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Drogas, por que legalizar? A interferência do direito penal na questão das drogas (página 3)


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Em 2006 temos então a edição da lei 11.343/06, que dá um novo enfoque à questão das drogas, aplicando modelo de "despenalização" (segundo STF) do usuário e penas mais altas ao traficante. Na verdade, trata-se de uma nova roupagem a um velho modelo. Adiante alguns aspectos da referida lei.

3.2 QUESTÕES CONTROVERSAS DO ARTIGO 28 DA LEI DE DROGAS (LEI 11.343/06).

O usuário de Drogas, após décadas de intensos debates e estudos, propugna-se que deve ser tratado e não mais punido pela rigidez do direito penal, pois a criminalização do usuário afronta princípios penais, como a alteridade e lesividade, e princípios constitucionais, como autonomia da vontade (princípio implícito), pois, atinge apenas sua esfera individual. Porém, a lei 11.343/06, em seu artigo 28, define crime o ato de:

Art.28: Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas;

II – prestação de serviço à comunidade;

III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. (BRASIL, 2006)

Muito se discutiu acerca da natureza jurídica deste artigo, se houve uma descriminalização, despenalização, "abolitio criminis" ou uma infração "sui generis". Porém, o STF se manifestou em 2007, afirmando que a conduta descrita no art. 28 trata-se de despenalização, mantendo-se então a conduta como criminosa. Foi através do Recurso Extraordinário 430105RJ (julgado em 2007), que pronunciou-se o Supremo nesse sentido.

Discute-se atualmente no STF acerca da descriminalização deste artigo, mas deixaremos para explorar melhor no ítem 5.1. Gomes (2007, p.147) faz uma crítica veemente ao posicionamento que propugna pela despenalização, pois, segundo este:

Se as penas cominadas para posse de droga para consumo pessoal são exclusivamente alternativas, não há que se falar em crime ou contravenção (por força do art. 1º da lei de introdução ao Código Penal). O art. 28, consequentemente, contempla uma infração sui generis (uma terceira categoria que não se confunde nem com crime nem com a contravenção penal).

Continua Gomes (2007, p.147), dizendo que "o fato deixou de ser criminoso (em sentido estrito), houve uma descriminalização formal, porém, sem a concomitante legalização [...] mas a posse da droga não foi legalizada". Reforça sua teoria dizendo que é infração "sui generis", não só porque as penas cominadas não conduzem à prisão, senão também porque normalmente a transação penal impede outra por prazo de cinco anos. Em relação ao usuário, isso não acontece.

Assim, a lei 9.099/95, que traz algumas espécies de penas alternativas, não é aplicada ao usuário, pois, este pode ter várias transações penais dentro do prazo de cinco anos, de modo que caracterizaria um caso "sui generis".

Importante fazer algumas observações acerca do posicionamento do STF. Crime ou contravenção são espécies do gênero infração penal, que são sancionadas com uma pena ou uma medida de segurança, estas, espécies de sansão penal.

Se houve uma despenalização no crime descrito no artigo 28 da Lei de Drogas, logo não há possibilidade de aplicação de qualquer pena, então, poderemos questionar se deveria haver uma medida de segurança a ser aplicada para continuar sendo descrita a conduta como criminosa. Não é o que acontece, pois, advertência, prestação de serviço à comunidade ou medida educativa não são espécies de medida de segurança, que segundo o Código Penal são:

Art. 96. As medidas de segurança são:

I - Internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado;

II - sujeição a tratamento ambulatorial.

Parágrafo único - Extinta a punibilidade, não se impõe medida de segurança nem subsiste a que tenha sido imposta. (BRASIL, 1940)

Por óbvio, ainda assim seria impossível aplicação de medida de segurança, tendo em vista ser imputável o agente que pratica tal conduta, sendo somente por exceção a inimputabilidade em casos extremos de dependência.

Importante salientar que existem posicionamentos que afirmam ser a despenalização uma suavização da resposta penal, com penas alternativas, segundo o art.5º, XLVI, alínea "d" da CF/88, e que é o posicionamento do STF no julgado de 2007:

Art. 5º, XLVI: A lei regulará a individualização da pena e adotará, dentre outras, as seguintes:

  • a) privação ou restrição da liberdade;

  • b) perda de bens;

  • c) multa;

  • d) prestação social alternativa;

  • e) suspensão ou interdição de direitos;

(BRASIL, 1988, grifo nosso)

Ora, o próprio inciso 5º XLVI indica outras formas de "pena". Logo, equivoca-se o STF afirmando que houve despenalização. Poderia então alegar, no máximo, uma descarceirização.

Por isso, é difícil de entender a posição do STF de manter a conduta como criminosa e despenalização do artigo, pois, tal dispositivo, trata-se de pena restritiva de direitos, e prestação social alternativa é uma espécie de pena restritiva de direitos, por força do art. 43 do Código Penal, que estabelece a prestação de serviços à comunidade como uma espécie de pena restritiva de direitos. Logo, não houve então uma despenalização, isso porque a prestação social alternativa é uma espécie de pena, conforme art.32 c/c com o art.46 CP:

Art. 32 - As penas são:

I - privativas de liberdade;

II - restritivas de direitos;

III - de multa. (BRASIL, 1940, grifo nosso)

Art. 46. A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é aplicável às condenações superiores a seis meses de privação da liberdade.

§ 1o A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado.

§ 2o A prestação de serviço à comunidade dar-se-á em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais.

§ 3o As tarefas a que se refere o § 1o serão atribuídas conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho.

§ 4o Se a pena substituída for superior a um ano, é facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em menor tempo (art. 55), nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada. (BRASIL, 1940, grifo nosso)

Assim, a prestação social alternativa está incluída no Título V do Código Penal (Das Penas), não deixando, portanto, de se configurar uma espécie de pena, de modo que não pode ser considerado despenalizado aquilo que é considerado pena pelo Código Penal. Importante observar também que o art. 46 CP requisita condenação superior a seis meses para esta modalidade de pena, algo impossível, pois o art. 28 não prevê penal alguma.

Observa-se também que não se pode considerar crime aquilo que é despenalizado, pois não existe crime sem pena, que, além de ser um vácuo inócuo sem qualquer sentido, que torna a intervenção penal arbitrária e viola o princípio da intervenção mínima. Este é o caminho mais importante a ser observado, pois, de acordo com a teoria constitucional do pós-positivismo, os princípios são inclusos dentro da norma, portando, com força vinculante, conforme já abordado.

Assim, em conflitos entre regras e princípios haverá prevalência do princípio sobre a regra, de modo que sua observância é vinculada. Isso gera, portanto, a inconstitucionalidade do artigo, em vista de afrontar não apenas um princípio (intervenção mínima), mas vários princípios constitucionais penais (lesividade, alteridade etc...).

Outra observação refere-se ao fato de a lei não explicar o que é droga, deixando para a ANVISA tal papel. Portanto, trata-se de uma norma penal em branco, preenchida por um ato administrativo, portanto infralegal, e por ser infralegal é uma norma penal em branco heterogênea. É a portaria de número 344/98 da S.N.V.S (Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária) que define drogas.

Quanto ao crime tipificado no artigo 28 da nova lei, ampliou-se o rol em relação à lei 6.368/76, incluindo quem adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou leva consigo droga para consumo pessoal, tendo por base a ideia de que a referida conduta traz consigo um inerente risco social, colocando em perigo a saúde pública no sentido de que o usuário ou dependente, mesmo que a transporte ou realize qualquer das condutas com o objetivo do consumo próprio, está sempre psicologicamente predisposto a disseminar o vício a outrem.

No entanto, entende a lei que a lesão social deste usuário é menor e menos marcante do que aquele que pratica o crime de tráfico, por exemplo, o que explica o porquê da "pena" mais leve.

Poderíamos questionar que, se, ao trazer consigo "drogas", o usuário está predisposto a disseminar o vício a outrem, logo, o mesmo pensamento deve ser atribuído ao tabaco e ao álcool, pois a lógica é a mesma, tornando incoerente a intervenção penal num caso, mas não noutro.

Mas pode ser ainda pior, pois aquele que entrega, ainda que gratuitamente, drogas a outrem, pratica o delito de tráfico (artigo 33 da referida lei), tornando inválida a fundamentação da posse de drogas para consumo pessoal, baseada na ideia de que o consumidor está "predisposto a disseminar seu vício a outrem", e que as drogas poderiam cair em mãos alheias, pois, se assim fosse, não seria então drogas para consumo pessoal, mas sim para consumo alheio.

Santos e Figueiredo (2012) afirmam que é crime de mera conduta, os verbos núcleo do tipo, trazer consigo, transportar [...], portanto, não necessita de prova do perigo concreto, lembrando que crimes de mera conduta têm acentuada crítica de parte da doutrina pátria, pois não há fato praticado para merecer intervenção penal, pois não houve lesão ou ameaça ao bem jurídico, violando o princípio da ofensividade da conduta.

Com pensamento divergente, Souza e Bersan (2013) protestam pela constitucionalidade do artigo 28 da lei de drogas afirmando que:

A manutenção do denominado porte de entorpecente para uso próprio, atualmente aplicado à conduta de adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar encontra justificativa por não ser considerado um atentado contra a saúde individual daquele que pratica tal conduta, mas sim por considerar-se um atentado contra a saúde pública. Em que pese o fato do usuário da droga prejudicar sua própria saúde, não podemos nos olvidar de que a coletividade, como um todo, também é colocada em risco. O vício das drogas tem o potencial de desestabilizar o sistema vigente. Nessa linha de raciocínio, necessário se faz consignar elucidativa lição do eminente Vicente Greco Filho (2011): "[...] a punição do simples porte se insere, como parte no todo, no quadro geral e no ciclo operativo completo, da luta, com meios legais, em todas as frentes, contra o alto poder destrutivo do uso de estupefacientes e contra a difusão de seu contágio que alcançam o nível de manifestações criminosas tais que suscitam, em medida cada vez mais preocupante, a perturbação da ordem". E continua o renomado autor (2011): "A razão jurídica da punição daquele que adquire, guarda ou traz consigo para uso próprio é o perigo social que sua conduta representa". Mesmo o viciado, quando traz consigo a droga, antes de consumi-la, coloca a saúde pública em perigo, porque é fato decisivo na difusão dos tóxicos. Já vimos ao abordar a psicodinâmica do vício que o toxicômano normalmente acaba traficando, a fim de obter dinheiro para aquisição da droga, além de psicologicamente estar predisposto a levar outros ao vício, para que compartilhem ou de seu paraíso artificial ou de seu inferno.

Assim, na visão dos autores, é plenamente constitucional o artigo 28 da lei 11.343/2006 e complementam afirmando que:

Como pode ser facilmente vislumbrado, o porte de substância entorpecente está relacionado aos riscos provenientes da droga frente à sociedade e à saúde pública. Assim, o argumento dos que entendem que o referido porte para consumo pessoal constitui uma autolesão, alegando em consequência a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei 11.343/06, em que pese a sua força, data máxima vênia, não merece prosperar.

Forte argumento em defesa de constitucionalidade de tal artigo, diz respeito ao fato de que não existe ataque ao princípio da alteridade ou da lesividade, afirmando que a conduta de consumir a droga não é incriminada, logo não haveria autolesão. Gomes (2007, p.110) por sua vez afirma que:

é preciso distinguir, prontamente, o usuário do dependente de drogas. Nem sempre o usuário torna-se dependente. Aliás, em regra o usuário de droga não se converte num dependente. Ser usuário de droga (como álcool) não significa ser toxicodependente (ou alcoólatra).

Logo, ao contrário de Vicente Greco Filho, Luiz Flávio Gomes não concorda que toxicômano é necessariamente um viciado que irá traficar para manter seu vício, além de estar predisposto a levar outros ao seu "inferno astral".

Na verdade, é distorcida a visão que inclui todos os usuários de drogas como viciados e com tal predisposição. Aliás, apenas algo em torno de 10% dos usuários são dependentes, de modo que a esmagadora maioria (aproximadamente 90%) que usa substâncias psicoativas, utilizam por recreação sem ser toxicodependente.

É o que afirma Carl Hart (2014), neurocientista, professor adjunto nos departamentos de psicologia e psiquiatria da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos. Para os defensores da constitucionalidade do artigo 28, o bem jurídico tutelado é a saúde pública e não se criminaliza a autolesão.

O problema está no fato de que ninguém pode consumir drogas sem trazer consigo, salvo raríssimas exceções. Além disso, as drogas lícitas também poderiam atentar contra o suposto bem jurídico "saúde pública", e não existe um critério que defina porque um é considerado lícito e outro ilícito.

Acreditar que usuário necessariamente levará consigo outras pessoas a consumirem drogas, o coloca em patamar semelhante ao traficante, pois aquele, consumindo ou não a droga, acreditar que levaria outras pessoas a consumirem, consubstanciaria na figura típica do art.33 da referida lei de drogas(tráfico), tornando incoerente a justificativa de criminalização do artigo 28.

Logo, mais uma vez, mostra-se incoerente tal artigo com impossibilidade de distinguir usuário de traficante, já que, mesmo gratuitamente, quem entrega droga a outrem pratica o crime de tráfico. É o que diz o artigo 33 da lei de drogas:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. (BRASIL, 2006, grifo nosso).

Portanto, podemos perceber, claramente, que, por detrás do pretendido bem jurídico saúde pública, o que de fato subsiste no delito de drogas é uma tutela da moral, o que não é permitido em matéria penal por violação ao princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos.

A saúde pública é utilizada como subterfúgio, como fachada, para burlar a tutela da moral, que é proibida, de modo que a confusão do que pode ser ou não considerado lícito ou ilícito em matéria de drogas, do que é considerado tráfico ou uso é muito confuso, justamente porque não se tem delineado claramente o bem jurídico tutelado pela norma, justamente pelo fato de que o que verdadeiramente há é uma tutela da moral. Por isso, a confusão.

Aliás, se realmente houvesse preocupação com a saúde pública, não haveria de manter a proibição, tendo em vista os malefícios que a proibição traz à saúde pública como um todo. É também, algo inconsistente diferenciar usuário e traficante, tendo em conta que, se todo usuário leva alguém a consumir drogas consigo, pratica este, portanto, o delito de tráfico, o que torna absolutamente incoerente a posição defendida pela constitucionalidade do artigo com tal premissa.

Apesar de haver alguns critérios para definir se o agente é usuário ou traficante, existe uma incerteza, uma verdadeira confusão, pois vai depender do grau de análise e subjetividade de cada juiz no caso concreto, o que dá margem para haver classificações diferentes em situações muito semelhantes. Gomes (2007, p.161) explica a diferenciação:

Há dois sistemas legais para decidir se o agente é usuário ou traficante: a) sistema de quantificação legal – fixa-se nesse caso o quantum diário para consumo pessoal; b) sistema de reconhecimento judicial ou policial – cabe ao juiz ou a autoridade policial analisar cada caso concreto e decidir sobre o correto enquadramento típico. A última palavra é a judicial, de qualquer modo, é certo que a autoridade policial (quando o fato chega ao seu conhecimento) deverá fazer a distinção entre o usuário e o traficante.

Vemos que esse subjetivismo leva muitas vezes alguns a serem considerados traficantes e, em casos extremamente análogos, haver classificação como usuários, tornando confusa a tipificação, pois existe falta de critérios precisos. Isso decorre, em última análise, muito possivelmente, do fato de tutelar-se materialmente a moral no delito de drogas, porém formalmente escondida sob a rubrica da saúde pública.

Os defensores da inconstitucionalidade do artigo 28 da lei 11.343 afirmam que, acima de tudo, a intimidade do ser humano deve ser preservada e, portanto, nenhuma norma penal será legítima no momento em que interferir nas opções pessoais ou impuser padrões de comportamento aos sujeitos.

O mesmo se deve ao fato que o direito penal deve proteger bens jurídicos, e padrões morais não fazem parte de tal perspectiva. Pode-se alegar que nenhum direito fundamental é absoluto, e de fato não o é. Portanto, na conduta de posse de drogas para consumo pessoal não existe um perigo direto, concreto e imediato a terceiros, de forma a ferir princípios penais e constitucionais tal proibição, pois, a liberdade, desde que seu exercício não extrapole sua esfera de atuação, é um direito absoluto, até encontrar limites no direito de outros.

Santos e Figueiredo (2012):

Considera-se que a incriminação do uso de drogas fere o princípio da lesividade e tudo que há de acordo com política criminal na matéria. Bizzoto et al.(apud ARAUJO, 2012) defende que a inconstitucionalidade se dá porque o individuo é senhor de seu próprio destino, saúde e corpo, sendo por isso, a única pessoa competente para decidir o que ele acha melhor ou pior para si mesmo. Portanto, qualquer conduta que ameace violar a liberdade e o interesse do agente fere o princípio da lesividade. A infração penal só tem lugar quando se afeta bem jurídico de terceiro. É por conta desse principio que temos o exemplo da não criminalização das condutas da tentativa de suicídio, de dano a coisa própria e autolesão. A noção de descriminalizar a conduta do usuário de drogas, já tem aderência nas cortes supremas da Argentina e da Colômbia, porque paira o entendimento geral de que o sujeito só está fazendo mal a si próprio.

É inconstitucional, também, porque o simples porte de uma droga não pode ser considerado capaz de vulnerar a saúde pública, se revestindo, portanto, da mínima ofensividade ao bem jurídico tal conduta. Aliás, outro embate jurisprudencial e doutrinário, diz respeito à possibilidade de decretar a insignificância (bagatela) no crime do artigo 28 da lei de drogas.

A questão polêmica é quando a prática de uma das condutas previstas do crime for cometida com o porte de pequena quantidade de droga. Alguns entendem ser fato atípico, pois não configura nenhum perigo social, pela lógica de que a ínfima quantidade possibilitaria apenas ao agente consumir, inexistindo o risco social de algum terceiro vir a ter acesso à droga. Sem o perigo social, inexiste crime.

Abaixo, algumas demonstrações de decisões judiciais que demonstram as disparidades de entendimento que provocam a discussão acerca da possibilidade ou não de aplicação do princípio da insignificância ou da (in)constitucionalidade do artigo:

TJRS: RECURSO CRIME Nº Nº 71003642618

Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais.

Relator: Edson Jorge Cechet

Julgado em 07/05/2012.

POSSE DE SUBSTÃNCIA ENTORPECENTE. ART. 28, "CAPUT", DA LEI 11.343/06. INEXISTÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE QUANTO AO DELITO. ABOLITIO CRIMINIS INOCORRENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÃNCIA AFASTADO. TIPO PENAL COMPOSTO. 1. Não há inconstitucionalidade a ser reconhecida quanto ao delito de posse de substância entorpecente. a disposição prevista no art. 28 da lei n. 11.343/06 busca coibir a difusão da droga, resguardando a saúde pública, sem afronta a qualquer das franquias constitucionais. 2. a lei n. 11.343/2006 não descriminalizou a conduta de porte de substância entorpecente para uso próprio, vindo apenas a cominar novas modalidades de sanção para o tipo penal previsto em seu artigo 28, inexistindo impedimento legal a que penas restritivas de direito sejam a única sanção cominada ao tipo penal. Conduta, por sinal, lesiva, por extrapolar a esfera da discricionariedade do indivíduo em causar dano próprio para atingir o coletivo. 3. princípio da insignificância afastado. A insignificância não está na quantidade da substância apreendida, mas na qualidade desta e na circunstância de perigo decorrente do fato. 4. a confissão espontânea sempre é causa atenuante da pena, a ser considerada na segunda fase de sua aplicação, autorizada, segundo entendimento da turma recursal, sua compensação com a agravante da reincidência. 5. impossibilidade de substituição da pena de prestação de serviços à comunidade por advertência como a mais branda das medidas previstas na legislação de regência, essa pena, que visa a incentivar o despertamento de uma consciência que desestimule a continuidade do uso de drogas, deve ser reservada àquele que não apresente envolvimento anterior nessa área, e não ao reincidente específico, como no caso. RECURSO PROVIDO EM PARTE. (Recurso Crime Nº 71003642618, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Edson Jorge Cechet, Julgado em 07/05/2012).

Outro julgado que defende a constitucionalidade do dispositivo:

TJMG: APELAÇAO Nº nº 1.0223.05.167245-7/001

Rel. Des. Vieira de Brito.

Julgado em 09/10/2007.

APELAÇAO - CRIME DE USO - ABSOLVIÇAO - NAO-CABIMENTO - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÃNCIA - INAPLICABILIDADE - APLICAÇAO DA NOVEL LEI MAIS BENÉFICA - ADMISSIBILIDADE - ISENÇAO DAS CUSTAS - POSSIBILIDADE. Não há que se falar em absolvição na hipótese se o conjunto probatório é firme e consistente em apontar a participação dos apelantes no crime narrado na denúncia, emergindo clara a responsabilidade penal de todos à vista da prova trazida aos autos. A pequena quantidade de droga não implica a aplicação do princípio da bagatela, mormente em razão de se tratar de delito que coloca em risco potencial a saúde pública e a sociedade. Condenado por crime de uso de tóxicos, nos termos do art.16 da Lei 6.368/76, deve-se aplicar a regra dos §§ 3º e 5º, do art. 28 da nova Lei Antitóxicos, por consistir lei penal mais benéfica. Em razão da Lei 14.939/03, no Estado de Minas Gerais, os assistidos pela Defensoria Pública fazem jus à isenção das custas processuais, nos termos do art. 10, inciso II, da aludida lei." (TJMG – Ap. 1.0223.05.167245-7/001(1) – Rel. Des. Vieira de Brito – j. 09-10-07).

Por outro lado, alegando a inconstitucionalidade do artigo, afirmam as seguintes decisões:

JUIZADO ESPECIAL DE CAMPINAS-SP

PROCESSO Nº 2564/2013.

JOSÉ HENRIQUE RODRIGUES TORRES JUIZ DE DIREITO.

SENTENÇA PROFERIDA 15/04/2014.

PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL – ATIPICIDADE – INCONSTITUCIONALIDADE DO ART.28 DA LEI 11343/2006 – JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DE CAMPINAS

O porte de drogas para consumo pessoal não é crime.  Trata-se de conduta atípica. É que o artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 é inconstitucional. A criminalização primária do porte de entorpecentes para uso pessoal é inconstitucional, porque (1) não descreve conduta hábil para produzir lesão que invada os limites da alteridade, o que implica afronta ao princípio constitucional da lesividade, (2) viola os princípios constitucionais da igualdade, inviolabilidade da intimidade e vida privada, pro homine e respeito à diferença, corolários do princípio da dignidade humana, albergados pela Constituição Federal e por tratados e convenções internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil, e (3) contraria os princípios constitucionais da subsidiariedade, idoneidade e racionalidade, que, no âmbito da criminalização primária das condutas, devem ser observados em um Estado de Direito Democrático.

Ainda:

JUÍZO DA COMARCA DE CONCEIÇAO DO COITÉ - BAHIA

Bel. Gerivaldo Alves Neiva Juiz de Direito.

Sentença proferida em 17/05/2012.

POSSE DE DROGAS PARA USO PESSOAL - ATIPICIDADE - INCONSTITUCIONALIDADE DO ART.28 DA LEI 11343/06 – COMARCA DE CONCEIÇAO DO COITÉ-BA.

Tráfico de maconha. Desclassificação para uso próprio pelo Ministério Público após a instrução. Inexistência de crime. Comprar e portar maconha para uso próprio não configura crime. Inexistência de tipicidade e inconstitucionalidade do artigo 28, da Lei n° 11.343/06. Matéria em Repercussão Geral do STF. Só pode ser punido pelo tráfico quem o pratica. A Constituição Federal não pode ser ferida pela "guerra às drogas". Absolvição do acusado. [...] A vontade e supremacia da Constituição devem permanecer como o norte e o esteio do ordenamento jurídico. Neste dilema – combate ao tráfico e respeito à Constituição – é papel de todos que lidam com o Direito buscarem soluções diferentes da simples condenação e encarceramento de milhares de jovens que muitas vezes vendem pequenas quantidades para manter a própria dependência ou que se tornam traficantes de verdade por falta de alternativas e oportunidades sociais. [...].

Interessante ainda, observar as recentes decisões de nossos juízes catarinenses, em especial, Juiz Maurício Fabiano Mortari (Autos n° 0004223-97.2015.8.24.0075) da comarca de Tubarão/SC, e do Juiz Alexandre Morais da Rosa (Autos n. 0000010-03.2015.8.24.0090), da 4ªVara Criminal de Florianópolis/SC.

Ambos protestam pela inconstitucionalidade do art.28 da lei de drogas. Mortari (fls.35-48 dos autos), afirma que:

o primeiro aspecto que deve ser abordado diz respeito à ausência de lesividade a direito de terceiros, não sendo possível para justificar a criminalização da conduta de portar entorpecentes adotar o discurso cômodo e simplista da lesão à "saúde pública" ou mesmo que se trata de um delito de perigo abstrato [...]. Isso porque a saúde pública não deve ser protegida pelo direito penal, pois antes de mais nada, deve ser promovida e estendida a todos os cidadãos por políticas públicas adequadas, inclusive no que se refere aos usuários de drogas que queiram ser tratados, sendo inviável pensar que toda a coletividade é atingida diante de uma pretensa potencialidade ofensiva da conduta de portar drogas para uso pessoal. [...] Na exata lição de Claus Roxin, a descriminalização é possível em dois sentidos: primeiramente pode ocorrer uma eliminação definitiva de dispositivos penais que não sejam necessários para a manutenção da paz social. Comportamentos que somente infrinjam a moral, a religial ou a political correctedness, ou que levem a não mais que a uma autopericlitação, não devem ser punidos num Estado social de direito. Pois o impedimento de tais condutas não pertence às tarefas do direito penal, ao qual somente incumbe impedir danos a terceiros e garantir condições de coexistência social. [...] Portanto, não se verificando na hipótese vertente a existência de uma conduta típica, evidente a impossibilidade de recebimento da denúncia por falta de justa causa. [...] Ante o exposto, REJEITO A DENÚNCIA oferecida contra Oswaldo Ãngelo de Quadra Neto, com base no art. 395, III, do Código de Processo Penal, declarando a nulidade parcial sem redução do texto do art. 28 da Lei n. 11.343/06. (Grifo nosso).

Rosa (2015), por sua vez afirma que:

não obstante a existência de manifestações no sentido oposto, entendo que a conduta abstratamente prevista no art. 28 da Lei de Drogas não consubstancia crime. Primeiro, porque, como expressa e taxativamente define a Lei de Introdução ao Código Penal, em seu art. 1º, "considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa". Adotando-se, portanto, a conceituação formal de crime, verifica-se desde logo que a conduta do art. 28 do Código Penal não pode ser tida como tal, porquanto as sanções nele previstas não correspondem ao que dispõe a lei. Mas, para além disso, sob uma pespectiva material, a conduta criminosa pode ser caracterizada como aquela que ofende os bens jurídicos mais caros e indispensáveis à manutenção do convívio social. Na conduta prevista no art. 28 da Lei de Drogas, não se pode observar qualquer tipo de ofensividade social, sendo o único dano dela decorrente provocado ao próprio usuário – fato que não é objeto do Direito Penal. Destarte, diante dos princípios da lesividade e fragmentariedade, há que se reconhecer a conduta em questão como um indiferente penal. [...] Por todo exposto REJEITO a denúncia de fls. 33-36, com fundamento no art. 395, inc. III, declarando a nulidade parcial sem redução do texto do art. 28 da Lei n. 11.343/06, do Código de Processo Penal. (Grifo nosso).

Para o STF, são quatro os critérios a serem analisados para poder decretar o princípio da insignificância. São eles: a ofensividade mínima da conduta, a presença de nenhuma periculosidade na ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, e a inexpressividade da lesão jurídica.

Podemos observar de plano que a conduta descrita no artigo 28 da lei de drogas de fato é uma conduta minimamente ofensiva, pois ofende (lesa) apenas o próprio usuário; não há periculosidade na ação, pois não há violência empregada; há um reduzido grau de reprovabilidade, e verifica-se isso mais claramente com a manifestação de constitucionalidade, e um direito a manifestação pela marcha da maconha, declarado constitucional pelo STF (ADPF 187) em várias manifestações pelo Brasil afora, além do debate presidencial pela descriminalização das drogas, pauta no último pleito eleitoral de 2014.

Por fim, inexpressividade da lesão jurídica, pois a lesão produzida é referente ao próprio usuário, e afronta princípios como a lesividade criminalizar conduta que não ultrapassa a esfera do indivíduo. Além do mais, o bem jurídico saúde pública não é colocado em risco de modo a necessitar a proteção penal para resolução do conflito, afrontando a subsidiariedade.

Deste modo, verifica-se que o artigo 28 da Lei de Drogas preenche todos os requisitos para configuração do Princípio da Insignificância, e seu acolhimento leva a atipicidade material do fato, deixando de subsistir crime.

Gomes (2007, p.156) afirma que é aplicável sim o princípio da insignificância ao delito do artigo 28. Segundo ele:

Quando se trata de posse ínfima de droga, o correto não é fazer incidir qualquer uma dessas sanções alternativas, sim, o princípio da insignificância, que é causa de exclusão da tipicidade material do fato. Há duas modalidades de infração bagatelar própria: a primeira reside da insignificância da conduta e a segunda na do resultado. A posse de droga para consumo pessoal configura uma das modalidades de delito de posse (...) não existe nesse caso, conduta penalmente ou punitivamente relevante.

Após explanação referente ao usuário de drogas, passaremos então a analisar o tráfico e as disposições controvertidas relativas ao crime descrito no artigo 33 da lei 11.343/06.

3.3 QUESTÕES CONTROVERSAS DO TRÁFICO DE ENTORPECENTES.

O tráfico de drogas é considerado crime equiparado a hediondo e a Constituição Federal vedou aos crimes hediondos e equiparados, a anistia, graça e a fiança. Diz a CF em seu artigo 5º XLIII:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. (BRASIL, 1988)

A lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos) definiu, em seu artigo 2º, a insuscetibilidade de anistia, graça, indulto e fiança aos crimes hediondos e equiparados. A questão polêmica trata-se da vedação do indulto, já que a Constituição não o proibiu. Logo, a lei teria ido além das disposições constitucionais, indo, portanto, além do mandado expresso de criminalização constitucional, tratando-se assim, de uma inconstitucionalidade tal proibição.

O STF entendeu ser constitucional a vedação do indulto, pois o termo graça, a CF o fez em sentido amplo, logo, indulto seria uma espécie de graça. Assim, temos graça em sentido amplo, que se subdivide em graça em sentido estrito, que tem alcance individual, e indulto, que tem alcance coletivo. É o que diz o informativo 486 do STF.

Outro ponto discutido, diz respeito à fiança. A proibição da fiança não implica necessariamente em proibição de liberdade provisória, pois, cautelares diversas da prisão (artigo 319 CPP) podem ser aplicados, apenas excluindo o inciso VIII (fiança).

Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:

I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para in formar e justificar atividades;

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;

IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;

VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX - monitoração eletrônica. (BRASIL, 1941)

Porém, o artigo 44 da lei 11.343 veda a fiança e qualquer forma de liberdade provisória.

Art. 44: Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos. (BRASIL, 2006, grifo nosso)

Maciel (2011) afirma que o STF declarou ser inconstitucional tal dispositivo, por violar a individualização da pena. Foi o HC 104339, onde o relator do caso, ministro Gilmar Mendes, afirmou em seu voto que a regra prevista na lei é incompatível com o princípio constitucional da presunção de inocência e do devido processo legal, dentre outros princípios.

O ministro afirmou ainda que, ao afastar a concessão de liberdade provisória de forma genérica, a norma retira do juiz competente a oportunidade de, no caso concreto, analisar os pressupostos da necessidade do cárcere cautelar em inequívoca antecipação de pena, indo de encontro a diversos dispositivos constitucionais.

De acordo com o ministro Dias Toffoli, a impossibilidade de pagar fiança em determinado caso não impede a concessão de liberdade provisória, pois são coisas diferentes. Segundo ele, a Constituição não vedou a liberdade provisória e sim a fiança.

Quanto à possibilidade de pena restritiva de direitos, o artigo 44 da referida lei é enfático ao afirmar a não possibilidade de aplicação de PRD. Maciel (2011), afirma que tal dispositivo também foi declarado inconstitucional pelo STF, por meio do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE 663261) e do HC 97256.

No julgamento do referido HC, em setembro de 2010, por seis votos a quatro, os ministros decidiram que são inconstitucionais dispositivos da Lei 11.343/2006 que proíbem expressamente a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos (também conhecida como pena alternativa) para condenados por tráfico de drogas.

O Plenário concluiu pela inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos", constante do artigo 33, parágrafo 4º, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do artigo 44, ambos da Lei 11.343/2006. Entenderam, pois, que tal proibição afronta o princípio da individualização da pena.

O mais estranho é que, se por um lado já foi declarada inconstitucional a conversão de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, por outro lado, a vedação do sursis até presente momento continua a pleno vigor. Isso talvez se deve ao fato de o pleno ainda não ter analisado tal argumento, mas é de esperar que venha a ser declarado também inconstitucional, pois, não há como admitir que um traficante condenado a uma pena de até quatro anos possa ser beneficiado por pena restritiva de direitos, e um traficante condenado a uma pena de até dois anos não possa ser beneficiado pelo sursis, por exemplo.

Tal fato tornar-se-ia ainda mais desproporcional, pois, aos crimes hediondos, já houve declaração de inconstitucionalidade da proibição do sursis, de modo que espera-se que o pleno do STF, ao analisar tal questão, seguirá no mesmo sentido, declarando inconstitucional a proibição do sursis também ao tráfico de entorpecentes.

Segundo Vaz (2013), o STF analisou da seguinte forma, em sua evolução jurisprudencial, sobre a (im)possibilidade da substituição e do sursis:

1ª posição (composição do STF de 1990): Nenhuma das duas possibilidades seria cabível. Não caberia nem restritiva de direitos nem sursis, justamente porque o art. 2º, § 1º da Lei 8072/90 impunha o cumprimento da pena privativa de liberdade, impossibilitando, assim, a sua substituição por restritivas ou a suspensão condicional da sua execução. Tratava-se de uma proibição implícita, caso, por exemplo, de tentativa de estupro poderíamos verificar uma pena de até 2 (dois) anos.

2ª posição (entendimento atual do STF): Entende-se que hoje cabe, para os crimes hediondos e assemelhados, a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e sursis. Isso, porque o Supremo entendeu que, ao se falar em regime, está se falando justamente do cumprimento da pena privativa de liberdade, e, o sursis e as penas restritivas de direito, são questões anteriores, prejudiciais a pena privativa de liberdade. Dessa forma, por se tratar de questões antecedentes (o sursis e a substituição por penas restritivas de direito), não se fala em pena privativa de liberdade e, portanto, em regime.

Por fim, o crime de associação criminosa do Código Penal (art.288 CP) exige três ou mais pessoas, para o fim de cometer crimes, com pena de reclusão de um a três anos. Observa-se, desde logo, que, ao mencionar apenas crimes, esta não abrange contravenção penal.

Já nos crimes de organização criminosa (lei 12850/13), exige-se associação de quatro ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com fim de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante prática de infrações penais com penas superiores de 4 anos, ou que seja de caráter transnacional, com pena de três a oito anos de reclusão. É o que diz logo em seu artigo 1º e 2º.

Vemos que o crime de organização criminosa exige quatro ou mais pessoas com funções claras a cada participante, com fim de obter vantagens e com penas acima de quatro anos. Além disso, abrange tanto crime quanto contravenção penal, pois estas são espécies de infrações penais.

Agora, para o crime de associação criminosa no delito de tráfico de drogas, é diferente tal disposição. Diz o artigo 35 da lei 11343/06:

art 35: Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e §1º e 34 desta lei. Pena: reclusão de três a dez anos, e pagamento de 700 a 1200 dias multa. (BRASIL, 2006)

Vemos que as penas são maiores ao delito de associação criminosa em tráfico de drogas, além de exigir apenas duas ou mais pessoas. Também merece destaque o fato de a lei mencionar reiteração ou não. Como se vê, houve um recrudescimento em relação à organização criminosa em tráfico de entorpecentes.

Filho (2009, p.178), diz que não há definição na forma ou modo de ser da quadrilha ou bando, mas a ideia é a que se trata da reunião de pessoas que se ajustam para a prática de crimes, em futuro concurso ou não.

Por fim, em relação à questão da proporcionalidade, podemos perceber que existe um ataque direto a tal princípio, pois, no art.33, ao dizer "fornecer ainda que gratuitamente ou entregar a consumo" mostra-se desproporcional a pena em relação a quem vende, exporta, importa etc. Há um tratamento igual para o traficante contumaz, que faz disso sua profissão, e ao que comete um tráfico casual, ocasionando um tratamento igual a uma situação totalmente desigual.

Temos, como exemplo, o caso de uma mãe que vai a boca de fumo comprar droga para um filho viciado a fim de controlar o consumo deste. Se pega pela polícia, responderá esta mãe como traficante, ainda que contrariando o senso comum do que seria tráfico, com todos os rigores da lei penal, inclusive em relação a crimes hediondos por este ser equiparado.

Carvalho (2010, p.208) discorrendo sobre o tema aduz:

o princípio da proporcionalidade se desenvolve a partir da ideia do devido processo legal, estabelecendo controle dos atos abusivos do Poder Legislativo e do Poder Executivo. Segundo Paulo Bonavides há violação do princípio da proporcionalidade, com ocorrência de arbítrio, toda vez que meios destinados a realizar um fim não são por si mesmos apropriados e ou quando a desproporção entre os meios e fim é particularmente evidente, manifesta.

É, portanto, para Carvalho (2010), a proporcionalidade a intersecção entre dois princípios clássicos: o da proporcionalidade e o da ofensividade, de modo que a ofensa ao bem jurídico deve guardar a devida proporcionalidade com a pena cominada.

Continua Carvalho (2010, p.210) dizendo:

a título de exemplificação [...] alguns interrogantes seriam pertinentes, como, p. ex., se as condutas fornecer ainda que gratuitamente ou entregar a consumo possuem o mesmo grau de lesividade daquelas relativas à exportação, importação ou venda de entorpecentes? Se não seria excessiva punição (quantidade e qualidade de pena) isonômica destas condutas? Se não seria razoável estabelecer tratamento penal, processual e punitivo diferenciado? A inevitável resposta positiva evidencia a ruptura com o princípio constitucional, estabelecendo a necessidade de elaboração de ferramentas doutrinárias e jurisprudenciais corretivas.

Dessa forma, vemos o tratamento desproporcional, e a fúria legislativa em torno da questão das drogas que tem, principalmente, nas questões morais, sua maior fonte de fundamentação.

3.4 ESTUDOS ACERCA DA PROBLEMÁTICA DAS DROGAS NO MUNDO.

No mundo afora, e, principalmente no Brasil, vemos uma verdadeira guerra no combate às drogas, que infelizmente tem dizimado milhares de pessoas, policiais, traficantes, inocentes, além de vermos a prática do tráfico de drogas suceder a prática de vários outros crimes decorrentes dela. Discorrendo sobre o Narcotráfico, Rodrigues (2003, p.11-12) argumenta:

a inquietação causada por essa prática proibida é intensa porque ela é apresentada como um inimigo sem rosto, uma força potente e difusa difícil de ser localizada e que se oculta como um animal ardiloso. O narcotráfico, tornado uma ameaça misteriosa, é amedrontador. Porém, o incômodo alimentado pela existência da economia ilegal das drogas se apoia não apenas na dificuldade de identificá-la ou no medo gerado por sua violência; ela transtorna porque negocia mercadorias consideradas insuportáveis por boa parte das pessoas. Os produtos comercializados por esses homens de negócios são substâncias amplamente desejadas e que hoje são ilegais. Tal ilegalidade significa que o circuito de produção e venda de inúmeros compostos químicos é proibido de existir segundo as leis específicas. Essas leis, no entanto, não bastam para erradicar a procura por tais substâncias, fato que impulsiona um rentável negócio clandestino que se dedica a fazer chegar ao consumidor sua droga preferida. A proibição das drogas e o mercado subterrâneo por ela inaugurado produzem uma situação de guerra constante dentro dos países que banem o uso de psicoativos e também no plano internacional. (Grifo nosso).

Assim, a violência que decorre da guerra ao tráfico, está muito mais relacionada ao fato de ser ilegal o comércio de tais entorpecentes, que propriamente pela droga em si. É o que afirma Zaffaroni (2013), informando que só no México mais de 50 mil pessoas morreram na última década não em decorrência do mal das drogas, mas da proibição.

Infelizmente, é utopia acreditar que eliminando traficantes estaremos livres do consumo das drogas. É a velha lei do mercado: onde há demanda sempre haverá oferta. E, pior, quanto mais se endurece as leis penais em relação ao comércio de entorpecentes, mais lucrativo e atentador se torna tal atividade.

Silva (2015) informa que, segundo dados divulgados pelo Relatório Mundial sobre Drogas da ONU , que em 2014, cerca de 5% da população mundial entre 15 e 64 anos usa drogas ilícitas, o que corresponde a uma média de 243 milhões de pessoas. É um número e tanto, mas não é o único dado superlativo nessa história.

Estima-se hoje que, 40% dos nove milhões de presos em todo o mundo, estejam na cadeia em razão das drogas, e isso tudo tem um custo altíssimo. Segundo Silva (2015), para a London School of Economics, essa guerra já custou ao mundo mais de 1 trilhão de dólares e criou um imenso mercado negro, avaliado em aproximadamente US$300 bilhões, um mercado negro cada vez mais fortalecido por organizações criminosas que, ao contrário do que pode parecer, não estão nem um pouco interessados nessa história de descriminalização.

Ainda Silva (2015), informa que quando Richard Nixon, então presidente dos EUA declarou "guerra às drogas" na década de 70, o então maior ideólogo liberal americano Milton Friedman, apoiador de Nixon, levantou-se contra tal política, e tomou a história como exemplo.

Lembrou Friedman que, na década de 1920, por força do puritanismo americano que há muito vinha fazendo lobby pela criminalização de qualquer entorpecente e até mesmo o álcool, foi decretado à lei seca, tornando ilegal o comércio de álcool.

Com isso, a máfia do álcool surgiu, e um grande nome desse período foi Al Capone, além de outros traficantes de álcool que serviram até mesmo de fonte de inspiração para filmes, como "O poderoso Chefão". Ou seja, a criminalização só trouxe prejuízos e nada de solucionar o problema, tanto, que pouco mais de uma década depois o governo americano se viu obrigado a legalizar novamente o álcool.

A criminalização do álcool nada mais serviu que para constituir traficantes poderosos, que controlavam este comércio ilegal e acabavam por criar inúmeros crimes conexos pela atividade ilícita, além de cada vez mais tornarem as substâncias vendidas mais fortes, pois, na ilegalidade, não havia qualquer controle da produção e venda, algo muito semelhante ao que vivemos com a criminalização das drogas ilícitas atualmente no Brasil.

A respeito da lei seca, vemos no Wikipédia (2015) que esta entrou em vigor em 1920, com o objetivo de salvar o país de problemas relacionados à pobreza e violência. A Constituição americana estabeleceu na 18ª emenda, a proibição, a fabricação, o comércio, o transporte, a exportação e a importação de bebidas alcoólicas. Essa lei vigorou por 13 anos.

O efeito causado pela lei foi totalmente contrário do que era esperado, ao invés de acabar com o consumo de álcool, com os problemas sociais, entre outros, a lei gerou a desmoralização das autoridades, o aumento da corrupção, explosões da criminalidade em diversos estados e o enriquecimento das máfias que dominavam o contrabando de bebidas alcoólicas. O ponto de encontro das pessoas que queriam beber eram bares clandestinos, localizados no subterrâneo com o objetivo de não chamar atenção.

Argumentando que a legalização das bebidas geraria mais empregos, elevaria a economia e aumentaria a arrecadação de impostos, os opositores do então presidente norte-americano Franklin Roosevelt, o convenceram a pedir ao Congresso que legalizasse a cerveja. Com isso, em 1933 é revogada a emenda constitucional da lei seca.

Já Araújo (2007, p.64) afirma que:

colocar as drogas na ilegalidade foi a solução sistematicamente adotada no século 20, em todas partes do globo. Infelizmente, a lei não controlou o consumo – e há quem defenda que ela aumentou. De quebra, nos jogou numa guerra contra traficantes, que por sua vez estão em guerra contra todos nós. O dano que o vício dos outros causa em nós nasce quase completamente do fato de as drogas serem ilegais, escreveu em 1972 o americano Milton Friedman.

O uso de substâncias tóxicas é tão antigo quanto à humanidade, e sempre fez parte do cotidiano das sociedades. Bucher (apud SOUZA e BERSAN 2013), psicanalista, doutor em Psicologia pela Universidade Católica de Lovaina, Bélgica, enfatiza que:

em todas as sociedades sempre existiram drogas, utilizadas com fins religiosos ou culturais, curativos, relaxantes ou simplesmente prazerosos. Graças às suas propriedades farmacológicas, certas substâncias naturais propiciam modificações das sensações do humor e das percepções. Na verdade, o homem desde sempre tenta modificar suas percepções e sensações, bem como a relação consigo mesmo e com seus meios naturais e sociais. Recorrer a drogas psicoativas representa uma das inúmeras maneiras de atingir este objetivo, presente na história de todos os povos, no mundo inteiro. Antigamente, tais usos eram determinados pelos costumes e hábitos sociais, e ajudaram a integrar pessoas na comunidade, através de cerimônias coletivas, rituais e festas. Nessas circunstâncias consumir drogas não representava perigo para a comunidade, pois estava sob o seu controle. Posteriormente, as drogas passaram a ter outra conotação, devido ao desregulamento destes costumes, em consequências das grandes mudanças sociais e econômicas.

E foi justamente por motivação religiosa que o modelo proibicionista foi imposto nos EUA, porém, sua eficácia foi considerada fracassada, conforme observa Araújo (2007, p.64):

a primeira política moderna para colocar entorpecentes na ilegalidade nasceu nos EUA, em 1914, com o Ato de Narcóticos. Era uma reação aos crescentes problemas de dependência e overdose de ópio e cocaína, uma novidade num país tão religioso. Em 1918, o governo criou uma comissão para avaliar os efeitos da legislação. O grupo concluiu que: 1) um mercado negro havia surgido para atender à procura pelas drogas; 2) esse mercado estava organizado nacionalmente para importar e distribuir o contrabando; e 3) o uso do ópio aumentara significativamente. Diante das evidências, de que a proibição beirava o fracasso, o governo americano não teve dúvidas: aumentou mais ainda as restrições, passando de 5 para 10 anos a pena máxima por crimes relacionados às drogas – na década de 1950 esse limite chegaria a pena de morte.

Dessa forma, o modelo proibicionista serviu apenas para através da repressão aumentar o preço, que valoriza o tráfico, que por sua vez estimula o consumo, que aumenta a repressão, num círculo vicioso negativo de consequências catastróficas para todos. Em 1961 houve um pacto global contra as drogas assinado pela ONU, sob influência Americana.

Resultado foi que no início daquela década, todos os países comprometeram-se a combater às drogas, e terminando com soldados americanos fumando maconha na Guerra contra o Vietnã, e hippies se entupindo de LSD mundo afora. É neste contexto, segundo Souza e Bersan (2013), que Richard Nixon declara guerra às drogas, com sua política de tolerância zero. Resultado desse aumento de repressão foi fazer a cocaína, que andava sumida, retomar sua carreira de sucesso nos EUA e espalhando-se pelo mundo afora.

O mais estranho, é que com toda essa proibição e endurecimento às drogas, de acordo com Araújo (2007, p.65), a população carcerária pulou de 50 mil para 500 mil em 30 anos, enquanto que os EUA, maior proibicionista, chegou ao 1º lugar no rancking de consumidores. Ou seja, todo esse endurecimento repressivo apenas serviu para atrair mais consumidores, resultado completamente antagônico ao almejado.

Porém, paradoxalmente, a Suécia, na década de 70, respondeu o alto consumo de drogas com repressão e leis penais. E o resultado foi satisfatório. Percebemos então, que nos EUA proibir só aumentou o consumo, e na Suécia o resultado foi o almejado: diminuí-lo. Umas das possíveis respostas para tal sucesso, pode ser a justa distribuição da renda, que, quando mal distribuída, anda de mãos dadas com o tráfico, aliado a falta de sentimento de injustiça social, com taxa de desemprego baixíssima e uma escolaridade com altíssimo grau que pode, com sucesso, campanhas de prevenção ao uso surtir o efeito desejado.

Já nos EUA, o objetivo inicial de fins do século XIX, era atingir justamente as drogas oriundas de estrangeiros que disputavam espaço no país e "ameaçavam" os costumes puritanos americanos. Para Rodrigues (2003, p.31), "os chineses trouxeram o hábito de fumar ópio, [...] os mexicanos eram associados à maconha, e por isso vistos como indolentes, preguiçosos e agressivos, e os negros [...] atribuía-se a cocaína, e por fim, o álcool, era atribuído aos irlandeses".

Logo, a proibição visava de alguma forma, dar meios para o Estado intervir no estilo de vida dessas minorias, que eram mal vistas pelos americanos de origem protestante, anglo-saxônica, que os viam como entidades exógenas e de hábitos perigosos, que traziam "venenos" e disputavam empregos com estes que já estavam ali a gerações. Era o direito penal tutelando escancaradamente a moral.

Logo, havia uma clientela definida para ser estigmatizada e, através do tráfico ou consumo de tais substâncias, possibilitar uma intervenção estatal para puni-los por seus hábitos. Importante lembrar, que neste período, o preconceito americano a outras culturas chegou a níveis estratosféricos, que propiciou o surgimento de grupos que pregavam o preconceito e o ódio de forma aberta como era a Ku Klux Klan, grupo extremamente xenofóbico e racista, além de outros.

Portanto, a proibição às drogas, tem como fundamento também o preconceito a culturas diversas das tradicionais americana. Na mesma década de 70, assim como a Suécia, na Holanda também houve um aumento do consumo de drogas, porém por lá, a resposta ao problema foi completamente diversa, tendo em vista algumas peculiaridades.

Na Holanda, a maioria dos jovens consumidores de heroína ia até o traficante em busca de maconha e acabavam levando heroína. Portanto, pensou-se em quebrar este elo maconha-heroína, liberando a primeira considerada menos nociva em detrimento da segunda, considerada um risco social. Desta forma, surgiram os chamados Koffeshops, estabelecimentos onde o usuário podia escolher variedades da erva no cardápio.

O resultado foi a diminuição do consumo de heroína, alvo desejado pelo governo, o que faz refletir que a maconha serve de porta de entrada para outras drogas, mas não por questões intrínsecas a ela, mas por conta da proibição, que leva o traficante a oferecer e estimular o consumo de outras drogas mais pesadas.

Carneiro (2011) afirma que:

uma política realmente democrática em relação às drogas psicoativas seria aquela que legalizasse todas, submetendo-as a um mesmo regime, não importa se remédios sintéticos ou derivados de plantas tradicionais. Ao mesmo tempo, tal política deveria ampliar a severidade dos controles, distintos para cada substância. Toda publicidade em veículos de mídia destinados ao público em geral deveria ser proibida. A fiscalização e punição para consumos irresponsáveis – ao volante, por exemplo – de álcool ou outras drogas, deveria ser rígida. Outra medida necessária seria a estatização da grande produção e do grande comércio. Ela evitaria que corporações gananciosas dominassem o mercado e garantiria que todos os lucros desse comércio fossem direcionados para fins sociais – inclusive para programas de desabituação para os consumidores problemáticos que necessitassem. Além de uma política em favor dos genéricos e da quebra das patentes farmacêuticas, o Estado deveria garantir a fabricação de todos os fármacos indispensáveis, oferecendo-os ao menor preço possível e aplicando os lucros obtidos no interesse social. Um amplo programa de pesquisa, com financiamento e destinação pública, poderia assim estimular também o desenvolvimento de novos fármacos. Legalização e controle público afastariam crime organizado e criariam fundo público para financiar Saúde – inclusive atendimento aos dependentes. A legalização da maconha, da cocaína e de todas as drogas, sob controle estatal do grande atacado e produção afastaria o atrativo para o crime organizado, permitiria maior monitoramento dos usos problemáticos e encaminhamento dos necessitados a tratamentos. Financiados pela própria renda gerada na venda legal, seriam oferecidos no serviço público de saúde. Por que não criar-se um Fundo Social – resultado não apenas de impostos, mas do controle econômico estatal da grande produção e circulação de drogas, remédios, bebidas e cigarros? O conjunto do faturamento obtido poderia servir para custear o orçamento de Saúde Pública. O conjunto das drogas legalizadas acabaria com os efeitos nefastos do chamado "narcotráfico", encerraria a "guerra contra as drogas", libertaria os prisioneiros dessa guerra: em torno de metade da população carcerária tanto nos EUA como no Brasil. Seria interrompido o crescimento vertiginoso do encarceramento por drogas, principal fonte de lucros para o sistema penal privado norte-americano e mecanismo de repressão social e racial contra os pobres e os afrodescendentes no Brasil. Reduziriam-se os danos sociais dos usos problemáticos de drogas. Seriam potencializados os usos positivos, tanto terapêuticos como recreacionais.

Afirma ainda Carneiro (2014) que:

a indústria farmacêutica movimenta 700 bilhões de dólares por ano, a indústria das drogas ilícitas movimenta 400 bilhões. Isso se deve ao preço da proibição o alto custo das drogas ilícitas. Foi o que ocorreu na lei seca dos EUA com a proibição do álcool de 1919 a 1933. A máfia do álcool fez descriminalizar e legalizar novamente a venda de álcool nos EUA. O próprio EUA legalizou o uso das drogas completamente em dois Estados e em 21 legalizou apenas para uso medicinal. Em colorado – EUA vigora o modelo privado de legalização das drogas, onde o comerciante precisa ter 3 milhões de dólares de capital inicial para iniciar os negócios. No Brasil, a maior empresa é a AMBEV e 3 dos maiores bilionários do Brasil 3 são os donos da AMBEV o que mostra que a produção de drogas é um comercio altamente rentável. No Uruguai vigora um modelo diferente dos EUA. Lá o Estado será o principal fornecedor e distribuidor da maconha para garantir os lucros para o Estado. No Colorado os primeiros 40 milhões em arrecadação de impostos são destinados a construções de escolas.

A indústria farmacêutica, já em meados da década de 50, reforçou a pressão proibicionista, com fortalecimento do enfrentamento aos países considerados fontes de matéria prima de drogas como Irã e Turquia. Afirma Rodrigues (2003, p.37) que:

a disputa, em linhas gerais, estava em torno da seguinte questão: Os Estados industrializados (EUA e países da Europa ocidental) exigiam maior rigidez no controle de opiáceos, maconha e cocaína e pouca regulação para os psicoativos sintéticos (barbitúricos e anfetaminas) produzidos em suas indústrias farmacêuticas, ao passo que os países menos desenvolvidos, produtores principalmente de ópio bruto e folhas de coca, defendiam sua posição e, em caso de proibição total de psicoativos, a inclusão também das drogas sintéticas na lei internacional.

Portanto, percebemos que a saúde pública sempre serviu como pretexto para a criminalização de determinadas substâncias, e mais, que substâncias oriundas de países menos desenvolvidos sempre foram o alvo das políticas proibicionista, tendo em vista, ou o menosprezo por sua cultura em detrimento da cultura dos países hegemônicos, ou, ainda, o interesse comercial e industrial dos países hegemônicos, além de intervenções policiais nos locais onde se encontram grupos vulneráveis.

Exigir criminalização das drogas que exigem pouca industrialização e pouca regulamentação, além das drogas sintéticas, teve como objetivo, auferir lucro apenas aos países industrializados, ou seja, a saúde pública infelizmente nunca foi o grande objetivo das criminalizações de drogas, seja qual for.

Hoje, percebemos que mantém-se a criminalização, com uma forte carga de endurecimento penal ao traficante, e, quanto ao usuário, houve um abrandamento com o objetivo de encarceramento da pobreza, sempre vista quando em larga escala como algo a ser controlado, se não por via política, por via penal, pois representa risco social. A verdade é que pobres, em sua extensa maioria, são enquadrados como traficantes, pois, pessoas oriundas de famílias mais abastadas conseguem facilmente enquadrar-se como usuário. A prova disto é o que diz o art. 28 §2º da lei 11.343/06:

art.28 §2º: Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente. (BRASIL, 2006, grifo nosso).

Percebemos que, muitas vezes, juízes julgam com base em local, o fato de estar próximo a "boca de fumo", ou ainda, sob argumento de estar condicionada para venda o fato de a droga estar embrulhada, como se o comprador não adquirisse a droga também embrulhada. Porém, o mais interessante é no que diz respeito à conduta, antecedentes e circunstâncias sociais e pessoais.

Nas duas primeiras hipóteses, sob tais argumentos, pode-se classificar os indivíduos, tanto como traficantes quanto usuário, pois, estar próximo à boca de fumo, representaria ou pode representar tráfico ao menos favorecido que, estando neste local, só poderia ser para fins de venda, e usuário para os mais favorecidos, que somente frequentam tais locais para comprar, pois não pertence ao seu convívio natural viver naquelas localidades, e o fato de estar embrulhado seria fins de venda ao pobre, enquanto a droga estando embrulhada no poder do rico seria prova que ele comprou.

Agora, a terceira hipótese é ainda mais alarmante a disparidade, pois, circunstâncias sociais, representam em verdade, que para o rico a quantidade muitas das vezes significa "estoque", pois tem dinheiro para comprar o suficiente para não necessitar ir à boca a todo o momento. Já para o pobre, por ser despossuído, determinada quantidade ainda que amplamente menor, representaria, ou pode representar, entretanto, tráfico.

Logo, percebemos claramente que mais de 50% do encarceramento no Brasil está em crimes relacionados às drogas. É justamente a quantidade de demanda judicial a crimes relacionados às drogas, que faz "entupir" os gabinetes judiciais de processos.

Com isso, percebe-se que a legalização poderia representar a retirada das prisões de mais da metade dos encarcerados, e mais, desafogaria o judiciário para resolver de fato as demandas necessárias e úteis dentro da razoabilidade de prazos, além do que, a criminalização, apenas serve para sobrecarregar o sistema estatal de atuação, deixando, portanto, margem enorme de pessoas que cometem inúmeros delitos na impunidade, o que gera cifra negra e estimula a prática delituosa.

Ainda, a incapacidade do sistema estatal se mostra com a quantidade de mandados de prisão em aberto que no Brasil, que, segundo Struck (2013), chegou à cifra de 200.00 (duzentos mil) no ano de 2013 e, segundo portal G1-SC (2015), o número de mandados de prisão em aberto somente no litoral catarinense é de 11.783 (onze mil setecentos e oitenta e três) no ano de 2015, demonstrando, portanto, a enorme cifra negra criada justamente tendo a imensa maioria dos crimes relacionados à droga.

Percebemos que, a única explicação para o aumento cada vez maior do número de usuários de drogas, apesar do proibicionismo, se justifica pela falta de adequação social. Princípio este que pugna pela adequação do fato delituoso como aceite pela sociedade. Assim, é fácil e tranquilo perceber que quando ocorre um homicídio, o próprio agente delituoso bem como a sociedade sabe que o fato merece punição. Quando ocorre um roubo, tanto o agente quanto a sociedade sabem que o fato merece reprimenda, e na maioria dos delitos são assim. Obviamente o delinquente tentará ficar impune, porém, em seu íntimo, ele sabe que praticou um ilícito.

O fato é que, no delito de drogas, as coisas não funcionam bem assim. O usuário não consegue visualizar que mal ele faz a outrem no momento que ele decide, recreativamente, fazer uso de determinada substância entorpecente. Para piorar, esse sentimento enrijece quando o mesmo percebe que outras substâncias entorpecentes, que fazem tão mal quanto, ou ainda, fazem mal maior, são permitidas por critérios nada esclarecidos. Isso alimenta o sentimento que ele não faz mal a ninguém, além de si próprio ao decidir fazer uso de algum tipo de droga, o que fomenta o mercado consumidor a se manter em alta, mesmo após mais de cem anos de proibicionismo pelo mundo afora.

Neste sentido, demonstrando o fracasso da política proibicionista em relação aos delitos de drogas, Varella (2011) afirma:

é ilusão imaginarmos que a polícia vencerá a guerra contra o tráfico. Basta olharmos para os americanos que investem US$ 10 bilhões anuais para manter o mais organizado aparato policial de repressão que se tem notícia: são os maiores consumidores de drogas ilícitas do mundo. Na década de 1960, cerca de 100 mil americanos fumavam maconha regularmente; em dezembro de 2003, havia 14 milhões de usuários habituais e 70 milhões de usuários ocasionais. As razões para o fracasso da estratégia repressiva são múltiplas e fáceis de entender. Vejamos algumas delas: [...] Para o sucesso comercial de determinado produto, o custo do transporte é crucial. Plantar tomates no norte de Mato Grosso para vendê-los nas feiras livres de São Paulo levaria o produtor à falência. Quando a mercadoria é uma droga ilícita, no entanto, o custo do transporte fica desprezível. Senão vejamos: um quilo de cocaína na Colômbia ou na Bolívia custa US$ 2.000. Em São Paulo ou Rio de Janeiro, depois de "batizada" para aumentar o rendimento, essa quantidade de droga poderá render US$ 20 mil. Se um vendedor encomendar 500 quilos e o traficante pedir a absurda quantia de US$ 500 mil para trazê-la dos países vizinhos, que diferença fará? Apesar de o aumento de mil dólares por quilo representar 50% do preço do produto, a margem de lucro continuará estratosférica. Lucros dessa magnitude, numa atividade não sujeita à taxação pela Receita Federal, recolhimento de obrigações trabalhistas e demais impostos que sufocam a produção em nosso país, têm um poder de corrupção irresistível. Não sejamos ingênuos: bocas-de-fumo são pontos de comércio estabelecidos em endereços acessíveis aos usuários. Se eles, e até os cidadãos que não consomem drogas, sabem onde podem ser encontradas, só a polícia treinada para combatê-las é que não tem ideia dos locais em que se situam? Quando os jornais noticiam que apenas na favela da Rocinha o tráfico movimenta 10 milhões de reais por semana, como as autoridades não conseguem identificar os mecanismos financeiros empregados na lavagem de quantias tão astronômicas? Por que razão os traficantes mais poderosos escapam das cadeias pela porta da frente graças a habeas corpus impetrados por advogados de saber jurídico precário? Quantos representantes do povo são eleitos às custas do dinheiro do tráfico? Por razões como essas alguns especialistas sugerem que a única forma eficaz de combater o tráfico seria acabar com a ilegalidade da comercialização. Sem entrar no mérito da discussão técnica, tal sugestão é de pouco valor, porque não existe a menor possibilidade de ser colocada em prática. Primeiro, porque a sociedade não está disposta a assistir ao aumento expressivo do número de consumidores, que certamente ocorreria numa primeira fase. A experiência com a legalização de drogas como o álcool e a nicotina mostra que o número de usuários dependentes passa a ser contado aos milhões. Segundo, porque o Ocidente jamais permitiria. Enquanto os norte-americanos não abandonarem a política de guerra militar contra as drogas como estratégia-mãe para combatê-las, as experiências de trazer o consumo para a legalidade ficarão restritas ao comércio de maconha em países desenvolvidos como a Holanda. O que fazer, então? A lei da oferta e da procura garante sobrevivência perene ao tráfico. [...] Independentemente da necessidade de encontrarmos alternativas mais sensatas para combater o tráfico do que o simples uso da força bruta necessitamos urgentemente multiplicar pelo país o número de centros para tratamento de dependência química e de programas educativos agressivos que ensinem já na escola primária, em casa e através dos meios de comunicação de massa que as drogas psicoativas modificam a arquitetura do cérebro, provocando uma doença neurológica crônica, destruidora, que acaba com os prazeres da vida. (Grifo nosso).

Interessante observar que, o artigo produzido pelo ilustríssimo Doutor Dráuzio Varella é de 2011, anterior à abertura americana de discussão às drogas que datam de 2013 para cá, e, ao contrário do previsto, a legalização inclusive para fins recreativos não acarretou em aumento considerável do consumo.

Defendendo a continuação da política proibicionista, Miranda (2012) afirma que:

não acredito que a descriminalização das drogas contribuirá para a redução do tráfico e da violência. [...] se a droga for liberada haverá o aumento do consumo, do tráfico (a disputas pelos pontos de venda), e também da criminalidade. A descriminalização vai gerar um problema de segurança pública: o aumento da criminalidade e a explosão do sistema público de saúde gerado, causado pelo crescimento da demanda por tratamento. Estamos abordando apenas a ponta do problema. É necessário conscientizar a traumatizar nossas crianças, a partir dos 6/7 anos. Mostrar o perigo das drogas, e ao mesmo tempo alertar pais e educadores para a importância de dialogar melhor com nossas crianças e adolescente sobre o problema. A chave do problema [...] é a diminuição do mercado consumidor, que não será resolvida com a liberação, mas sim com a atuação integrada de todos. Se não agirmos assim, não daremos conta do combate que já estamos enfrentando. As pessoas que defendem a liberação precisam ouvir um pouco mais a realidade dos profissionais da segurança, de saúde e dos familiares e vítimas desse mal.

O que vemos hoje é justamente um movimento contrário por parte dos traficantes em relação à descriminalização ou legalização, pois seu poder está justamente atrelado à proibição. O traficante só existe porque a venda de determinadas drogas é proibida, se fosse permitida e regulamentada, o traficante sequer existiria.

Do mesmo modo como abordado em capítulo anterior, Al Capone somente se tornou um dos maiores traficantes de álcool nos EUA com forte influência, riqueza e poder, justamente porque a venda de álcool era proibida na década de 20. Bastou os EUA voltar atrás, e legalizar novamente a venda de álcool, que tanto Al Capone, quanto todos os outros poderosos traficantes de álcool, sumirem e perderem seu poder e influência.

Outros argumentos favoráveis à manutenção da criminalização vêm da análise crítica de Lima (2014):

os defensores do proibicionismo creem que a criminalização é capaz de aconselhar o individuo a não fazer uso de drogas. Acredita-se que a criminalização, portanto, seja capaz de dificultar a disseminação do vício, promover a reabilitação do dependente e a ressocialização dos envolvidos na trama. Dessa forma, atuaria na contramotivação do uso, através da coação psicológica, na recuperação de dependentes e no combate à proliferação da violência, evitando o cometimento de crimes em razão do uso de drogas. O sistema repressivo atua de forma direta, ao condicionar os consumidores através de sanções, e indireta, ao tentar definir a disponibilidade das drogas, justificando a ação no fato do consumo causar ofensa ao bem jurídico saúde, pois essa conduta propaga a droga e causa danos à coletividade e à saúde de toda a população. Além de tudo, sustenta-se que o consumo de drogas aumenta a violência urbana, pois o usuário este diretamente compreendido com a violência domestica e em crimes patrimoniais, como furtos e roubos, os até mesmo crimes contra a vida para subsidiar do vicio, sendo responsável direto pelo fortalecimento e crescimento do trafico de drogas, afinal se não tivesse tantos usuários o tráfico não seria tão intenso e dominador. Portanto, embora o usuário não pratique a conduta mais grave, é o consumo que sustenta a pratica de crimes mais severos, como a produção e o tráfico de drogas, sendo fundamental sua criminalização para manter o ciclo de atuação estatal fechado, pois este é, ainda, o único dispositivo efetivo que o Estado possui para prevenir a pratica de determinadas condutas nocivas à saúde pública. Logo, a manutenção da criminalização das drogas ilícitas é imune porque o uso além de gerar a dispersão do vício, fomentado, pois, o risco à sociedade, harmoniza a manutenção do narcotráfico e do crime organizado, além de ser fomentador da prática de crimes patrimoniais e domésticos para subsistência do vício, o que acaba por gerar mais violência e criminalidade na sociedade. No entanto, quando o problema do vício é analisado sob o viés da família, da escola, da saúde e da segurança pública, e não apenas sobre a visão do indivíduo, verifica-se verdadeira sensação de pânico e angústia que vivenciam as pessoas, especialmente familiares, que precisam enfrentar sujeitos drogados, que comprometem toda a sua formação e relações familiares, desassossegar a todos que o cercam. Tudo isso que é impossível aceitar alegação que essa conduta não viole ou coloque em risco bens jurídicos de terceiros, pois os efeitos do uso são sentidos por todas as pessoas que coabitar com o consumidor. À vista disso, a dependência química acaba por afetar e ceifar toda a vida do dependente que inicia com o consumo eventual até chegar à dependência e perda total de controle sobre o vicio, acabando por perder o emprego, deixar os estudos e, posteriormente, passa a cometer, primeiramente, pequenos furtos dentro da própria casa. Nos vizinhos, e, quando já não encontra meios para o sustento desses vicio nesses locais, parte para invasão de domicílios, roubos e latrocínios, tudo com o fim de satisfazer o vicio e, consequentemente, alimentando o trafico.

Partes: 1, 2, 3, 4, 5


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