Transtorno bipolar do humor e uso indevido de substâncias psicoativas

Enviado por Ronaldo Laranjeira


RESUMO

O transtorno bipolar e o uso indevido de substâncias psicoativas são doenças com alto potencial de limitação de autonomia, tornando-se ainda mais sérios quando associados. Este artigo apresenta as evidências científicas disponíveis acerca da epidemiologia, etiologia, evolução clínica, diagnóstico e tratamento farmacoterápico e psicossocial da comorbidade transtorno bipolar do humor e o uso indevido de substâncias psicoativas.

Palavras-chave: Transtorno bipolar, abuso de substâncias, comorbidade, tratamento.

 

ABSTRACT

The bipolar disorder and substance abuse are illness with highly autonomy limitation potential, becoming still more serious when associates. This article presents the available scientific evidences concerning the epidemiology, etiology, clinical evolution, diagnosis and pharmacological and psychosocial approaches designed for the bipolar disorder and substance abuse comorbidity.

Key words: Bipolar disorder, substance abuse, comorbidity, treatment.

 

 Introdução

O uso indevido de substâncias psicoativas pelo paciente bipolar é extremamente comum e mais freqüente do que o observado na população geral (Kessler, 2004). Tal associação é capaz de alterar a expressão, o curso e o prognóstico de ambas as patologias (Levin e Hennesy, 2004; Krishnan, 2005), mesmo quando o consumo de álcool e/ou drogas é considerado de baixo risco ou moderado (Os et al., 2002; Shrier et al., 2003). A presença de outro transtorno psiquiátrico em dependentes químicos torna mais provável a procura desses por tratamento, fazendo com que as comorbidades sejam bastante recorrentes nos ambulatórios e enfermarias especializados (Grant, 1997; Hersh e Modesto-Lowe, 1998). Apesar da prevalência bem demonstrada, ainda há uma grande quantidade de lacunas, tais como a ausência de parâmetros diagnósticos confiáveis e a falta de metas terapêuticas apropriadas, que colocam o psiquiatra em situações de dúvida e indecisão. Este artigo apresenta as evidências científicas acerca da etiologia e da evolução clínica dessa comorbidade, seus critérios diagnósticos, bem como as estratégias farmacológicas e psicossociais disponíveis.

Epidemiologia

Os transtornos relacionados ao consumo de substâncias psicoativas estão entre as patologias psiquiátricas mais comuns. Em um estudo realizado em três capitais brasileiras (Brasília, São Paulo e Porto Alegre) no início dos anos noventa, o uso indevido de álcool foi detectado em quase 10% da população, e mais da metade desta estava desprovida de tratamento (Almeida-Filho et al., 1992). O I Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas no Brasil (2001) (Carlini et al., 2001) detectou que cerca de dois terços da população já consumiu álcool pelo menos uma vez na vida e outros 10% são dependentes da substância. Quanto ao uso de drogas ilícitas e prescritas, quase um quinto dos brasileiros o fez. Entre estudantes do ensino fundamental e médio, o consumo de álcool atinge 70% deles, enquanto o de outras substâncias, 25% (Galduróz et al., 1997).

O transtorno bipolar do humor acomete cerca de 1% da população geral brasileira (Almeida-Filho et al., 1992). Mesmo sendo pouco freqüente, seu impacto sobre a vida dos indivíduos e seus grupos de convívio se traduz em um sério problema de saúde pública. Além disso, o conceito da doença sofreu reformulações significativas nos últimos anos, ampliando-se o seu espectro (Angst, 2004). Desse modo, estudos mais recentes apontam para índices de prevalência até cinco vezes maiores, se comparados aos atuais (Akiskal, 1996). A partir desses novos critérios, cerca da metade dos indivíduos com diagnóstico para depressão unipolar poderia ser considerada portadora de transtorno bipolar tipo II (Perugi e Akiskal, 2002). Isso significa que essa categoria de transtorno bipolar pode ser mais prevalente que a depressão maior, requerendo atenção redobrada por parte dos profissionais e órgãos de saúde (Angst, 2004).

O transtorno bipolar é a patologia do eixo I mais associada ao uso indevido de substâncias psicoativas. Os índices de comorbidade com o uso indevido de álcool atingem 60% a 85% desta população ao longo da vida (Regier et al., 1990; Vieta et al., 2001), enquanto o consumo de outras substâncias psicoativas (excluído o tabaco), de 20% a 45% (Strakowski e DelBello 2000; Krishnan, 2005). O uso de indevido de álcool e drogas parece ser mais prevalente no sexo masculino, apesar de não haver diferença com as mulheres no que concerne ao uso de algumas substâncias, como a cocaína (Cassidy, 2001). Além disso, o consumo pelas mulheres de substâncias psicoativas chega a ser de quatro a sete vezes mais intenso do que a média geral para o mesmo sexo (Hendrick et al., 2000).

Já entre os pacientes com problemas relacionados ao uso de álcool e drogas, um quarto apresenta algum transtorno do humor associado (Hasin e Nunes, 1998). Nos serviços especializados, a prevalência de dependentes químicos com depressão associada pode atingir 50% e com transtorno bipolar, de 20% a 30% (Grant, 1997; Hersh e Modesto-Lowe, 1998). Esses achados foram corroborados no Brasil por Cividanes (2001), que encontrou uma porcentagem de 22,4% de transtornos relacionados ao consumo de álcool entre 85 pacientes internados em dois hospitais psiquiátricos e um serviço ambulatorial. Por outro lado, Menezes e Ratto (2004) observaram psicóticos (incluindo o transtorno bipolar do humor) em diversos ambientes de tratamento em São Paulo e encontraram uma baixa porcentagem de uso nocivo (4,2%) e dependência (3,1%) de álcool. Quanto ao uso indevido de outras drogas, 8,3% dos participantes referiram algum consumo nos últimos 12 meses, sendo a maconha (5,2%), os benzodiazepínicos (4,1%) e a cocaína (2,6%), os mais consumidos.

Antecedentes familiares de uso indevido de álcool e drogas são muito comuns nos pacientes acometidos pela comorbidade em questão (Nolen et al., 2004). A prevalência é ainda maior quando, além do transtorno bipolar e do uso de substâncias psicoativas, um transtorno de conduta é diagnosticado (Biederman et al., 2000).

 


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