O Poder e a Glória: a questão das assimetrias no sistema internacional



1. A questão das assimetrias de poder no sistema internacional

A noção pura de assimetria se refere a diferenças estruturais, que podem ser naturais ou adquiridas. No sistema internacional, o conceito aparece geralmente associado a conotações negativas, que se traduzem nos famosos diferenciais de poder político ou de poder econômico que separam os países do mundo. Essas assimetrias costumam dividir os países em um grupo restrito de nações poderosas – as superpotências –, um outro grupo intermediário de potências médias – que poderiam ser chamados de países emergentes, aqui com diversas qualificações – e, finalmente, o resto, isto é, países menores e sem grande peso na comunidade internacional, em termos políticos, econômicos ou demográficos.

Não parece haver dificuldade em se reconhecer o grupo de nações mais poderosas do planeta. Elas são, obviamente, os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, detentores, desde 1945, da responsabilidade última sobre a paz e a segurança mundial (com a exceção de China, que só substituiu a China nacionalista, hoje Taiwan, em 1971). Esse foro atuou de forma muito precária na era da Guerra Fria, em função do direito de veto concedido a cada um dos membros e da falta de cooperação política em diversos conflitos regionais. Esse grupo também ostenta enormes assimetrias entre si, sobretudo nos planos econômico e tecnológico, e comportou conflitos inconciliáveis entre alguns dos seus membros, mas o impasse militar foi de certa forma assegurado pelo chamado "equilíbrio do terror", imposto pelo domínio da arma atômica, ou por alianças estáveis ou ad hoc, como no caso da OTAN e outros arranjos especiais.

Esse grupo pode e deve receber a agregação de pelo menos duas outras potências reconhecidas, o Japão e a Alemanha, que não integram (ainda) o foro mais importante da segurança internacional, devido justamente ao cenário de 1945, mas que hoje constituem, respectivamente, o segundo e o terceiro maiores contribuintes financeiros do sistema da ONU, são membros fundadores do G-7 e ativos participantes de missões humanitárias e de peace-keeping da ONU. Eles não foram, e ainda não são, parte ativa em operações de peace-making (aliás, bem raras na história do CSNU) em virtude dos arranjos especiais pós-Segunda Guerra que resultaram na diminuição de seu status militar e na virtual tutela exercida pelos EUA sobre sua capacidade ofensiva.

2. O poder é a capacidade de projetar poder militar

Quando se pensa em assimetria de poder, se está pensando, portanto, nesse grupo de nações poderosas no plano militar, no domínio econômico e tecnológico e, sobretudo, na capacidade financeira de prestar ajuda ao desenvolvimento e de tomar iniciativas no plano multilateral. O poder, em termos primários, é sobretudo a capacidade de projetar poder, isto é, ser capaz de empreender operações militares em territórios distantes e de impor-se pela força sobre quaisquer adversários. Os EUA são, a esse título, o único poder verdadeiramente hegemônico da atualidade. Todas as demais potências não são capazes de se confrontar a seu poder incontrastável, salvo uma coalizão inesperada e virtualmente impossível no atual cenário internacional.

Numa segunda linha de poder relativo, poderiam ser colocados alguns países que acederam ao domínio do poder nuclear, por razões essencialmente regionais ou locais, e que podem vir a desempenhar um papel importante no cenário internacional. Nesse grupo podem ser colocados a Índia, verdadeira potência regional, e Israel, por circunstâncias especialíssimas que não se reproduzem em outros contextos. O Paquistão e a Coréia do Norte também possuem capacitação nuclear, mas essa situação foi criada por cenários de conflitos em suas respectivas regiões e persistem dúvidas sobre a manutenção dessa capacidade no futuro de médio prazo, assim como sobre sua capacidade de projetar forças além de seus respectivos territórios.

Outros países perseguiram no passado, ou ainda perseguem, a posse da arma atômica, ou mesmo estão em condições de fazê-lo, se assim o desejarem, mas sua capacitação depende de várias circunstâncias nem sempre controláveis por eles mesmos. Estão ou estiveram, nessa condição, o Brasil e a Argentina, no cenário sul-americano, a República da África do Sul, na África subsaárica (que renunciou à sua capacitação no momento de transição do apartheid para o regime de maioria negra), a Líbia, mas de maneira muito incipiente, e o Irã, de maneira mais ativa e ainda hoje. O Iraque tentou adquirir capacidade nuclear ofensiva, sob o regime de Saddam Hussein, mas foi oportunamente detido pela comunidade internacional, vale dizer, pelos EUA. A esses países, poderiam ser agregados o Canadá, a Alemanha e o Japão, que seriam capazes, se assim o desejassem, de se dotar de armas atômicas em poucos meses, se houvesse decisão nesse sentido.

Esta é, portanto, um tipo de assimetria elementar, aquela baseada numa certa capacitação militar, mas ela é, ainda assim, muito diferenciada em função dos atores e de seus demais vetores de poder primário, isto é, militar. Ela é importante, decisiva mesmo num cenário de conflitos militares e de instabilidade político-militar, mas ela não é a única, nem a mais relevante num cenário de crescente interdependência global.

 


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