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Fatores limitantes ao crescimento do capim-tanzânia em um sistema agrossilvipastoril com eucalipto, (página 2)

Daniele Rebouças Santana Loures; Rasmo Garcia; Odilon Gomes Pereira; Paulo

 

4. Material e métodos

O estudo foi conduzido na Fazenda Riacho, pertencente à CMM, localizada no município de Paracatu, Minas Gerais. A região apresenta vegetação natural de Cerrado, e está situada à latitude 17°13'S, longitude 46°52'W e altitude de 650 m. A área experimental foi uma das subdivisões (2,0 ha) de um sistema agrossilvipastoril da Fazenda Riacho, cuja área total é de 50 ha. O sistema estudado foi implantado em novembro de 1993, tendo como componente arbóreo o Eucalyptus urophylla, plantado no espaçamento 10 x 4 m, com as linhas de plantio orientadas no sentido leste-oeste. Junto com o plantio do eucalipto, foi realizado o cultivo de arroz em suas entrelinhas. A adubação do eucalipto constou da aplicação, nas linhas de plantio, de 240 kg/ha de fosfato natural de Araxá, 120 kg/ha de gesso agrícola e 48 kg/ha de óxido de magnésio, e ainda de 100 g/cova da fórmula NPK 10-28-6. Para o arroz, foi realizada uma calagem, para elevar a saturação de bases para 50%, e aplicados 150 kg/ha da fórmula NPK 4-30-16.

O capim-tanzânia foi estabelecido em novembro de 1994. O preparo da área para o plantio da gramínea consistiu de uma gradagem na área correspondente às entrelinhas do eucalipto. A adubação constou de 400 kg/ha de fosfato natural de Araxá e 100 kg/ha de superfosfato simples, aplicados a lanço, antes da gradagem. A gramínea foi semeada a lanço, utilizando-se 10 kg de sementes por hectare. O sistema tem sido utilizado para a engorda de novilhos desde 1996, principalmente durante o período chuvoso.

O solo da área experimental é um Latossolo Vermelho-Escuro (LE) distrófico e álico, com textura muito argilosa, cujas características químicas são apresentadas na Tabela 1.

O experimento foi implantado no dia 9 de janeiro de 1999, em uma área localizada 40 metros a partir da borda do sistema agrossilvipastoril. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos casualizados, com quatro repetições. Os tratamentos foram distribuídos no arranjo fatorial 23, sendo constituídos por doses de nitrogênio (0 e 100 kg/ha de N), fósforo (0 e 70 kg/ha de P2O5) e potássio (0 e 100 kg/ha de K2O). As fontes de nitrogênio, fósforo e potássio foram, respectivamente, sulfato de amônio, superfosfato simples e cloreto de potássio.

As unidades experimentais foram constituídas por parcelas de 4,0 m², localizadas a 2,0 m da fileira de eucalipto. A demarcação das parcelas no campo foi realizada procurando-se obter o máximo de uniformidade entre as mesmas, pois o sub-bosque apresentava-se irregular quanto à cobertura do solo. O sub-bosque de toda a área experimental foi rebaixado a 15 cm de altura, com a utilização de uma roçadeira costal motorizada. O material cortado foi retirado de dentro das parcelas, para facilitar a distribuição dos adubos e também para não interferir na rebrotação da gramínea. Os adubos foram aplicados a lanço, logo após o rebaixamento do sub-bosque.

Em seguida à demarcação das parcelas no campo, foi realizada uma avaliação visual de cada parcela, atribuindo-se escores com base na seguinte escala: 1 - péssimo; 2 - ruim; 3 - regular; 4 - bom; e 5 - excelente. O critério utilizado para a atribuição dos escores foi a situação da parcela quanto à cobertura do solo e ao vigor das plantas. Estes escores foram utilizados como covariável, de modo a aumentar o controle local e melhorar a precisão do experimento, devido à redução do erro experimental.

Foram realizados dois cortes para avaliação da resposta da gramínea aos tratamentos aplicados, sendo o primeiro em 16 de março de 1999, 66 dias após a aplicação dos tratamentos, e o segundo em 15 de maio de 1999, 60 dias após o primeiro corte. Em cada avaliação, coletou-se a forragem contida em uma área de 1 m², no centro de cada parcela, a 15 cm de altura. O material coletado foi pesado e subamostras de, aproximadamente, 300 g foram retiradas e congeladas em freezer para serem transportadas ao Laboratório de Nutrição Animal do DZO/UFV, onde foram colocadas para secar por 72 horas em estufa com circulação forçada de ar, a 65°C, moídas com peneira de 1 mm e submetidas às seguintes análises: MS, por secagem a 105°C; N, pelo método semi-micro Kjeldahl; K (fotometria de chama) e P (colorimetria), após digestão nítrico-perclórica (SILVA, 1990).

Ao término do período experimental, coletou-se uma amostra de solo na profundidade de 0 a 10 cm, em cada parcela experimental, de modo a se obter uma amostra composta para cada tratamento. Cada amostra composta foi separada em duas subamostras: uma foi imediatamente congelada para posterior análise dos teores de N-NO3- e N-NH4+, de acordo com metodologia descrita por TEDESCO et al. (1985), e a outra foi colocada à sombra para secar e passada em peneira de 2 mm para obtenção da terra fina seca ao ar (TFSA). Nesta, foram determinados os teores de P e K disponíveis, obtidos pelo extrator Mehlich-1 (DEFELIPO e RIBEIRO, 1981).

Os dados obtidos no ensaio de adubação NPK foram analisados estatisticamente de duas formas: aqueles em que o efeito da covariável escore foi significativo (P<0,05), foram submetidos à análise de covariância, e os demais foram submetidos à análise de variância. As análises de variância e covariância foram realizadas utilizando-se o procedimento GLM do programa SAS (LITTELL et al., 1991). As médias dos dados analisados por covariância foram ajustadas utilizando-se o comando lsmeans, também do procedimento GLM do programa SAS. Como todos os tratamentos possuíam apenas um grau de liberdade, as médias foram comparadas pelo teste F.

5. Resultados e discussão

Resposta à adubação NPK

A distribuição das chuvas durante o período experimental foi muito irregular. Durante o primeiro período de crescimento (9 de janeiro a 16 de março de 1999), a precipitação acumulada foi de 442 mm, sendo que a maior parte (350 mm) ocorreu nos últimos 25 dias do período. Já no segundo período de crescimento (16 de março a 15 de maio de 1999), a precipitação acumulada foi de apenas 103 mm, dos quais 90 mm ocorreram nos primeiros dois dias. Essa baixa pluviosidade durante o segundo período de rebrotação reduziu bastante o crescimento do capim-tanzânia, em relação ao primeiro, fazendo com que a resposta aos tratamentos aplicados praticamente desaparecesse (Figura 1). Em razão disso, a discussão da resposta da gramínea à adubação NPK será fundamentada, principalmente, nos resultados obtidos no primeiro corte.

Quanto à taxa de acumulação de MS do capim-tanzânia, a análise de variância mostrou que não houve interação entre os nutrientes aplicados, sendo que no primeiro corte houve efeito apenas da adubação nitrogenada (P<0,001) e, no segundo corte, tanto da adubação nitrogenada (P<0,01) quanto da potássica (P<0,05) (Figura 1). De fato, no primeiro corte, a resposta da gramínea à aplicação de 100 kg/ha de N foi expressiva, havendo incremento de 84% na taxa de acumulação de MS, em relação aos tratamentos não-adubados com N. Além disso, as plantas recuperaram sua coloração verde normal e apresentaram-se mais vigorosas, com folhas maiores e mais largas e colmos mais grossos. Isso demonstra que o crescimento da gramínea, neste sistema agrossilvipastoril, estava sendo restringido pela baixa disponibilidade de nitrogênio no solo.

Os resultados obtidos no primeiro corte mostraram que a adubação nitrogenada elevou o teor de N (P<0,01) da gramínea, sendo que o contrário ocorreu com a aplicação tanto de fósforo quanto de potássio (P<0,05), que resultaram em ligeira diminuição dos teores de N do capim-tanzânia (Tabela 2a). Quanto ao teor de P, houve efeito negativo tanto da adubação nitrogenada (P<0,001) quanto da potássica (P<0,05), sendo que a adubação fosfatada elevou o teor de P (P<0,001) da gramínea (Tabela 2b).

A análise de variância mostrou que não houve efeito da adubação fosfatada (P>0,05) sobre o teor de K do capim-tanzânia, havendo, entretanto, interação N x K (P<0,001). O desdobramento desta interação revelou as seguintes informações:

a) a aplicação de nitrogênio reduziu o teor de K do capim-tanzânia (P<0,001), quando não se aplicou potássio, devido ao efeito de diluição, todavia, quando se aplicou N e K simultaneamente, houve ligeiro aumento no teor de K (P=0,05) (Figura 2a);

b) a aplicação de potássio elevou os teores de K da gramínea (P<0,01), independentemente da adubação nitrogenada (Figura 2b).

Por ocasião do segundo corte, quatro meses após o início do experimento, os teores de N inorgânico no solo das parcelas que receberam adubação nitrogenada (9,0 mg/kg) foram praticamente iguais aos das parcelas não-adubadas (8,7 mg/kg), confirmando o pequeno efeito residual da adubação nitrogenada. O nitrogênio amoniacal representou a maior porção (87%) do N inorgânico do solo, em ambos os casos. Já o solo das parcelas que receberam adubação fosfatada apresentou maior teor de P disponível (2,7 mg/dm³) do que aquele das parcelas não-adubadas (1,8 mg/dm³). Em ambos os casos, os teores são considerados muito baixos pela classificação da CFSEMG (1999). O teor de K disponível no solo das parcelas que receberam adubação potássica (49,8 mg/dm³) foi superior ao das parcelas não-adubadas (34,0 mg/dm³). De acordo com os critérios de interpretação para K disponível, adotados pela CFSEMG (1999), o teor verificado nas parcelas não-adubadas é baixo e, nas adubadas, médio.

Os resultados deste experimento mostraram que a adubação fosfatada elevou os teores de P, tanto no solo quanto no capim-tanzânia, mas não teve efeito no seu crescimento. Provavelmente, o "P extra", fornecido pela adubação fosfatada, foi acumulado na planta como reserva na forma de Pi (fósforo inorgânico). Portanto, pode-se inferir que a disponibilidade de fósforo no solo não estava sendo limitante ao crescimento do capim-tanzânia, neste sistema agrossilvipastoril, apesar dos teores muito baixos de P disponível no solo, obtidos com o extrator Mehlich-1. Sabe-se, entretanto, que o fósforo é um nutriente extremamente importante no estabelecimento inicial e na reforma do pasto, devido à sua grande influência no crescimento de raízes e no perfilhamento das gramíneas, diminuindo de importância após as plantas estarem completamente estabelecidas (WERNER, 1998). Isto se deve, provavelmente, ao aumento da capacidade de aquisição de P pelo sistema radicular mais desenvolvido das plantas já estabelecidas.

Da mesma forma ocorrida para a adubação fosfatada, a adubação potássica elevou os teores de K, tanto no solo quanto no capim-tanzânia, sem, no entanto, ter resultado em elevação significativa no crescimento da gramínea. Isto significa que houve "consumo de luxo" de K e que os teores disponíveis deste nutriente no solo (baixos) foram suficientes para suprir a demanda da gramínea.

Fatores limitantes ao crescimento do capim-tanzânia

Durante o primeiro período de crescimento, quando houve precipitação suficiente, a taxa de acumulação de MS apresentada pelo capim-tanzânia adubado com 100 kg/ha de N (25,8 kg/ha.dia), embora bem superior à obtida quando não se aplicou nitrogênio (14,0 kg/ha.dia), pode ser considerada baixa, quando comparada às normalmente verificadas em pastagens a céu aberto da região, formadas com a mesma gramínea e também adubadas com nitrogênio. Por exemplo, BERETTA et al. (1999) obtiveram uma taxa de acumulação de MS de 97,6 kg/ha.dia, durante o período chuvoso, em pastagem formada com capim-tanzânia em Campo Grande, MS. Também, GERDES et al. (2000) obtiveram taxas de acumulação de MS de 94,3 e de 82,3 kg/ha.dia, na primavera e no verão, respectivamente, em pastagem formada com capim-tanzânia em Nova Odessa, SP. Essa diferença entre as taxas de acumulação de MS verificadas em pastagens a céu aberto e aquela obtida no sistema agrossilvipastoril estudado, mesmo após a correção da deficiência de nitrogênio do solo, pode ser explicada, em grande parte, pela menor quantidade de luz disponível para o crescimento da gramínea no sistema agrossilvipastoril, devido ao sombreamento imposto pelas árvores de eucalipto. A transmissão de luz ao sub-bosque deste sistema agrossilvipastoril, ao final do experimento (maio de 1999), foi estimada em 32% da densidade do fluxo de fótons medida a pleno sol (ANDRADE, 2000). De acordo com o autor, se a avaliação tivesse sido realizada durante o verão, quando haveria menor interceptação de luz pela copa das árvores, devido à maior altitude solar, é provável que a transmissão de luz ao sub-bosque estivesse próxima a 50%. Portanto, pode-se afirmar que, quatro anos após a introdução do capim-tanzânia no sistema agrossilvipastoril estudado, os principais fatores limitando o seu crescimento, durante o período chuvoso, foram a baixa disponibilidade de nitrogênio no solo e o sombreamento imposto pelo eucalipto.

Com relação à hipótese de que a baixa produtividade e o reduzido vigor das plantas do capim-tanzânia eram conseqüência do efeito de substâncias alelopáticas produzidas pelo eucalipto, a elevada resposta da gramínea à adubação nitrogenada, com notável recuperação do vigor e da coloração de suas plantas, indica que tais efeitos são improváveis de estar ocorrendo ou são de magnitude desprezível, pelo menos sobre as plantas já estabelecidas do capim-tanzânia. PAULINO et al. (1987), avaliando o efeito alelopático do eucalipto sobre o crescimento de forrageiras, também não encontraram efeitos alelopáticos do eucalipto sobre o capim-colonião, mas constataram interferência negativa, devido à imobilização de N no processo de mineralização da matéria orgânica do solo, refletindo-se sobre os rendimentos da gramínea. Entretanto, a possibilidade de existência de efeitos alelopáticos do eucalipto sobre a germinação e o crescimento das plântulas do capim-tanzânia, ou sobre a atividade microbiana do solo, não foi investigada no presente trabalho.

Uma das expectativas dos sistemas silvipastoris é que o efeito da sombra das árvores, reduzindo a evapotranspiração, proporcione maior disponibilidade de água às forrageiras, em períodos de mais baixa precipitação, em relação às áreas sem sombra (CARVALHO, 1997). Entretanto, neste experimento, foi verificado que, com a diminuição das chuvas no segundo período de crescimento (março a maio), houve redução acentuada nas taxas de acumulação de MS do capim-tanzânia, em todos os tratamentos aplicados, sugerindo que durante a época mais crítica do período seco desta região (maio a setembro), as taxas de crescimento da gramínea e, conseqüentemente, a capacidade de suporte do sistema, serão muito reduzidas.

Alguns fatores podem estar contribuindo para acentuar ainda mais o efeito da diminuição das chuvas sobre a disponibilidade de água para a gramínea, nesse sistema agrossilvipastoril: a) subsolo ácido e com elevada saturação de Al (Tabela 1), afetando o crescimento do sistema radicular da gramínea em profundidade; b) Latossolo muito argiloso (mais de 64% de argila), comportando-se como solo arenoso, em termos de disponibilidade de água para as culturas (LOPES, 1984); e c) competição pelo eucalipto, não apenas na absorção da água disponível no solo, mas também pela interceptação da água das chuvas na sua copa, diminuindo o aporte de água na faixa central da entrelinha - parte da água interceptada será depositada na faixa mais próxima à linha de plantio das árvores e parte irá evaporar diretamente da copa, sem atingir o solo.

Causas da redução da disponibilidade de N no solo

Em pastagens exclusivas de gramíneas tropicais, não adubadas com nitrogênio, também ocorre redução da disponibilidade de N, com o passar dos anos após sua implantação, conforme demonstrado nos trabalhos de ROBBINS et al. (1989) e ROBERTSON et al. (1993), na Austrália, e de NEILL et al. (1997), no Brasil. De acordo com BODDEY et al. (1997), este processo é também o principal responsável pela degradação das pastagens de Brachiaria spp., Andropogon gayanus e Panicum maximum, estabelecidas nos Cerrados do Brasil e em outras áreas tropicais da América do Sul.

A elevada produtividade verificada nos primeiros anos após a implantação de pastagens exclusivas de gramíneas, o que também ocorreu neste sistema agrossilvipastoril, deve-se ao efeito do cultivo do solo para o estabelecimento das forrageiras, o qual libera N do reservatório passivo para o ativo, pela ruptura das partículas do solo que o protegiam anteriormente (FISHER et al., 1996).

A redução gradual da disponibilidade de N, ou da taxa de mineralização líquida de N, diminuindo a produtividade destas pastagens com o passar do tempo, tem sido atribuída à interação entre a composição química da liteira e a mineralização de N (WEDIN, 1996). Segundo esse autor, não é sensato considerar a disponibilidade de N no solo como uma propriedade inerente ao solo, desconsiderando as características das vegetações atual e passada.

As gramíneas tropicais, assim como o eucalipto, são plantas perenes que possuem elevada eficiência de utilização de nutrientes e, portanto, produzem liteira com baixos teores de nutrientes, principalmente daqueles mais móveis (N, P e K). Desse modo, não é de causar surpresa que, em sistemas silvipastoris, nos quais as gramíneas tropicais e as árvores de eucalipto são os componentes principais, os processos decorrentes da adição de resíduos de baixa qualidade sejam muito parecidos com aqueles verificados em pastagens exclusivas de gramíneas tropicais. A liteira produzida pelo eucalipto, neste estudo, confirmou as expectativas quanto à sua baixa qualidade, demonstrada pelos baixos teores de N e P (0,63 e 0,04%, respectivamente) e pelas elevadas relações C/N, C/P e Lignina/N (86, 1360 e 18, respectivamente) (ANDRADE, 2000).

No sistema agrossilvipastoril estudado, os possíveis fatores, responsáveis pela baixa disponibilidade de N no solo, são: a) imobilização de N na biomassa do eucalipto e na liteira, reduzindo a quantidade de N sendo reciclada no sistema - o conteúdo de N na parte aérea do eucalipto e na liteira foram estimados em 207,6 e 40,8 kg/ha, respectivamente (ANDRADE, 2000); b) imobilização de N pela biomassa microbiana na decomposição da matéria orgânica do solo e da liteira; c) solo ácido e com textura muito argilosa, fatores que afetam negativamente a taxa de mineralização da matéria orgânica do solo; e d) perdas de N associadas ao pastejo.

De fato, o pastejo pode ter tido um papel importante na redução da quantidade de nitrogênio disponível para o crescimento da gramínea, provavelmente, por meio de dois mecanismos: a) transferência de nutrientes decorrente da deposição de excreções em uma "área de descanso" existente no sistema, na qual os animais permaneciam por determinado período do dia para que pudessem satisfazer suas necessidades de consumo de água e minerais; e b) grande parte do nitrogênio removido dos tecidos das forrageiras pelo pastejo retorna ao solo com a deposição de fezes e urina de maneira irregular e concentrada, favorecendo a ocorrência de perdas por lixiviação de nitrato, volatilização de amônia e denitrificação (RUSSELE, 1996) e, também, a competição pelo eucalipto, que poderá absorver e imobilizar o N na sua biomassa. Esses mecanismos precisam ser estudados para se entender melhor o papel dos animais na ciclagem de nutrientes em sistemas silvipastoris.

Esse processo de redução da disponibilidade de N no solo parece não ser uma característica exclusiva do sistema estudado. É provável que também ocorra em outros sistemas silvipastoris compostos por gramíneas e eucaliptos, ou outros componentes com características semelhantes, nos quais não existe fonte externa de N, principalmente quando implantados em solos distróficos e álicos, como os da região dos Cerrados. Entretanto, mais estudos são necessários para verificar a generalidade deste acontecimento e, também, para identificar os principais mecanismos envolvidos, para que possam então ser manipulados.

Considerações sobre o eucalipto

Poder-se-ia pensar que o eucalipto não seria a melhor opção para compor um sistema silvipastoril, já que não contribui para a melhoria da fertilidade do solo e, ainda, compete efetivamente com a gramínea associada pelos fatores água e nutrientes. Do ponto de vista ecológico, isso certamente seria verdadeiro. Entretanto, do ponto de vista econômico, o eucalipto constitui-se em uma das melhores opções existentes, devido à sua elevada capacidade de produção de madeira, mesmo em solos pobres. Assim, alternativas devem ser buscadas para minimizar as possíveis interações negativas que possam existir entre o eucalipto e sub-bosque de sistemas silvipastoris.

No caso do sistema estudado, pode-se aumentar sua rentabilidade e sustentabilidade, buscando alternativas para solucionar o problema da redução da disponibilidade de N para a gramínea associada. As alternativas existentes para a manutenção da disponibilidade de N em níveis adequados, nestes sistemas, parecem ser: a) aplicação anual de fertilizante nitrogenado ou b) incorporação de plantas leguminosas (herbáceas, arbustivas ou arbóreas) ao sistema, que sejam de comprovada eficácia na fixação de N2 atmosférico. Essas alternativas precisam ser avaliadas quanto às suas relações benefício/custo e à viabilidade técnica.

6. Conclusões

O sombreamento imposto pelo eucalipto não era o único fator interferindo no crescimento normal do capim-tanzânia. A baixa disponibilidade de nitrogênio no solo constituiu-se na principal limitação nutricional ao crescimento da gramínea, quatro anos após sua introdução no sistema agrossilvipastoril.

É improvável que as plantas estabelecidas do capim-tanzânia estavam sendo afetadas negativa e significativamente por substâncias alelopáticas produzidas pelo eucalipto.

A sustentabilidade de sistemas silvipastoris verdadeiros constituídos por gramíneas e eucaliptos, implantados em solos distróficos e álicos como os da região dos Cerrados, sem uma fonte externa de N, precisa ser melhor investigada.

Agradecimento

À Companhia Mineira de Metais (CMM), pela disponibilização da área experimental e pelo apoio financeiro, em especial ao Chefe Geral da Unidade Agroflorestal, Dr. Luciano Lage de Magalhães, e ao Gerente de Processos Pecuários, Dr. Arnaldo Geraldo Cardoso.

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Carlos Mauricio Soares de Andrade2, Rasmo Garcia3, Laércio Couto4, Odilon Gomes Pereira3 rgarcia[arroba]ufv.br

1 Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor, bolsista da CAPES.

2 Engo-Agro, Doutorando em Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa.

3 Professor do Departamento de Zootecnia da UFV, bolsista do CNPq.

4 Professor do Departamento de Engenharia Florestal da UFV, bolsista do CNPq.



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