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Ética do discurso e IURD: as estratégias de persuasão para a "conversão" (página 2)


Segundo Torresan (2007), o discurso religioso é foco de vários estudos em diversas áreas do conhecimento, em virtude de sua complexidade, implicações diversas e por causa de sua presença marcante na sociedade, logo, essa pesquisa é relevante cientificamente.

O discurso religioso da IURD está ligado à cultura pluralista da pós-modernidade que possui como características principais, o consumismo e pragmatismo, e a análise desse discurso é importante para se perceber a capacidade humana de adaptar a religião às mudanças da sociedade. E considerando que a prática da manipulação está presente em vários segmentos, inclusive o religioso, identificar as características discursivas, técnicas e estratégias persuasivas de manipulação no discurso é uma necessidade, como meio de preservação da própria liberdade defendida pela ética do discurso. Isto comprova a relevância social da pesquisa.

Sabe-se que as mudanças econômico-sócio-culturais refletem no discurso religioso, e os neopentecostais surgem adaptando os seus discursos a estas mudanças. O resultando é uma competição religiosa e uma diversidade de discursos. Segundo Habermas (1984), estas mudanças discursivas refletem a colonização do mundo da vida pelos sistemas do Estado e da economia. O surgimento de várias igrejas neopentecostais com propostas ideológicas similares fundamentadas na teologia da prosperidade, fez da estratégia discursiva de persuasão um aliado para agregar fiéis e vencer a concorrência através do comércio do sagrado. Logo, as igrejas neopentecostais se estruturam como organizações comerciais para se impor e se expandir no mundo capitalista.

A IURD é uma destas igrejas neopentecostais que também desenvolveu uma ideologia e discurso religioso compatíveis às demandas da pós-modernidade, valorizando o capitalismo e a vida terrena em detrimento a celestial. Assim, tornou-se o maior fenômeno religioso dos últimos anos, ultrapassando rapidamente tanto as igrejas históricas protestantes estabelecidas no Brasil desde o século XIX como as demais denominações neopentecostais. Diante disso, a presente pesquisa se fundamenta na seguinte problemática: o sucesso da IURD é resultado de manipulação no discurso "religioso"? Que evidências fazem deste um discurso persuasivo-manipulador? As estratégias de persuasão da IURD contraria a ética do discurso?

Segundo Fairclough (1992), o procedimento da linguagem pode fazer do discurso religioso, um instrumento de poder para a manipulação. Enfim, a linguagem está sempre presente nas relações sociais, mas nem sempre a intenção no seu uso é óbvia e ética. Daí surge o papel da análise crítica do discurso que é o de tornar visível o não-óbvio, desvendando questões de poder, ideologias e manipulações no discurso.

Segundo Torressan (2007), o discurso religioso é, incontestavelmente, resultado de interações verbais no qual o processo de manipulação pode ser ferramenta importante, e com base nisso, a presente pesquisa analisará o discurso da IURD, verificando os possíveis mecanismos de persuasão e manipulação discursiva.

Esta pesquisa pretende provar que a IURD tem demonstrado não está interessada apenas que seus fiéis sejam convencidos acerca da veracidade do seu discurso, mas que estes coloquem em prática a mensagem anunciada, convencendo-os por meio de um discurso persuasivo-manipulador.

A estratégia que um discurso persuasivo-manipulador normalmente utiliza é propor soluções para dificuldades das pessoas que vivem atualmente numa sociedade tão assimétrica, onde os problemas existenciais e sociais são comuns e intensos. Assim, estas pessoas se tornam alvos fáceis de pregadores manipuladores, pois o discurso é construído a partir da esperança do fiel com a intenção de convencer.

Portanto, faz-se necessário começar discutindo sobre a ética do discurso na perspectiva teórica de Habermas, uma vez que o autor é referência na presente pesquisa.

Capítulo 1.

Ética do discurso na perspectiva de Habermas

1.1.Habermas: A vida e a obra

 

Jürgen Habermas nasceu em Düsseldorf, na Alemanha, curiosamente no mesmo ano em que foi fundada a Escola de Frankfurt, ou seja, 1929. Em 1954, aos 25 anos, graduou-se em filosofia com o trabalho intitulado: "O Absoluto e a História", sobre Schelling[1]No mesmo ano, Habermas tornou-se assistente de Adorno, a quem assistiria durante os próximos cinco anos, até 1959, no Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, a chamada Escola de Frankfurt.

Aos 31 anos, Habermas passou a lecionar filosofia em Heidelberg e em 1961 publicou as famosas obras: Entre a Filosofia e a Ciência; O Marxismo como Crítica inserida em O estudante e a Política. Depois, Jürgen Habermas passou a lecionar filosofia e sociologia na Universidade de Frankfurt.

Várias obras e artigos foram publicados pelo filósofo nos anos seguintes, entre os quais se destacam: Evolução Estrutural da Vida Pública, em 1962; a famosa Teoria e Práxis, em 1963; Lógica das Ciências Sociais, em 1967, e Técnica e Ciência como Ideologia e Conhecimento e Interesse, ambas em 1968.

Em 1968, Habermas mudou-se para New York e tornou-se professor da New York School for Social Research. Em, 1972 retorna para Starnberg, assumindo a direção do Instituto Max-Planck, e em 1983 torna a lecionar na Universidade de Frankfurt.

Habermas aposentou-se em 1994, porém sem nunca deixar de contribuir para o arcabouço do conhecimento através de contínuas palestras, obras publicadas e outros. Autor de vasta obra cujos temas compreendem: hermenêutica jurídica, críticas ferrenhas ao positivismo em sua expressão resultante, o tecnicismo, análise do Marxismo, entre outros. Jürgen Habermas é representante da segunda fase da Escola da Frankfurt.

Pode-se dizer que Jurgen Habermas tornou-se um dos mais importantes filósofos contemporâneos ao abordar todas as áreas da filosofia: epistemologia, filosofia da história, filosofia da linguagem, filosofia moral e política, teoria social, psicologia etc.

Destacam-se três idéias fundamentais seguidas por Habermas: Teoria da ação comunicativa; a defesa da existência de uma esfera pública, na qual os cidadãos, livres de domínio político podem expor suas opiniões e discuti-las, e o pensamento de que as ciências naturais seguem uma lógica objetiva, enquanto as ciências humanas seguem uma lógica interpretativa.

Cada um desses temas expressa a característica de Habermas, herança explícita da Escola de Frankfurt, isto é, a abordagem dita "crítica" a respeito das teorias, das ciências e do próprio presente, construindo, assim, um conhecimento engajado e revolucionário. Seguindo este eixo e introduzindo uma nova visão a respeito das relações entre a linguagem e a sociedade, em 1981 Habermas publicou aquela que é considerada sua obra mais importante: Teoria da Ação Comunicativa.

1.2 Introdução ao pensamento de Habermas

A Ação Comunicativa é uma das principais teorias desenvolvidas por Jürgen Habermas. "Teoria da Ação Comunicativa", pode ser delimitada em termos gerais, como a teoria da sociedade moderna fundamentada por métodos da sociologia, filosofia social e filosofia da linguagem.

Habermas (2007), coloca que a linguagem serve como garantia da democracia, já que a própria democracia pressupõe a compreensão de interesses mútuos e o alcance de um consenso. Diante disso, no pensamento habermasiano, para que a linguagem assuma papel democrático, é necessário que a comunicação seja clara, sem a distorção de palavras e de sua compreensão, o impede uma comunicação efetiva, o consenso e, consequentemente, a prática efetiva da democracia.

O uso correto das palavras só ocorreria quando fosse abandonado o uso exclusivo da razão instrumental – ou iluminista – a razão utilizada pelo sujeito cognocente ao conhecer a natureza com o fim de dominá-la, ou seja, a confusão do conhecimento com a dominação, exploração e poder.

Assim, a razão torna-se um instrumento de uma ciência que, deixando de ser acesso a conhecimentos verdadeiros, passa a se tornar meio de dominação e poder da natureza e dos próprios seres humanos, caracterizando não como um instrumento de dominação, mas de democracia: a razão comunicativa. Esta além de compreender a esfera instrumental de conhecimentos objetivos, alcança a esfera da interação entre sujeitos, marcada por simbolismo e subjetivismo, experiências pessoais e a contextualização dialógica de agentes linguísticos.

Diante do exposto, podemos inferir uma ruptura no diálogo que é baseado em conhecimentos instrumentais resultantes da relação entre um sujeito cognocente[2]e um objeto cognoscível[3]a partir do qual o consenso, se possível, é desprovido do caráter democrático. Por outro lado, trava-se um diálogo entre sujeitos capazes de compartilhar, pela linguagem, de um universo simbólico comum e interagir, buscando construir um conhecimento crítico pautado por argumentação submetida a critérios de validade, sem, contudo, ser orientada por rígidos domínios científicos.

Nesse contexto, Habermas acredita que a comunicação só é eficiente quando quatro critérios são seguidos: uso de regras semânticas inteligíveis (uso de regras semânticas compreensíveis para o receptor); ser verdadeiro o conteúdo dito; justificação do emissor por direitos sociais ou normas invocadas pelo uso do idioma e o emissor que se utiliza da sinceridade sem procurar enganar seu receptor.

A Teoria da Ação Comunicativa propõe um retorno ao diálogo construtivo, capaz de alcançar um conhecimento mais profundo do que o alcançado pela relação entre o "sujeito cognocente e o objeto cognoscível" por ser resultado da relação, em última análise, entre dois sujeitos cognocentes. Dessa maneira, a prática da Ação Comunicativa não se limita apenas à busca do consenso da democracia, mas também é instrumento para pedagogia, filosofia e muitos outros campos da ação humana. Habermas efetuou a articulação denominada por ele de "teoria da competência comunicativa", usando elementos da "filosofia transcendental"[4] moderna, da linguistica e da filosofia da linguagem para fundamentar a teoria crítica da sociedade. Segundo Oliveira (2006), "a linguagem humana não é explicável pelo simples concurso de competência e condições concretas; é necessário tematizar uma "terceira dimensão", que nos vai fazer possível situar as outras duas"[5].

Habermas corrobora com a idéia de que "Competência, é a capacidade de um falante ideal dominar um sistema abstrato de regras gerativas de linguagem"[6]. Para o investigador, situações e contextos da fala possuem elementos extralínguisticos variáveis, por exemplo: a constituição psíquica do falante, seus conhecimentos factuais e habilidades. E define que "a tarefa específica dessa teoria consiste no sistema de regras segundo o qual produzimos ou geramos, enquanto tal, situações de possível fala."[7].

Habermas explica que na teoria dos atos de fala, unidades elementares da fala, elaborada pela escola de Oxford, caracterizam-se quando o falante, por meio da expressão, realiza exatamente a ação que a expressão performativa empregada no proferimento, é o que ocorre quando digo: "prometo vir amanhã". Nesse proferimento, é a promessa que ele apresenta que nas palavras de Habermas se torna "Um ato de fala tem ao mesmo tempo, a forma de sentença"[8].

Na comunicação comum só se realiza uma compreensão quando pelo menos dois sujeitos atingem ao mesmo tempo os níveis de intersubjetividade - quando o ouvinte e o falante falam um ao outro - e dos objetos sobre os quais eles se entendem, como se verifica no discurso de Habermas:

"A unidade dimensional da fala tem uma estrutura duplo dimensional, porque comunicação, enquanto entendimento sobre os objetos, só se realiza sob a condição de metacomunicação simultânea, isto é, de um entendimento no nível de intersubjetividade sobre o sentido pragmático determinado na comunicação."[9]

Nesse contexto, Habermas distingue dois tipos de linguagem: o analítico e o reflexivo, visto que:

"O analítico pode ser considerado o que emprega a metacomunicação apenas por meio de alcançar o entendimento sobre os objetos. Já o uso reflexivo é quando a comunicação sobre os objetos é usada para obter o entendimento sobre o sentido do uso das sentenças."[10]

 

Segundo os critérios de Habermas, há duas formas de comunicação: "ação comunicativa ordinária e discurso."[11] Na ação comunicativa, entende-se a interação para a troca de informações. Já no discurso, não há trocas de informações. O discurso tenta justificar um acordo conduzindo para uma compreensão legitimada.

Para Oliveira 2006, a ação comunicativa se realiza em jogos de linguagem quando os sujeitos que falam e agem compreendem os seus proferimentos, comunicam intencionalmente e em correspondência compreendem o sentido de seus proferimentos. No ato discursivo, Habermas diz conter as justificações, com pretensões de validade e não há troca de informações.

Oliveira (2006) afirma: "... o discurso tem por finalidade a fundamentação das pretensões de validade de opiniões e normas."[12] Habermas distingue cinco casos de discurso, conforme percebe-se abaixo relacionados:

a) "o discurso enquanto meio de ação comunicativa ( o ensaio informativo ou a conversa-disputa organizada judicialmente); b) a ação comunicativa que falsamente levanta a pretensão de ser discurso (todas as formas de justificação ideológica).c) o discurso terapêutico que serve de reconstrução das condições do discurso por meio do estímulo metódico da auto-reflexão (diálogo psicanálitico).d) o caso normal do discurso que serve de fundamentação das pretensões da validade problematizadas (p. ex. as discussões científicas); e) o discurso intencionalmente renovador ( aprender por meio do discurso no lugar do discurso enquanto meio de interação, o modelo de discussão nos seminários."[13]

Na perspectiva de Habermas, a finalidade do discurso é atingir um verdadeiro consenso em relação aos meios linguísticos do próprio discurso com a teoria consensual da verdade.

De acordo com Habermas, "só posso controlar as minhas afirmações por meio do acordo de muitas pessoas, que devem ser competentes para fazer o julgamento."[14] E ainda, a compreensão das coisas é certamente uma condição de um julgador competente deve possuir, ou seja, deve ser capaz de uma comprovação adequada e prefere não indicar critérios independentes, já que acredita que os julgadores sejam capazes de controlarem seus juízos próprios e precisam estar dotados de racionalidade.

Habermas salienta que uma pretensão de verdade só pode ser legitimada discursivamente, isto é, por meio de argumentos, sendo que a legitimação torna-se um consenso racional e funciona como forma de distinguir o consenso falso do verdadeiro. Para justificar sua afirmação, expressa que um crítico competente é um crítico racional que escolhe o caminho da observação e de consultas para a comprovação das afirmações.

Com consciência objetiva, Habermas considera insuficiente para análise do discurso acreditar na racionalidade independente para a justificação da verdade, "considera importante medir a racionalidade de um falante na veracidade de seus proferimentos: os proferimentos de um falante são verídicos quando não engana nem a si, nem aos outros".[15] Nessa perspectiva, Habermas é criterioso em seus métodos, e explica que com proferimentos dos atos de fala é possível fazer a distinção entre essência e fenômeno, prevenindo a ilusão que os falantes têm sobre si e os outros.

A ética do discurso em Habermas fundamenta-se também na questão da confiabilidade do falante e de seus proferimentos. A partir disso, surge a necessidade de saber como verificar a confiabilidade do falante e a veracidade de seus proferimentos.

Habermas explica que "a veracidade de um proferimento ocorre quando um falante, de fato, segue as regras constitutivas para a execução do ato da fala, sobretudo, as que são constitutivas da obrigação de cumprir condições implícitas de seriedade".

Afirma também que "para decidir a veracidade dos proferimentos, apela-se para a "justeza" das ações"[16]. Em relação à ética do proferimento, pergunta-se para Habermas, como podemos dizer que uma ação se realiza com "justeza"? È certo que com base apenas nas observações, não se pode afirmar a justeza das ações, segundo Habermas, é necessário que os sujeitos saiam do contexto da ação e atingem o nível de discurso. Nessa perspectiva, Oliveira (2006) conclui que:

"A teoria consensual da verdade torna consciente que não é possível decidir sobre as verdades das proposições sem referência à competência de possíveis críticos, e essa competência, por sua vez, sem a avaliação da veracidade de seus dos proferimentos, e a justeza das suas ações."[17]

È notável a distinção entre um consenso falso de um verdadeiro, sendo que a linguagem ideal caracteriza-se pelo fato do consenso atingido.

1.3 A ética do discurso: a consciência moral e o agir comunicativo

A "ética da discussão" elaborada por Habermas é uma das grandes teorias filosóficas do nosso tempo, vindo esclarecer as condições de intercompreensão e demarcar pressupostos pragmáticos da linguagem, identificar termos de uma fundamentação inter-subjetiva e racional das normas.

Ao tratar da ética do discurso, Habermas adota o modelo dialógico. Para o pesquisador, em meio ao pluralismo de culturas e formas simbólicas, há também uma variedade interpretativa, conforme podemos observar em seu discurso:

"Até certo ponto o fato do pluralismo cultural também significa que o mundo revela e é interpretado de modo diferente segundo as perspectivas dos diversos indivíduos e grupos-pelo menos no primeiro momento. Uma espécie de pluralismo interpretativo afeta a visão de mundo e a autocompreensão, bem como a percepção dos valores e dos interesses de pessoas cuja história individual tem raízes em determinadas tradições e formas de vida e é por elas moldada".[18]

Ademais, podemos verificar em Habermas 2007 que a ética discursiva mantém sua atenção direcionada para a discussão do que é direito, correto ou justo; logo, a ética do discurso tem como objeto o universo da moralidade. Além disso, quando Habermas 2002 fala em consciência moral e agir comunicativo refere-se às questões relacionadas com o caráter dialógico da moral que abrange conceitos elementares, como: o princípio de universalização, a ética do discurso e a teoria do desenvolvimento da consciência moral.

Nesse sentido, o princípio de universalização para Habermas, fundamenta-se na ética do discurso, pois integra uma relação de fala que poderá possibilitar a quem participar de uma argumentação chegar aos mesmos juízos sobre a aceitabilidade de normas de ação. Habermas diz:

"É evidente que a autoconsciência e a capacidade das pessoas de assumir uma posição refletida e deliberada quanto às próprias crenças, desejos, valores e princípios, mesmo quanto ao projeto de toda a vida, é dos requisitos necessários para o discurso prático. [...] A discussão nos faculta, com efeito, ambas as condições: a primeira, que cada participante individual seja livre, no sentido de ser dotado da autoridade epistêmica da primeira pessoa, para dizer sim ou não. A segunda, que essa autoridade epistêmica seja exercida de acordo com a busca de um acordo racional; que portanto, só sejam escolhidas soluções que sejam racionalmente aceitáveis para os envolvidos e todos os que por elas forem afetados"[19].

 

Assim, a ética do discurso surge como uma teoria da linguagem, com caráter moral, capaz de potencializar os processos de comunicação. Para Habermas (2007), "cabe à ética do discurso provar que a necessária dinâmica de "cada qual ver o que o outro vê" está embutida nos pressupostos pragmáticos do próprio discurso prático".[20]. É importante estabelecer certos pressupostos pragmáticos de argumentação, capazes de garantir que todos possuam direitos e oportunidades iguais no uso da palavra, não podendo haver distorção resultante de diferenças de poder e influência.

Para Habermas, "só na qualidade de participante de um diálogo voltado para um consenso, somos chamados a exercer a virtude cognitiva da empatia em relação as nossas diferenças"[21]. Percebe-se que os participantes de um discurso deveriam interagir com cada um, para acontecer o que Habermas define como "universalização de todos os interesses envolvidos"[22] e conclui que nesse tipo de discurso não podem chegar a um acordo que atenda o interesse de todos, ao menos que adotem os pontos de vista uns dos outros. O discurso ressaltado por Habermas pode ter efeito de convencer todos, igualmente, mas a capacidade de autoconsciência da pessoa de assumir uma posição, uma crença, desejos, valores e princípios é requisito fundamental, tão quanto, o de os participantes estarem dispostos a atender a exigência e "cooperar" uns com os outros.

As alternativas de "universalização dos interesses" e "cooperação" refletem a um vínculo social, aspectos não condizentes para uma liberdade comunicativa. Habermas propõe condições essenciais para a liberdade comunicativa:

"- a primeira , que cada participante individual seja livre, no sentido de ser dotado da autoridade epistêmica da primeira pessoa, para dizer "sim" ou não";- a segunda " que a autoridade epistêmica seja exercida de acordo com a busca de um acordo racional; que portanto, sejam escolhidas soluções que sejam racionalmente aceitáveis para todos os envolvidos e todos os que por elas forem afetados."[23]

Habermas aceita a redenção discursiva de uma alegação de verdade somente baseado na aceitabilidade racional, considera os discursos:

"como maquinas de lavar: que filtram aquilo que é racionalmente aceitável para todos. Separam as crenças questionáveis e desqualificadas daquelas que, por um certo tempo, recebem licença para voltar ao status de conhecimento não problemático."[24]

Ressaltar-se que a questão filosófica envolvendo a moralidade não é o de descrever os padrões dominantes, mas o de oferecer uma justificativa objetiva para a sua validade, e é justamente quanto a esse ponto que o cognitivismo considera possível fazer afirmações verdadeiras. Não se trata, pois, da identificação das normas morais presentes em um grupo social, mas da elaboração de uma justificativa racional que fundamente a validade objetiva de enunciados de dever-ser. Nesse sentido, Habermas não vê simplesmente a possibilidade fazer afirmações verdadeiras sobre normas, entretanto fazer afirmações que sejam objetivas e verdadeiras acerca da validade normativa.

Habermas (2007), esclarece que os conceitos de "imoral" ou de "culpa" somente fazem sentido para os que vivem inseridos em sistema moral, pois todos nós vivemos dentro da moral, e não podemos ficar fora dela. Não é uma escolha que nos é dada, já que não podemos nos despir de nossas crenças, e que, justamente, por isso podemos falar sobre ela. Ao dizer que não existe obrigação moral objetiva significa desconhecer que as pessoas vivem de acordo com esses critérios e que eles fazem parte da vida em sociedade. Os julgamentos morais não são subjetivos, mas têm pretensão de objetividade. Assim, todo o discurso moral tem caráter impessoal, pois envolve a afirmação de obrigações que não são meramente subjetivas.

Na tentativa de fundamentar a validade objetiva de enunciados morais, Habermas (2007) desloca o eixo da discussão tradicional. Ele parte da admissão de que foram falidas todas as tentativas de afirmar que essa validade é uma característica intrínseca ao enunciado, que poderia ser percebida a partir de uma espécie de observação cuidadosa. Em sentido diverso, ele busca a fundamentação no efetivo diálogo, tentando extrair essa validade objetiva da argumentação moral, e não do conteúdo da norma.

Habermas (2007) entende que nas relações cotidianas há uma diferença entre pretensão de verdade e pretensão de validade, e para desenvolver esse pensamento, ele retoma a distinção entre o agir estratégico - busca de fazer com que outra pessoa atue da forma que você considera adequada - e o agir comunicativo, busca de convencer outra pessoa de que ela deveria agir da forma adequada, persuadindo o outro a aderir ao seu posicionamento.

No agir comunicativo, o falante tenta convencer, de forma racional, o ouvinte das suas próprias razões. Tudo o que o falante diz tem uma pretensão de validade, ou seja, ele somente pode falar coisas que possua bons motivos para considerarem verdadeiras. Para tanto, se o ouvinte pode ser convencido, é porque as afirmações do falante podem ser justificadas discursivamente (o que Habermas chama de resgate da pretensão de validade). Em outras palavras, no agir comunicativo, atua de três maneiras.

A primeira trata-se de quando uma pessoa pratica um ato ilocucionário, ato de fala regulativo. Esse ato tem uma pretensão de validade, chamado de pretensão de correção, na medida em que o falante tem boas razões para convencer o ouvinte de que ele deve atuar conforme o que ele diz. A segunda maneira se refere assim que uma pessoa pratica um ato de fala constatativo, caracterizado por uma pretensão de verdade, em que o falante deve poder justificá-lo racionalmente. Já no último modo, há uma pessoa que pratica um ato de fala expressivo (emotivo). Neste ato ocorre uma pretensão de sinceridade, mas que não pode ser demonstrada, argumentativamente, podendo ser apreendida apenas pela análise do efetivo comportamento do falante. Nesta forma, tanto a verdade das proposições constatativas, quanto a validade das proposições normativas deve haver bons argumentos que as fundamentem.

Todavia, Habermas (2003), tenta mostrar que as relações validade/norma e verdade/asserção são assimétricas. Tomemos os dois pares de frases: 1 Não se deve matar; 1' É obrigatório não matar; 2 O ferro é magnético; 2' É verdade que o ferro é magnético. Diante do exposto, nota-se que:

" uma norma moral reclama sentido de validez também independente de ser proclamada ou reivindicada. Uma norma pode ser formulada por meio de uma proposição como (1) , sem que essa formulação, ( por exemplo no assentamento da frase ) tenha que se compreendida como um ato de fala, isto é, como outra coisa senão uma expressão impessoal para a norma ela própria."[25]

Como se vê, na frase "não se deve matar" é a expressão linguística de uma regra que existe independentemente do fato de a enunciarmos dessa maneira. Assim, a pretensão de validade não é apenas do ato de enunciação, mas da própria norma que foi enunciada — e que poderia ter sido enunciada de diversas formas, como: "é defeso tirar a vida de qualquer ser humano." São maneiras variadas de enunciar a mesma regra que existe independentemente de falarmos dela — em outras palavras, a norma enunciada é uma regra que pode ser enunciada (1) ou da qual podemos falar (2).

Já na frase "o ferro é magnético", não é a enunciação linguística de um objeto existente, mas um enunciado linguístico que pretende descrever a realidade. A situação a qual ele se refere não pode ser verdadeira, ou ela existe, ou não. O que pode ser verdadeira é somente a enunciação linguística do fato — ao contrário do que acontece com a enunciação de uma norma, já que a norma enunciada pode ser entendida como válida ou inválida. Com isso, no caso das normas, a pretensão de validade já está no objeto, não apenas na sua enunciação, ela é um predicado do objeto tratado.

No caso dos fatos, a pretensão de validade é apenas da sua descrição linguística. Então, o que confere verdade a um enunciado constatativo é o fato de podermos verificar na realidade que ocorre a relação descrita. Já o que confere validade à norma não é o fato de podermos verificar na realidade que as pessoas atuam dessa maneira, pois uma norma pode ser eficaz e ilegítima. Como afirmou Habermas, " temos que distinguir o fato social do reconhecimento intersubjetivo,( eficácia) e o fato de uma norma ser digna de reconhecimento ( legitimidade)."[26]

Para aferir a validade de uma norma, não nos basta verificar a sua adequação formal, vigência, e nem a sua observância, eficácia, como também é necessário avaliar a sua legitimidade. Na legitimidade reside o grande problema. Quando uma norma é legítima? Quando é possível confirmar a sua pretensão de legitimidade? É quando ela pode ser aceita pelo círculo de pessoas as quais é endereçada e aceita por motivos ligados aos valores dessas pessoas. Assim, Habermas (2003) afirma que:

"A imposição de normas está duplamente codificada, porque os motivos para o reconhecimento de pretensões de validez normativa podem remeter tanto a convicções como a sanções, ou mescla complicada de discernimento e violência. Em regra geral, o assentimento motivado racionalmente associar-se a uma aceitação empírica, ou seja, produzida pelas armas ou por bens materiais numa crença legitimada cujos componente não são simples de analisar." [27]

Portanto, para demonstrar a validade de uma norma, é preciso fundamentar nessa regra, persuadindo o grupo a que ela é endereçada de que eles devem aceitá-la e a justificação que somente pode se apresentar, discursivamente, mediante um agir comunicativo.

No discurso do ser, a argumentação baseia-se no princípio da indução, que permite construir afirmações gerais, como: todo corpo tende a permanecer parado ou em movimento retilíneo uniforme, a partir de constatações pontuais; os corpos analisados permaneceram imóveis ou em movimento retilíneo uniforme quando não submetidos a qualquer força. Entretanto, uma argumentação sobre a legitimidade não se pode fundar num discurso indutivo, pois não há evidência empírica sobre valores do fato das pessoas acreditarem que matar é mau. Não podemos derivar a regra de que não se deve matar. Caso não seja possível a indução, fica descartada também a aplicação do método dedutivo, tendo em vista que as regras gerais precisariam ser construídas indutivamente.

Segundo o princípio da universalização, as normas válidas precisam merecer o consentimento por parte de todos os concernidos. Elas somente podem tratar de interesses comuns a todos os concernidos.

Alguns filósofos tentam indicar semelhante principio moral, como kant e Rawls, que propõem:

"O princípio moral, compreendido de tal maneira que exclui como invalidas as normas que não possam encontrar o assentimento qualificado de todos os concernidos possíveis. O princípio ponte possibilitador deve assegurar que somente sejam aceitas como válidas as normas que exprimem uma vontade universal;..." [28]

Diante do exposto, pode-se afirmar que uma pessoa, monologicamente, analisando uma norma a partir de um ponto individual e egoísta, não pode tê-la como verdadeira.

Segundo os critérios adotados por Habermas (2003) conclui-se que:

 

"A ética do discurso não dá nenhuma orientação conteúdistica, mas sim um procedimento rico de pressupostos , que deve garantir a imparcialidade na formação do juízo. O discurso prático é um processo, não para a produção de normas justificadas, mas para o exame da validade das normas consideradas hipoteticamente. È só com esse proceduralismo que a ética do discurso se distingue de outras éticas cognitivistas, universalistas e formalistas, tais como a teoria da justiça de Rawls."[29]

 

Com isso, percebe-se que esses autores permitem que os valores defendidos por eles passem a integrar a teoria na qualidade de regras racionais. Assim, em vez de perceber a sua contribuição pessoal como uma expressão de valores subjetivos, tais autores apresentam suas concepções como resultados da identificação de padrões racionais, e, portanto, objetivos de moralidade.

Todavia, fazendo a Rawls a mesma crítica que o próprio Rawls dirigiu aos utilitaristas clássicos, Habermas afirma que ele não leva em consideração a diferença entre as pessoas, pois toma certos valores subjetivos como se eles fossem valores universais de moralidade, o que envolve a suposição que o restante de sua sociedade deveria submeter-se a eles.

É nesse ponto que a teoria de Habermas distingue-se das teorias de Rawls e de Kant. Habermas afirma que estes autores desconsideram a função das normas morais na prática comunicativa cotidiana, que é a de funcionarem como padrões para a restauração de uma convivência perturbada ou ameaçada. É em um contexto de tensão que surgem as argumentações morais, as quais precisam servir como pautas para o estabelecimento de um consenso que somente pode ser atingido a partir de um esforço de cooperação.

Esse esforço de cooperação, de levar a sério as diferenças valorativas existentes entre os vários participantes e de encontrar uma saída que satisfaça os interesses de todos, é uma atividade que não pode ser pensada monologicamente, isto é, que não pode ser feita por uma pessoa isolada. Os valores das outras pessoas não podem ser identificados por uma abstração feita a partir dos meus valores pessoais. A resolução de um conflito dessa natureza somente pode ser feita quando há uma identificação de uma vontade comum, fruto de um acordo efetivo entre os participantes, conforme expressado:

"Mas, se as argumentações morais devem produzir um acordo desse gênero, não basta que um indivíduo reflita se poderia dar seu assentimento a uma norma. Não basta nem mesmo que todos os indivíduos, cada um por si, levem a cabo essa reflexão, para então registrar os seus votos. O que é preciso é, antes, uma argumentação "real", da qual participem cooperativamente os concernidos. Só um processo de entendimento mútuo intersubjetivo pode levar a um acordo que é de natureza reflexiva; só então os participantes podem saber que eles chegaram a uma convicção comum."[30]

Assim, Habermas conclui:

"ao invés de prescrever a todos os demais como válida uma máxima que eu quero que seja uma lei universal, tenho que apresentar minha máxima a todos os demais para o exame discursivo de sua pretensão de universalidade. O peso desloca-se daquilo que cada um pode querer sem contradição com a lei universal para aquilo que todos querem de comum acordo reconhecer como norma universal."[31]

Com essa argumentação, Habermas tenta substituir o monólogo do sujeito por um diálogo efetivo entre os participantes da enunciação. Assim sendo, o princípio ético-discursivo parte do pressuposto de que é possível chegar a um acordo racional sobre questões normativas e diz que o pacto deve ser feito por todos os atingidos dentro de um discurso prático.

É preciso que as pretensões de validade de uma norma possam ter um sentido cognitivo, ou seja, que se possa afirmar que elas são racionalmente fundamentadas. Mesmo admitindo que haja uma assimetria entre verdade e validade, Habermas procura mostrar que esses conceitos são similares para que seja possível uma analogia a qual sustente a racionalidade das posições morais e outro pressuposto de que a fundamentação racional dessas normas somente possa ocorrer dentro de um discurso real, não podendo ser feita monologicamente.

A ética do discurso utiliza-se de uma contradição um pouco mais geral. Todo aquele que ingressa em um discurso, seja para afirmar ou para negar a possibilidade de fundamentação das normas morais, parte do pressuposto de que o discurso é um meio capaz de levar a conclusões justificadas. Caso ele não admitisse esse pressuposto, a única posição coerente seria ficar calado e evitar o discurso. Assim, a partir do momento que uma pessoa ingressa no discurso para tentar convencer alguém de algo, ela precisa admitir que o discurso seja um meio hábil de convencimento e, que, há afirmações que podem ser consideradas fundamentadas.

Nessa medida, fundamentar não é deduzir a partir de premissas fundamentais cuja validade pode ser demonstrada, mas deduzir a partir de proposições que são incontornáveis, e a validade do discurso é incontornável para qualquer um que dele participe.

A partir de Habermas, pode-se dizer que toda pessoa que ingressa em um discurso racional, na busca de convencer alguém, precisa admitir os princípios básicos do discurso argumentativo racional. Entre as regras, há algumas que têm conteúdo apenas lógico-semântico que não interessa diretamente à ética. Todavia, o discurso racional tem certas regras procedimentais (sobre quem pode falar, em que momentos e sobre que assuntos) que exigem a eliminação de toda coerção exterior e que criam uma situação de igualdade, e especialmente:

 

"assegurar a todos os participantes chances iguais de contribuir com a argumentação e de fazer seus próprios argumentos. Exige condições de comunicação que tornem possível o prevalecimento tanto do direito a um acesso universal ao Discurso quanto do direito a chances iguais de participar dele, sem qualquer repressão, por sutil e dissimulada que seja.".[32]

Se qualquer pessoa pode ingressar na discussão, não podemos excluir qualquer interesse para que cheguemos a um consenso sobre uma afirmação qualquer. Antes, é preciso que essa posição seja universalmente aceita. Logo, todo aquele que aceita as pressuposições comunicacionais necessárias do discurso argumentativo racional e sabe o que quer dizer justificar uma norma de ação precisa admitir o princípio da universalização como parte integrante da idéia de justificação. Com base nessa estrutura argumentativa, Habermas considerou que estava, devidamente, explicado o modo como o agir comunicativo permitia a fundamentação objetiva de certos valores e normas morais, de modo a sustentar a sua perspectiva ética cognitivista que é um dos fundamentos desta pesquisa.

2° Capítulo:

Consolidação e expansão da Iurd e a persuasão para a "conversão."

2.1 O início da Iurd

Edir Bezerra de Macedo, fundador da Iurd, nasceu em fevereiro de 1945 na cidade de Rio das Flores, no estado do Rio de Janeiro, com seus 17 anos conquistou seu primeiro emprego na loteria do Rio de janeiro, no bairro São Cristóvão, iniciou o curso de matemática, mas não chegou a concluir, converteu-se na igreja Nova Vida com seus 18 anos, dando início a sua trajetória até a fundação da iurd.

Edir Macedo, como membro da Nova Vida em 1975, e de acordo com Mariano, "cansado do elitismo desta igreja e sem apoio para suas atividades evangelísticas consideradas agressivas, decidiu partir para vôos mais altos"[33] e partindo para estes, Edir Macedo, juntamente com Romildo Ribeiro Soares, Robert Augusto Lopes, Samuel e Fidellis Coutinho, fundaram a cruzada do caminho eterno. Dois anos depois, após desentendimento com um os irmãos coutinho, Edir Macedo, Romildo e Robert Lopes fundaram a Igreja Universal do Reino de Deus em 09 de julho de 1977. A IURD inicia-se em uma pequena funerária, no Bairro da Abolição no Estado do Rio de Janeiro.

No princípio de fundação da Igreja universal, o missionário Romildo Soares assumiu a liderança como principal pregador, portanto com o caráter autoritário de Macedo, o então principal líder pregador Romildo Soares foi perdendo espaço até que culminou numa votação para decidir qual deles assumiriam as decisões da Igreja. Então, Edir Macedo que sempre demonstrou espírito de liderança sendo " carismático e autoritário, portador de um senso prático dentro da recém fundada IURD,"[34] em um sistema gradual cortou o espaço do seu parceiro de fundação Romildo soares, que desligou-se da Iurd para fundar a Igreja internacional da Graça de Deus no mesmo sistema neopentecostal da Iurd.

Partindo do surgimento do neopentecostalismo no Brasil, a Igreja Nova Vida desempenhou o papel formador de duas lideranças das grandes igrejas neopentecostais: a Igreja universal do reino de Deus e a Internacional da Graça de Deus. A Igreja nova Vida, surge no Rio de Janeiro no Bairro de Botafogo pelo missionário Canadense Walter Robert McAlister, apesar de ser dirigida a classe média cresceu pouco, comparada a grande expansão da Iurd.

2.2 Características da Iurd

A partir das transformações ocorridas nos discursos a partir do pentecostalismo, analisaremos como se deu a expansão da Iurd e as características favoráveis para a rápida propagação da ideologia do Bispo Macedo.

O pentecostalismo surge no Brasil no século XX, apresentando um grande crescimento nos diversos segmentos da religiosidade cristã Brasileira. Segundo Almeida 2009, a Congregação Cristã do Brasil, foi a primeira igreja pentecostal a se instalar no Brasil, mas sem fazer uso da mídia e sem proselitismo. Logo surge a Igreja assembléia de Deus, pregando "o afastamento do mundo" incluindo o distanciamento da política, exortando aos seus fiéis da necessidade de obediência aos pregadores, que condenavam as práticas ritualísticas da Igreja Católica, expressamente o culto à "Maria", na tentativa de se impor no território brasileiro.

Foi a partir de 1950, que surge denominações com destaque nacional como a igreja do "Evangelho Quadrangular", a partir desta houve uma multiplicação de adeptos e houve uma diversificação das instituições pentecostais, surgindo assim fragmentações em pequenos grupos formando novas instituições. Este contexto foi favorável para formações de novas formas religiosas e maneiras inovadoras de "pregar o evangelho" atendendo as diversas classes sociais.

Segundo Cardoso, "o movimento neopentecostal é uma vertente do movimento pentecostal, que surgiu nos EUA no inicio do séc. XX com os chamados " movimentos de avivamento"[35]. Estes acreditavam, que o batismo com o espírito santo era uma benção que o indivíduo recebia ao se converter e uma das suas características era o falar línguas estranhas.

O pentecostalismo foi divido em três ondas, mas foi a partir da terceira, que surgiu a corrente designada neopentecostal, para classificar as novas igrejas que surgiram. Segundo Mariano, 2005 o uso do termo neopentecostais refere se:

 

"o prefixo neo é usado para designar a sua formação recente, embora este termo já estivesse sido usado há anos nos EUA, designou este termo na década de 70 para as dessidências pentecostais que saíram das protestantes, movimento que posteriormente foi nomeado de carismático."[36]

 

E na perspectiva de Bittencourt citado por Mariano temos ainda:

 

"que o pentecostalismo autônomo participa ativamente da política partidária, tem função terapêutica baseada na cura divina, na prosperidade e os rituais de exorcismo, os quais dão "nome aos bois" e culminam na "guerra santa", contêm doses maciças de " misticismo", incluindo o uso de objetos como mediação do sagrado. Nos cultos, concede liberdade as "expressões emotivas", propiciando catarse individual e coletiva".[37]

É conforme este contexto e com estas caractéristicas afirmadas, é que esta inserida a Igreja Universal do Reino de Deus, com o discurso de cura, prosperidade, exorcismo, e trocas simbólicas. Segundo observa Mariano, o enfoque da Iurd é nestas manifestações, usa uma linguagem de combate ao mal, travando uma "guerra contra o diabo"[38]. É observado que esta transformação dos deuses adversários em demônios é uma prática antiga na história do cristianismo e com esse mesmo discurso, julgando ser o "diabo" o principal responsável pela desgraça humana, evidências negativas, apologia a teologia da prosperidade e travando uma guerra contra as religiões afro-brasileiras, a Iurd consolidou-se no Brasil e em outros países.

Outros autores compartilham do mesmo pensamento de o neopentecostalismo Mariano sobre o neopentecostalismo. E por Ferrari percebemos outras características da Iurd:

" Os novos pentecostais (neo) tem uma configuração institucional própria, independente das igrejas pentecostais ou protestantes já estabelecidas, sejam nacionais ou estrangeiras. As lideranças religiosas deste novo pentecostalismo tem perfil carismático e empreendedor." Inicialmente, esse movimento foi chamado de pentecostalismo autônomo ou de pós pentecostalismo."[39]

É válido ressaltar que a Iurd é independente de outras instituições religiosas e sempre adota características diferenciadas das instituições protestantes tradicionais, não faz alianças, nem parcerias com outras instituições religiosas.

2.2 O uso da mídia

Conforme Tavolaro (2007), Edir Macedo sempre demonstrou interesse de possui um veículo de comunicação em massa, para propagar o discurso, porém começou com 15 minutos de programa na rádio Metropolitana e comprovando seu sucessor empreendedor, consegue em um ano comprar a rádio Copacabana. Este avanço extraordinário é atribuído à propagação do discurso pelos meios de comunicação que a Iurd aderia ou comprava.

A IURD, esteve no auge de seu crescimento especificamente na década de 80, quando completava os seus três anos de existência e já tinha 21 templos, segundo é observado por Mariano (2005):

" quando completou três anos, tinha 21 templos em cinco Estados. Em 1982, dobrou de tamanho, passando a contar com 47 templos em 08 estados. Em abril de 1983, chegou a 62 templos e alcançou mais um Estado. Em agosto de 1984, avançou para 85 templos em 10 Estados, No mesmo mês do ano seguinte, saltou para 195 templos em 14 estados e no Distrito Federal. Em Agosto de 1986, ano em que Macedo se mudou para os Estados Unidos, a Igreja avançou para 240 templos em 16 Estados. No final de 1987, com 356 templos em 18 Estados, 02 em Nova York e mais 27 "trabalhos especiais" em cinemas alugados, já reunia gente suficiente para lotar o Maracaçã e o Maracanãzinho concomitantemente. Até então suas anuais concentrações evangelísticas no Rio de Janeiro eram realizadas (desde 1981) apenas no Maracanãnzinho, jamais no estádio. Em Agosto de 1988, além "trabalhos especiais", possuía 437 templos em 21 Estados e Brasília, 03 deles fincados nos EUA e 01 no Uruguai. Em Abril de 1989, ano em que negociaria a compra da TV Record, somava 571 templos." [40]

Foi com este crescimento que a Iurd expandiu seus templos para outros países, em 1998, a Iurd já estava presente em 50 países estava inaugurando 01 te templo por dia em média, e já teria 700 templos no exterior.

A expansão do discurso Iurdiano a a crescente aglomeração de fiéis, é justificada em grande parte pela eficiência do uso dos meios de comunicação, como rádios, e propagandas, no qual sempre fez proselitismo.

Segundo Mariano (2005), sobre a expansão radiofônica da Iurd afirma:

 

" seu primeiro programa , na Rádio Copacabana, durava irrisórios 15 minutos. Mas em pouco tempo expandiria sua presença nas ondas radiofônicas. Em Abril de 1983, já transmitia 27 programas de rádio. A compra da primeira emissora a Copacabana, no Rio, ocorreu no ano seguinte."[41]

Seguindo o sistema de crescimento e propagação do discurso religioso, a Iurd consegue agregar fiéis e ao mesmo tempo expandir dos seus meios de comunicação.

Atualmente, no feriado de 21 de abril de 2010, a Igreja Universal conseguiu reunir mais de 8 milhões de pessoas em todo Brasil. Este dia foi denominado de "D" ou seja, dia da decisão. Um dia dos fiéis decidirem uma mudança em suas vidas. Esta concentração aconteceu em estádios, autódromo , praias, e só em São Paulo reuniu-se cerca de 2 milhões de pessoas, conforme Jornal Folha Universal da própria instituição:

 

"A enorme mobilização e fé e esperança do dia D", reuniu-se mais de 08 milhões de pessoas em megaeventos nas 27 capitais do país, além da cidade de campos dos Goytacazes (RJ), foi destaque na programação da "Rede Record", .... Das 14:30 ás 15:30, a emissora dedicou uma edição especial do programa " fala que eu te escuto" para mostrar as concentrações organizadas pela Igreja universal do Reino de Deus ( IURD) nos estados.Apresentado por Gustavo Marques, o programa passou imagens aéreas feitas de helicópteros da multidão de fiéis, a maioria com guarda-sóis e sombrinhas para proteger do sol forte e do calor que atingiu boa parte do Brasil."[42]

 

Neste dia, Edir Macedo discursou ao vivo de Londres, para todas as capitais do Brasil, o Bispo apareceu dirigindo um discurso com oração, para as mais de 08 milhões de pessoas e também aqueles que acompanhavam através da Rede Record, rádio ou internet.

Geralmente o discurso de Edir Macedo é voltado o otimismo da fé, sendo comprovado nas palavras do Bispo no seu discurso desse do dia D":

"Saiba que Deus está presente em sua vida: quando você está no fundo do poço, não pode contar com ninguém, nem familiares, colegas. Você fica só, somente com Deus do seu lado. Tenho certeza que você não vai sair daqui da mesma forma que entrou, vai sentir algo diferente, pois o Deus dos impossíveis vai fazer algo. O que Ele fez no passado, irá realizar na sua vida nesta tarde." Todos nós pode se dar o luxo de falhar, pois Ele é Deus, perfeito."[43]

Percebe-se claramente que a persuasão ocorre não somente para as trocas simbólicas mas há também a indução a conversão e no discurso do Bispo comprovamos esta tese:

" A minha fé é a voz de Deus, para receber um objetivo, você tem que sacrificar, você têm que sacrificar todo o seu futuro, você não deve entregar apenas 10% tem que ser 100% de sua vida para Jesus. Compreenderem, sim ou não!

Aqui nós não cobramos, nós conscientizamos, a conversão é uma atitude de sacrifício da pessoa. A pessoa deve manifestar o seu sacrifício, deixar de fazer coisas erradas, e mudar de vida. Compreende pessoal, sim ou não!

Se você quer mudar de vida e quer que Deus guie a sua vida, vêm aqui a frente receber a oração."[44]

 

Percebe-se neste discurso, que o Bispo esclarece que há necessidade da pessoa esforça-se para obter os seus objetivos, é colocado para o fiel que o seu sucesso depende da sua disposição em aderir aos rituais da iurd, e participar das colaborações para a instituição religiosa.

Partindo do pressuposto que a partir da consolidação do discurso religioso, a Iurd ganhou adeptos, faz-se necessário analisar quais são estas características discursivas propícias a "conversão".

2.3 O DISCURSO RELIGIOSO

Para uma melhor compreensão do crescimento da Iurd faz-se necessário entender o que é o discurso religioso.

O discurso religioso tem sido objeto de estudo de várias áreas do conhecimento, tendo em vista a sua complexidade, e crescente presença na sociedade pós-moderna. Aquela dar-se pela presença dos aspectos lingüísticos, hermenêuticos e teológicos, sendo que, os aspectos linguísticos do discurso é analisado por instrumentos teórico metodológicos da análise do discurso.

É conveniente detalhar as características de um discurso religioso a partir nas perspectivas de alguns autores, com o objetivo de esclarecer que o discurso iurdiano trata-se também de um discurso religioso.

Observa-se que o discurso religioso, é exemplo de autoritarismo discursivo, conforme afirmação:

[...]o paroxismo autoritário chega a tal grau de requinte que o eu enunciador não pode ser questionado ,visto ou analisado ; é ao mesmo tempo o tudo e o nada. A voz de Deus plasmará todas as outras vozes, inclusive daquele que fala em seu nome: o pastor."[45]

 

Segundo Silva (2004), ao analisar a linguagem do discurso religioso afirma que a mesma possui características de formação coletiva, legitimação de consciência e imposição, conforme podemos comprovar em Silva 2004:

" a linguagem faz do discurso religioso, um instrumento formador e legitimador da consciência religiosa coletiva, impondo com isso uma ordem definida no modo do indívíduo crer e pensar, pelo seu poder de convencimento e uso da argumentação bíblica sob uma ótica fundamentalista."[46]

Percebe-se que em outros discursos abre se a possibilidade para que troca de comunicação no ato discursivo. Porém no discurso religioso é diferente, acontece na posição "horizontal" de forma que quem fala é sempre representantes autorizados devidamente declarados, que falam em nome de Deus: papas, pastores, padres, bispos, neste sentido, no ato do discurso não há interação pois há uma distância entre Deus e o povo ou fiéis.

Segundo foucault (2009), ... " o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo porque, pelo que se luta, o poder do qual nos podemos apoderar."[47] É bem notado nas palavras do autor que o discurso coloca em jogo o poder e o desejo. E esse poder do discurso religioso torna-se persuasivo, observar-se nos rituais, que a ideologia é mantida como sistema de dominação do fiel conforme afirmado:

... "o ritual define a qualificação que devem possuir os indivíduos que falam ( e que no mesmo jogo do diálogo, na interrogação, da recitação, devem ocupar determinada posição e formular determinado tipo de enunciados); define os gestos, os comportamentos, as circunstâncias, e todo o conjunto de signos que devem acompanhar o discurso; fixa, enfim , a eficácia suposta ou imposta das palavras, seu efeito sobre aqueles aos quais se dirigem, os limites do seu valor de coerção. Os discursos religiosos, judiciários e terapêuticos e em parte também políticos não podem ser dissociados dessa prática de um ritual que determina para os sujeitos que falam, ao mesmo tempo, propriedades singulares e papéis pré- estabelecidos."[48]

 

No discurso religioso da Iurd, além do autoritarismo presente nota-se a mistificação que envolve o pecado e na figura do diabo, o elemento primordial para a intimidação do fiel e abrir a possibilidade das trocas simbólicas.

Há no discurso religioso a indução de trocas simbólicas, destacando a promessa de realizações pessoais e sociais, com a certeza de um retorno seguro. Este procedimento é verificado no pensamento de Silva (2004):

"Linguagem que estabelece uma coerência mínima entre o discurso e a necessidade existencial, por ser linguagem valorativa e motivadora, que fornece elementos para a experiência religiosa com nexo entre a realidade e a utopia do fiel." [49]

O autor deixa claro que "os valores escolhidos pela imaginação do fiel, são inculcados pela ideologia do sistema religioso". Com base em Silva (2004) nota- se que o indivíduo passa a acreditar no discurso religioso baseado na autoridade revelada, por argumentações e convencimento.

Conforme argumentos apresentados, pode-se afirmar que no discurso religioso, há autoritarismo, formação de uma consciência coletiva que possibilita a dominação, e esta facilita as trocas simbólicas, portanto fica esclarecido que o discurso iurdiano trata-se de um discurso religioso persuasivo.

2.4- As estratégias de persuasão para a "conversão"

 

Segundo Antônio (2005), a persuasão implica sobretudo em uma intenção com profundas implicações psicológicas, como nas propagandas que visam distribuir suas mensagens e prender a atenção do seu auditório ou ouvintes.

Como nas propagandas, a intenção da Iurd, é estabelecer uma imagem positiva de seus pastores, templos e de seus membros, conforme observado por Antônio (2005) referindo-se a imagem positiva que o Bispo faz sobre si mesmo, nessa dedicatória: " A Deus através de Jesus Cristo que me levantou para esta grande obra". (dedicatória do livro Orixás caboclos e guias, 2000), e quanto a seus templos, a Iurd divulga como: " endereços da Felicidade", " onde o milagre espera por você", e quanto a sua oferta religiosa a iurd possui: "oração forte", "oração energética", "aliança energética com Deus"; quanto a imagem dos membros, conforme observamos nos jornais folha Universal no quadro "caminho do amor", os membros têm a intenção de relacionar com "homens e mulheres de Deus". Estas são as imagens positivas que a Iurd procurar divulgar com a intenção de atrair as pessoas.

Ainda, estrategicamente utiliza a troca de nomes, com o objetivo de influenciar positivamente o receptor das mensagens. Este recurso léxico-semântico, objetiva-se obter termos mais adequados ao público que deseja atingir. Como exemplo, temos o fato da Iurd em vez de usar o termo "culto", como na maioria das instituições protestantes, utiliza-se o termo "reuniões", em muitas ocasiões o termo "pastor" e substituído por "conferencista", que é voltado para o conceito de palestras, visando atrair o público da classe média, os empresários, para as reuniões de prosperidade.

Percebe-se variações nos nomes dos "cultos" dirigidos a empresários. Segundo Antônio (2005), estas variações são estratégicas conforme cada região. Por exemplo, em Goiânia nomeia-se "consultoria empresarial", no Paraná " palestras empresariais" ou mesmo "congresso empresarial" em São Paulo.

Segundo o livro de doutrinas da Iurd, esta não é uma religião, porém intitula-se como uma Igreja cristã evangélica neopentecostal. Nessa perspectiva podemos considerar que este tipo diferenciação é uma forma de desqualificar as outras igrejas. Segundo Antônio (2005), esta é uma estratégia muita utilizada nos discursos ideológicos dando as outras igrejas uma conotação negativa, com a finalidade de enfatizar a superioridade do discurso apresentado.

2.5 A prosperidade

A Igreja Universal do Reino de Deus é adepta da teologia da prosperidade, que inicia no Brasil nos anos 70, e penetrou em muitas Igrejas e ministérios segundo afirma Mariano (2005) nestas especificamente:

"..em especial, nas igrejas Internacional da Graça de Deus, Universal, Renascer em Cristo, Comunidade Evangélica Sara a Nossa Terra, Nova vida, Bíblica da Paz Cristo Salva, Cristo Vive, Verbo da Vida, Nacional do Senhor Jesus Cristo, Adhoneop, CCHN, Missão Sheinah."[50]

Cada Igreja com seus líderes adotaram modos diversos de assimilarem com seus fiéis esta nova doutrina, porém duas denominações se destacaram, por seu tamanho e pela ênfase dada a teologia da prosperidade, que são a Igreja universal do Reino de Deus e a Internacional da Graça de Deus.

A teologia da prosperidade prega que os crentes ou féis devem ser bons colaboradores na instituição religiosa a qual pertencem, sejam na entrega do dízimo ou das ofertas. E é justificada da seguinte maneira: ao fiel fazer doações para a instituição, o mesmo torna merecedor das graças divinas para serem desfrutadas neste mundo. Enfatiza que o fiel deve ser submisso a vontade de Deus e colaborar para o crescimento da obra de Deus na Terra, garantindo que o fiel será retribuído como é bem observado no discurso de Edir Macedo da Universal segundo Tavolaro, (2007) " Quem dá tudo recebe tudo de Deus. É inevitável. É toma lá e dá cá."[51] Ao fiel não é dado outra alternativa, se quiser ser próspero, é preciso dar algo para Deus.

Há várias manifestações de crenças na teologia da prosperidade, uma delas coloca o fiel em conflito consigo mesmo, quando é afirmado que a posse de bens materiais, o gozo de uma boa saúde, uma vida sentimental realizada e outras questões da vida, como resultado da espiritualidade do fiel. Para os defensores da teologia da prosperidade, o fator primordial do sucesso é através da determinação, como é bem observado por Mariano:

" .. Para alcançar tais bênçãos, garantir a salvação e afastar os demônios de sua vida, basta o cristão ter fé incondicional e inabalável em Deus e exigir seus direitos em alta voz e em nome de Jesus e ser obediente e fiel a Ele no pagamento dos dízimos."[52]

É garantido que aquele que é fiel, deve exigir os seus direitos, que na verdade é uma vida digna, sucesso financeiro e saúde .

Em uma sociedade capitalista, que cada vez é iludida pelas fantasias do consumo exagerado, a teologia da prosperidade ganhou espaço. Este discurso que dá esperança para o indivíduo adquirir riquezas, propondo que o mesmo desfrute das maravilhas desde mundo terreno.

Segundo Ferrari, (2007) " a teologia da prosperidade é uma etapa avançada da secularização da ética protestante."[53] Faz também uma crítica á maneira como a Iurd prega os modos de se ascender socialmente, de acordo com Ferrari (2007) a Iurd deveria incentivar a qualificação profissional, a formação pessoal de seus membros, dado o seu poder de atingir as pessoas mais necessitadas e interessadas em obter melhores condição de vida, em vez de "incutir uma visão mágica de barganha através dos dízimos e das ofertas"[54].

O discurso da igreja universal é baseado nos anseios materiais humanos como por exemplo: " saia da miséria", tome posse da herança de Deus", "tenha uma vida em abundância," "desfrute das coisas boas que o dinheiro pode oferecer, venha para a Igreja Universal do Reino de Deus e seja uma pessoa bem sucedida."[55] Compreende-se que o discurso iurdiano é facilmente aceito entre os menos favorecidos socialmente, dada a mentalidade cada vez mais materialista propagada pela mídia.

Nestas condições, a IURD é favorecida para a consolidação do seu discurso, tanto no Brasil, como em qualquer parte do mundo, onde as desigualdades e a exclusão é predominante. O discurso iurdiano enfatiza a exclusão social, cultural e econômica, variando com ataques a outras denominações religiosas.

Nesta ideologia, sempre aparece o paralelismo de idéias sempre baseados em trechos bíblicos levando os fiéis a construir a imagem do transcendente ligado a bens e riquezas. Busca-se expressões de coragem, determinação, confiança e ação, com o objetivo de seduzir o fiel a acreditar que realmente aquela atitude é a correta e determinada pelo Sagrado, nas palavras da bíblia.

O discurso econômico iurdiano pode ser entendido como aquele baseado em trocas, no sentido que quanto mais o fiel fazer o seu investimento, mais ele receberá como o próprio Edir Macedo afirma: " Oferta é um investimento".[56] Dar uma determinada oferta, é provar que tem fé, no ato de entregar, o fiel terá o direito de cobrar de Deus aquilo que é o seu pedido.

Pode-se considerar que no discurso iurdiano existe uma mistificação que envolve o pecado, representado pela imagem do diabo, do inferno, como elemento de intimidação do fiel. Segundo Mariano, (2005),:

" para Macedo, os demônios são responsáveis por todos os males que afligem a humanidade, doenças misérias, desastres e todos os problemas". Os demônios, espíritos destruidores, estão nos germes, nos bacilos e vírus. Eles fazem da vida das pessoas o que bem entendem"[57]

Nesta perspectiva, o discurso Iurdiano, convoca as pessoas a participarem de correntes e campanhas de combate ao demônio. A figura do diabo é colocado como um adversário ativo e perigoso, e para enfrentá-lo é preciso estar preparado. Segundo Macedo sobre a figura do demônio afirma:

 

" os demônios se apossam das pessoas por participação direta ou indireta em centros espíritas, hereditariedade, trabalhos ou despachos, maldade, envolvimento com pessoas que praticam o espiritismo, comidas sacrificadas a ídolos." [58]

Neste tipo de discurso a manipulação é clara quando o objetivo é desmerecer outras práticas religiosas, tentando o predomínio da ideologia iurdiana.

Podemos considerar que a manipulação, é a forma de ação que o destinador de um discurso exerce sobre o sujeito fim de fazê-lo executar algo. Segundo Torresan (2007) existem quatro formas de manipulação que é facilmente encontrado em todos os tipos discursivos que são: manipulações por "tentações, intimidações, provocações e seduções"[59], ou pode incluir todas essas formas num único discurso.

Consideramos que a manipulação por tentação, o interlocutor expõe aspectos positivos sobre a ação do sujeito, exemplo: se você ajudar, você terá tudo em dobro. Na intimidação, os aspectos negativos é apontado, exemplo: acho melhor você fazer a vontade de Deus, o diabo está solto. Na provocação discurso aplica uma imagem negativa do interlocutor, exemplo: Você que não quer ser um pessoa derrotada, participe desta campanha. Já na sedução, o discurso é para passar uma imagem positiva de algo que o indivíduo deve realizar, exemplo: Você que é abençoado, vai abençoar a obra de Deus.

No discurso iurdiano, o uso da mistificação do demônio, é considerado como elemento de intimidação, que produz mudanças nos hábitos, temor, conversão e consequentemente produz consciência coletiva, para que os convertidos nunca abandonem as doutrinas pregadas, pois o abandono significa o castigo, o abandono de Deus, estando o corpo livre para a ação do demônio. Esta estratégia de manipulação por intimidação, é bastante usada no discurso.

Na sociedade, podemos observar que a maioria dos discursos são persuasivos, em se tratando do discurso religioso, podemos analisar que os elementos persuasivos tentação e por sedução, também se destacam no discurso iurdiano.

Em um discurso persuasivo de tentação, notamos que é quando o pastor diz: se você crer em um Deus grande, então a sua vida deve ser proporcional à sua grandeza. Nesta ideologia percebe-se que é incutido na pessoa a necessidade de agir para alcançar as bênçãos divinas. Este discurso tentador faz com que o fiel não meça esforços para colocar em prática o que lhe é pregado, que, além da conversão, pode levar o indivíduo ao fanatismo religioso.

De acordo com a ética do discurso o ato de intimidar o fiel, não combina com a sociedade pós- moderna pois o que pretendes-se com a manipulação do discurso religioso sãos os resultados em detrimento da ética, pois na verdade, a linguagem é uma forma de comunicação, está deve ser " ...apropriada ao ser, como sua expressão ou apresentação e, por isso não pode ser estabelecida arbitrariamente." Nesta perspectiva há uma ..."necessidade da crítica há linguagem, pois ela é obra humana e, enquanto tal, sujeita a erro"[60].

A linguagem expressa pelo discurso religioso como manifestação de fé, torna-se instrumento de manipulação atraindo milhares de fiéis em busca de soluções mágicas para as suas vidas. Podemos analisar as palavras de Habermas que:

"Já a teoria da ação comunicativa é uma tentativa de provar a plausalidade da idéia de que uma pessoa se socializou numa determinada língua e numa determinada forma cultural, não pode senão dedicar-se certas práticas comunicativas acedendo assim tacitamente a certos pressupostos pragmáticos presumivelmente gerais. À reconstrução do conteúdo intuitivo desses pressupostos inevitáveis da ação comunicativa cabe revelar a rede de idealizações performativas na qual os sujeitos que falam e interagem acham se envolvidos sem dela poder sair, na mesma medida em que participam das práticas culturais em questão."[61]

Para Habermas (2007), o sujeito que faz parte de um discurso, socializa-se com aquela determinada maneira de ver o mundo, dedicando, interagindo com o discurso e se envolvendo com as práticas religiosas. Este envolvimento torna-se prejudicial dependendo da maneira como esse discurso é absorvido.

A partir de Habermas, será analisado se as estratégias de persuasão da IURD contraria a ética do discurso.

Capítulo 3-

"A ética do discurso e IURD"

Segundo Habermas (2007), ética da discussão atende exigências, e estas serão analisadas com o objetivo de comparar com as características discursivas da Iurd. Nessa perspectiva a ética veio potencializar os processos de comunicação. Partindo desse pensamento temos esta como forma de definir normas para o uso do discurso.

De acordo com Habermas, a linguagem serve como garantia da democracia, e esta pressupõe a compreensão de interesses mútuos, baseados na clareza, e sem distorção de palavras, porém, comparando com o discurso da Iurd, percebe-se que neste não há garantia da democracia, porque a verdade é imposta as pessoas como verdade absoluta, as palavras são distorcidas como forma de fundamentação do discurso, e o interesse é que a pessoa faça a opção pela conversão, portanto nesse discurso não há comprovação da comunicação interativa.

A comunicação interativa é fundamentada por Habermas (2007) pela razão comunicativa, que é o alcance da interação entre pessoas para a contextualização do diálogo. Com esta fundamentação infere-se que o discurso religioso deveria ser baseado no diálogo, ou seja numa comunicação simultânea e não na imposição de supostas verdades, como faz o discurso iurdiano.

Outro critério a ser comparado com o discurso da Iurd, é o que diz Habermas ser necessário, para a ética do discurso que são: a veracidade e a sinceridade, sem procurar enganar o receptor. Análises dos discursos da Iurd provam que, no discurso há persuasão com interesses, o que para Habermas é sintetizado na frase : " Calculam, pensam no quanto vão ganhar e no quanto vão perder"[62] Esta estrutura de discurso interesseiro, com finalidade de convencer, faz a ideologia ser estratégica e persuasiva não condizente com a ética do discurso sendo contrário a ação comunicativa, que é a possível troca entre os participantes, com a finalidade democrática. Na prática todo pessoa que participa de um discurso religioso na Iurd esta sujeita a ser persuadida a tal práticas fundamentadas no próprio discurso.

Nesta perspectiva fica evidente que na Iurd, pratica-se o discurso com características persuasivas., e não a ação comunicativa que é baseada em trocas, portanto fica comprovado nesta pesquisa a evidente persuasão no discurso da Iurd.

Analisando o discurso da Iurd, percebe-se que, não há igualdade no uso da palavra, a relação de poder permite o uso do discurso apenas pelos pastores da própria Iurd. Evidentemente não caracteriza a ação comunicativa, desta maneira a não compatibilidade com a ética da discussão.

Segundo Habermas:

 

"A transição da reflexão monológica para o diálogo explica uma característica do procedimento de universalização que permaneceu implícita até o surgimento de uma nova forma de consciência histórica, na virada do século XXIII para o XIX. Quando tomamos consciência de que a história e a cultura são fontes de uma imensa variedade de formas simbólicas bem como as especificidades das identidades individuais e coletivas...[ E esta multiplicidade de perspectivas interpretativas explica por que o sentido do príncípio de universalização não esgota numa reflexão monológica...]"[63]

 

Com esta fundamentação Habermas justifica a necessidade da interação, na sua ética discursiva.

Partindo da idéia de Habermas (2007) o discurso intencional, tem finalidades, tenta-se justificar pretensões, o que na verdade difere da ação comunicativa. Analisando o discurso da Iurd, o que percebe-se, é uma tentativa de atraí as pessoas para a conversão conforme podemos observar neste discurso:

 

" Quando Deus Criou os céus e a Terra, ele criou perfeito. Tudo que Deus criou era perfeito. Agora, por que o escritor falou que a terra era sem forma e vazia? Porque depois da criação houve uma rebelião nos céus. Houve uma rebelião dos anjos[...]Quando um anjo de Luz e um terço dos anjos se rebelou contra Deus. Por que esse anjo, chamado Lúcifer, quis ser igual a Deus. Então foi expulso do Reino de Deus e se tornou o diabo, o satanás. E desde o que o diabo foi enviado à terra ela ficou sem forma e vazia. E assim é a vida do ser humano sem Deus. Assim é a pessoa sem a presença de Deus, da pessoa sem a presença de Deus." [64]

 

Segundo Almeida (2009), a partir desse texto o pastor começa a falar sobre as situações de vida que o fiel pode estar passando e da ação do diabo. Esta representa uma tentativa no discurso de intimidar o fiel para que o mesmo faça a preferência pela "conversão" . Na Iurd é comum atribuí ao diabo, a origem dos males que atingem a humanidade. Nos discursos observa-se a intenção de diagnosticar a possessão e destaca características ou sintomas mais freqüentes, que são assim enumerados: "insônia, medo, nervosismo, dores de cabeça, desmaios, freqüentes, visão de vultos, audição de vozes estranhas, vontade de suicídio, vícios, perturbações, dores não diagnosticadas pela medicina e depressão"[65]. Estes sintomas são inculcados no ouvinte do discurso, para que a pessoa sinta a necessidade da oferta religiosa da Iurd. Nessa perspectiva é que acontece no discurso terapêutico, servindo de estímulo, auto-reflexão, e através desta o indivíduo é convencido pelo discurso a aderir as práticas Iurdianas, e consequentemente há conversão, e isto percebemos no testemunho dados por membro da Iurd :

"Desde a infância, em companhia de minha avó, frequentava o candomblé, Umbanda e mesa branca.Com quatorze anos era viciada em maconha, cocaína e Crack. Na adolescência passei a me prostituir-me para comprar drogas e roupas. Tentei suicídio por diversa vezes. Conheci Senhor Jesus e tive a vida transformada."[66]

O discurso iurdiano, encontra-se em harmonia com a necessidade da jovem, que convencida, adere a Igreja universal do Reino de Deus.

Análises a partir da ética do discurso de Habermas (2007), percebe-se que esta pretensão de verdade, ao apontar sintomas de possessão, é o agir estratégico, ou seja, a busca do convencimento para que a pessoa possa agir de acordo com a verdade revelada dos atos discursivos da Iurd. Este convencimento é feito por discursos como nesse fragmento " chega de sofrer, de viver tão triste, já chega de chorar; felicidade existe."[67]

Segundo Habermas (2007), a ética do discurso também é direcionado para o que é correto ou justo, e tem como objeto o universo da moralidade. E esta moralidade no que diz respeito a ética discursiva deve ser analisada.

Será que o discurso da Iurd tem a moralidade exigida pela ética discursiva?

O que percebe-se é que segundo Habermas o discurso precisa ter a "exclusão de enganos e ilusões; e, finalmente a não-coação"[68]. Nesta perspectiva Habermas quer propor também a liberdade para o efetivo domínio de um agir comunicativo.

No discurso Iurdiano nota-se a coação, que pode ser compreendido no próprio discurso proselitista e exclusivista notado no trecho bíblico reproduzido no discurso " não é possível servir a dois senhores". Este discurso do pastor vêm sempre acompanhado da recomendação que "aquele que converte-se a Iurd, deverá permanecer tão somente nela"[69]. É com esta postura que a Iurd atraí a sua clientela e aniquila a concorrência, exigindo a exclusividade dos seus fiéis.

Na perspetiva da ética discursiva, sob o ponto de vista da liberdade como um dos fundamentos essenciais para a prova da autenticidade de uma escolha de vida, em Habermas (2002) há esta preocupação com a necessidade do ser humano ser livre e racional conforme verifica-se:

 

"A comparação com a idéia de liberdade com a suposição de racionalidade no agir comunicativo faz pouco caso ao primeiro aspecto. A racionalidade é uma obrigação. Mesmo à vista da conduta moral ou legal, a suposição da racionalidade não tem o sentido de cumprimento das normas a que a outra se sente obrigada; lhe é imputado apenas saber do que é agir autonomamente."[70]

Uma vez que na Iurd o indivíduo não têm a liberdade do agir comunicativo, os indivíduos são motivados a agirem de maneira justificada pelo discurso em que estão inseridos. E este indivíduo poderia atingir o nível ético comunicativo se: os sujeitos literalmente como falantes e destinatários, nos papéis das primeira e segunda pessoas estivessem no mesmo nível. Esta perspectiva de comunicação não acontece na Iurd, pois conforme já comprovado, no discurso religioso o autoritarismo é predominante.

No discurso segundo Habermas, existe a pretensão de verdade, e para situarmos esta afirmação dentro da pretensão a conversão, temos parte da letra de um cântico da Iurd, comprovado por um estudo etnográfico na instituição:

 

"Só Jesus nos espera ansiosos e de braços abertos. Só Jesus guiará nossos pés aos caminhos mais certos. Basta apenas você aceitar as verdades sagradas. Que estão todas na Bíblia e estão confirmadas. Só Jesus. Só Jesus. Só Jesus poderá lhe dar a mão. Só Jesus. Só Jesus. Só Jesus. Só Jesus lhe dará a salvação"[71]

Neste fragmento induz a pretensão de uma verdade religiosa. Mas segundo os critérios da ética do discurso, os proferimentos só "são verídicos quando não engana a si e outros",[72] sendo que na perspectiva religiosa não é possível prevenir a ilusão do indíviduo religioso, como também impossível medir a sua racionalidade, nem mesmo verificar a confiabilidade do discurso e a veracidade dos proferimentos. Contudo não pode ser afirmado o caráter ético discursivo em relação a pretensão de verdade religiosa do discurso iurdiano.

A ética discursiva de Habermas mantêm sua atenção direcionada, para aquilo que é direito correto e justo, sua maneira de resolver questões normativas, é baseado não por meio de violência ou pressão, da influência ou do poder dos interesses mais fortes, mas sim por meio de um acordo racionalmente aceito por todos, conforme no agir comunicativo fundamentado por Habermas:

"no agir comunicativo partimos que todos os participantes são atores capazes de se justificarem. De fato à autocompreenssão dos sujeitos agindo comunicativamente que assumam posições racionalmente motivadas para as exigências de validez; os atores supõem reciprocamente que de fato agem a partir de razões justificadas."[73]

 

Os sujeitos enquanto participantes do discurso religioso Iurdiano, agem orientados pelo entendimento de receptador, e não como participante do discurso "como falantes e destinátarios, nos papéis de primeira e segunda pessoa, no mesmo nível de olhar"[74] que é o sugerido pela ética do discurso.

No discurso da Iurd é notado a tentativa de inculcar as seguinte ideologia:

 

"Confessar nada têm a ver com pedir e suplicar a Deus, estas são atitudes reprovavéis, demontrações de pouca fé, sinais de ignorância de modo correto de como relacionar com Deus. Os cristãos em vez de implorar, devem decretar, determinar, exigir, reivindicar, em nome de Jesus, como Deus prescreverá para tomar posse da benção."[75]

Há crítica a esta ideologia iurdiana é fundamentada na "ilusão" ou seja, percebe-se uma atitude de pretensão no discurso. Não podemos discordar de que alguma maneira as pessoas sentem-se satisfeitas com algumas respostas aos seus anseios, não entraremos nesse mérito, pois o objetivo da pesquisa a analisar o caráter ético desse discurso. O que é válido ressaltar é a maneira como o discurso é direcionado as pessoas, colocando-os numa situação de decisão, ou aceita e adere ao posicionamento do discurso, ou deixa de receber as bênçãos.

A partir da ética do discurso podemos comparar com o dito de Habermas:

"que esses tais jogos de linguagem normativos de suas asserções, os atores se relacionam sobre o conteúdo afirmativo e de suas asserções, também naturalmente com algo do mundo objetivo, mas apenas de um modo acidental. Mencionam circunstâncias e as condições de sucesso das ações que exigem, solicitam, aconselham, censuram, desculpam, prometem, etc."[76]

 

Segundo Habermas (2002), este tipo de discurso gera uma relação legitima, ao mesmo tempo que induz o ouvinte a contrair obrigações. Sendo que a ética discursiva propõe que:

"...a aceitabilidade racional das expressões correspondentes se fundamenta na capacidade de convencimento dos melhores argumentos. Por isso, aquele argumento que convence não decide juízos particulares, porém aqueles enfeixados no consentimento racionalmente motivado da tomada de posição de todos que participam na prática pública da permuta dos fundamentos."[77]

A partir dessa fundamentação, Habermas (2002) coloca que a comunicação "deve está livre de restrições, que impedem que o melhor argumento venha a tona,"[78] com isso, podemos perceber a incompatibilidade do proposto acima, com o discurso Iurdiano, no qual, não é dado direitos comunicativos iguais, existe a presença de coação e ilusões.

Observa-se na construção discursiva do Bispo Macedo:

"Fé é a certeza de que Deus vai fazer aquilo que prometeu. Quando as pessoas estão procurando os benefícios da fé como a cura divina, a libertação dos males espirituais, a reconstrução dos seus lares e a constituição de suas famílias, na maioria das vezes elas esquecem do Reino de Deus. Querem os benefícios, mas em contrapartida, não querem se comprometer com o Seu Reino. [...] É a partir da entrega pessoal, sem restrição e de forma incondicional para o Senhor Jesus, que a pessoa toma posse do Seu Reino, de todos os benefícios."[79]

O discurso do Bispo é analisado na seguinte perspectiva: "geralmente acreditam no que dizem e nas consequências de que suas asserções não serão refutadas."[80] Neste tipo discursivo a persuasão é premeditada, tem-se a pretensão de obter benefícios, como por exemplo: a "conversão" do ouvinte ou apenas a adesão às práticas religiosas daquele determinado momento.

Nota-se no discurso do Bispo Edir Macedo, a evidência da persuasão no discurso, na verdade é o que Citelli (1985), revela como " discursos autoritários persuasivos que podem vir a revelar a voz do sujeito falante, nele apenas a noção de dogma"[81]. Diante desta teoria, tem-se que:

"enquanto no discurso dos homens se abre a possibilidade de ocorrer uma reversão no processo comunicativo ( emissores e receptores podem interagir) no discurso religioso tal procedimento torna –se impossível. Interagir com quem?"[82]

Esta forma em que é construído o discurso religioso, impede que este seja transformado no agir comunicativo que segundo habermas é a teoria da interação:

" ...teoría de la acción comunicativa concede a la legalidad propria de la interaccion socializadora la importancia que merece, así también com su distinción entre dos tipos contrarios de medios de comunicación nos capacita y sensibiliza para percibir el valente potencial de la comunicación de masas."[83]

Temos: a teoria da ação comunicativa concede a própria legalidade da interação socializada a importância que merece, assim também como as sua distinção entre os dois tipos contrários e médios de comunicação que capacita e sensibiliza para perceber o grande potencial da comunicação de massa.

Temos na própria obra de Habermas (2003), o reconhecimento da necessidade da interação e socialização, portanto, temos a prova que não é condizente com o discurso religioso Iurdiano.

Segundo Citelli, (1985), existem vários mecanismos em que podem ser encontrados a persuasão em um discurso religioso entre outros tem-se:

" uso do modo imperativo, o que revela a idéia de coisa acabada; o vocativo sujacente ( creio) que afirma o chamamento do sujeito; a função emotiva ( afinal eu devo acreditar ter fé. O problema da salvação está comigo, o Senhor é exemplo a ser seguido); o uso de metáforas que acentuam o ciframento do discurso religioso: a mansão dos mortos e o ressurgimento de todos só criam um jogo simbólico acerca do inusitado dogma; o uso intenso de parábolas e da paráfrase; de um lado a evocação alegórica, e, do outro, a presença do texto bíblico; o uso de estereótipos e chavões que possuem força daquilo Umberto Eco chama de sintagmas cristalizados: "Oh! Senhor," "Todo poderoso", "Criador", "nosso Senhor" etc."[84]

No discurso Iurdiano percebe-se essa relação expressada por Citelli (1985), e para comprovar esta afirmativa observa-se neste discurso do Bispo Macedo:

".Dái e vós será dado" é a promessa que garante que o Senhor lhe devolverá multiplicado. No entanto, Ele não precisa de oferta. A verdade é que a oferta serve para abençoar o ofertante e não para ajudar a igreja."..[..] "Quem crer não tem medo de dar. Fé é coragem. Quem crer, dá tudo, e quem não crê, põe um pé na frente e fica com o outro atrás."[85]

Deus abençõe a todos.

A partir da ética discursiva, podemos comprovar que o discurso iurdiano é baseado no pragmatismo, pois conforme a ideologia acima, o ato de ofertar serve como garantia de receber, e só recebe aquele que não tem medo, ou seja, o corajoso, possuidor da fé.

Em outro discurso é dado a ênfase no dogma da fé. Observe a construção desse ato discursivo do Bispo Macedo:

" Quando há uma fé, uma certeza, você não tem que perguntar a nínguém. É Deus que colocou no seu coração, vá na sua fé. Isso é um segredo. Os filhos das trevas, ás vezes usam isso e tomam posse das coisas grandes porque são decididos. Se não der certo, eles começam novamente, mas vão em frente, enquanto os filhos da luz ficam perguntando a terceiros."[86] Jornal folha Universal. A opinião definida.Ed.933, p.3i. 21 fev.2010.

Nesta perspectiva podemos considerar que é através da manipulação de um discurso baseado nos anseios dos ouvintes que o toda a ideologia iurdiana é aceita, sem a devida ètica discursiva proposta por Habermas. E por ser baseado na fé, esta é subjetiva e estritamente pessoal, mas que pode ter efeito coletivo, pois, segundo Siebeneichler, (2003), Habermas entende que a comunicação constitui sempre uma ação social. Nesta perspectiva podemos concluir que o discurso iurdiano, não é devidamente efetivado na prática da ação comunicativa. Os sujeitos ouvintes da ideologia iurdiana seguem o princípio da suposta eficácia, pelo convencimento, e não pelo processo comunicativo fundamentado pela ètica do discurso de Habermas.

Referências Bibliográficas:

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CAMPOS, L. S. Teatro, templo e mercado. 2ª Ed. Petrópolis: Vozes, 1997.

Dedico este trabalho a meu pai Dário Costa (in memorian), a minha mãe Rosângela pelo amor incondicional, e ao meu irmão Sérgio pela força e companheirismo.

AGRADECIMENTOS

Agradeço pela minha inspiração, a fonte sobrenatural de sabedoria, que põe fim às dificuldades. Ao meu orientador prof. Ms Wagner Rocha, pela paciência, por transmitir confiança e companheirismo. Agradeço a minha mãe por acreditar sempre no meu sucesso, a minha avó pelos ensinamentos na adolescência e que merece todo o meu carinho, todos os meus colegas pela amizade, por compartilhamos experiências, em especial Angela, Regina, André, Ana Maria e Wênia pela ajuda e cumplicidade.

A todos vocês o meu carinho e eterno muito obrigado!

 

Autor:

Paulo Cesar Costa Silva

pcsilva-costa[arroba]hotmail.com

Orientador:

Prof. Ms. Antônio Wagner Rocha

Trabalho de conclusão de curso – TCC - apresentada ao Departamento de Filosofia /Ciências da Religião da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes – como requisito para obtenção de título de Licenciatura plena em Ciências da Religião.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS – UNIMONTES

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS-CCH

DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA/ CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

MONTES CLAROS – MG

JULHO/2010


[1] Friedrich Wilhelm Joseph Von Schelling (1775-1884). Foi um filósofo Alemão, um dos representantes do idealismo alemão, assim como Fichte e Hegel.

[2] Cognoscente ( que possui a capacidade de conhecer, indivíduo capaz de adquirir conhecimento).

[3] Cognoscível ( o que é passível de ser conhecido). http://www.dicionarioinformal.com.br/buscar.php?palavra=cognoscente

[4] Sistema de filosofia com ênfase intuitivo e espiritual, acima do material.

[5] OLIVEIRA, 2006, p. 293, 294.

[6] OLIVEIRA, 2006, p.294.

[7] OLIVEIRA, 2006, p.296

[8] OLIVEIRA, 2006, p.297

[9] HABERMAS Apud OLIVEIRA, 2006 p.298.

[10] HABERMAS Apud OLIVEIRA, 2006 p.298,299.

[11] OLIVEIRA, 2006, p. 303

[12] OLIVEIRA, 2006, p. 305

[13] HABERMAS, Apud OLIVEIRA, 2006, p.307.

[14] HABERMAS Apud OLIVEIRA, 2006, p.310

[15] OLIVEIRA, 2006, p.315

[16] HABERMAS, apud Oliveira, 2006, p.316.

[17] OLIVEIRA, 2006, p.317

[18] HABERMAS, 2007 p.9.

[19] HABERMAS, 2007 p.15-16.

[20] HABERMAS, 2007 p. 67.

[21] HABERMAS, 2007 p.10.

[22] HABERMAS, 2007 p.10.

[23] HABERMAS, 2007 p.15,16.

[24] HABERMAS, 2007, p.63.

[25] HABERMAS, 2003, p. 81

[26] HABERMAS, 2003, p. 82.

[27] HABERMAS, 2003, p.82, 83.

[28] HABERMAS, 2003, p. 84.

[29] HABERMAS, 2003, p. 148.

[30] HABERMAS, 2003, p.88.

[31] HABERMAS, 2003 p.88

[32] HABERMAS, 2003 p.112.

[33] MARIANO, 1999, p. 55

[34] FERRARI, 2007, p. 104

[35] CARDOSO, Wellington de Olivera. A iurd no Brasil: O discurso legitimador do Bispo Edir Macedo. Goiânia, monografia, UCG, 2004, p. 13.

[36] MARIANO, 2005, p.33.

[37] MARIANO apud Bittencourt, 1991, p.34.

[38] MARIANO, 2005, p. 109.

[39] FERRARI, 2007 p. 86.

[40] MARIANO, 2005, p.64.

[41] MARIANO, 2005, p.66.

[42] Jornal folha Universal. A presença da Record, n° 943, p. 16i de 02 de Maio 2010.

[43] Jornal folha Universal. A presença da Record, n° 943, p. 9 de 02 de Maio 2010.

[44] Rede Record. Discurso do Bispo Macedo, 20/03/10.

[45] CITELLI, 1997, p.48.

[46] SILVA, 2004 p.20.

[47] FOUCAULT, 2009 p.10.

[48] FOUCAULT, 2009 p.39.

[49] SILVA, 2004, p.19.

[50] MARIANO, 2005 p.156 e157.

[51] TAVOLARO, 2007 p.207.

[52] MARIANO, 2005 p.160.

[53] FERRARI, 2007, p.93.

[54] FERRARI, 2007 p.94.

[55] GONÇALVES. Mercantilizarão, política e religião: Igreja universal do reino de Deus em perspectiva.

[56] TAVOLARO, 2007, p. 207.

[57] MARIANO, 2005 p. 114.

[58] MARIANO, 2005 p.115.

[59] TORRESAN, J. L. A manipulação no discurso religioso, Dialogia, São Paulo, v.6, p.99, 2007.

[60] OLIVEIRA, 2006 p.21.

[61] HABERMAS, 2007 p.20.

[62] HABERMAS, 2007, p.39

[63] HABERMAS, 2007, p.09.

[64] ALMEIDA, 2009, p. 78.

[65] ALMEIDA 2009 p.81 e 82.

[66] ALMEIDA, 2009 p. 67.

[67] ALMEIDA, 2009 p.78.

[68] HABERMAS, 2002, p.20.

[69] ALMEIDA, 2009, p.118.

[70] HABERMAS, 2002, p. 50.

[71] ALMEIDA, 2009 p.75.

[72] OLIVEIRA, 2006, p. 315.

[73] HABERMAS, 2002 p.51.

[74] HABERMAS, 2002 p. 53.

[75] CARDOSO, 2004 p. 10.

[76] HABERMAS, 2002 p.61.

[77] HABERMAS, 2002 p.66.

[78] HABERMAS, 2002, p.67.

[79] Folha Universal. Priorize o Reino de Deus. ed. 939, p. 3i. abril, 2010.

[80] HABERMAS, 2002, p.79.

[81] CITELLI, 1985p. 48.

[82] CITELLI, 1985 p. 49.

[83] HABERMAS, 2003, p. 551. Teoría de la accíon comunicativa, II .

[84] CITELLI, 1985, p. 52.

[85] Jornal.Folha Universal. A oferta abençoa o ofertante. Ed. 918, p 3i, 08 novembro 2009.

[86] Jornal folha Universal. A opinião definida.Ed.933, p.3i. 21 fev.2010.



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