A legalidade do aborto de anencéfalos sob o prisma da hermenêutica



  1. Resumo
  2. Introdução
  3. Da anencefalia
  4. Das hipóteses legais de aborto
  5. Da Hermenêutica Metodológica
  6. Da Hermenêutica Filosófica
  7. Conclusão
  8. Referências bibliográficas

"(…) filosofar consiste, talvez, em tomar consciência do tempo que somos e discernirmos se fazemos apenas ciência (nos atendo à letra) ou se filosofamos (se lemos a vida em seu supra-senso); afinal de contas, sabemos o quanto fica, sempre, de ‘não-dito quando se diz algo’" (Luiz Rohden)

1 – RESUMO

O presente estudo objetiva demonstrar as diversas respostas sobre a questão da legalidade do abortamento de fetos portadores de anencefalia decorrentes da adoção de diferentes métodos hermenêuticos. Para tanto, após a análise do conceito de anencefalia, é feita uma abordagem sobre as duas formas interpretativas e colacionados nos quais se observa a aplicação da Hermenêutica Metodológica e da Filosófica.

2 – INTRODUÇÃO

Diante da iminência de ser prolatada decisão pelo Supremo Tribunal Federal – STF na Argüição de Descumprimento de receito Fundamental – ADPF n° 54-8/DF acerca da possibilidade da prática legal de aborto de fetos anencefálicos, torna-se ainda mais importante a reflexão sobre as várias interpretações que podem ser deduzidas do texto do art. 128 do Código Penal – CP.

O presente estudo visa justamente demonstrar que várias respostas podem ser deduzidas para a questão: "O ordenamento jurídico brasileiro permite a prática de aborto de fetos anencefálicos? Ou a conduta será punida pelo Estado-Juiz, eis que tipificada pelo Diploma Repressivo?". Tais respostas derivam, justamente, do tipo de interpretação levada a cabo pelo intérprete.

Assim, serão analisadas as respostas dadas pela Hermenêutica Metodológica e pela Hermenêutica Filosófica, emergindo ao leitor, desta análise, a possibilidade de, com consciência, realizar a escolha, inclusive em outros temas com os quais se deparar, sobre o método utilizado para interpretar o texto legal.

3 – DA ANENCEFALIA

Primeiramente, a fim de que se tenha domínio sobre o tema estudado, mostra-se indispensável a definição do que é a anencefalia.

Trata-se de uma má-formação congênita que ocorre por volta do vigésimo quarto dia após a concepção, quando o tubo neural (estrutura fetal precursora do sistema nervoso central) sofre um defeito em seu fechamento.

Tal defeito não pode ser ligado a causas específicas, sendo certo que vários eventos podem ocasioná-lo. Dentre eles podemos citar a deficiência de vitaminas do complexo B, em especial o ácido fólico, a ingestão de álcool, o tabagismo, questões genéticas e, até mesmo, a submissão da gestante a altas temperaturas.

Deste defeito resulta que a estrutura encefálica é inexistente ou, caso existente, é amorfa, estando solta no líquido amniótico ou deste separada por uma membrana. Não há, portanto, a formação dos hemisférios cerebrais e nem do córtex cerebral (que constituem a estrutura cerebral).

Quanto ao tronco cerebral (estrutura responsável pela respiração), por ser a estrutura encefálica mais interna, é possível que não apresente lesões, embora seja muito comum que as apresente.

Percebe-se, assim, que a anencefalia é uma má-formação que diz com a lesão de parte do encéfalo – a sua parte mais importante –, qual seja, o cérebro, não sendo possível observar nos fetos portadores desta anomalia qualquer sinal de "consciência, cognição, vida relacional, comunicação, afetividade e emotividade".

Seu diagnóstico poderá ser feito, de forma inequívoca, já a partir do terceiro mês de gestação, utilizando-se, para tanto, de simples ultra-sonografia, eis que a estrutura craniana do feto portador desta má-formação é inconfundível: ela não possui o formato oval/circular, mas tem profunda depressão na parte superior.

Outrossim, poderá ser usado o exame de sangue para seu diagnóstico, eis que gestações destes fetos geram um significativo aumento de alfa-fetoproteínas no sangue materno.

Quanto à incidência desta má-formação, é difícil precisar com que freqüência ocorre, eis que muitas vezes o abortamento ocorre espontaneamente, não chegando aos órgãos responsáveis pelas estatísticas a informação desta gravidez.

Entretanto, números existentes apontam a incidência de 0,6 portadores de anencefalia para cada mil fetos nascidos vivos, sendo o Brasil o quarto país no mundo com o maior número de incidência de fetos anencefálicos, ficando atrás apenas de México, Chile e Paraguai.

4 – DAS HIPÓTESES LEGAIS DE ABORTO

O art. 128 do CP prevê duas hipóteses nas quais a interrupção da gestação ou aborto não sofrerá punição. Uma das hipóteses é o aborto necessário, quando não há outra forma de salvar a vida da gestante, ou seja, quando a continuidade da gestação levará, sem sombra de dúvidas, à morte da gestante.

A segunda hipótese prevista no referido artigo é o aborto humanitário ou sentimental. Neste caso, não se pune a interrupção da gravidez decorrente de estupro, sendo requisito indispensável que a gestante consinta com a prática abortiva.

Nota-se que, se a interrupção da gestação for embasada em qualquer outro fundamento, a conduta será tida por ilícita, sofrendo o agente a incidência da pena cominada pelos arts. 124 a 126 do CP.

Do que acima foi dito resulta que não haverá discussão quanto à legalidade do abortamento de anencéfalos se a gestação puder ser enquadrada nas hipóteses literalmente previstas no CP de inaplicabilidade da pena.

Entretanto, em não sendo possível tal enquadramento, restará a necessidade de se definir se aquele que pratica o abortamento de fetos com esta característica restará submetido à incidência da norma incriminadora ou poderá, a exemplo dos demais casos, ser beneficiado, tendo sua conduta como permitida.

Esta definição será encontrada através das duas hipóteses de interpretação às quais este trabalho se dispôs a analisar.


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