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Recreação e turismo para todos (página 2)

Luis Grunewald
Partes: 1, 2, 3, 4, 5


Por outro lado, as necessidades fisiológicas ou vitais podem associar-se a um certo hedonismo pelo qual se empreendem viagens com o objetivo de degustar comidas típicas, e do mesmo modo o impulso sexual pode servir como móbil na decisão de uma viagem. Assim, dois níveis diferentes se conjugam: um é o de decidir uma viagem em função da satisfação que promete às necessidades mais básicas, o qual parece elementar já que conecta com a pulsão de autoconservação do ser humano, e o outro é o de associar a viagem (a partir da fantasia) a um plus de prazer na satisfação das mesmas. Por exemplo, escolher uma praia em função de certo elemento erótico com o qual essa foi divulgada e ao qual está associada, ou realizar um tour gastronômico. Em ambos os níveis se colocam em jogo temores e fantasias, que vão desde fantasiar a privação até fantasiar esse plus, elementos ambos que podem tanto inibir a viagem como fomentar a sua realização. Para certos indivíduos, certa dose de privação pode resultar estimulante e, em outros, toda fantasia associada a um plus de fruição, pode resultar inibidora. Nada do muito nem do pouco resulta universalmente estimulante, e o leque de combinações que se abre é infinito.

Isso se conecta com as necessidades de segurança-risco na medida em que o ser humano tende, em linhas gerais, a evitar situações que ponham em perigo a sua existência. Agora, o modo como cada um julga o que considera um risco ou uma garantia de segurança é variável, como o é, também, a sensação associada a cada um desses: o risco pode ser estimulante para alguns e inibidor para outros, o mesmo acontece com a segurança máxima. Deixar por conta do acaso algum aspecto da viagem pode causar muita angústia a certos sujeitos e um grande prazer a outros. Vê-se, por exemplo, que os jovens costumam preferir viajar como mochileiros, tipo de turismo onde não há certeza nem quanto ao alojamento nem quanto ao meio de transporte, fato que constitui o fator estimulante da viagem. Nesse sentido, a preferência pela aventura e pelo imprevisto parece ser um denominador comum nos viajantes mais jovens. A tendência quase indicaria que, na medida do aumento da idade, mais temores surgem; sobretudo quando se viaja com a responsabilidade pelo cuidado dos filhos, ou com o temor pela fragilidade da própria saúde, como na terceira idade.

A busca de garantias e de segurança numa viagem geralmente é projetada nos outros componentes do grupo familiar, dando, às vezes, motivo para a confrontação entre pais e filhos, tornando-se a viagem um cenário de conflito familiar. A viagem coloca em movimento, nos pais, temores e fantasias que eles depositam nos filhos sob a forma de advertências, ou de proibições. Nesse sentido, quando se oferece uma viagem aos estudantes, está-se colocando em movimento, nos adultos, temores e fantasias que deveriam ser trabalhadas em oficinas ou em grupos de pais, tanto no momento prévio como no posterior à viagem.

Outro fator que motiva um sujeito a empreender uma viagem, considerando necessidades de estima e notoriedade, pode ser encontrado no prestígio que o mesmo, supostamente, outorga frente aos demais. O turismo, sobretudo para o exterior, confere o mesmo prestígio que tantos outros símbolos da nossa cultura, à cuja possessão dedica-se tantos esforços. Vê-se, aqui, a conexão com a imagem daquela antiga elite ociosa que viajava pelo mundo possuindo a exclusividade no exercício da atividade. Hoje, o turismo é massivo, mas, em certo sentido, comportamo-nos como réplicas dos turistas de elite de outrora.

A viagem é tomada como meio de engrossar o currículo, ao tempo em que eleva o sentimento de auto-estima, tendo sua origem, freqüentemente, mais do que num genuíno desejo, numa obrigação social.

O movimento em massa dos turistas de hoje faz que aqueles que desejam diferenciar-se procurem sítios inexplorados, os que transformam em símbolos de uma elite que representam, mas que de pronto se verão invadidos por aqueles que os tomam como grupo de referência. A busca de símbolos exclusivos, não-massificados, conduz certos grupos em direção a experiências turísticas novas, que conferem o prestígio de ter visto ou vivido algo diferente dos demais, o que prontamente se transformará no ideal turístico da maioria, devido ao fato de que a mobilidade social nas práticas de lazer é acelerada. O julgamento social não se detém nos bens que um sujeito tem, nem na profissão que exerce, mas tem como base, também, a maneira como emprega seu tempo livre e o modo como faz turismo.

Com relação ao que Garde chama de desejos de auto-realização transitiva Vê-se que alude à busca do sentido da própria experiência, de alargar o horizonte comunicando-se e ficando mais perto dos outros, ampliando, desse modo a sua consciência de universo. Pode-se notar diferentes níveis nesse desejo, que vão desde o viajar para conhecer outros lugares, outras pessoas e culturas, até o viajar realizando uma missão, para prestar auxílio a outros necessitados. "é tomar consciência da obrigação que impõe, à própria vida, a vida dos outros", diz o autor (Garde, 1985, p. 48). Pode-se ver, aqui, as pegadas dos viajantes expedicionários, que, após o ano 1750, viajavam para explorar, sem o espírito de conquista. O exemplo mais acabado é o de James Cook, cujas viagens científicas estavam longe do afã de conquista dos colonialistas e que têm fundado, sem o saber, a etnografia, baseando-se no respeito e no conhecimento do outro, não na sua submissão. Esta maneira de ver e de pensar ainda estão vigentes no idealismo humanitário de alguns poucos que fazem da viagem a ocasião para dar testemunho do seu compromisso consigo e com a vida. É um tipo de viajante que se encarna em poucos de modo manifesto, mas que sobrevive, em muitos, sob forma adormecida. Trabalhar para despertá-lo talvez seja uma tarefa que devolva o sentido original ao ato turístico. Como assinala o autor, tem um ponto em que o desejo de saber e ter interesse por algo se transformam no amor por esse algo.

A uma aproximação objetiva e a uma curiosidade racional pode seguir-se o amor pelas coisas, para o que a adolescência é um período propício pela força que nela adquirem os ideais de justiça, de beleza e de verdade. Talvez, deva-se oferecer aos estudantes a possibilidade de superar a fugacidade do tempo dedicado a viajar através de uma continuidade que conjugue o jogo e o dever, o conhecimento e o prazer, substituindo talvez os manuais de História e Geografia e as classes teóricas por vídeos turísticos, por dramatizações em classe que lhes permitam sentir-se um pouco colonizadores, um pouco expedicionários. Explicar a fauna e a flora, hoje brincando de realizar um safári no qual eles são alternativamente o caçador e a vítima, e, amanha, organizar um safári fotográfico. Dever-se-ia superar primeiro o temor e a angústia que suscita o fato de romper com as vias consideradas adequadas para a transmissão do saber, trabalhando esse aspecto com pais e professores já desde o ensino fundamental. Talvez a História ganhe outro sentido se ensinarmos, brincando, as viagens de conquista, e talvez o mundo se abra ante os olhos dos jovens se o atravessarem num avião imaginário. Dramatizar as viagens permitiria aprender a viajar, e brincar de ser o outro, ensinaria a conhecê-lo.

Motivações Turísticas Em Função Dos Impulsos Sociais

Nesse caso, estabeleceu-se a seguinte classificação:

  • impulso de afiliação;
  • impulso aquisitivo;
  • desejos de emancipação;
  • desejos de evasão;
  • impulso de curiosidade.

O impulso de afiliação atua como móbil para viajar em virtude da tendência gregária presente no ser humano. Os homens buscam a companhia daqueles com os que se assemelham e também nutre curiosidade em conhecer a quem é diferente. Viajar em grupo resulta num móbil positivo sobretudo para os mais jovens em quem o instinto gregário é forte. Para quem não tem possibilidades de viajar com companhia e sente o peso da sua solidão, se oferecem grupos de "sos" que permitem superar a angústia de se encontrar sozinho nas férias, angústia que se faz sentir mais que em outras épocas, devido ao fato de que, durante os restantes dias do ano, as exigências do trabalho e de todo tipo distraem o sujeito e o afastam um pouco da sua solidão.

Vê-se que a solidão, nestas viagens, está referida à vida conjugal e não a outro tipo de vínculo afetivo. Desta forma, o fator que mais influi na cmpora destes tours, onde predominam divorciados, viúvos e solteiros, é o estado civil. Esse tipo de turismo recebe o nome de relacional e resulta em um fenômeno típico das sociedades complexas, altamente industrializadas, onde além da viagem se compra a companhia e a promessa implícita de um vínculo amistoso ou amoroso com algum ou alguns dos integrantes. O tempo livre geralmente dispara sentimentos de culpa ou angústia associados ao não fazer nada, que levam o sujeito a uma espécie de vazio quando não tem que ir em busca do êxito. E agora, o que?, parece ser a pergunta, que se torna mais angustiante, quando se está sozinho. Nesse sentido, os tours relacionais aspiram a ser um paliativo para a solidão no tempo livre.

O impulso aquisitivo é o que dá origem às viagens de compras. Em alguns casos oferece motivação suficiente para ser a causa única da viagem e em outras ocasiões resulta em um motivo secundário. Opera quase que exclusivamente nas viagens para o exterior. Como o turismo é um bem de consumo transitório, os objetos que são trazidos de uma viagem parecem imortalizar-la na medida em que são suas testemunhas. Aqui pode-se diferenciar entre o objeto que se traz como souvenir porque é típico, seja para presentear ou para conserva-lo consigo, e aqueles cuja aquisição é mais barata, mas que não têm o caráter de símbolo do local visitado. Assim, não é o mesmo regressar de uma viagem com um forno microondas do que com um tapete confeccionado artesanalmente. Importa, pois, não só o objeto, mas também o poder motivador que o mesmo tenha tido para aproximar uma pessoa de um lugar determinado, desde que o valor atribuído ao abjeto pode estar ligado ao prestígio que a possessão confere (o que faz dele um fetiche) ou à satisfação de uma necessidade.

O desejo de emancipação resulta especialmente importante para o adolescente, que considera a viagem como ocasião para conseguir a independência, ou consolidá-la. Aqui se encontra, freqüentemente, certa resistência por parte dos adultos que vêm esse desejo de emancipação do filho como um perigo e/ou uma ameaça, transformando a viagem num cenário de conflitos. O desejo de sair em férias sozinhos, sem os seus pais, encontra satisfação na viagem de fim de curso, freqüentemente a primeira de uma série que virão.

Aqui o fator econômico incide fortemente, transformando o dinheiro freqüentemente no último vestígio de poder que fica em mãos dos adultos, que o utilizam para autorizar ou proibir esse pedido dos filhos, escondendo temores, fantasias e medos.

Se o adolescente aceita a situação (ainda que reclame), sem tentar sequer romper com ela procurando ter dinheiro próprio, será porque o pedido de independência está ainda tingido de ambivalência. Desejar ir-se e ao mesmo tempo ficar sob o amparo protetor dos vínculos parentais, é típico nesse período. Se os desejos de emancipação são genuínos, resultará importante escapar da tutela econômica paterna. Vê-se que as viagens de fim de curso do ensino médio são pagas pelos pais, e que, freqüentemente, o jovem nem sequer conhece com exatidão o custo das mesmas.

Por isso, quando se organiza uma viagem de final de curso, deveriam ser realizadas reuniões com pais e filhos para considerar a importância de que o jovem pague a sua viagem. Com isto a independência econômica seria estimulada e o jovem assumiria um papel mais protagónico como consumidor. Chama a atenção, nas pesquisas, que o jovem não saiba responder que serviços contratou; por exemplo, se determinada viagem incluía a pratica de ski, qual a qualidade e quantidade das refeições diárias, quantos seriam alojados por habitação, etc. desconhecimento que mostra claramente que aquele que não paga não pergunta, não sabe, fica à mercê. A autonomia se restringe e, uma vez no local de destino, o usuário não sabe que reclamar, nem que serviços esperar.

Respeito ao desejo de evasão, vê-se que é o móbil central para o ato turístico, sendo isto mencionado pelos diferentes autores que analisam o fenômeno, ainda que difiram em outros pontos. Evadir-se implica romper com as formas de escravidão e servidão cotidianas, encontrando para isto cada indivíduo seu modo, sendo a viagem uma possibilidade privilegiada.

Toda viagem acarreta fantasias prévias infinitamente variáveis: solucionar nela os problemas do casal ao dispor de mais tempo e de um novo entorno favorável; praticar um esporte em férias após de um ano de sedentarismo; esquecer do trabalho; encontrar uma companhia; divertir-se. Antes da viagem surgem muitas ilusões que levam a uma idealização do que virá como se fosse um oásis, exagerando a função reparadora do lazer. Tal é a necessidade de escapar que, freqüentemente as pessoas tem a ilusão de serem outras. Parece ignorar-se o fato de que a escravidão e a servidão são internas e não dependem de fatores geográficos nem tempestades. Muitas pessoas, mesmo sabendo disto, precisam aferrar-se à idéia de que podem viver outra vida e muitas mudanças acabam acontecendo logo após um período de férias. Mas também pode acontecer que a decepção seja muito forte e quem não sabe brincar, não brincará e quem não sabe olhar, nada descobrirá. Conectar-se com a possibilidade de usufruir de nosso tempo livre e de nossas férias pode estar requerendo um trabalho prévio de treino na medida em que o indivíduo se encontra alienado.

Dá-se o nome de neurose do tempo livre à patologia típica do homem contemporâneo das grandes metrópoles que está impedido de desfrutar da sua inatividade. Ensina-se às crianças que ao brincar, deve-se pensar em ganhar, não pelo prazer de brincar; se se aprende é para ser aprovado no exame, não pelo prazer de aprender. O prazer visual tem sido transferido à filmadora, não necessitando deter-se a contemplar um objeto belo, porque em segundos a máquina o terá captado para sempre, dando a possibilidade de reproduzi-lo quantas vezes se deseje.

Esse homem deverá aprender que o desfrutar da sua inatividade não é uma obrigação, mas um direito. Agora, como pode um ser humano aprender a desfrutar? É possível ensinar a usufruir do tempo livre? Será necessário trabalhar para isso na escola, na empresa, na fábrica, na família, com oficinas onde gerar um espaço para o debate, onde cada um possa conectar-se com essa porção de tempo que tem para si próprio, onde não esteja obrigado a ganhar de ninguém, nem tenha que bater nenhum recorde, nem agradar a ninguém, nem ir a nenhuma parte se não desejar.

Resultará essencial possibilitar que o sujeito se pergunte o que deseja, para além do que supõe que os outros lhe demandam,.

Criar um local onde se possa ver que coisas se fazem no tempo livre, por que e para quem, onde se possa revisar os ideais de evasão que a cultura nos impõe, poder reproduzir o último final de semana e o último verão num espaço dramático onde apareçam os outros internalizados e seus mandatos. Talvez o sujeito possa recuperar para si, só para si, essa porção de liberdade que lhe pertence e da qual tem o uso exclusivo.

Por último, deve-se abordar o impulso de curiosidade, que está relacionado com alguns dos anteriores móbiles já expostos. A curiosidade é esse interesse pelas coisas que leva-nos a querer explorá-las, manipulá-las, conhecê-las. Desde que o ser humano nasce desenvolve modos diversos de apreensão da realidade; nos primeiros meses aproxima-se dos objetos e os conhece por contato oral; depois desenvolve outros modos como tocar, olhar os objetos, até que finalmente ele tem uma apreensão intelectual e racional do mundo e das coisas. A curiosidade dá lugar ao conhecimento, e já, desde criança, mostra o ser humano ser um pesquisador, tarefa que será facilitada ou não, conforme as possibilidades que o ambiente em que cresce oferece para ele. Freud ensina que as primeiras perguntas das crianças em relação as diferenças sexuais entre o homem e a mulher, ou ao nascimento dos bebês, etc. resultam ser o gérmen dos ulteriores destinos que sofre o instinto de investigação.

A infância é uma etapa especialmente propícia para estimular esse desejo de saber, igual a adolescência, e, nesse sentido, um meio ambiente estimulante favorecerá seu desenvolvimento.

Tal como ensina Garde, a saturação de estímulos em que se vive provoca esforços desesperados por tornar cada vez mais complexo esse meio ambiente para aumentar o interesse.

Os diferentes móbiles antes expostos combinam-se de modo diverso em cada indivíduo conforme variáveis tais como: idade, ocupação, nível socioeconômico, sexo, estado civil, etc., de maneira que o ato turístico se encontra determinado simultaneamente por um desejo individual e pelos valores e normas do grupo de pertença.

Capítulo 2

Características gerais da demanda turística: conhecimento qualitativo e quantitativo dos grupos humanos

Num destino turístico se apresenta a necessidade, em primeiro lugar, de uma definição clara dos grupos humanos que fazem parte da atividade. Do ponto de vista antropológico, o desenvolvimento do turismo apresenta dois grupos humanos claramente definidos: a demanda e o residente do centro turístico: um conjunto dedicado ao lazer e a atividades de consumo, e o outro dedicado à produção para satisfazer as necessidades do primeiro.

O conhecimento da demanda que, nas estatísticas, recebe o nome de visitantes e se subdivide em turistas e excursionistas, permite o desenvolvimento de uma correta estratégia considerando que os mercados não são estáticos, mudam continuamente, o que determina que deve ser desenvolvidas táticas que se adaptem às condições.

O caso do residente do centro turístico, que geralmente não é considerado dentro do processo de planejamento turístico, requer uma segmentação também para sua análise, já que pode ser classificado em: a) residente permanente, nativo ou por migração com participação ativa ou passiva no desenvolvimento da atividade e b) o residente temporal, que migra na baixa temporada.

Essa classificação é necessária considerando que, do ponto de vista antropológico, cada um desses segmentos tem sua própria cultura, padrões de comportamento, etc. e uma gestão competente de um destino turístico implica no conhecimento quantitativo e qualitativo dos grupos humanos envolvidos.

Conhecimento Quantitativo

Da ótica do conhecimento quantitativo interessa, em primeiro lugar, estabelecer uma classificação e definições básicas para mais uma avaliação estatística da demanda a partir das precisões conceituais elaboradas pela OMT. Surge, assim, o referente básico de todo o sistema de estatísticas do turismo, que é o visitante de um destino turístico, que pode ser classificado como visitante internacional ou interno e que, por sua vez se divide em dois grandes grupos: turistas e excursionistas (o critério fundamental dessa segmentação é a estada mínima no destino já que o primeiro passa a noite neste e o segundo retorna ao local de residência habitual).

Essa classificação é fundamental já que geralmente a demanda é considerada como um número denominado "turista". Numa estratégia competitiva de desenvolvimento, porém, considera-se que as motivações e necessidades dos visitantes em cada um dos grupos antes definidos são distintas e requerem, para sua satisfação implementação de ações distintas.

O Tempo Do Homem

O ato turístico é um ato motivado, que se assenta sobre um certo excedente de tempo, que resulta para o habitante dos países desenvolvidos um bem cada vez mais escasso.

Abordaremos, em primeiro lugar, o tempo livre na sua dimensão psicossociológica, para em seguida deter-nos naquelas atividades que o indivíduo realiza, entre elas, o turismo e a recreação.

O lazer é, ao mesmo tempo, um fenômeno social e uma atividade individual, dimensões essas que se entrecruzam por um lado, devido ao condicionamento que a atual cultura de massas impõe a essa porção do tempo nos países industrializados e, por outro, porque, enquanto prática individual, dota o indivíduo de um sentimento de liberdade.

O homem dos países desenvolvidos enfrenta hoje a problemática de ter que distribuir seu tempo em esferas e afazeres diversos. Pode-se falar, assim, seguindo o modelo de Linder (1983, p.32-35), de cinco categorias de classificação, considerando a atual forma de empregar o tempo pelo homem:

  • Tempo de trabalho: é aquele dedicado à produtividade e, como tal, é o que mais incide sobre todas as outras categorias de emprego de nosso tempo, devido ao fato de estar vinculado diretamente ao nível de ingressos econômicos.
  • Tempo de trabalho pessoal: é o tempo dedicado ao cuidado e manutenção dos bens de consumo adquiridos, como também do corpo, da saúde. Se relaciona tanto ao tempo que demanda levar o carro à oficina mecânica, como ir ao dentista. No primeiro caso, talvez se possa delegar a tarefa a terceiros, mas no último exemplo, não.
  • Tempo dedicado ao consumo: é comum que aumente quando aumenta o nível dos ingressos do indivíduo, devido ao fato de poder ter acesso a uma maior quantidade de bens de consumo, mas paradoxalmente – e esta é a afirmação central do autor - se nota uma redução do seu tempo livre. É difícil determinar a priori qual será o efeito que produz um aumento no nível de ingresso de um indivíduo sobre todas as outras categorias do uso do tempo, mas a realidade leva a inferir que um sujeito, cujo tempo de produtividade adquire um alto valor no mercado, também precisará especializar-se, aperfeiçoar-se, em definitiva, reduzir seu tempo livre, que acabe se tornando mais caro que qualquer outro bem. É possível que aumente o volume dos bens que consome, mas não seu tempo livre para consumi-los. Obviamente, isso dependerá de situações particulares.
  • Tempo para a cultura: é o tempo dedicado a cultivar a mente e o espírito que Linder sintetiza como "tempo para a cultura" e que tem sido uma das metas do progresso econômico, ao supor que um aumento em nossos rendimentos traz naturalmente uma maior parcela de recursos para atividades tais como: assistir a espetáculos (teatro, cinema, dança), leitura, ópera, pintura, etc.

A tendência atual indica, por um lado, que o aumento esperado de tempo dedicado à cultura, não se produziu devido a que o tempo dedicado ao trabalho aumenta na medida da competição crescente a que os indivíduos estão submetidos.

Se é certo que à medida que o nível médio de rendimentos aumenta, maiores são as possibilidades de uma melhoria no nível educativo e cultural do indivíduo e de seu grupo familiar, por outro lado, a realidade indica que a tendência atual não vai no mesmo sentido em todos os âmbitos, e as diversões hoje costumam reduzir-se mais ao âmbito do privado-doméstico e não tanto à atividade social.

Está-se falando de tendências observáveis do fenômeno na sua dimensão social, deixando para mais adiante a referência aos aspetos psicológicos do mesmo. A função psicológica do lazer merecerá um tratamento especial.

  • Tempo inativo: é a quinta categoria do uso do tempo à que Linder denomina inatividade, e que é o tempo excedente, próprio daqueles países mais pobres, ou daqueles indivíduos à margem do processo de produção (como pode ser o caso de uma pessoa com uma deficiência específica, ou por estar aposentado).

Não é a inatividade criativa, nem o ócio de uma elite que pode dedicar-se ao ideal grego da vida contemplativa e do desenvolvimento do espírito e do intelecto, se não que é uma inatividade imposta por condições sociais, políticas e econômicas, que não deixam ao sujeito outra opção se não a de enfrentar esses pontos mortos do seu tempo, pois é justamente nos países mais pobres ou nos indivíduos separados do processo de produção econômica onde o tempo é um bem que sobra. O excedente de tempo vai de mãos dadas com a pobreza.

"As culturas nas quais o tempo sobra aparecem nos países mais pobres. Tão baixa é a produtividade, que certa porção do tempo não tem rendimento algum. Essas culturas não têm grande necessidade de ter precisão no cálculo e nem na medição do tempo do mesmo modo, os indivíduos diminuídos, a quem se exclui do mercado de trabalho e do processo de desenvolvimento que contam, por tanto, com baixos rendimentos, podem experimentar um excedente de tempo"(Linder, 1983, p.38)

Vem-se que o tempo livre não é o tempo vazio que segue ao tempo de trabalho, e sim um fenômeno social a cujo estudo se dedicaram grandes especialistas, devido ao fato de que é uma importante problemática do homem moderno e que deve ser discutida a fim de conseguir a integração de todos e principalmente daquelas pessoas portadoras de necessidades especiais.

O Tempo Livre e a sua Valorização Histórica

Nas sociedades pré-industriais, sabe-se que a disposição de tempo livre era reservada a uma casta ociosa, que desfrutava do mesmo tal como o concebiam os gregos, isto é, como direito só de uma minoria, que por sua linhagem e pertença podia viver sem trabalhar.

A grande massa não se subtraia do trabalho, a exceção daqueles casos de inatividade forçada, em que por condições de clima ou por acasos do destino, o indivíduo ficava excluído da cadeia produtiva.

Com o surgimento das primeiras sociedades industriais, se produz o êxodo em direção às grandes cidades, locais de assentamento das primeiras fábricas, e se transformam as condições de trabalho, aumentando as pressões sobre o indivíduo, em prol do aumento da produtividade. O trabalho se converte no valor fundamental do sistema social, instaurando-se uma verdadeira moral do trabalho, sendo o ócio criticado desde um ponto de vista moral e econômico.

Somente após da Segunda Guerra Mundial, se materializa o direito a férias pagas e à redução das horas de trabalho para as grandes massas de trabalhadores, que ocupam o cenário social para usufruir dos direitos que antes eram exclusividade de uma minoria, e começam a se fazer presentes naqueles locais e atividades que antes lhes eram vedados.

Segmentam-se as diversões, se estabelecem modas, locais, atividades, esportes, preferências que serão o símbolo da pertença a determinada subcultura, com códigos e valores próprios e específicos. O tempo livre é, tal como se tem dito anteriormente, um tempo de consumo, e ao mesmo tempo, um símbolo de pertença a uma determinada subcultura.

As Funções Psicológicas Do Tempo Livre

Essa porção de tempo à qual denominamos de tempo livre, e que se encontra condicionada, tal como se assinala, por fatores históricos, sociais e econômicos, cumpre importantes funções psicológicas no indivíduo.

Em primeiro lugar, lhe permite evadir-se, até onde é possível, das atividades da rotina cotidiana e das exigências cada vez maiores de eficiência, eficácia, e aperfeiçoamento, a que nos submete o exercício do tempo de trabalho.

Supõe-se que o trabalho se torna menos cansativo se for alternado com momentos para o descanso e a diversão, que por sua vez redundará numa melhoria na produtividade do trabalhador. Mas também é certo, por outra parte, que o lazer se torna, por momentos, mais uma instância de exigência para o indivíduo na medida em que, sendo um artigo de consumo, a sua obtenção requer empenho, como a de qualquer outro bem. Assim resulta que as funções que o lazer cumpre no plano individual, se encontram inseparavelmente ligadas com o marco sociocultural que lhe serve de base.

Em linhas gerais, quando um indivíduo busca evadir-se, costuma eleger um leque de atividades, entre as que podem ser citadas segundo Sue (1982, p.71):

  • atividades socioculturais;
  • estudos e formação profissional;
  • repouso (descanso, passeios);
  • repouso cultural (televisão, rádio, cinema);
  • leitura (literatura, periódicos, revistas);
  • educação dos filhos;
  • gostos pessoais. (Educação física, esportes,etc.).

Quer dizer que a escolha de como usar o tempo livre é um processo, não um ato isolado.

Basicamente, o lazer supõe a busca de bem-estar, que alguns encontram nas atividades sedentárias, mas que propiciam enriquecimento espiritual, como a leitura, e outros exercendo atividades lúdicas, como jogos, esportes ou fazendo turismo. Não importa a atividade que se realize, importa a busca de prazer associada a ela. E, nesse ponto, freqüentemente o indivíduo se depara com barreiras internas, pelas quais vivencia com angústia ou culpa essa porção de tempo improdutivo, já que não foi educado para o prazer.

O "como preencher" essa porção de tempo costuma enfrentar o indivíduo com uma sensação de vazio e perda de referências, dado que todo seu tempo geralmente está hiper organizado e submetido à agenda e ao relógio. Isso impede, freqüentemente, um pleno desfrute do tempo livre, porque livrar o imaginário não é uma atividade à qual o homem moderno está muito acostumado. O tempo livre ajuda também no estabelecimento do contato humano, do intercâmbio, aspecto importante na vida do homem que não se vê favorecido pelas condições do trabalho moderno, pela urbanização intensiva e pelo habitat vertical que traz consigo uma diminuição das inter-relações sociais.

Em relação a isso vê-se também uma tendência maior em direção ao estilo individual de consumo do tempo livre, já que a maior parte do mesmo é passado no seio da família, e em atividades privadas, da porta para dentro, como por exemplo, ver televisão. Não há uma única maneira de praticar o lazer, e também não há tipos "puros" de atividades, na medida em que cada uma delas acarreta a valoração contrária. Nada é tão branco nem tão preto como aparece nos textos de consulta. A função socializante do lazer que apontam certos autores, se vê atravessada por fatores que a modificam, e o mesmo acontece com o ideal de evasão, de recreação, de diversão.

É o homem e são as suas circunstâncias, e nesse sentido, quer-se mostrar os impedimentos, as barreiras e os mandatos que pesam sobre as diferentes esferas do exercício dessa atividade, que mais que um fato isolado é, como já tem dito, um processo. Pretender explicar o lazer dos nossos dias como um modelo terminado e perfeito de um ideal teórico, seria tirá-lo do seu contexto, caindo em meras descrições sem sentido.

As Variáveis De Valorização Na Motivação Da Demanda

Essa busca permanente de bem-estar que o homem tem como objetivo de vida adquire, no tempo livre destinado ao turismo e à recreação, uma valorização muito importante propiciando seu desenvolvimento pessoal e social.

A partir da motivação da demanda ou seja, do conjunto de razões objetivas ou subjetivas que conduzem a um comportamento de adesão para desenvolver uma atividade turística ou recreativa, se podem estabelecer as variáveis mais significativas para a obtenção desse bem-estar. Ao analisar o comportamento da demanda se deve considerar a relação entre quatro variáveis fundamentais:

  • necessidades;
  • desejos;
  • valores;
  • benefícios.

O primeiro impulso que um indivíduo tem é uma necessidade ou privação percebida que, quando comunicada se transforma num desejo e que leva a elaborar, no caso da atividade turística, um produto turístico ou recreativo que lhe permita satisfazer essa necessidade. O conjunto de pessoas que se propõe satisfazer as suas necessidades de lazer, no mercado, organiza a oferta turística ou recreativa.

Consciente ou inconscientemente esse indivíduo estabelece uma escala de valores para a seleção do destino e selecionará aquele que lhe ofereça os melhores benefícios nas óticas psicológica, funcional e econômica.

Isso leva a estabelecer que a demanda compra inicialmente sempre, ao fazer turismo, uma ilusão motivada por uma necessidade básica que é a busca de um estado de bem-estar integral, que geralmente, é exteriorizado quando diz simplesmente que o que procura é "curtir"; por isso que, em seu tempo de férias dedicado ao turismo, procura produtos e serviços turísticos e recreativos em distintos lugares que lhe ofereçam os melhores benefícios e que lhe permitam obter o maior grau de satisfação durante a sua viagem.

Uma visão integral do tema é considerar que a demanda parte principalmente de uma motivação para esse deslocamento de seu lugar de residência habitual, podendo-se dizer que o objetivo principal é:

  • conhecer;
  • recrear-se;
  • descansar.

Uma dessas três variáveis é o fator dominante para a escolha de um produto e posterior destino, uma das três atua como "gatilho" na tomada de decisões, ainda que se deva considerar que é uma ação conjunta das três com a preponderância de uma delas sobre as demais. As perguntas básicas que se devem responder à demanda são:

  • Como chego?
  • Onde durmo?
  • Onde como?

E a mais difícil de responder:

  • O que faço?

As pessoas portadoras de necessidades especiais

A primeira informação que se pode dar é que não há consciência, no campo do turismo, acerca das características numéricas desse segmento da demanda. Encontramos em Poole (1996), presidente de KEROUL – Tourisme pour personnes a capacite Physique Restreinte- de Canadá uma primeira aproximação quando diz:

"KEROUL acaba de receber os resultados de uma vasta pesquisa de mercado encomendada pela comunidade de deficientes do Canadá, dos Estados Unidos e da Europa. As cifras obtidas são de admirar: aos 4,1 milhões de canadenses sumam-se aproximadamente 45 milhões de estadunidenses e 40 milhões de europeus atualmente com algum tipo de impedimento físico, 60 milhões dos quais dizem que viajam e que um produto turístico de fácil acesso lhes resultaria em muito beneficio."

Entre outras descobertas, o estudo mostra que a condição de deficiente tem deixado de ser sinônimo de pobreza. Com os planos de saúde, das empresas e dos governos, as aposentadorias privadas e os seguros, adicionados ao surgimento do que se tem denominado "o trabalhador informatizado" e a possibilidade de realizar tarefas em casa por meio do telefone, do fax, do modem, etc., um acidente ou uma doença já não significam a indigência. Pelo contrario, é muito elevado o número de indivíduos com limitações físicas que têm à sua disposição importantes rendimentos, e (igual que o turista ideal) usufruem dos benefícios de uma agenda flexível."

Os rápidos computadores, os gráficos atuariais, as probabilidades e as regras de cálculo, todos juntos predizem que nos próximos 15 anos centenas de milhões de turistas vão exigir uma maior facilidade de acesso. A isto se agregam as cifras confirmadas pelos estudos de que em cada 2,4 viajantes tem um deficiente, um subgrupo visível que conta com multiplicandos invisíveis. Como os grandes números tendem a criar confusão, nos limitaremos a qualificar essa estatística com o termo que usam os expertos em marketing: "uma oportunidade para ter em conta."(Poole, 1996, p.4)

Conhecimento Qualitativo

A atual política baseada na segmentação da demanda permite desenvolver diferentes matrizes de análise. Uma proposta de pesquisa para um melhor conhecimento da demanda real ou potencial é em primeiro lugar o estudo da motivação e, depois de realizada a viagem, o estudo sobre o grau de satisfação do visitante (turista e excursionista).

Do ponto de vista teórico, o estudo de motivação objetiva explorar e analisar determinados temas em profundidade: hábitos de consumo com relação a distintos bens ou serviços, imagem de empresas ou marcas, etc. Do ponto de vista técnico através de pesquisas ou entrevistas grupais se determinam os assuntos mais relevantes. O objetivo desse tipo de estudo não é obter cifras relativas a tendências ou orientações da população nem porcentagens de opiniões, mas analisar conteúdos visando identificar problemas, descrever costumes, preferências e aprofundar nas motivações (razões, impulsos) que explicam os comportamentos e atitudes da demanda.

No caso dos estudos sobre grau de satisfação do visitante, o objetivo é medir a satisfação da demanda com relação ao produto (ao visitar os atrativos naturais e culturais, na prestação de serviços básicos como alojamento, gastronomia, transporte, agências, etc.) Esse estudo permite avaliar a qualidade dos serviços turísticos, orientar a atividade privada no sentido do melhoramento das facilidades e ter um diagnóstico de como o turista ou o excursionista percebem o destino, o cuidado e a manutenção dos recursos turísticos e das cidades e localidades onde a infra-estrutura turística está.

Ambas as pesquisas, a da motivação e a do grau de satisfação, requerem estudos permanentes, de uma política a longo prazo já que os hábitos e costumes da demanda se modificam com o passar do tempo, pela influência de modas e da consolidação das tendências, o que requere adequar a oferta aos câmbios mencionados desde o ponto de vista da qualidade e variedade dos atrativos e serviços.

Capítulo 3

Perfil da demanda portadora de necessidades especiais: As barreiras culturais à integração

A plena acessibilidade ao meio físico pelas pessoas portadoras de necessidades especiais é uma condição necessária para a equiparação das oportunidades em toda comunidade que se proponha a incrementar a qualidade de vida.

Essas pessoas compõem, para efeitos de análise, um segmento populacional que inclui fundamentalmente pessoas da chamada terceira idade, grávidas e as pessoas com deficiências temporárias ou permanentes, inatas ou adquiridas.

Além da diversidade se trata de pessoas que, por diferentes razões, vêm limitadas as suas possibilidades de ação e deslocamento. Precisamente no devir de desenvolvimento de todos os membros da comunidade existem riscos suficientes para que qualquer um possa ver-se afetado em algum momento da sua vida.

Ocupar-se da acessibilidade é, então, uma maneira de atender às necessidades latentes ou manifestas de todos. Dar resposta a essa demanda implica, em primeira instancia, definir com precisão a problemática.

A proposta deste capítulo é enquadrar a problemática da deficiência dentro da ampla gama de problemas sociais que assediam uma comunidade, diferenciando-a das meras dificuldades ou inquietudes, que constituem um assunto privado. Isso implica enfatizar particularmente a responsabilidade que a sociedade tem na prevenção, reabilitação e equiparação de oportunidades de todo tipo.

Pode-se dizer que a deficiência é um problema social desde que, por diversos fatores inatos ou adquiridos, certas pessoas vêem limitadas suas possibilidades para viver segundo o padrão cultural vigente. Essa limitação e restrição das possibilidades de desenvolvimento não depende exclusivamente, e como muitas vezes se pretende, da pessoa afetada, mas da mesma comunidade à que pertence, que nem sempre lhe oferece alternativas para desenvolver suas outras capacidades.

Concordar com o exposto no parágrafo anterior, ainda que seja em nível de declaração, começa a ser uma postura cada vez mais difundida, até ditada pelo sentido comum e devido aos câmbios evolutivos e da sociedade. Isto não foi sempre assim e tampouco é uma visão que esteja verdadeiramente enraizada na cultura ainda.

Deficiência, Cultura E Sociedade

A deficiência é um problema social. Desde a perspectiva sociológica, que orienta esta exposição, sustentar esta afirmação é reconhecer que a deficiência não é de competência exclusiva do afetado e da sua família mas de toda a sociedade.

A deficiência é, então, mais um problema social, entendendo-se por problema social aquele que "constitui uma condição que afeta um número significativo de pessoas de um modo considerado inconveniente, e que, segundo se acredita, deve ser corrigido mediante ação social coletiva." (HORNO, Leslie. 1974, p.4)

Desse modo, a deficiência, como problema da comunidade, é uma condição que reconhece uma origem social, implica situações criadas pelo homem ou que podem ser modificadas por ele, (excluindo assim o natural e o sobrenatural) e tem certo grau de permanência. Afeta um número importante de pessoas, pois além das cifras o que importa não é somente quantos são, mas que a dignidade de que deve gozar o ser humano como tal vê-se ameaçada o que é muito relevante para a comunidade e que precisamente justifica enfrentar a situação ainda que o número de casos não seja elevado.

Deve ser reconhecido como algo não-desejado e a consciência social a respeito deve generalizar-se. Só a ação coletiva pode atacar o problema. Ação coletiva que, concretamente, se expressa no planejamento e na ação social, setorial e multisetorial, nas pesquisas científicas e tecnológicas, em campanhas de prevenção e tratamento, construção de centros adequados, legislação pertinente, atuação associativa, promoção de ajuda mútua, etc.

O substrato indiscutido da ação é a conscientização. Somente a clareza sobre o problema pode vislumbrar os recursos necessários para propor soluções eficazes e, talvez, a difusão massiva, gerada por organismos públicos e privados, seja um dos passos preliminares.

De qualquer forma, tratar o mal-estar que isso gera não esgota, desde uma ótica sociológica, o que comumente chama-se problema social, porque para o sociólogo, o verdadeiro problema não consiste exclusivamente em ver que algo funciona mal, mas "na compreensão dos fatores que intervêm neste ponto em termos de interação social."(BAGER, 1967, p.61) A perspectiva sociológica da deficiência permite, então, estabelecer não só os aspectos problemáticos, mas o marco-geral de relações que estabelece a pessoa com alguma capacidade restringida considerada no seu contexto.

Deficiência, incapacidade e desvantagem

Reconhecer o caráter social do problema gerado por essa situação leva a identificar um ator com certas conotações específicas. É importante e necessário precisar, conceitualmente, a terminologia.

Seguindo à Organização Mundial da Saúde é bom distinguir entre os conceitos de deficiência, incapacidade e desvantagem.

Deficiência: é toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função cinética, fisiológica ou anatômica.

Incapacidade: é toda restrição ou ausência (devido a uma deficiência) da capacidade de realizar uma atividade na forma ou dentro da margem que se considera normal para um ser humano.

Desvantagem: é uma situação desvantajosa para um indivíduo determinado, conseqüência de uma deficiência ou de uma incapacidade que o limita ou o impede a desempenhar um papel que é normal em seu caso (em função da sua idade, do seu sexo e de fatores sociais e culturais).

Em virtude dessas contribuições, a OMS estabeleceu uma classificação das conseqüências da doença que, embora hoje, está sujeita a uma profunda revisão, à luz de experiências internacionais específicas realizadas nos últimos anos, orienta uma análise pacífica e realista.

Ainda que na América Latina a palavra desvantagem cause certo receio, tomar em conta o entorno resulta esclarecedor, e a noção de situação de desvantagem, que se esconde, pode ser a fonte teórica de interpretação que conduza à uma compreensão melhor das possibilidades de integração e participação social de pessoas portadoras de necessidades especiais, esclarecendo que há diferentes maneiras de avaliar a desvantagem: segundo o afetado, segundo os seus achegados e segundo a comunidade.

A problemática da deficiência deve ser entendida num contexto social, cultural, histórico e geográfico.

A idéia de diferente

É muito freqüente descrever à pessoa com alguma deficiência como um ser diferente com relação aos outros que se desenvolvem no mesmo contexto social, cultural, histórico e geográfico. Se é certo que, por natureza, todos os homens são diferentes e não há indivíduos idênticos, comumente se pensa na pessoa com alguma capacidade restringida como sendo diferente da maioria. Pode se dizer que a maioria de uma sociedade vem representada por um conjunto de indivíduos que, ainda sendo diferentes entre si próprios, mostram uma série de semelhanças que supera, quantitativamente, as diferenças quanto à sua forma de comportar-se, viver, atuar e funcionar nos diversos níveis da sua existência dentro do contexto social a que pertencem. Assim entendida, a maioria será aquela que determina as normas com que se compara cada indivíduo da sociedade. Isso se deve à tendência estatística que relaciona norma com freqüência, de tal sorte que o normal é o freqüente e os indivíduos são classificados como normais ou anormais.

A pessoa afetada por uma deficiência ocupava um lugar na sociedade; tinha um lugar assinalado, um status pré-estabelecido entre os atípicos e os pobres. Era identificado, destarte, por uma dupla marginalização: orgânica/funcional e social, visível em diferentes expressões culturais ao longo da história. Esse modelo tradicional, basicamente europeu porém exportável e exportado nos ciclos sucessivos de conquista e colonização, visto com perspectiva diacrônica, mostra que de objeto a eliminar (Esparta), expressão do mal ou, dialeticamente, manifestação do sagrado ou hierofante (Antiguidade) o cego, o deformado, o mendicante, o leproso, etc. têm passado sucessivamente a ser: objeto de caridade, administrado, assistido (surgimento dos Estados Modernos), estudado, tutelado (neopositivismo do século XIX), e, ultimamente, reabilitado.

Evidentemente, isso não é um simples escalonamento onde um rótulo suprime os anteriores; os modelos e as tendências são co-existentes.

Dentro desse esquema, pouca margem de mobilidade ficava aos portadores de deficiência, sendo a dependência a característica central.

O chamado modelo da reabilitação prolonga essas características, mas com a sua versão mais legitimada dentro de um setor profissional, o médico – sanitário-assistencial, que parece apropriar-se do problema ou estimular o reducionismo no tratamento e atendimento do afetado, com uma tecnologia terapêutica e de recuperação.

O modelo da vida independente surge em meados da década de 70, nos Estados Unidos, havendo já, nesse momento, iniciativas isoladas na Europa (particularmente nos países escandinavos).

Paralelamente, e em relação a isso, desenvolvem-se várias tendências como a do princípio de normalização na área da deficiência mental, pelo qual se defende o direito dessas pessoas de serem consideradas e tratadas como as demais, precisamente a partir de uma crítica à idéia leiga de normalidade. Trata-se, em essência, de fazer a sociedade acessível para todas as capacidades dentro dos padrões culturais vigentes.

O movimento do viver independente ou da autonomia pessoal propõe uma desinstitucionalização a partir das bases, por meio da qual os próprios interessados possam estabelecer os limites e alcances da integração.

Seu verdadeiro fim é a autodeterminação em todos os níveis e resulta em uma extensão natural das reivindicações anteriores de outros grupos marginais dos Estados Unidos (negros, mulheres, etc.), na busca de apoio mútuo para se desempenhar autonomamente como adultos numa sociedade competitiva.

Contrariamente ao que se possa pensar, esses três modelos e as suas possíveis versões co-existem na vida social atual, registrando-se como tendência uma ampla difusão do modelo reabilitado – incluso como etapa evoluída do tradicional - e uma incipiente mas ainda insuficiente – e até às vezes distorcida - propagação do modelo de autonomia pessoal.

A década de 80, inaugurada com o Ano Internacional dos Deficientes (1981) e a chamada Década das Nações Unidas para implementar o plano de ação conseqüente, têm um papel decisivo, que não é casual e que recolhe o aporte cruzado de afetados, familiares e profissionais que vem sendo gerado desde anos anteriores e que talvez possam dar-o testemunho dessa conciliação ou harmonização de interesses.

Nesse sentido, épocas e geografias diversas mostram distintas valorações das diferenças e explicam com maior especificidade o caráter social do problema e a ingerência do componente cultural.

O déficit ou dano da pessoa afetada explica só uma parte da situação de deficiência

O plano da deficiência, seja do tipo que seja, propõe certas considerações de fatores que terão notável incidência na pessoa e em seu posterior desenvolvimento.

Assim, a detecção precoce da alteração ou anomalia, o estabelecimento de um diagnóstico realista, o projeto de um plano de reabilitação que contemple não só o dano mas as potencialidades, as ajudas técnicas avançadas, uma reabilitação bem abrangente e orientada com eficiência, etc. reduzirão, sem dúvida os efeitos que produzem a incapacidade ou a desvantagem, mas somente na medida em que se conte com um entorno receptivo, aberto e preparado para as diferenças.

Freqüentemente, às limitações da pessoa se adicionam as da família (afetivas, econômicas, psicológicas, etc.) e as do entorno (falta de equilíbrio na distribuição dos recursos, carência de legislação pertinente, sistema de saúde restringido ou inacessível, sub-emprego ou desemprego agudo generalizado, etc.).

Isso permite dizer que não há duas pessoas iguais, e muito menos há pessoas com a mesma incapacidade ou desvantagem apesar de terem tecnicamente uma deficiência similar.

A recepção e a contenção familiar e a dotação social ante o problema, à luz das características de personalidade dos indivíduos de que se trata, explicarão a razão.

A resolução do problema implica tanto em ter uma adequada reabilitação como em contar com uma sociedade acessível

Reabilitar um indivíduo com deficiências implica prepará-lo para levar o padrão de vida vigente, de acordo com seu sexo, idade e lugar ocupado social e culturalmente. Isso pressupõe orientar-se por um modelo de ambiente e de comportamento que deveria aproximar-se o mais possível da realidade.

Não entanto, não é o que costuma acontecer. Cria-se uma notável distância entre o modelo proposto pela reabilitação e os desafios concretos que protagonizará cada indivíduo uma vez completada aquela, se é que realmente isto acontece. Inclusive, em certas ocasiões a situação se agrava porque nem sempre se levam em conta, no projeto da reabilitação, os desejos, as necessidades e as expectativas do próprio sujeito.

Acontece, também, que, muitas vezes, o processo reabilitador é acertado, mas o desajuste se produz com a ascensão do indivíduo e seu ingresso no âmbito competitivo (escola, trabalho, recreação, etc.) que nem sempre está preparado para o diferente, embora se trate de um diferente / reabilitado. Nesses casos, mais do que com um modelo real, se trabalha com um modelo ideal, se prepara para o que a sociedade deveria ser e não para o que a sociedade é.

Precisamente esses desajustes se produzem em quatro frentes principais: o meio físico, a educação, o trabalho e a vida social. (RPPAMP, 1987)

Uma sociedade é acessível quando elimina barreiras de todo tipo

As pessoas com deficiência podem participar da vida da comunidade a não ser que essa lhes oponha barreiras infranqueáveis. Essas pessoas têm dificuldades diversas derivadas da sua própria circunstância pessoal, mas têm capacidades subsistentes para transitar pelo meio urbano, para educar-se, para ser ativos, para conviver. É bem certo que na maior parte dos casos, a participação social das pessoas portadoras de necessidades especiais se vê obstaculizada por barreiras físicas, legais e também do tipo moral. Suprimir as barreiras existentes e evitá-las no futuro é uma tarefa difícil mas possível. Sua aplicação não é coisa que possa fazer-se num prazo imediato nem depende só dos poderes públicos ou da sociedade civil ou dos interessados, tem que ser um trabalho continuado e compartilhado.

O parágrafo anterior reflete o espírito de uma campanha espanhola de conscientização comunitária para a eliminação de barreiras à integração, ouvida internacionalmente, com bastante freqüência, na década de 1980.

A mesma implica, de certa forma, um exemplo da harmonização da concepção dos modelos reabilitador e da vida independente a que se fez referência antes. A reabilitação de uma pessoa com alguma deficiência seria mais completa se houvesse a possibilidade de implementar as destrezas e capacidades, treinadas, dentro de uma sociedade acessível, pensada para todos.

Isso pressupõe, participação social em todos os níveis para eliminar ou prevenir fatores que, de uma ou de outra forma, aparecem como entraves a uma integração plena.

Tudo isso, que no fundo não é outra coisa senão a reabilitação da sociedade, pode ser analisado em quatro frentes:

  • o meio físico;
  • a educação;
  • o trabalho;
  • a vida social.

A acessibilidade ao meio físico implica suprimir barreiras urbanísticas, arquitetônicas e no transporte, reconhecendo claramente a necessidade que todos os indivíduos têm de se movimentar.

A acessibilidade à educação tem como base que o ideal da mesma é contribuir com o desenvolvimento das pessoas e que, por definição, são todas educáveis. Pode tratar-se de integração escolar total ou parcial, segundo cada caso. De todos os modos, é um chamado ao incremento da qualidade da educação geral, pois quanto mais aberta, abrangente e completa for, menos necessário será contar com âmbitos especiais segregados.

A acessibilidade ao trabalho aparece como um dos mecanismos integradores mais eficazes por ser considerado como dos mais necessários para a independência das pessoas afetadas. Resulta altamente desejável que através do trabalho estas obtenham os meios propícios para seu sustento; inclusive a atividade produtiva resulta importante como expressão pessoal e de relação social. Supõe suprimir barreiras especificamente trabalhistas também, como qualquer obstáculo à mera opção de acesso ao trabalho, à capacitação para o trabalho competitivo, o perfil profissional requerido e o regime de desempenho, etc., assim como outras mais generalizadas como a falta de emprego.

A acessibilidade à vida social evidencia aspectos menos visíveis, mas que são transcendentes para o desenvolvimento e a dignidade da pessoa, tais como: a família, a convivência no bairro, as atividades culturais e recreativas, assim como a formação dos variados tipos de vínculos inerente a cada uma.

Propiciar essa acessibilidade ou, em outros termos, reabilitar uma comunidade que obstaculiza as diferenças, supõe oferecer alternativas, equiparar oportunidades em todas as facetas da vida humana e também prevenir aquilo que é visto como inconveniente e, nesse sentido, não-desejado.

Mas todas as barreiras implícitas no anteriormente exposto têm suas raízes nas concepções culturais, na noção compartilhada socialmente desse tipo concreto de diferenças. Por essa razão, eliminar as barreiras visíveis, sejam reconhecidas ou não como tais, supõe desentranhar outras mais profundas e intangíveis.

As barreiras culturais constituem a base onde se formulam as tangíveis ou de tipo físico

Nesse marco, deve-se ter em conta que toda barreira é uma construção humana, consciente ou inconsciente, que supõe "deixar fora" todo indivíduo que não tenha as capacidades médias consideradas por uma comunidade. Por isso, suprimir ou eliminar obstáculos não significa só destrui-los ou impor sanções, mas trabalhar sobre as percepções e os valores das pessoas, basicamente fazendo conhecer o diferente, sua origem e transcendência.

É imprescindível considerar de que forma o desconhecimento ou o conhecimento insuficiente das diferenças, a redução da pessoa à sua carência, falta de funcionalidade ou deformidade, o preconceito baseado no anterior, etc. acarretam condutas sociais diferenciadoras, transmissíveis e geradoras de produtos sociais – ações ou artefatos - que tendem a assinalar e separar os portadores dessas diferenças enquanto valoradas negativamente.

Na área da política e da ação social referentes à deficiência visualiza-se a inutilidade de programar a dissolução desses obstáculos sem atender às verdadeiras forças que os produzem, que não são outras senão as descritas.

Dessa maneira, a proposta de resolução do problema implica num novo marco conceitual do mesmo, que permite entendê-lo nas suas verdadeiras dimensões, reconhecendo os verdadeiros atores e os possíveis condicionantes.

Mas, para além de tudo isto, que é, certamente válido, fica claro que é necessário reconhecer que o verdadeiro trabalho que temos pela frente é, especialmente, no que diz respeito ao conhecimento realista da situação de deficiência, dentro do marco mas amplo de dignificação da pessoa humana e da busca de uma autêntica qualidade de vida para todos.

Elementos De Avaliação Na Atividade Turística De Portadores De Capacidades Restritas

Ao analisar o desenvolvimento da atividade turística, encontra-se dois pontos principais de conflito para a plena integração das pessoas portadoras de necessidades especiais: a) a acessibilidade ao meio físico; e b) a qualidade da prestação de serviços dos prestadores de serviços turísticos e recreativos.

a) Acessibilidade Ao Meio Físico

No meio construído, urbano, se observam impedimentos arquitetônicos e urbanísticos que marginalizam a um grupo importante, pela existência de barreiras.

As barreiras arquitetônicas e urbanísticas são os impedimentos que encontramos no entorno físico (criado pelo próprio homem), que dificultam ou impossibilitam a transitabilidade (possibilidade de transitar) urbana, convertem em infranqueáveis edifícios públicos ou privados, fazem inacessíveis ou impossíveis de utilizar parte dos edifícios ou seu equipamento.

Aqui se coloca em discussão a imperiosa necessidade de uma estratégia que permita a plena acessibilidade ao meio físico como resposta a essa situação.

A primeira alternativa para essa integração é o que se pode denominar "um design universal" entendendo isso como os padrões para a elaboração do projeto e a sua posterior construção que permitem desde a sua concepção intelectual até a plena integração de todos os indivíduos.

A segunda alternativa que tem sido aplicada para limitar a desvantagem é o desenvolvimento do que se pode denominar "próteses", ou seja, um elemento da criatividade do homem que permite potencializar a restrição natural do indivíduo. Assim tem-se "próteses arquitetônicas", como por exemplo, as rampas de acesso e as "próteses urbanísticas" como é o caso da incorporação de bancos em espaços públicos para pessoas da terceira idade que não podem percorrer longos trechos sem um descanso.

As pessoas afetadas por alguma forma de menos-valia quando no uso do seu tempo livre, destinado a atividades turísticas e/ou recreativas, geralmente encontram várias situações de conflito no espaço turístico, que podem ser agrupadas em:

  • Os espaços verdes (praças e parques), a estrutura urbana (obras de saneamento, cruzamentos de pessoas ou veículos, etc.), o mobiliário urbano (luminárias, bebedouros, bancos, etc.);
  • Os edifícios, notadamente os destinados a alojamento hoteleiro e extra-hoteleiro, as instalações para gastronomia (bares, cafés e restaurantes), e as instalações para o desenvolvimento de atividades culturais como museus e salas de espetáculos;

As instalações para atividades científicas (congressos e convenções) se somam às instalações para o desenvolvimento de atividades recreativas - esportivas como estádios e seus espaços complementares (vestiários, ginásios, etc.) Esses são os exemplos mais significativos desse segmento;

  • O desenvolvimento de atividades lúdicas nas áreas naturais (montanhas, praias e rios) e em áreas urbanas (zoológicos, cassinos e discotecas) vê-se comprometido pela dificuldade de acesso a esses atrativos;
  • A variável transporte também apresenta situações de conflito no caso de terminais, acessos e áreas de estacionamento, junto com os meios específicos de transporte aéreo, marítimo, terrestre e fluvial.

b) A Qualidade Da Prestação De Serviços

Para o pleno desenvolvimento de um indivíduo, necessita-se potencializar principalmente três variáveis: a confiança em si próprio, a independência e o sentimento de solidariedade nas várias fases do seu desenvolvimento (individual, de relacionamento, grupal ou social). O exposto leva a considerar três etapas de integração de uma pessoa portadora de necessidades especiais durante o desenvolvimento de atividades turísticas:

  • uma integração física, que lhe permita aproximar-se a outras pessoas ou transitar por qualquer espaço urbano ou rural;
  • uma integração funcional, que lhe permita coordenar os vários serviços e que não permita uma discriminação com as pessoas sem mobilidade restrita;
  • uma integração social, utilizando juntos os diferentes serviços e atrativos através da cooperação entre as várias pessoas que tomam parte do desenvolvimento da atividade turística, baseando-se nos seus interesses mútuos.

Especificamente sobre o grupo de pessoas portadoras de necessidades especiais,o físico inglês Stephen Hawking expressa: "Aqueles que tsem alguma deficiência não deveríamos considerar-nos marginalizados. Somos seres humanos normais que só temos algumas necessidades especiais. Nos anos que passaram outros grupos prejudicados, como as mulheres e as pessoas de diferentes raças, têm conseguido ser tratados igualitariamente e terem as suas necessidades reconhecidas. Já é hora que consigamos o mesmo respeito pelas necessidades das pessoas com alguma capacidade restringida..."(Actualidad [...], 1996, p. 36)

Atualmente, as pessoas portadoras de necessidades especiais incorporam-se cada vez mais às atividades sociais, econômicas e culturais em igualdade de condições com o resto da comunidade. Isto implica o desejo e o direito de toda pessoa de desfrutar individual ou coletivamente das inúmeras atividades, integrada ao conjunto da população.

A resposta a essa problemática deve iniciar-se pela tomada de consciência sobre as características das necessidades desse segmento da demanda e uma troca de mentalidade no agir, porque a acessibilidade é principalmente um problema de solidariedade, esta é o único caminho para resolver os problemas de um futuro cada vez mais complexo. Uma forma de potencializar a solidariedade é conhecendo as limitações reais e não imaginadas daqueles que têm uma capacidade restringida e pensando que, num futuro próximo, passaremos também a integrar esse segmento da demanda.

Essa concepção teórica para entendimento dessa temática é necessária para aqueles que estão na atividade turística. Requer uma consciência coletiva que permita a todos aqueles que têm uma capacidade restrita ou uma limitação – da criança ao ancião – permanente ou temporária, transitar sem barreiras pela vida, a fim de melhorar a qualidade de vida desse visitante a um destino turístico, consciência esta que permita sentar as bases para uma integração real em cada uma das atividades que o homem realiza quando faz turismo.

As profundas mudanças na tecnologia da comunicação, os sistemas e as normas de difusão da informação e a comunicação global têm ultrapassado as barreiras geográficas eliminando, desta maneira, a mais significativa das barreiras: a falta de conhecimento.

Capítulo 4

O conceito de recreação na atividade turística

O turismo é o conjunto de atividades, originadas no movimento voluntário de pessoas, em forma temporária, fora da sua residência habitual, que gastam no lugar visitado recursos obtidos fora da mesma. Poderia ser sintetizada dizendo que o turismo é uma migração voluntária, temporária e condicionada economicamente.

Quem se desloca da sua residência habitual, por qualquer motivo e não realiza atividades com retribuição econômica, é um turista. É talvez a única atividade onde o delito é trabalhar.

O conceito de recreação é de maior amplitude que o de turismo, e abarca todas as atividades que o homem realiza em busca de uma satisfação física ou espiritual. Do ponto de vista temporal é colocada dentro do tempo livre, mas nada impede que essa condição se cumpra dentro do tempo ocupado.

Recreação passiva ou ativa, dependendo de se o sujeito é um mero espectador do meio ou se interatua com o mesmo. Sempre com o objetivo de obter um certo grau de satisfação.

A recreação é independente da residência habitual, ou do tempo de permanência na mesma. Inclui tanto a residentes como a visitantes.

Há países como Estados Unidos, onde denomina-se outdoor recreation a toda atividade de recreação, incluindo o turismo interno, reservando-se o termo turismo apenas para a recreação fora do país.

A Competitividade A Partir Da Recreação

Parte-se da premissa de que há dois possíveis tipos de recreação: uma recreação ativa que pressupõe a utilização do meio ambiente e uma recreação passiva entendida como simples contemplação do meio. A possibilidade de êxito, numa situação de competitividade entre destinos turísticos com uma oferta de recreação ativa é superior sobre aqueles com uma oferta de recreação passiva.

Recreação passiva e recreação ativa

O conceito de recreação passiva corresponde à interação entre o visitante (a procura de turismo ou recreação) que atua como um simples observador e o meio (espaço físico turístico). Essa modalidade recreativa conta com o inconveniente que o atrativo esgota rapidamente a motivação do visitante e nota-se uma tendência de não reiterar a visita. Caso a mesma ocorra novamente, se produzirá em grandes intervalos de tempo.

Pode-se diferenciar uma recreação passiva em espaços naturais como seria o caso da contemplação das cataratas do Iguaçu, de uma recreação passiva cultural como percorrer uma cidade.

O conceito de recreação ativa corresponde à interação física entre o visitante e o meio, e é uma modalidade reiterativa da presença da demanda no destino. Como exemplo pode-se citar que a "água lúdica" (a praia e o mar em qualquer de seus destinos), motivam continuamente o regresso do turista.

Uma política de desenvolvimento recreativa implica para um município:

  • captar um mercado que tem como raio de ação 200 quilômetros de distância ou um tempo de traslado máximo de duas horas do local de residência habitual permanente ou temporal (residência do turista num destino turístico);
  • melhorar a qualidade dos espaços recreativos existentes e consolidar os espaços em vias de desenvolvimento: assim como detectar e potencializar novos locais propícios para o desenvolvimento das atividades de lazer.

Este objetivo tem implícita a idéia de redefinir o campo de atuação a partir de um conceito de desenvolvimento integral das atividades do tempo livre.

Uma dessas alternativas é que, a partir do conceito de desenvolvimento sustentável, ou seja, sem a destruição do sistema natural apesar do uso do mesmo, se possa utilizar esse espaço para a vida social baseando-se na recreação e potencializar ali uma cultura do lazer que permita uma melhor qualidade de vida para os residentes do município e para comunidades vizinhas.

A Recreação Como Ferramenta De Integração

Um tema de real importância é a atividade social, que não só é transcendente para a maioria das pessoas, mas também para as pessoas portadoras de necessidades especiais. A mesma pode ser incorporada e servir aos propósitos, como parte de um programa de reabilitação.

Deve-se levar em conta que as pessoas que nasceram com perda parcial ou total das suas capacidades ou aquelas que as perderam a uma altura determinada da sua vida, costumam experimentar um grande distresse que vem acompanhado de um comportamento introvertido, ansiedade, depressão, insegurança, solidão, desconfiança, falta de iniciativa, etc.

Soma-se a isso também uma pobre imagem de si próprio, traduzida na insatisfação das suas necessidades emocionais e na falta de compromisso para consigo e para com a sociedade.

Muitas vezes, essas atitudes são provocadas pelos elevados custos da terapia física e psicológica, da qual inclusive necessitam participar seus familiares, adicionada à falta de aceitação do diagnóstico determinado pelo médico.

O fato de freqüentar exclusivamente os centros de atenção, escola ou trabalho, também gera uma situação na qual, freqüentemente, os pacientes e familiares não se dão "a permissão", por diferentes causas, de levar uma vida social além do itinerário inflexível que devem cumprir como obrigação. Isto repercute no ambiente familiar carregado de insatisfação, saturação, opressão, etc.

Tempo Livre

É nesse lapso de tempo que a pessoa pode encontrar a oportunidade para enriquecer e potencializar sua normalização e integração à sociedade. No caso das pessoas portadoras de necessidades especiais, supõe as mesmas conquistas e valores daquelas que não as apresentam. A oportuna e prudente utilização do tempo de expansão, relação, etc., como passatempo e diversão, representa sem dúvida, uma ferramenta a mais, que favorece a comunicação interpessoal e grupal.

A essas novas oportunidades se somam:

  • uma maior flexibilidade na consecução de conquistas e metas, além da existência de um aprendizado com regras;
  • o aprendizado do comportamento social que permite a adaptação ao sistema, facilitado através de atividades executadas em tempo livre;
  • o favorecimento de atitudes positivas através da atividade lúdica. Aqui se apresenta uma tarefa essencial da condição humana: pôr a liberdade criadora em funcionamento, enriquecendo os jogos, criando, dinamizando. Esses são passos que exercem um poder extraordinário na formação da personalidade. Também é comum o surgimento de idéias e emoções que a pessoa dificilmente poderia manifestar, se não fosse pelo jogo. Vale acrescentar a alegria, a simpatia pelos outros, a camaradagem e a propensão a aguçar a observação e a adquirir um pensamento flexível. dar partida nesta poderosa bateria levará, muito provavelmente, ao diálogo profundo, a repensar algumas atitudes, à aceitação da condição de ser uma pessoa com capacidade restrita, ao abandono da passividade, assim como a lembrar causos engraçados, a gratificação do riso contagiante, o estímulo à imaginação, a expressão corporal, a restauração muscular, a supressão dos estados de angústia e um somatório de avanços nos níveis de melhora.
  • o estímulo que conduz todos os participantes a refletir sobre realidades e alternativas de vida distintas, adaptando suas capacidades e formas de expressão e comunicação às de seus colegas;
  • a interação entre iguais e a relevância do grupo, facilitando, assim, a integração.
Partes: 1, 2, 3, 4, 5


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