ser concebidas para formarem, em conjunto, uma imagem global que reforce a auto-estima local, o envolvimento e a participação dos cidadãos e actores no processo de planeamento. Deve, ao mesmo tempo, criar representações positivas nos indivíduos e organizações externos ao território [SOUTO GONZÁLEZ et al., 2001]. Por isso, é necessário criar uma imagem forte, que seja clara, coerente e qualificante.

Estas imagens têm que ser concebidas de modo diferenciado para poderem atingir com maior eficiência os diferentes públicos-alvo. Segundo este pressuposto, torna-se importante segmentar os públicos (pelo menos de forma elementar: habitantes, visitantes e investidores), e dividir o plano por temas, uma vez que permite juntar e confrontar os agentes com interesses em comum.

No entanto, divulgar só não basta, sendo necessário envolver os principais agentes e a sociedade civil local, como foi referido.

Pois, o marketing urbano é um instrumento de divulgação que pressupõe riscos, podendo, inclusivamente, constituir-se mais como uma manipulação de vontades da população (nomeadamente na sua componente de comunicação interna), construindo uma democracia amorfa e acrítica em vez de um processo sócio-cultural de base local e sustentado que promova uma mudança estrutural da cultura local.

Neste sentido, por forma a regular aquela situação e no sentido de converter o marketing urbano num projecto de construção de uma auto-estima local, da qualidade de vida e da competitividade acrescida pela fixação de recursos, defende-se que é fundamental equacionar de modo consistente o papel da participação e promoção da cidadania a partir de bases mais profundas. No entanto, mantém-se o problema de definição dos critérios de selecção ou escolha dos grupos e indivíduos que podem intervir no processo, e dos assuntos sobre os quais podem ter opinião os residentes, as associações e os sindicatos. Como atrás se disse, normalmente, os cidadãos têm uma maior percepção dos problemas locais do que os poderes públicos.

Neste sentido, é oportuno comprometer os cidadãos na procura de soluções para esses problemas e conceder-lhes um grau de responsabilidade política e institucional que os comprometa com o desenvolvimento da área onde vivem. Deste modo, aumentar-se-á a identidade territorial e a auto-estima local que será um dos objectivos principais do marketing territorial.

4.1.6 - Avaliação geral da implementação dos planos estratégicos

O Gabinete de Cidade (ou outro organismo análogo) deveria ter iniciado um processo de acompanhamento, numa primeira etapa, através de grupos de trabalho, debates, seminários, comissões de acompanhamento, etc. Concumitantemente, aquela estrutura deveria ter reunido periodicamente para ser efectuado um balanço do trabalho realizado, salientando as actuações iniciadas e o nível de implementação das medidas prioritárias. Devendo então ser realizado um relatório de acompanhamento do desenrolar dos trabalhos, com uma determinada periodicidade.

Dadas as escassas concertações público/privado, os esforços para a implementação das medidas dos planos têm sido da responsabilidade das Câmaras Municipais. Assim, avaliar o grau de implementação das medidas dos planos estratégicos, corresponde, grosso-modo a avaliar a execução do programa PROSIURB, pois, a maioria das intervenções realizadas estiveram dependentes do seu financiamento e alguns documentos não passam de simples reflexões que tratam de responder às exigências normativas dos domínios de actuação do PROSIURB em vez de encontrarem verdadeiras estratégias de actuação que valorizem as suas potencialidades e que promovam um desenvolvimento equilibrado e sustentável.

A gestão da implementação dos projectos contemplados com financiamento do PROSIURB, encontravam-se a cargo de funcionários da Câmara Municipal, não tendo sido, portanto, criado qualquer organismo específico. Por outro lado, o envolvimento dos actores privados ficou muito aquém do desejável. Como anteriormente se salientou.

O PROSIURB pretendeu dar um passo em frente na inovação institucional, no sentido de uma maior eficiência e flexibilidade na construção da cidade, porque em vez da definição de regras tentou contribuir para o estabelecimento de princípios estruturantes de desenvolvimento através de um processo negocial. Por isso, iniciou um processo que deveria ter continuidade.

No entanto, foram estabelecidos objectivos de política urbana que estavam normalmente para além da área da acção municipal, nomeadamente, aquelas que envolvem uma grande componente imaterial: emprego, atractividade económica, promoção cultural, promoção social, etc. e as autoridades locais não foram devidamente preparadas para lidarem com estas temáticas.

Outro factor de insucesso foi a não consideração das especificidades locais, pois, as cidades inserem-se em contextos diversificados, quer em termos de dimensão demográfica, bem como a sua localização em relação aos principais eixos e áreas de desenvolvimento, e à quantidade, variedade e qualidade dos seus recursos e instituições.

Saliente-se, ainda, que o PROSIURB, ao restringir o acesso ao financiamento às cidades possuidoras de plano estratégico e ainda ao definir o conteúdo e conceito dos planos estratégicos, ao fixar as cidades consideradas médias e, ainda, ao considerar que só um determinado tipo de acções eram passíveis de financiamento, condicionou o entendimento do planeamento estratégico e introduziu distorções na sua elaboração e implementação.

Em suma, na concepção do PROSIURB estiveram presentes perspectivas de contratualização, de articulação público-privado e a perspectiva da integração. Este programa previa o plano estratégico como instrumento de racionalização das propostas e da sua integração num projecto de cidade, contudo, o tempo para a formulação do plano foi mal aproveitado, tendo reflexos na qualidade do trabalho e nas deficiências observadas. No entanto, e apesar disso, os domínios de intervenção possuem alguma abrangência, pelo que seria desejável elaborar planos estratégicos que fossem além do âmbito do PROSIURB e que se constituíssem processos contínuos de aprendizagem e de actuação estratégica face aos desafios.

O planeamento estratégico deveria ser um complemento dos instrumentos de planeamento já existentes e a sua elaboração assentaria na cooperação entre agentes públicos e privados, partindo do princípio de que a participação de todos é condição necessária para garantir a máxima eficácia na sua concretização. Ou seja, foi a componente que falta aos PMOT (estes muito limitados às questões do uso do solo e com um carácter normativo), onde se devem entender os planos estratégicos, não como um novo plano, mas como parte integrante de um planeamento municipal mais estratégico e operacional.

4.2 – As formas de concertação e participação pública na experiência de planeamento estratégico na cidade de Aveiro

Pretende-se com esta secção reflectir sobre o processo de planeamento estratégico na cidade de Aveiro. De uma forma geral questionamo-nos acerca do grau de eficácia do processo implementado. Se conseguiu alterar algumas práticas e paradigmas de planeamento e funcionamento da autarquia e dos agentes urbanos. Ou seja, pela confrontação das experiências realizadas, avalia-se a pertinência da hipótese da passagem de um modelo hierárquico e burocratizado de planeamento para outro modelo participado, flexível e estratégico de gerir e planear a cidade.

Desta forma, pretendem-se avaliar as dimensões principais do planeamento estratégico: a transformação administrativa da autarquia, a criação de uma nova cultura de relacionamento entre os agentes (públicos, privados, associativos, etc.), através da criação de parcerias, e da participação pública dos cidadãos em geral, no devir da cidade. Além disso, dentro das parcerias entre agentes públicos, avalia-se se ocorreu um posicionamento diferente da cidade perante o exterior, nomeadamente através da criação de acordos de concertação com outras cidades afastadas ou autarquias limítrofes.

Para tal, tentou-se analisar criticamente todo o processo, mais através de uma observação participada e perscrutadora, do que pela percepção dos agentes implicados, ou dos técnicos municipais, que se supõe deveriam acompanhar o desencadear de todas as acções. No entanto, formulamos desde já a seguinte questão: o processo de planeamento estratégico na cidade de Aveiro foi sistémico, ou pelo contrário, foi um processo linear e unidireccional?

Um sistema pressupõe interacção e troca de experiências entre actores. Neste caso, também convém esclarecer um pouco mais este último conceito. Pois um actor, para assim ser designado, tem um papel importante num processo de planeamento, sendo uma peça-chave indispensável, pois interage com outros elementos, onde ao partilharem conhecimentos e experiências chegam à definição do plano de acção. Ora, o que aconteceu neste caso, a nada disso se assemelha. Pois, os actores dignos desse nome são os técnicos responsáveis pela elaboração do plano, e num grau muito restrito os elementos do Gabinete de Cidade.

Assim, ainda não se perdeu a prática de considerar o planeamento como uma actividade estritamente técnica, consistindo na elaboração de planos por parte dos agentes públicos, ou equipas técnicas externas à autarquia, com ausência de participação dos agentes locais responsáveis pela construção da cidade, constituindo assim uma maior preocupação pelo controlo da expansão urbana e dos agentes urbanos do que propriamente pela sua promoção e desenvolvimento. Esta prática de planeamento justificava-se num contexto de crescimento urbano, onde o seu objectivo era o de regular a ocupação do solo, fixando orientações de longo prazo da organização do espaço, tentando coordenar as intervenções territorializadas.

No entanto, as tendências actuais são outras. O crescimento urbano abrandou consideravelmente e os problemas prioritários tornaram-se os do crescimento económico e da redução das desigualdades sociais. De igual forma, também aparece um tipo de planeamento urbano menos jurídico e mais institucional quanto ao seu âmbito – o planeamento estratégico. Tendo como objectivo principal territorializar as políticas de desenvolvimento através de planos integrados que visem o tempo médio e longo e a articulação entre instituições e sectores de intervenção.

De facto, o planeamento estratégico trata-se de um processo institucional e não de um procedimento jurídico, que recai na elaboração de uma visão estratégica e situa-se à escala de toda a cidade, sendo pois, uma ‘intervenção’ de toda a comunidade local. Com o plano estratégico pensa-se no global, para se planear a nível urbano e actuar localmente.

Desta forma, o novo planeamento, ou o planeamento emergente, tenta ultrapassar a vertente estritamente técnica de formulação dos planos, abrangendo uma vertente de concertação muito forte entre uma multiplicidade de agentes e actores urbanos. Além disso, são documentos com uma dimensão estratégica e heurística, ou seja, estão voltados para uma actividade de planeamento que, envolvendo a participação dos agentes locais, se vai construindo por acordos e negociações, garantindo a participação alargada dos cidadãos e dos agentes interessados.

No entanto, a cultura jurídico-institucional portuguesa tende a reduzir os instrumentos de planeamento e ordenamento à definição de normas e de regulamentos, desconhecendo que a gestão e planeamento estratégico, seja actualmente, um movimento de grande amplitude, que se pode observar em numerosos países europeus [HEALEY et al., 1997].

De facto, se nos últimos 30 anos várias mudanças ocorreram em Portugal, nomeadamente ao nível da repartição da estrutura económica, da alteração dos modos de vida e algumas mudanças no papel do Estado (nomeadamente na maior autonomia das autarquias locais), desta forma, acompanhando o desenrolar da evolução experimentada em outros países europeus, reclama-se uma maior flexibilidade para o planeamento.

A anunciada descentralização não se pode fazer sem uma democracia concebida à escala local e concretizada na gestão da cidade, onde o debate e a participação pública são entendidas como o símbolo da democracia, e onde os planos se adaptem mais facilmente a um contexto de mudanças estruturais e conjunturais. Assim à democracia representativa, já mais ou menos consolidada, há que complementá-la com a democracia participativa, pois só assim se conseguem cidadãos livres e responsáveis, partes constituintes de uma sociedade mais justa, solidária e competitiva.

Contudo, actualmente, à medida em que se consolida a ideia do regime democrático como a melhor prática de governo, os sistemas políticos clássicos, baseados na cultura da representatividade, que teriam que a sustentar, dão sinais de esgotamento, estimulando a não participação, o distanciamento, deixando os mandatários, após eleitos, livres para escolherem sem acompanhamento, sem controlo social directo.

O Estado, afastado do controlo social, torna-se presa fácil de interesses privados, sejam eles oriundos de seu próprio interior (clientelismo ou tecnocratização) ou exteriores (lobismo corporativo). Numa sociedade, onde o Estado cumpre a função de regulador das relações sociais e económicas, o resultado do abandono da participação na vida política é trágico. Secundarizado o papel da política, o substrato social é a fixação de metas individuais exclusivamente relacionadas com o próprio bem estar material, fazendo surgir cidadãos apáticos e egoístas (materialismo e individualismo), despreocupados com os assuntos comunitários.

A tradição de relacionamento clientelista, baseado na troca de favores entre o cidadão e o poder público, induz à passividade e inviabiliza a participação da população. É, então, necessário encontrar maneiras de quebrar a passividade e a relação de clientela e estimular a participação. Pois, mesmo que, de uma forma geral, as decisões raramente satisfaçam toda a gente, por vezes tenta-se legitimá-las em nome do interesse geral, que, quanto muito, servem para afirmar que quem decide é o porta-voz desse interesse geral e que tem a legitimidade necessária para acabar com o debate.

Ora, em urbanismo é mais pertinente raciocinar em termos de interesses de grau e de natureza diferente. Pois, frequentemente, as decisões têm o carácter de uma arbitragem política e não de uma escolha justificada por uma lógica técnica ou por um cálculo económico. Pois, a política pode ser entendida como a arte de escolher entre dois inconvenientes, ou a ‘arte do compromisso’ ou ainda, "a arte do possível" [Bismark, cit. por SLOTERDIJK, 1997: 7].

A participação social implica abrir canais na construção da governabilidade. Representa em si o cimento de uma nova democracia, não somente a clássica democracia representativa, articulada nas instituições políticas. Inclusive a crise da política é detonada pela crise da democracia represen-tativa, ou seja, pela nula credibilidade da população nos processos eleitorais (constatada nas eleva-das taxas de absentismo eleitoral). Perante esta situação, uma nova estratégia política deve estimu-lar a democracia participativa, ou seja, transformar o cidadão em protagonista da mudança política.

Na sua essência, a participação não põe em causa o funcionamento da democracia representativa, ela enriquece-a. Uma vez que pode melhorar a adequação dos projectos às necessidades, mobilizar os actores, aumentar a pertinência de fazer com os habitantes em vez de fazer para os habitantes. Esta abordagem toma, por outro lado, em conta a vontade dos habitantes de não serem somente consumidores, mas actores do seu quadro de vida.

A participação pode permitir aos habitantes julgarem os projectos existentes, elaborar e apresentar projectos próprios, ou de gerirem o seu quadro de vida. Por outro lado, a redefinição das instituições do poder local na perspectiva da adopção de formas de democracia participativa exige a introdução de mecanismos de democratização no acesso às informações que digam respeito à gestão das políticas locais. Não há autonomia de decisão nem de opinião se não houver informação sobre condições e contextos. Ou seja, a população, para poder interferir nas decisões, tem o direito de ter acesso às informações que tornem a decisão mais livre e eficiente.

Assim, tornar transparentes as informações sobre os mecanismos de gestão é condição imperiosa para o sucesso das políticas participativas. Desburocratização de trâmites, descentralização da gestão e transparência nas decisões são pré-requisitos para a constituição de uma forma de democracia inovadora na gestão do poder municipal. A democracia participativa supõe o reconhecimento da pluralidade de actores presentes na cidade e o compromisso efectivo com a construção de processos de decisão que incluam as concepções divergentes, de modo a estabelecer verdadeiras arenas públicas de negociação e de decisão.

4.2.1 - Contextualização do surgimento do plano estratégico da Cidade de Aveiro

O Plano Estratégico da Cidade de Aveiro foi elaborado com a finalidade de a Câmara Municipal se candidatar aos fundos do PROSIURB, embora, o dito documento faça referência a um segundo objectivo que seria a definição de linhas orientadoras das estratégias de desenvolvimento a implementar no futuro, muitas delas correm o risco de cair no esquecimento ou caducar num futuro mais ou menos próximo.

É um documento onde se apresentam alguns projectos estruturantes para a cidade com visibilidade no ordenamento do território, mas onde a inovação institucional não foi abordada de forma contundente, nomeadamente no que se refere à melhoria do capital humano e da potenciação do capital social. Em vez disso, pressupõe a actuação verticalizada por parte dos agentes públicos.

Dito de outra forma, aposta-se mais nas operações de urbanismo do que em exercícios integrados de desenvolvimento económico e social, através da concepção de um projecto global para a cidade na sua articulação com a região (esta debilidade poderá estar directamente relacionada com a predominância de arquitectos na formulação do plano).

Um dos grandes desafios da actualidade é a criação de emprego, no entanto, há que atender que o grande empregador é o sector privado, pois, o emprego é antes de mais o resultado da vivacidade das actividades económicas. Neste sentido, aquando da execução de exercícios de planeamento estratégico há que criar, ao nível local, um quadro adequado para se poder agir neste sector, onde a administração local, no âmbito das suas competências, poderá, em coordenação com as empresas, fomentar a criação de trabalho temporário.

Assim, deveria ter sido um documento que envolvesse um maior número de agentes possível, e da população em geral, ainda antes da formulação do plano, e não depois como insipidamente foi feito, só assim, se resolveriam e aproveitariam muitos dos desafios que se colocam à cidade, conjugando esforços por parte dos agentes institucionais, económicos e sociais no sentido de se obter uma maior eficácia e sinergias das suas intervenções e do alcance da melhoria da qualidade de vida da população residente, bem como dos utilizadores da cidade e dos turistas. Deste processo surgiria uma ideia de cidade, que seria mais ou menos consensualizada entre todos os seus habitantes, valorizando-se desta forma as suas especificidades intrínsecas e idiossincráticas.

Além disso, no momento presente não se pode esquecer a vertente da concertação interurbana, não só com as localidades mais próximas, mas também com cidades mais ou menos longínquas (ao nível das respectivas administrações e instituições).

4.2.2 - Processo de formulação do plano

O plano estratégico da cidade foi encomendado a uma equipa externa (com uma composição pluridisciplinar), que procedeu à sua formulação em três etapas [CMA, 1997]:

  • Na primeira etapa procedeu-se à redacção de um Diagnóstico Estratégico por parte da equipa técnica externa;
  • Posteriormente, a mesma equipa, procedeu à realização de uma Matriz Preliminar;
  • Na terceira etapa elaborou-se o Projecto de Plano Estratégico, onde se apresenta a estrutura final do Plano Estratégico para a cidade, o qual inclui a definição de objectivos e linhas estratégicas, bem como um conjunto de 99 Projectos/Acções que deveriam ser alvo de análise, aprofundamento e selecção, por forma a obter o Plano Final. Foram ainda definidas as medidas e acções para a implementação dos «projectos estruturantes» e para os projectos considerados prioritários.

Concomitantemente, procedeu-se à realização de quatro encontros temáticos, sendo convidados diversos agentes representativos de vários sectores relevantes na cidade. O primeiro encontro, serviu para a equipa técnica entregar uma síntese do Diagnóstico Estratégico e da Matriz Preliminar, para apreciação por parte dos membros que o constituíam, e o segundo para o debate de ideias surgidas após a entrega do primeiro relatório.

No entanto, o debate foi pouco conclusivo, uma vez que se baseou em considerações de carácter muito geral, salvo as observações no que se refere ao sector da cultura, que era muito parco naquele projecto de plano, sendo então proposta a criação de um Gabinete de Cultura, que ainda não foi implementado. Os outros dois encontros ocorreram após a entrega do plano, sendo pouco relevantes, pois, os debates resumiram-se a considerações generalistas e sem quaisquer resultados palpáveis, não havendo um comprometimento sério por parte dos seus participantes, encarando estas reuniões como uma mera formalidade, sem esperarem algo de novo.

Por outro lado, dada a diversidade dos campos de intervenção, os actores tiveram dificuldade em apreciarem e terem uma visão de conjunto da cidade, ficando-se por reparos restritos, exclusivos e limitados à sua área de intervenção. Sendo, então visíveis visões ‘paroquiais’ dos participantes.

Este ‘paroquialismo’ pode ser explicado pela relutância em actuar de forma colaborativa. GRAY [1989, cit. em MARGERUM, 2002: 248] explica este comportamento dos participantes ao valorizarem a eficiência em vez da criatividade e da resolução de problemas e predominando o individualismo, onde a negociação é encarada como uma fraqueza.

O relatório final foi entregue em Março de 1997, criado-se nesta altura o Gabinete de Cidade, sendo pedido um parecer sobre o plano estratégico a cada um dos agentes ou instituições, posto isto, o documento foi submetido a aprovação na Assembleia Municipal. No entanto, todo este processo foi demasiadamente centrado na equipa técnica e onde, insipidamente, se consultaram as principais instituições e agentes políticos, económicos, sociais, culturais e desportivos da cidade, e onde a participação da sociedade civil ficou de fora. Além disso, algumas das instituições presentes no Gabinete de Cidade não chegaram a dar o seu parecer ao plano estratégico.

Assim, o Gabinete de Cidade deveria ter sido criado antes de se iniciar o processo de formulação. Desta forma, a equipa técnica auscultaria primeiro os vários agentes, e só depois procederia à definição da visão estratégica e respectivas medidas de execução.

Aqui perdeu-se uma oportunidade para democratizar as decisões em planeamento urbano, mais adaptadas ao contexto real, e não relacionado com as burocracias obsoletas, discricionárias e nada transparentes. Além de que foi um organismo criado já na fase final do processo de formulação do plano, e que as alterações àquela proposta inicial foram mínimas, o que pode supor ou um bom trabalho anterior realizado pela equipa técnica que conseguiu o consenso de todos os elementos do Gabinete de Cidade, ou que o trabalho de reflexão foi mínimo, ou inexistente, não havendo assim um debate aberto e construtivo, acerca do futuro da cidade.

Depois da entrega do documento final pela equipa técnica externa, o Gabinete de Cidade, seguindo o consignado na legislação, emitiu um parecer onde se identifica (bem intencionadamente) como "uma estrutura de natureza consultiva que tem por objectivo avaliar o Plano Estratégico, animar e acompanhar o seu processo de implementação", denominando o documento formulado como "um suporte altamente qualificado e extremamente útil para o processo de Planeamento Estratégico em curso", considerando importante a continuidade da dinamização deste organismo no apoio ao exercício do planeamento estratégico. Só que do plano das intenções ao plano das acções vai uma distância abismal. Pois, o Gabinete de Cidade não avaliou o grau de implementação das acções, nem tal foi efectuado por qualquer outro organismo municipal ou externo.

Pura e simplesmente, o plano estratégico foi considerado aquando do concurso ao PROSIURB, durante muito tempo foi quase olvidado, pois as realizações foram mínimas e pontuais, além de que serviu de apoio à candidatura ao Programa POLIS, pois, foram apresentadas a concurso algumas das suas acções.

No entanto, depois de o Gabinete de Cidade dar aquele parecer ao plano estratégico, formalmente não foi extinto e contrariando as expectativas criadas, nunca mais se reuniu, esperando a convocação da Câmara Municipal. Assim, as suas actividades foram quase irrelevantes, as parcerias entre o sector privado e o sector público foram incipientes, e não houve qualquer participação da sociedade, por forma a criar um espírito colectivo de cidade.

Segundo AMDAM [1999], o processo de planeamento deve ter um início ou iniciativa espe-cífica. Na maioria das vezes os exercícios eficazes iniciam-se com pequenas ambições e à medida que os participantes aprendem a confiar uns nos outros, são formulados objectivos mais ambiciosos e são admitidos no processo novos participantes. No entanto, no caso estudado tal não aconteceu.

Assim, durante a formulação do plano, as discussões foram quase inexistentes, pois os agentes revelaram uma visão muito parcelar da cidade. Em vez disso era de grande utilidade que fosse o Gabinete de Cidade a definir as acções prioritárias e a definir projectos estruturantes dinamizadores da cidade, não deixando de olhar para a cidade como um todo e na sua articulação com a envolvente. Outro aspecto importante seria a apresentação de medidas concretas, mas viáveis, ou seja, possíveis de implementar, em vez de definir situações ideais e não realizáveis, que foi o que aconteceu. Apresentou-se um leque alargado de acções que idealizam um futuro risonho para a cidade, mas antes disso, não se olhou para os recursos existentes e mobilizáveis para a realização dessas acções. Desta forma, o importante é canalizar os recursos escassos, para projectos estratégicos, mas com capacidade de exercerem um arrastamento positivo no desenvolvimento da cidade.

Não serem projectos pontuais e isolados, mas sim projectos realizáveis, financiados, mobilizadores e com carácter abrangente para toda a cidade, de forma que a cidade como um todo ‘veja e sinta’ os seus efeitos positivos.

Ora, o que aconteceu, foi que se apresenta um rol exagerado de acções – 103 – mas não se apresentam os respectivos planos operacionais de execução. Desta forma, o plano estratégico perde credibilidade, pois não passa de um documento de intenções.

Assim, o plano deveria apresentar as medidas por ordem de importância, distinguir as medidas que podem ser implementadas de forma imediata, de outras medidas a implementar a longo prazo. E essas medidas que não pudessem ser implementadas imediatamente, teriam que ser revistas periodicamente, pois a realidade é mutável, e o plano tem que se adaptar a essas mudanças, alterá-las mas também ser moldado por elas, nunca pode ser concebido como um produto acabado.

Devendo considerar dois aspectos na definição e escolha dos projectos: o seu cariz estratégico e o conceito de sustentabilidade. Ou seja, evitar os projectos de cariz imediatista pensados nos ciclos político-partidários, mas em vez disso pensados no que é melhor para a projecção da cidade no futuro. Em vez de visar os resultados dos próximos actos eleitorais, pensar sim no bem geral da colectividade, mesmo que para tal seja necessário sacrificar alguma popularidade; por outro lado, deverão ser projectos, com carácter abrangente, apoiados principalmente em três pilares fundamentais: que visem a integração social e territorial no tecido urbano e das classes sociais, ao mesmo tempo deve-se pensar em termos da sua rentabilização e, além disso, deve preservar e não agredir o ambiente.

Desta forma, tanto a participação da população como a criação de parcerias com agentes privados e sociais é imprescindível. Só que neste caso, os cidadãos não foram envolvidos em todo este processo. Este envolvimento deve ser constante, desde o período que antecede a formulação do plano até à sua implementação. Pois, é imprescindível ouvir a sua opinião ainda antes de a equipa de peritos elaborar o plano, mas depois de executar as medidas, é necessária a conservação, animação e rentabilização do projecto.

Outro aspecto tem a ver com a articulação entre agentes públicos, nomeadamente a criação de parcerias intermunicipais, no caso de haver projectos que envolvam mais do que um município. Se no projecto preliminar constava uma maior articulação (ou cooperação intermunicipal) entre as câmaras de Ílhavo e de Aveiro, esta medida foi retirada do documento final. Assim, a debilidade institucional destas poucas experiências não conduziu a estádios mais maduros de desenvolvimento da concertação intermunicipal.

Relativamente ao plano, é um documento muito voltado para a cidade consolidada ou para os eixos de expansão física, esquecendo os subúrbios que necessitam de um ordenamento do espaço público. Pois as suas grandes tónicas são a afirmação económica, a renovação urbana, e alguma protecção do ambiente nas áreas consolidadas da cidade. "Uma cidade é um sistema. Não se pode contentar em ter uma acção reparadora sobre este ou aquele bairro" [SUEUR, 1999]. Por outro lado, ao negligenciar-se a cidade como um todo, está-se a menosprezar a sua sustentabilidade. A cidade não é, por definição, sustentável, mas, como lugar e nó de relações sociais e económicas e como centro de um espaço natural mais alargado, tem exigências de funcionamento e eficiência (económica e social) que só têm viabilidade com a adopção de políticas que enquadrem e implementem, no longo prazo, a valorização e protecção dos recursos ambientais e a equidade social, como prioridades internas e como elemento estruturante da sua relação com o exterior.

Neste caso específico, recomenda-se que seja adoptada uma estrutura organizacional que favoreça o desenvolvimento de mecanismos de mobilização e participação que conduzam a um envolvimento das instituições e cidadãos em geral na formulação e legitimação das estratégias de desenvolvimento. Se privilegie a criação de parcerias público-privado e a responsabilização dos diferentes actores pela concretização das propostas do plano na fase de implementação, devendo ser incluídas acções e projectos intermunicipais que concretizem uma estratégia de desenvolvimento comum, pois a ‘cidade real’ ou funcional, vai além dos limites administrativos.

4.2.3 - Novas orientações na concepção de desenvolvimento urbano: do plano estratégico para o projecto estratégico

Nos últimos anos tem-se vindo a caminhar no sentido de tornar a dar maior relevância a alguns projectos estruturantes que sejam, por si só, capazes de promover o desenvolvimento urbano, sendo concebidos como motores de desenvolvimento da cidade. Assim, se alguns dos planos estratégicos das grandes cidades foram concebidos para contextualizar e enquadrar grandes intervenções de urbanismo (como foram os projectos da Expo’98 em Lisboa e da cidade olímpica de Barcelona’92), durante uma década deu-se menos importância a estes projectos pontuais, mas com alguma relevância no desenvolvimento do tecido urbano, olhando para a cidade como um todo. Só que numa época de escassez de recursos, há que definir prioridades de investimento. Pois, chegou-se à conclusão que era extremamente difícil realizar aquela visão de cidade ideal pré-concebida nos planos estratégicos.

Assim, cada vez mais se volta à escolha de poucos projectos, mas com carácter de efeito multiplicador, devendo estar, contudo, devidamente enquadrados por um plano estratégico, de forma que com algumas intervenções pontuais seja a cidade na sua globalidade e não só uma área específica ou um conjunto limitado e restrito de indivíduos a beneficiarem, aumentando a segregação.

É dentro deste contexto que surge o Programa POLIS, embora com algumas deficiências na sua definição, pois encerra dos mesmos erros do Programa PROSIURB, nomeadamente:

  • A forma discricionária e pouco transparente de escolha das intervenções, tendo sido a administração central a nomear os gestores do programa, devendo antes, a avaliação das candidaturas ser efectuada por uma entidade gestora independente, segundo regras e princípios claros, premiando a iniciativa local e a criatividade através da qualidade e da inovação [CABRAL, 2002]. O facto, porém, de o projecto de qualificação e valorização da cidade ser da escolha e iniciativa do poder central tem um efeito desmobilizador da capacidade de intervenção da sociedade civil e dos agentes e actores locais, comprometendo a valorização dos recursos endógenos e a capacidade de ser simultaneamente competitiva e coesa;
  • A ênfase limitada na promoção de parcerias, continuando a incidir na vertente assistencialista;
  • A ausência de participação da sociedade civil, reduzindo desta forma os efeitos que poderiam ser disseminados e apropriados pelos restantes agentes como modelo de regeneração urbana (sendo este um dos objectivos do programa);
  • A abrangência limitadora das intervenções [MAOT/CMA, 2001], nomeadamente o realce exagerado e exclusivo do elemento «água», como se a «valorização ambiental das cidades» não passasse por outros domínios. Além disso o documento de apresentação do programa visa, exageradamente e irrealisticamente, um futuro idealmente idílico para a cidade de Aveiro, mas não propõe as estratégias correspondentes para o alcançar.

Desta forma, dever-se-ia aproveitar esta oportunidade de em conjunto com o financiamento por parte da administração central aproveitar a concertação com outros agentes de forma a assumir e implementar projectos concebidos como motores de regeneração urbana, flexibilizando e descentralizando a tomada de decisões na selecção das intervenções, devendo esta ser tomada a nível local.

Assim, seria de realçar a importância dos projectos que fomentassem a acessibilidade (em termos físicos e no que respeita às comunicações), bem como projectos de regeneração urbana, criadores de uma imagem mais cativante e de melhoria da qualidade de vida dos residentes. Estes projectos urbanos tornariam a cidade mais acessível e por isso mesmo mais competitiva.

No entanto, este programa continua a atribuir uma importância significativa aos projectos de infra-estruturas, transportes e estacionamento, pontualmente associadas à construção de equipamentos colectivos e à abertura de frentes de urbanização. Este programa financia directamente as seguintes acções na cidade de Aveiro [MAOT/CMA, 2001]:

  • «Reconversão e re-funcionalização da zona da Antiga Lota do Porto de Aveiro;
  • Requalificação ambiental e urbana da área delimitada pelo canal Central, canal das Pirâmides, IP 5 e TERTIF;
  • Requalificação da envolvente do canal de S. Roque, canal dos Botirões e Mercado do Peixe;
  • Requalificação das áreas envolventes ao canal do Cojo e ao canal da Fonte Nova e reabilitação do Mercado Manuel Firmino;
  • Parque Central da Cidade;
  • Centro de interpretação e monitorização ambiental».

É objectivo do Programa POLIS em Aveiro, garantir a mobilização de vontades e indução de outros investimentos públicos ou privados. Só que a ausência de um processo participativo, de avaliação de impactes e da rentabilização do investimento público torna difícil, à partida, garantir a eficácia do projecto. Além disso, como não se envolveram outros agentes, a sua internalização e a sua divulgação a outras áreas da cidade serão dificultadas.

Durante a concepção dos projectos urbanos há que ultrapassar o mero carácter funcionalista e de curto prazo. Segundo BORJA e MUXÍZ [2000], os projectos urbanos devem ser programados como um compromisso entre objectivos diversos: funcionamento urbano, promoção económica, redistribuição social, melhoria ambiental, integração cultural, entre outros. Devendo ser previstos os impactes estimados e não desejados para os reduzir ao minímo.

Assim, o projecto de desenvolvimento necessita de ser enquadrado por um plano estratégico, que dê coerência às acções pontuais implementadas, de forma a integrá-las. Desta forma, o planeamento estratégico urbano necessita:

  • Que se fundamente na qualidade de gestão da cidade, nomeadamente através de uma transformação organizativa e institucional da autarquia;
  • Que proponha projectos concretos (alguns dos quais estruturantes e com capacidade real de transformação), que sejam ‘projectos motores’ de desenvolvimento urbano;
  • Que tenha em conta os agentes reais internos e externos à cidade bem como a sociedade civil em sentido amplo.

Desta forma, se em termos de desenvolvimento urbano, se tem dado maior relevo nas grandes cidades ao projecto urbano emblemático, nas cidades de média dimensão se dá (ou deveria dar) maior importância às questões do desenvolvimento regional e local.

4.2.4 - Análise do grau de realização do plano estratégico

Na avaliação da implementação das medidas constantes no plano estratégico devem colocar-se algumas questões prévias, nomeadamente: Qual a situação actual do processo de implementação dos planos?; Do total de medidas propostas quantas foram implementadas?; E quantas se encontram em fase de execução?

O plano estratégico de Aveiro previa a criação de um Gabinete de Cidade e Conselho do Planeamento Estratégico, de uma Agência de Desenvolvimento Local, de um Gabinete para a coordenação e promoção de eventos e realizações culturais e desportivas, bem como, a reorganização dos serviços do município [CMA, 1997].

Todavia, as acções implementadas até à presente data foram feitas de uma forma discricionária, dependendo, ou do financiamento da administração central, ou da decisão dos agentes privados, ou, ainda, da arbitrariedade da autarquia. Algumas estão em fase de arranque, outras nem sequer se iniciaram, ou por má programação, falta de financiamento, ou desentendimento dos parceiros envolvidos. Assim, as parcerias poderiam ser em maior número e estabelecidos mecanismos que obrigassem os tomadores das medidas a realizá-las em tempo oportuno. Haveria, neste caso, que aproveitar melhor os efeitos mobilizadores da realização do campeonato europeu de futebol, recorrendo para tal ao marketing territorial. A cidade repensada, reanimada e reconstruída será o farol do crescimento económico.

Como era intenção do Gabinete de Cidade continuar a reunir após a aprovação do plano estratégico, deveria o mesmo avaliar e monitorizar todo o processo. Pois algumas acções envolvem o sector privado, ou parcerias público-privado, e desta forma, nunca deve ser a autarquia a ter a exclusividade do acompanhamento destas acções.

Por outro lado, o dia-a-dia da autarquia está muito dependente dos ciclos político-partidários e dos caprichos partidários dos seus elementos, que não podem parar investimentos de vulto de forma arbitrária. Assim, mais uma vez é de salientar a importância de uma estrutura do tipo ‘Gabinete de Cidade’, que seja isenta, neutra e objectiva, que tenha uma visão ampla dos desafios que a cidade enfrenta, nas suas dimensões económica e social. Pois, de uma forma geral, quem desenvolve a cidade é o sector privado, mediado pelo sector público.

Este gabinete poderia definir as prioridades, alterá-las se o contexto, ou algum acontecimento inesperado assim o justificasse, bem como, debater e discutir com alguma regularidade o grau de progresso dos trabalhos, adicionar, ou retirar medidas, consoante as situações. Apostar-se-ia, assim, num planeamento flexível e ajustável ao contexto de mudança externa. Flexibilidade entendida não como incapacidade de previsão, mas como um mecanismo que permitisse a adequação do plano às transformações ocorridas, dando também margem de manobra para se lidar com a incerteza de comportamento desses cenários.

O plano foi aprovado há 5 anos, um número ínfimo de medidas foram realizadas, outras estão a dar os primeiros passos. Mas a grande maioria foi esquecida. Perante este cenário, é com alguma facilidade que se avalia o grau de execução do plano.

Assim, das medidas propostas no plano estratégico da cidade de Aveiro, no âmbito do PROSIURB, foram realizados os seguintes projectos:

  • Alargamento e arranjo do «Canal da Fonte Nova», junto ao Centro de Congressos e sua envolvente, permitindo o acesso e estacionamento das embarcações. Esta acção integrou a recuperação e valorização dos canais da cidade, surgindo como um elemento de valorização do espaço público central da cidade e criando um elemento urbano que reforce a tradicional presença da água na imagem de Aveiro;
  • A execução do «Eixo estruturante, 1.º troço, 1.ª fase», teve como objectivo criar melhores condições de acessibilidade à zona nascente da cidade e melhor articulação ao centro, desempenhando um papel importante na reestruturação urbanística da cidade, porque permitiu aumentar a conexão de freguesias periféricas com as áreas centrais;
  • Apoio a novas formas de mobilidade no espaço urbano (incluindo as seguintes vertentes: restrição da circulação automóvel, incremento do transporte colectivo urbano, criação de vias pedonais e ciclovias, e promoção de novos meios de acesso e circulação);
  • Construção da «Passagem superior para peões na Av. Artur Ravara», permitindo aceder à universidade e áreas adjacentes, com o objectivo de restringir o trânsito automóvel e promover a circulação e a segurança pedonal;
  • Finalmente, cabe ainda referir, a acção «Museus Municipais», que se traduziu na recuperação e valorização de dois imóveis que fazem parte do património histórico e cultural da cidade.

Algumas encontram-se em curso de execução (em 2002):

  • Ou são da iniciativa do sector privado: construção de um «centro de negócios» e do «parque de feiras e exposições», com o objectivo de reforçar a coesão e articulação empresarial, e da promoção externa da capacidade produtiva da região; a «urbanização da zona centro», com o objectivo de requalificar e reordenar a área central da cidade.
  • Da iniciativa da autarquia: como é exemplo a «animação urbana do centro», com o objectivo de dinamizar a área central da cidade; a recuperação do edifício da Capitania, a criação de um espelho de água (centro de congressos), com o objectivo de valorizar o património histórico e valorizar a água na criação de uma imagem de cidade.
  • São executadas através de parcerias público-privado: a «construção do estádio de futebol e de atletismo» e a «construção do centro de estágio», com o objectivo de melhorar a estrutura de práticas desportivas através da sua diversificação e actualização, apoiada na distribuição de equipamentos que capacitem o concelho para uma resposta crescentemente adaptada à procura desportiva e que permitam um maior aproveitamento das condições proporcionadas pela Ria, e que permita afirmar a centralidade desportiva de Aveiro no contexto nacional.
  • São da responsabilidade da administração central: a «construção do IC 1», com vista à melhoria das acessibilidades intermunicipais (abertas à consulta pública as duas alternativas projectadas).

As intervenções financiadas pelo programa POLIS, têm como principal objectivo requalificar áreas pontuais da cidade, dando uma grande ênfase às frentes de água e à componente de valorização ambiental, constando do plano estratégico, embora, algumas delas, com designações diferentes. Das 103 acções, a grande maioria não teve nenhum seguimento e não são esclarecidos os motivos que justifiquem o atraso. Além disso, não foi efectuado nenhum ajustamento do plano. O plano foi elaborado e em parte esquecido, em vez de se adaptar às actuais condições de intervenção, sendo actualizado e remodelado se necessário.

Deveria, também ser dada importância à componente da avaliação. Devendo ser efectuada quer pelos técnicos que elaboraram o plano estratégico, bem como pelo Gabinete de Cidade, ou então, por uma entidade externa a pedido dos agentes envolvidos (públicos e privados). Esta última tem a vantagem de ser mais imparcial e transparente.

Antes de mais, os técnicos responsáveis deveriam começar por avaliar o plano (de uma forma geral, é um exercício muito rápido, pois as realizações foram mínimas) considerando a análise das transformações sócio-económicas que comprometeram as acções do plano estratégico, acompanhar os factores externos que podem afectar o desenvolvimento da cidade, centrar a atenção nas questões estratégicas, informando e analisando a evolução da sua execução e fazer a distinção entre a avaliação das acções estratégicas a levar a cabo e o conjunto da cidade.

4.3 – Síntese das considerações sobre o processo de planeamento estratégico

Considerando os aspectos anteriores, convém sintetizar algumas críticas à forma como decorreu o processo de planeamento nas cidades de média dimensão, salientando algumas razões do seu insucesso, bem como algumas recomendações.

As experiências de planeamento estratégico nas cidades de média dimensão prendem-se com o facto de estas localidades desempenharem um papel fundamental nas estruturas urbanas, constituindo uma alternativa ao modelo polarizador das áreas metropolitanas. Desta forma, o modelo de desenvolvimento pretendido deveria possuir uma visão global, a qual comportasse as funções de integração territorial e sectorial.

Além disso, o planeamento destas cidades deveria proceder ao estabelecimento e consolidação do equilíbrio entre as aspirações e os sucessos econó-micos, sociais, culturais e ambientais, ou seja, a aposta na sustentabilidade. Em grande parte dos planos estratégicos, estas ambições estão explicitadas, embora raramente tenham sido executadas.

Se há 5 anos ter um plano estratégico era moda, era também um instrumento de obter financiamentos (a ‘eterna atitude assistencialista’) e não um instrumento de apoio ao desenvolvi-mento num contexto de mudança e concorrência entre territórios. Em muitos casos o planeamento estratégico foi mais um exercício de marketing político para alguns eleitos se auto-promoverem do que um exercício verdadeiramente estratégico.

Normalmente a equipa técnica externa não é imparcial nem objectiva, pois cede às exigências de quem a contratou. Não obstante, o processo de planeamento iniciado renovou, ainda que tenuemente, algumas formas de pensamento e de acção, assistindo-se a uma tomada de consciência pelos responsáveis locais, de que o destino das cidades depende cada vez mais das suas iniciativas e da capacidade de mobilização.

A implementação dos planos estratégicos está a ser efectuada de uma forma discricionária, revelando desvios acentuados entre as intenções aprovadas e as práticas ocorridas através da análise do processo de execução dos documentos de estratégia. Além disso, no processo de formalização não foram criadas quaisquer condições de monitorização e avaliação dos mesmos, designadamente a criação de uma estrutura de acompanhamento que efectuasse a constante avaliação dos impactes de implementação e do cumprimento dos objectivos.

Mesmo havendo desajustamentos não houve uma preocupação efectiva em proceder a uma reformulação dos planos. Em planeamento estratégico é necessário fazer apostas viáveis e desejáveis para o futuro das cidades, aproveitar as oportunidades mobilizadoras por forma a concretizar as acções e, ao mesmo tempo, adoptar uma metodologia adaptada a cada caso, nomeadamente uma metodologia interactiva e participativa.

Com insistência, os planos estratégicos fazem apelo à participação, no entanto, buscou-se mais a participação selectiva dos agentes institucionalizados da sociedade civil e não a participação da população em geral, ou dos agentes com capacidade de acção, resultando assim, documentos muito tecnocráticos com uma componente de implementação muito fraca. Além disso, não houve transformações significativas em termos de governância urbana, pois os municípios raramente descentralizaram as suas decisões nem fomentaram uma maior cultura cívica. Um processo participado cria um ambiente propiciador para a implementação, reforçando a coesão social da comunidade, o aumento da solidariedade e o crescimento económico.

De facto, a participação dos cidadãos, tanto pode dificultar o acordo sobre as políticas, como enriquecê-las, ao permitir tomar decisões mais fundamentadas, informadas e consensualizadas. Além da participação é importante a ‘capacitação’ dos cidadãos, entendida como o fomento da sua capacidade de empreender e de fazer. É um investimento na sociedade civil, na sua mobilização e na sua autonomia: "uma cidade motivada é uma cidade motivadora para os outros parceiros" [KAISERGRUBER, 2001: 106]. Mas esta capacitação necessita de uma mudança cultural: a abertura das mentalidades.

Assim, o planeamento estratégico, só tem eficácia se desencadear um processo de diálogo e de relacionamento activo entre os autarcas e os principais agentes das cidades. Importa, pois, criar um movimento de reflexão tendo em vista definir um projecto colectivo de cidade, consensualmente assumido, e estabelecer as principais estratégias e tácticas visando a realização desse projecto.

O envolvimento do sector privado é indispensável, mas este só se envolve se existir uma elevada probabilidade de realizar lucros importantes em relação ao seu investimento inicial. Para os atrair, é então essencial reforçar a sua confiança e limitar as suas incertezas. Para reduzirem os riscos financeiros podem constituir parcerias com outros investidores, sobretudo em operações de larga escala. Estas parcerias envolvem sempre complexas negociações e delicadas lideranças mas, simultaneamente, possibilitam a emergência de novos cenários de concertação e de novas alianças institucionais.

No entanto, há que atender a que os objectivos económicos e as estratégias políticas não se sobreponham aos valores de índole social, que não visem somente medidas de curto prazo, contrariamente aos objectivos do desenvolvimento sustentável. Aqui o sector público tem um importante papel de regulador. Às autoridades públicas cabe, pois, o papel de elemento orientador e mobilizador do conjunto dos recursos privados. "Será a boa combinação do intervencionismo e do partenariado a chave do sucesso, imediato ou futuro" [KAISERGRUBER, 2001: 107].

Por outro lado, a autarquia local deve deixar de ser uma simples instituição burocrática para a gestão de determinados actos administrativos e desempenhar um papel de instituição promotora que adquire um papel cada vez mais activo no desenvolvimento do território. Deixar de ter uma atitude reactiva perante a inevitabilidade das tendências, mas que actua activamente na sua potenciação. Neste contexto, a modernização da administração municipal e da sua operacionali-zação, da sua agilização, flexibilização e apetrechamento logístico, é uma questão crucial.

Assim, há que modificar as relações com os cidadãos e encontrar formas de envolver os técnicos das autarquias neste processo, designadamente em domínios em que a reflexão estratégica se cruza com as áreas de intervenção tradicional da Câmara Municipal, evitando estrangulamentos internos e falta de coordenação. O empenhamento do presidente de Câmara é crucial, porque se tal não acontecer os planos estratégicos estão condenados ao fracasso. Acrescente-se que a componente da comunicação é fundamental, porque só esta é que faculta e cria condições para a participação e a mobilização.

Por outro lado, a preocupação de actuar em simultâneo sobre as várias dimensões, faz com que se exija demasiado ao plano acabando este por se tornar indefinido e inoperacional. Assim, deveria apostar-se também em planos estratégicos sectoriais ou, em termos urbanísticos, no denominado ‘projecto urbano’. Pois, aqueles planos constituem um instrumento de precisão para a planificação em profundidade dos sectores chave para o desenvolvimento da cidade. De facto, os planos estratégicos sectoriais são muito mais domináveis tanto pela delimitação do âmbito de actuação como pelo número e variedade de actores. Ao plano estratégico de cidade caberia consensualizar ideias e vontades, integrando a perspectiva sectorial numa perspectiva territorial. Se bem que é certo que cada área funcional da cidade deve ter os seus próprios objectivos e estratégias, estas devem estar orientadas no mesmo sentido que as globais.

Concluindo, muitos dos planos estratégicos foram apresentados mais como uma carta de intenções do que como um documento de realizações efectivas. Desta forma, fez falta uma avaliação efectiva que devia ter decorrido ao longo de todo o processo. Pois, é importante que se definam acções desejáveis, mas que sejam também realizáveis e implementadas, em vez de se definir, somente, um futuro desejado para a cidade. Não se trata aqui de censurar o planeamento estratégico. Esta forma de planeamento na sua essência tem bastantes virtudes, no entanto, a forma como foi realizado em Portugal, ficou muito aquém das suas premissas. Pois tendo em atenção os fundamentos teóricos que lhe estão na origem, questiona-se se o défice da ‘cultura de planeamento’ não será um handicap muito mais estrutural de todo o sector público e institucional.

CONCLUSÃO

Nesta parte final pretendem-se reunir os argumentos que permitam encadear o raciocínio que presidiu à presente investigação, bem como a explicitação de propostas que abram caminho para futuro trabalho de aprofundamento e comprovação de algumas hipóteses formuladas, indo-se mais além da apresentação da síntese geral daquilo que oportunamente foi referido ao longo dos capítulos anteriores.

A perspectiva abrangente do planeamento estratégico veio trazer novas orientações aos exercícios de desenvolvimento das cidades portuguesas, nomeadamente das de média dimensão, vindo lutar contra as limitações do planeamento urbano tradicional e a tendência geral para a realização de operações sectoriais e fragmentadas. Além disso, a atenção dada aos factores e processos sócio-económicos e a sua ênfase nas abordagens integradoras fizeram-no parecer um procedimento de planeamento superior.

Todavia, embora, já desde há algumas décadas se caminhe, em termos teóricos, para um novo modelo de planeamento, menos restringido às questões físicas e de ocupação e uso do solo, os antigos métodos de planificar as cidades parecem continuar inscritos nos espíritos e nas práticas dos responsáveis políticos e técnicos (secção 4.1.3). Referimo-nos, concretamente, aos agentes públicos que normalmente tomam a iniciativa da realização de exercícios de planeamento e aos técnicos responsáveis pela sua formulação.

Deste modo, muitos autores defendem que os planeadores devem alterar o seu papel e o modo de pensar, devendo combinar a sua vocação de peritos com atitudes de mediação, aproximando mais o pensamento da acção, por forma a serem agentes de transformação social.

No entanto, em Portugal existem tendências pesadas. Umas são motivadas pelo peso da história. Outras são de ordem técnica, funcional e financeira, nomeadamente o fraco grau de autonomia dos municípios e o peso relativo do Estado central. Além disso, poder-se-ão juntar outros factores de ordem estrutural, nomeadamente, os de cariz sócio-cultural, como sejam o individualismo, a desconfiança e o atomismo entre agentes, instituições e cidadãos, próprios de uma sociedade fragmentada. Verificando-se, então, uma implementação discricionária das medidas constantes nos planos estratégicos formulados ao abrigo do PROSIURB, na medida em que ocorreram desvios bastante visíveis entre as propostas formuladas e as realizações efectivas, pois, tendo em atenção os fundamentos teóricos que lhe estão na origem, foram exercícios que ficaram muito aquém das suas premissas.

Mudança de paradigma do desenvolvimento

Muitos autores são unânimes em afirmar que o momento actual é de transição, caminhando-se para um novo paradigma que ainda não está bem definido. Um dos elementos mais visíveis deste período contemporâneo é a mudança na organização económica, tendo-se passado de uma sociedade industrial para uma sociedade pós-industrial caracterizada por formas de organização económica pós-fordistas, onde o sector terciário e as áreas urbanas têm cada vez mais relevância.

Além disso, o fenómeno abrangente da globalização, originado pela fluidez das trocas e de fluxos, também coloca novos desafios aos territórios e, em particular, às cidades de média dimensão. Cabendo a estas uma dupla função, que assenta no desenvolvimento e consolidação como locais inovadores e crescentemente competitivos e, por outro lado, a de coesão territorial e social, privile-giando as relações de interdependência com o território regional envolvente.

Assim, estas cidades têm um importante papel na estruturação do território, permitindo não só manter as populações e as actividades económicas nos seus locais de origem, como, também, descongestionar outras áreas urbanas mais saturadas. Foi neste âmbito que se criou o programa PROSIURB, instrumento despoletador da introdução, em Portugal, do planeamento estratégico neste tipo de cidades.

Outra mutação é de ordem cultural, reflectindo novas preocupações culturais pós-modernas de diversidade e diferença, enfatizando o saber crítico, reflexivo ou hermenêutico. Enquanto que o período moderno era homogeneizador, universalizador e não estabelecia diferenças entre os indivíduos, a pós-modernidade fomenta o pluralismo e o singular. Surgem novas preocupações, nomeadamente, uma maior consciencialização ecológica, com a sua ênfase nos limites do crescimento económico, bem como na importância da qualidade ambiental e da coesão social. Estas mudanças nas concepções ambientais e sociais estão inter-relacionadas com os conceitos relativos e ambíguos de qualidade de vida e de desenvolvimento sustentável.

Assiste-se a uma crescente indiferença perante as questões da vida colectiva (abstencionismo político, desconfiança nas instituições, desrespeito pela autoridade, etc.), enquanto se cultiva a vida privada e o individualismo. A razão deu lugar à subjectividade e ao sentimento. Como consequência, o homem pós-moderno não tem certezas absolutas, nada o surpreende e as suas opiniões são susceptíveis de modificações rápidas.

Os media tiveram aqui o seu papel, pois, ao contrário de homogeneizarem o pensamento, difundem as mais diversas concepções do mundo. As minorias étnicas, culturais, sexuais, religiosas ou estéticas tomaram a palavra e o indivíduo pós-moderno, submetido a uma avalanche de informações e estímulos, difíceis de estruturar, optou pelo deambular de umas ideias para outras. Abandonada já a ideia de que só existe uma forma de humanidade verdadeira, cada qual age mais pelo sentimento do que pela razão. Ao nível teórico, os pós-modernistas e os pós-fordistas desafiam os conceitos modernistas de centralidade, crescimento hierárquico e controlo burocrático do desenvolvimento territorial [KHAKEE, 1997] e salientam, em vez disso, um desenvolvimento urbano pró-activo, fragmentado e baseado em redes.

Um terceiro aspecto dessa transição é sublinhado pela mudança da filosofia política e organização do Estado providência universalista para abordagens neoliberais mais orientadas pelo mercado [HEALEY, 1997a]. Este aspecto tem alterado as formas e os métodos de governação, pois, o sector público devido a limitações de ordem financeira é cada vez mais incapaz de promover o desenvolvimento, recorrendo à colaboração dos sectores privado e associativo, nomeadamente através da realização de parcerias. Além disso, a influência crescente dos movimentos de protecção ambiental e de outros grupos de pressão organizados levou a uma maior atenção aos impactes dos projectos e a incluir a participação da população na sua definição. Desta forma, as cidades são obrigadas a encontrar formas de promoção do desenvolvimento de forma multidimensional e pró-activa.

Em suma, vive-se um contexto de mudança e por isso de incerteza, onde a organização dos sistemas territoriais e a nova ordem económica mundial marcada pela globalização das relações económicas e pela evolução tecnológica afectam as formas de estruturação económica e territorial, bem como a subsequente reorganização dos sistemas institucionais (secção 1.2.1), redefinindo, desta forma, as relações dentro da hierarquia urbana e, neste processo, alterando o papel das cidades de dimensão média. Aquele fenómeno, quer seja uma ameaça, quer seja transformado em novas oportunidades, acarreta reflexos profundos ao nível do planeamento territorial.

 

Desafios para as cidades de média dimensão

As experiências constantes do presente estudo referem-se a algumas cidades de média dimensão da Região Centro de Portugal. A nomenclatura deste tipo de cidades tem variado consoante as modas e as diferentes concepções da organização territorial, das cidades médias das décadas de 1960 e 1970 até às cidades intermédias/intermediárias de inícios da década de 1990, reflectindo assim a transição da utilização de critérios meramente quantitativos para posicionar estas cidades, a meia distância entre os pequenos aglomerados e as grandes cidades, para uma concepção mais volátil e, por isso mesmo, menos rígida da definição de cidade, onde interfere uma diversidade de critérios, desaguando-se numa certa ambiguidade e relativismo (secção 1.1). No entanto, considerando essa variedade de critérios, poder-se-á afirmar que as ‘cidades de média dimensão’ são aquelas que apresentam potencialidades, nomeadamente, em termos de qualidade de vida e qualidade do ambiente, relativamente às cidades de maior dimensão, contudo, são cidades onde, em termos de dinamismo económico e de oportunidades de emprego, ficam aquém daquelas, sendo por isso necessário, por um lado, preservar e promover aquelas amenidades e, por outro, fomentar a sua competitividade através de políticas pró-activas e de discriminação positiva enquanto motores de desenvolvimento regional e local. De facto, estas cidades, ao contrário das grandes cidades, ainda têm uma componente significativa de inter-relações com o seu hinterland envolvente, sendo, pois, relevante a função que a cidade desempenha com esse território mais ou menos imediato e as relações que exerce e mantém dentro deste. Assim, qualquer exercício de planeamento para as cidades de média dimensão deve considerar este último aspecto.

A sua dimensão permite-lhes reunir as vantagens das economias de aglomeração das grandes cidades, sem contudo, assumirem a maior parte dos seus inconvenientes. Admite-se, assim, que nas cidades de média dimensão é possível conciliar as relações humanas e a qualidade ambiental com a promoção económica, num contexto em que as relações institucionais entre agentes públicos e privados são mais estreitas. Tendo, então, maiores potencialidades e maiores probabilidades de êxito na implementação de processos de planeamento estratégico e participativo, capazes de promover a economia e aprofundar a democracia local. Ainda, pela sua dimensão, estas cidades constituem um espaço privilegiado para a articulação entre políticas descendentes (que se traduzem na descentralização de equipamentos e serviços) e as ascendentes (sustentadas nas dinâmicas locais). Acrescente-se, ainda, que a sua posição intermédia entre as grandes cidades e as áreas rurais pode permitir-lhes absorver desconcentrações produtivas e fornecer localizações alternativas.

Por outro lado, verifica-se que, face à sua média dimensão, têm dificuldades em atrair fun-ções e actividades mais qualificadas, reter recursos humanos melhor qualificados e em responder aos desafios da globalização, acarretando, desta forma, problemas de autonomia funcional face aos processos de crescimento das áreas metropolitanas, acentuando os processos de marginalização.

Por isso, em Portugal, se o crescimento recente da população tem favorecido as cidades de média dimensão, todavia, este período de crescimento poderá ser transitório. Se não for implementada nenhuma política que vise o favorecimento de um novo desenvolvimento específico destas localidades, arriscam-se a periclitar a médio prazo em benefício das grandes cidades, mesmo que estas percam parte do seu poder atractivo. Assim, tais cidades devem-se organizar em rede e encarar o futuro de forma pró-activa. De facto, se por agora, estas cidades ainda possuem algumas amenidades, a tendência geral é para a polarização, para a concentração urbana e, em Portugal, este fenómeno é bem visível, assistindo-se ao despovoamento das menores povoações e das áreas de menor densidade. Além disso, o carácter global da economia e a expansão da concorrência (globalização) têm impactes variáveis nos lugares e nos grupos sociais, de forma que as políticas públicas devem visar tanto a promoção económica como a prevenção e resolução de consequências sociais e ambientais indesejáveis.

Além da globalização, a sustentabilidade tornou-se outro dos maiores desafios para as cidades, uma vez que estas para serem atractivas terão que combinar a competitividade económica com a preservação ambiental e a promoção da equidade social. Deste modo, o progresso depende da capacidade das cidades enfrentarem os desafios do futuro, a sua adaptabilidade, a pró-actividade e a sua abertura à mudança. Transformar os problemas em oportunidades é o maior desafio para todos os actores e decisores. Por isso, todas as abordagens que visem o desenvolvimento requerem visão, estratégia e tácticas e, acima de tudo, cooperação e acções concertadas.

Ou seja, estes desafios só poderão ser ultrapassados e aproveitados através da implementação de instrumentos de planeamento e desenvolvimento apropriados, que regulando a intervenção de todos os agentes no tecido urbano, sejam adaptados às especificidades locais, mas onde as orientações genéricas do planeamento estratégico terão um papel indispensável (secção 1.3.2).

 

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