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Proposta para a recuperação e viabilidade da produção de aguardente de Medronho na Serra Algarvia (página 2)


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Fig. 3 – Área ardida que estava ocupada com medronhal

Relativamente a esta vertente - recuperação das áreas ardidas - foi já apresentada uma proposta por parte da Apagarbe-Associação de Produtores de Medronho do Barlavento Algarvio (vide anexos) no sentido de que esta recuperação se faça mediante a concessão de apoios às operações de limpeza, replantação, prevendo-se a construção de aceiros, onde tal fôr possível, com impacto na prevenção de novos incêndios, operações de limpeza de mato e melhoria nas condições de recolha do fruto.

A PROBLEMÁTICA DA LEGALIZAÇAO DAS UNIDADES DE PRODUÇAO DE AGUARDENTE DE MEDRONHO

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Fig. 4 – Destilaria artesanal de aguardente de medronho na serra algarvia

Relativamente a esta vertente - legalização das unidades de produção - a legislação que estabelece as normas disciplinadoras do exercício da actividade industrial - Decreto-Lei n.º 69/2003 de 10 de Abril e subsequente regulamentação - permite que sejam as câmaras municipais, das respectivas áreas de localização, as entidades coordenadoras para o caso das unidades de produção de tipo 4., onde se inserem as destilarias de medronho tradicionais da serra algarvia (n.º 3 do artigo 11.º do DL 69/2003), competindo-lhe a fiscalização do cumprimento das disposições legais e regulamentares sobre o exercício da actividade industrial. No entanto, de acordo com o artigo 32.º do DL em referência

"O exercício de quaisquer actividades industriais poderá ser objecto de regulamentação específica, contendo as prescrições técnicas e demais condicionalismos, de acordo com a sua natureza e riscos próprios".

Por outro lado, de acordo com o artigo 33.º deste mesmo DL, no seu número 1:

"Os estabelecimentos industriais existentes à data de aplicação do presente diploma sem licença de exploração industrial ou cujo processo de licenciamento não tenha tido seguimento por razões de localização devem regularizar a sua situação no prazo de dois anos a contar da data de entrada em vigor do presente diploma, nos termos previstos em diploma regulamentar."

Já durante o processo de licenciamento, de acordo com o Decreto Regulamentar n.º 8/2003, de 11 de Abril, artigo 9.º, n.º 4

"Sempre que à câmara municipal ocorram dúvidas quanto ao enquadramento de um estabelecimento industrial no tipo 4, esta solicita parecer aos serviços regionais competentes do Ministério da Economia ou do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, consoante os casos, os quais se devem pronunciar no prazo de 10 dias úteis."

Por outro lado, o ponto 5 do artigo 10.º daquele DR permite ainda que

"nos processos de licenciamento dos estabelecimentos industriais dos tipos 3 e 4 fica ao critério da entidade coordenadora a consulta das entidades no n.º4 deste artigo", que são a Direcção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território, para efeitos de qualquer parecer ambiental ou de licença ambiental, o centro regional de saúde pública e o serviço regional da Inspecção Geral do trabalho.

Por último, a Portaria n.º 474/2003, de 11 de Junho, no seu artigo 1.º vem definir que

"No caso de autorização do estabelecimento industrial a conceder por câmara municipal, o respectivo pedido é apresentado, em triplicado, na entidade coordenadora do licenciamento industrial e dirigido à câmara municipal competente (...)".

Tomando como base o definido pelo artigo 32.º do DL 63/2003 em que

"O exercício de quaisquer actividades industriais poderá ser objecto de regulamentação específica, contendo as prescrições técnicas e demais condicionalismos, de acordo com a sua natureza e riscos próprios",

propomos assim que esta actividade

Passe a ser objecto de uma regulamentação, que do ponto de vista do seu licenciamento e do pagamento do imposto especial sobre o consumo, assegure a sua viabilidade, atendendo às condições e particularidades regionais em que é obtida, prevendo-se a sua desclassificação da nomenclatura das actividades industriais, já que é obtida em contexto de explorações agro-florestais que utilizam a matéria-prima da própria exploração e incorporam elevados índices de mão-de-obra, com recurso a tecnologia rudimentar.

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Fig. 5 – Tecnologia rudimentar de destilação de aguardente de medronho

3. A INCIDÊNCIA DO REGIME DOS IMPOSTOS ESPECIAIS SOBRE O CONSUMO NA PRODUÇAO E COMERCIALIZAÇAO DE AGUARDENTE DE MEDRONHO

nomeadamente o Imposto Especial sobre o Consumo de

Bebidas Espirituosas, definido pelas directivas comunitárias 92/83/CEE e

92/84/CEE, do Conselho, de 25 de Fevereiro e de 19 de Outubro de 1992

Na vertente da incidência do regime dos impostos especiais sobre o consumo na produção e comercialização de aguardente de medronho, verificamos que a actividade está ao abrigo do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo, constante do Decreto-Lei n.º 566/99 de 22 de Dezembro, nomeadamente no que se refere à sua produção e armazenagem superiores a 10 litros (base para a presunção de fins comerciais), podendo ser solicitada a suspensão do imposto, referindo o legislador que (artigo 21.º)

"1- A produção, transformação e armazenagem de produtos sujeitos a imposto, em regime de suspensão, apenas podem ser efectuados em entreposto fiscal mediante autorização e sob controlo da estância aduaneira competente."

Tal suspensão confere ao produtor ou armazenista titular de um entreposto fiscal o estatuto de depositário autorizado. Já quanto à circulação deste produto em regime de suspensão esta apenas poderá efectuar-se entre entrepostos fiscais.

A aplicação do imposto sobre o álcool e as bebidas espirituosas beneficia de uma isenção ao abrigo do artigo 49.º, no seu n.º 2, em que se estipula que

"Beneficia ainda da isenção do imposto a aguardente produzida em qualquer destilaria, aprovada como entreposto fiscal, até ao limite de 30 l de produto acabado, por ano e por produtor, destinada ao seu consumo e dos membros da sua família ou dos seus convidados, desde que não seja objecto de venda."

O artigo 57.º define, por sua vez, que

"1-A unidade tributável das bebidas espirituosas é constituida pelo hectolitro de álcool contido, na base de 100% de volume, à temperatura de 20 º C.

2 - A taxa do imposto aplicável às bebidas espirituosas é de 163 200$00 por hectolitro."

O regime especial da pequena destilaria consta do artigo 60.º e

"pode ser concedido pelo director da alfândega respectiva a empresas, inscritas como destilarias no organismo competente do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, que detenham um único entreposto fiscal de produção de bebidas espirituosas e que, simultaneamente:

a) Produzam por ano até ao máximo de 10 hl de álcool puro incorporado em bebidas espirituosas;

b) Sejam jurídica, económica e contabilisticamente independentes de outras empresas ou destilarias;

c) Não operem sob licença ou por conta de outrem."

Apreciadas estas três vertentes, à luz da garantia de uma recuperação das áreas de medronhal ardidas e da sua viabilidade para a produção e comercialização de aguardente de medronho, podemos constatar que, a se direccionarem apoios para a limpeza e recuperação e a legalização das unidades produtivas a ser coordenada pelas câmaras municipais, tal não constituirá um entrave de monta para a sua viabilidade.

No entanto, é sobre a terceira vertente - o montante do imposto especial a pagar - que se torna necessário actuar por forma a não se onerar de tal modo os custos com a produção e comércio que possa assim ser inviabilizada a sua continuidade.

Neste ponto em particular somos de parecer e propomos que:

1. Se tenha em consideração que, tendo as áreas ardidas de medronhal, significando uma quebra que se estima em 70% da área de produção nesta sub-região, calculada em cerca de 2000 hectares, da qual apenas cerca de 40% estaria a produzir efectivamente;

2. Se tenha em consideração o regime de exploração em que a mesma decorre, em contexto de uma economia agrícola agro-florestal, de pequena dimensão, funcionando como complemento e subsidiária dos rendimentos da exploração, contribuindo para a multifuncionalidade dos espaços rurais, quer através das mais valias ambientais, da paisagem e da conservação dos solos, a par da defesa de uma produção típica da região, realizada num ambiente de práticas sociais e culturais que urge preservar a todo o custo.

De facto, o medronheiro, além de ser um ex-libris da serra algarvia, de relevante importância ecológica e ambiental, é um recurso endógeno que, pelo potencial que apresenta, em várias vertentes, e pelo decréscimo e abandono a que foi votado,

requere que se defina um quadro integrado de protecção, por forma a que se viabilize o seu aproveitamento futuro. Apontam-se quatro vertentes do seu potencial que justificam esta necessidade: ecológica, ornamental e energética, doçaria e bebidas e recurso turístico-cultural.

A espécie arbustiva Arbutus Unedo L., conhecida por medronheiro, é, em primeiro lugar, um ex-libris da flora natural e espontânea da Serra Algarvia, que urge defender e proteger como símbolo do seu equilíbrio ecológico.

De acordo com os dados obtidos através da Carta Agrícola e Florestal de 1957, do Inventário Florestal de 1973 e do Relatório de Avaliação Cadastral de 1985 do Eng.º Marques Tapum (1985), relativamente a Monchique, podemos traçar o seguinte quadro de evolução das áreas de medronhal no Algarve:

. em 1957 – Monchique - apresentava a maior mancha de medronhal a Sul do país – cerca de 10 700 Ha (21% da área deste Concelho).

Posteriormente, já

. Em 1973, esta área havia baixado para cerca de 7 600 Ha, e

. Em 1985, a área de medronhal havia baixado para 5 300 Ha (agora 13,6 % da área do Concelho).

Estima-se, pelo volume de investimentos noutras espécies florestais, que têm vindo a realizar-se nos últimos anos, que esta área possa, actualmente, estar reduzida a menos de 40% da verificada em 1985.

Tomando ainda como referência as fontes mencionadas, seguem-se como as mais significativas as áreas dos concelhos de Silves e de Aljezur.

. em 1957 – Silves – apresentava uma área de cerca de 2 750 ha e

. Aljezur – uma área aproximada de 1 000 Ha nesta data.

Seguem-se, para esta data, os concelhos de Portimão com cerca de 500 Ha e Loulé com cerca de 250 Ha. Os concelhos de Tavira e São Brás de Alportel apresentavam-se com idêntica área de medronhal (cerca de 250 ha em 1957).

Dados mais recentes permitem verificar que mesmo os concelhos limítrofes do Algarve, pertecentes ao Baixo Alentejo, apresentavam em 1971 as seguintes áreas de medronhal:

. Almodôvar – 793 Ha;

. Odemira – 603 Ha;

. Ourique – 89 Ha.

Desta análise, concluímos que, é essencialmente na área ecológica da Serra de Monchique, Espinhaço do Cão e Caldeirão, que o medronhal se encontra com maior densidade, encontrando aí as melhores condições culturais de solos e clima, próprios à sua propagação e consequente aproveitamento económico, tal como atesta Tapum (!985).

No entanto, também em todos estes concelhos, as áreas de medronhal reduziram-se substancialmente até aos dias de hoje, restando, na maioria dos casos, menos de metade do que existia naquela data.

Sendo a produção de aguardente de medronho altamente exigente em mão-de-obra, verificamos que o progressivo abandono da Serra Algarvia, ocorrido desde a década de sessenta, com o consequente encarecimento da mão-de-obra, baixo preço da aguardente de medronho, novos hábitos e modas de consumo de bebidas introduzidos pelo fenómeno turístico, a par dos incentivos ao investimento florestal entretanto disponíveis, conduziram a que o aproveitamento do medronhal não tivesse mais interesse como complemento ou actividade principal das explorações agro-florestais serranas, passando esta a ser a actividade florestal.

A par da substituição progressiva das áreas de medronhal pelas áreas de eucalipto, a única forma emergente de rentabilizar devidamente as explorações, entretanto desertificadas de mão-de-obra barata, iremos então assistir a um aumento gradual do preço da aguardente de medronho junto do produtor.

A recolha de dados junto dos produtores de Monchique permite traçar a seguinte evolução dos preços:

. em 1950 – 2$50 por litro;

. em 1960 – 10$00 por litro;

. em 1975 – 75$00 por litro;

. em 1980 – 300$00 por litro;

. Em 1990 – 1 000$00 por litro;

. Em 1995 – 2 000$00 por litro;

. Em 2000 – 3 000$00 por litro.

Mas, para além do abandono da Serra Algarvia por parte da sua população,

verificamos também que a partir da década de setenta, a obrigação do engarrafamento e rotulagem de bebidas espirituosas, como a aguardente de medronho, que era até então comercializada a granel, bem como a recente incidência do imposto sobre o consumo de bebidas alcoólicas, vieram contribuir para o encarecer desta bebida e levaram ao desincentivo da maior parte dos produtores, dado tratar-se esta, de uma actividade sazonal, já com elevada incorporação de trabalho.

Actualmente, tendo em consideração os custos associados à sua produção e comércio, só a sua exploração a uma escala semi-industrial e completamente industrializada permitiria que se obtivessem economias de escala. Mas esta será uma solução que passará à margem dos produtores e da exploração tradicional de aguardente de medronho, desde sempre realizada com recurso a pouca tecnologia e inovação.

Encontramo-nos, assim, numa fase em que urge responder se interessa ou não preservar esse potencial, em moldes tradicionais.

Se atendermos à importância social, económica e cultural da produção realizada em moldes tradicionais, chegar-se-á à conclusão de que esta produção necessitará de um conjunto integrado de medidas de protecção e defesa de uma potencial fileira do medronho, o que vai desde a planta em si até às suas múltiplas formas de aproveitamento.

Caso se atendesse apenas à sua importância meramente económica as áreas de medronhal a recuperar e novas áreas a plantar necessitariam de elevados investimentos para que se tornasse mais rentável a sua exploração industrial, com circuitos de apanha de acesso fácil e uma tecnologia de fabrico e embalagem que incorporasse o mínimo de trabalho.

A nossa proposta, e da Associação dos Produtores de Aguardente de Medronho do Barlavento Algarvio, é a de que, urge defender não só o recurso natural e ambiental Arbutus Unedo L., como a sua vertente de aproveitamento económico, diversificando-a, com base no seu aproveitamento tradicional.

Apontam-se naquele sentido um conjunto de quatro vertentes de valorização deste recurso, demonstradas em doze vias do seu potencial:

I.VERTENTE ECOLÓGICA

1. O medronheiro é uma espécie arbustiva indígena da Serra Algarvia, em perfeito equilíbrio ecológico com as restantes espécies vegetativas, podendo ser considerado um ex-libris da serra algarvia, a par com a alfarrobeira, a amendoeira ou a figueira.

2. O medronheiro contribui, pelo seu enraizamento superficial e pouco profundo, para preservação das camadas aráveis do solo, pelo seu poderoso efeito de suporte.

3. A floração do medronheiro, que ocorre a partir de Outubro, prolongando-se até Dezembro, é uma excelente fonte de alimento para as abelhas, e a principal durante os meses de Inverno, em que são muito escassas outras florações, sabendo-se como são fundamentais as abelhas para a polinização, que se realizará mais tarde.

4. Acrescente-se ainda o valor biológico do Mel Amargo de Medronheiro, com crescente procura em vários países europeus, nomeadamente a Alemanha.

II.VERTENTE ORNAMENTAL E ENERGÉTICA

5. As ramagens dos medronheiros jovens apresentam grande valor ornamental e decorativo, sobretudo para arranjos domésticos e decorativos diversos. Estas ramagens conservam-se viçosas durante vários dias e a sua exploração tem vindo a fazer-se já numa escala apreciável por toda a serra algarvia, não pelos seus proprietários, mas por particulares, que comercializam este recurso nos mercados abastecedores nacionais e inclusive estrangeiros (Holanda, por exemplo).

6. A madeira de medronheiro é excelente para ser esculpida e trabalhada artística e utilitariamente. Verificamos que os artesãos agricultores, e outros, obtêm vários utensílios para fins ornamentais e utilitários a partir das cepas do medronheiro.

7. A madeira de medronheiro é ainda uma excelente fonte de energia calorífica. Durante longa data foi aproveitada para o fabrico de carvão na serra algarvia, um recurso que se apresenta ainda com viabilidade de ser explorado.

III VERTENTE DA DOÇARIA E BEBIDAS

8. O fruto do medronheiro, depois de amadurecido, é comestível, alimentando toda a espécie de pássaros durante a época de Inverno. Este fruto amadurecido é aproveitável para a confecção de compotas.

9. O fruto do medronheiro, depois de fermentado, é matéria-prima para a obtenção da aguardente de medronho, ou medronheira, por destilação, podendo constituir-se num valioso recurso económico local para os produtores agro-florestais.

10. A aguardente de medronho serve de base a inúmeros licores de frutos e de ervas aromáticas ou medicinais por toda a serra algarvia.

IV. VERTENTE TURÍSTICA E CULTURAL

11. A "fileira do medronhal", assente nas destilarias tradicionais de carácter artesanal, aliadas à gastronomia, bem que podem constituir-se como pólo de animação a visitas turísticas, com base em roteiros pré-definidos e articulados com os produtores e restaurantes sob a forma de ROTAS do MEDRONHO.

12. A produção de aguardente de medronho, por via dos saberes empíricos, transmitidos de geração em geração e o recurso a uma tecnologia rudimentar, bem que pode constituir um elemento cultural importante a observar nas comunidades serranas algarvias.

A aguardente de medronho sempre funcionou na serra algarvia como uma manifestação da arte de bem receber oferecendo-se, no meio rural, um copo de medronho a um visitante, familiar ou amigo.

Conhecem-se também utilizações da aguardente de medronho como base de panaceias para alívio de reumático, dores musculares, etc.

Sendo, assim, a aguardente de medronho a produção que justifica a manutenção e conservação das áreas de medronhal, e pelos contributos que as mesmas proporcionam e tendo em conta o seu potencial de aproveitamento, somos de parecer que esta produção deverá passar a estar isenta do Imposto Especial sobre o Consumo de Bebidas Espirituosas, criando-se um

Regime Fiscal Especial de Isenção

para esta produção e comércio, que contemple:

I. As unidades produtivas até 300 litros de produção anual com isenção total do imposto - adopção de um

Regime de Destilaria de Quinta

O regime a designar por Destilaria de Quinta (Carvalho, 1992) pressupõe que se tenha em consideração de que estamos perante um

produto tradicional, fabricado em pequena escala, sazonalmente, isto é, apenas num determinado período do ano (que decorre de Janeiro a Março, em geral) e que resulta do aproveitamento de uma matéria-prima em contexto de uma exploração agrícola multifuncional, com produção de excedentes para venda, em que a produção de aguardente de medronho não constitui o seu objecto principal, fazendo parte de um conjunto de pluriactividades.

Trata-se, por outro lado, de um regionalismo, geograficamente localizado, mediante utilização de baixa tecnologia, em que os stocks são limitados ou inexistentes, com um mercado não convencional.

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Fig. 6 – Exploração agrícola multifuncional com produção

de excedentes

É ainda de considerar que se trata de um produto com elevada incorporação de trabalho e que não faz, por norma, concorrência, com os produtos industriais da mesma classe, ocupando um nicho próprio e insubstituível no mercado de consumo.

"Este tipo de produtos, quando corresponde a autêntica qualidade, tem especial interesse se pretende valorizar as actividades rurais e agrárias, directa e indirectamente, pela massa das mais valias arrecadadas nas vendas e pela atracção que este tipo de produtos exerce no turismo local"(Carvalho, 1992).

A definição de produto de "tecnologia caseira", por oposição a produto de "tecnologia industrial", e a definição de "produto de quinta", aplicam-se inteiramente a esta escala de produção até aos 300 litros anuais de aguardente de medronho.

Os "produtos de tecnologia caseira" identificam-se por serem

"produtos resultantes de transformações não industriais, de pequena escala, produzidos em unidades que, em geral, recorrem pouco ao trabalho assalariado e utilizam instalações e equipamentos simples. São produtos em que a transformação é feita por artesãos ou por agricultores em que as matérias-primas se mantêm intactas e com origem identificável." (Carvalho, 1992).

Os "produtos de quinta", por sua vez,

"são produtos produzidos e transformados nas explorações, admitindo-se, todavia, que haja incorporação de matérias-primas oriundas do exterior. Os PQ podem ser produzidos em explorações familiares (em pequena escala, portanto) ou noutros tipos de exploração, podendo atingir, então, escala industrial." (Carvalho, 1992).

Tratam-se, por outro lado, de produtos que não concorrem, de modo algum, com os produtos industriais de larga escala, admitindo-se, contudo, que

"A competição com "a indústria" existe na medida em que esta procura, frequentemente, a imitação deste nível de qualidade que, na grande maioria dos casos, só em pequena escala se consegue atingir. Na verdade, tem sido a inexistência de um quadro legal para este nicho de qualidade que tem permitido a alguns irem iludindo o consumidor, que sempre continua na eterna e vã procura do "caseiro" e do "genuíno", a baixo preço." (Carvalho, 1992).

São, por outro lado, produtos vocacionados para a venda directa, que se relacionam com as comunidades locais, suas culturas e tradições (Carvalho, 1992).

Nesta acepção de produtos artesanais e de quinta, com recurso a tecnologia caseira, verifica-se, no entanto, que as disposições legais adoptadas, como é o caso da incidência do Imposto Especial sobre o Consumo de Bebidas Espirituosas, bem a sua obrigatoriedade de licenciamento e de engarrafamento, dificultam ou impedem, em

grande parte, as soluções de pequena escala, com elevada incorporação de mão-de-obra e recurso a baixa tecnologia.

Propomos, assim, que as produções anuais até 500 litros, com vista a proteger este tipo de produto e a não se onerar excessivamente a sua produção, reduzindo-lhes a sua capacidade de penetração nos mercados, passem a estar isentos do referido imposto especial sobre o consumo na medida em que:

. Não concorrem, de modo algum, com os produtos de tecnologia industrial do mesmo sector (bebidas espirituosas) não afectando o seu mercado de larga escala;

. A sua produção se faz no contexto de uma exploração agro-florestal que, pela sua multifuncionalidade, contribui, de modo relevante, para a prestação de serviços à colectividade, como sejam os da preservação ecológica e ambiental, da paisagem e garantem a identidade biofísica das regiões, visto relacionar-se com a comunidade local, suas culturas e tradições;

. Esta será uma via para compensar o agricultor produtor agro-florestal pelos serviços prestados à colectividade.

Já numa segunda vertente desta isenção propomos que seja adoptada uma redução do referido imposto para

II. As unidades produtivas de produção superior a 300 litros até 2000 litros com pagamento do imposto apenas em 75% do montante conjugado com a redução de 50% do Regime da Pequena Destilaria

Trata-se, essencialmente de, pelas mesmas características apresentadas, se exigir para esta produção um tratamento de equidade e de igualdade de oportunidades e tratamento fiscal face a produtos de natureza idêntica produzidos nos arquipélagos da Madeira e dos Açores.

De facto, a Decisão do Conselho de Ministros da UE de 18 de Fevereiro de 2002 refere que para o rum e os licores produzidos e consumidos na Madeira, e nos Açores, para os licores e aguardentes aí produzidos, é necessária a aplicação de uma taxa reduzida do imposto especial de consumo, o que é considerado indispensável para a sobrevivência dos sectores de actividade locais ligados à produção e comercialização das referidas bebidas.

Refere ainda o preâmbulo desta decisão que

"Com efeito, atendendo aos elevados de produção dessas actividades, resultantes sobretudo de situações que se prendem com a insularidade, tais como as reduzidas dimensões das explorações, as pequenas quantidades produzidas, o afastamento, a descontinuidade geográfica e as limitações do mercado local, só uma redução da carga fiscal aplicada ao rum, aos licores e às aguardentes produzidos nessas ilhas e vendidos praticamente apenas nos respectivos mercados locais poderá permitir restabelecer a posição concorrencial desses produtos relativamente às bebidas espirituosas semelhantes importadas ou fornecidas a partir do resto da Comunidade e, consequentemente, assegurar a perenidade dos sectores de actividade em questão."

Tratando-se da necessidade de conferir capacidade concorrencial face a produtos do mesmo sector mas que têm um mercado mundial de larga escala, como é o caso específico dos wiskies, a Decisão do Conselho reconhece assim que

"Neste caso, para restabelecer a posição concorrencial é necessária uma redução da carga fiscal que permita compensar, para as bebidas espirituosas produzidas nas regiões autónomas da Madeira e dos Açores, as desvantagens concorrenciais que resultam dos custos de produção e de comercialização mais elevados nessas regiões."

Este quadro de análise aplica-se, como é do conhecimento geral, integralmente à região serrana do Algarve onde se produz aguardente de medronho.

Características como a reduzida dimensão das explorações, as pequenas quantidades de aguardente de medronho aqui produzidas, o afastamento dos mercados de grande consumo face às dificuldades em acessos e transportes e aos elevados custos de produção, bem como as limitações do mercado local para este tipo de produto, também aqui são constatáveis, tratando-se de uma realidade bem presente que urge não se desconsiderar em termos de uma estratégia de valorização dos produtos regionais algarvios.

É sabido que as actividades económicas tradicionais da serra algarvia têm vindo a registar uma progressiva redução da sua importância económica que outrora tiveram, sobretudo desde a década de sessenta, acompanhada de uma consequente desertificação, preocupante, dos espaços rurais.

Esta desertificação humana comporta consigo graves riscos de perda de identidade do nosso espaço rural, também de natureza ecológica e ambiental, por via do

desaparecimento das práticas culturais de limpeza e conservação da floresta, redutoras dos prejuízos decorrentes dos incêndios, e de igual modo, riscos de natureza económica, na medida em que, mercê das condições naturais específicas, aí se obtinham produções que, pela suas características de tipicidade, poderiam ser uma fonte de riqueza local em contexto de Mercado Único.

Uma breve análise permite identificar as produções de frutos secos, da fruticultura de variedades regionais, exploradas em regime de sequeiro, da pecuária com base em raças autóctones, de uma agricultura extensiva, assente em práticas biológicas, que conferiram, desde sempre, uma identidades ao nosso espaço rural.

A economia destes espaços sempre assentou numa diversificação de actividades - pluriactividade - que permitiam o sustento e sobrevivência das famílias através da multifuncionalidade do meio natural, em que se registava, historicamente, um aproveitamento dos recursos endógenos, como sejam os provenientes da vegetação e flora naturais.

É neste contexto global que teremos de situar as pequenas produções artesanais, porque com meios tecnológicos rudimentares, de aguardente de medronho por toda a serra algarvia. Produções estas que faziam parte da referida diversificação de actividades e multifuncionalidade de meio natural, em que condições naturais únicas na bacia mediterrânica, favorecem a vegetação espontânea da espécie arbustiva "medronheiro" - Arbutus Unedo L.

O medronheiro sempre caracterizou o espaço natural da serra algarvia e com base no aproveitamento dos seus frutos, por destilação, as famílias rurais sempre obtiveram da produção artesanal da aguardente de medronho um suporte subsidiário para a sua sobrevivência económica, enquadrada no ciclo de vida normal das colheitas agrícolas de uma economia de subsistência ou com reduzida produção de excedentes para o mercado.

Actualmente:

. A desertificação progressiva e preocupante do meio rural no Algarve reflectida num fluxo de êxodo que se iniciou na década de sessenta e ainda não estagnou;

. O abandono dos campos tradicionais de cultivo restando os mais velhos e de menor nível educativo, predominando uma população analfabeta;

. A falta de perspectivas e de estímulos que possam fixar os mais jovens ao espaço rural;

. A reduzida dimensão das explorações agro-florestais;

. A indisponibilidade da mão-de-obra no meio rural e cada vez mais cara,

levou a que a actividade produtiva de aguardente de medronho se tivesse reduzido de tal modo que o medronheiro é das espécies arbustivas que mais se encontra em completo desaparecimento por via da ocupação do seu espaço por variedades florestais mais rentáveis como é o caso do eucalipto.

Uma análise de rentabilidade, muito simples e linear, permite constatar que, actualmente, com os condicionalismos legais existentes, produzir um litro de medronho poderá atingir os 10 a 12 euros, suportados directamente pelo produtor, custos estes decorrentes da limpeza e conservação dos medronhais, com a apanha do fruto e sua destilação, com o licenciamento das destilarias, com o registo/renovação de marca comercial e ainda os custos com rotulagem e engarrafamento. Acrescem-se depois o imposto especial sobre o consumo e o IVA à taxa de 19%. O custo final médio de um litro de aguardente de medronho, para um produtor que opte por cumprir todos os normativos e condicionalismos existentes, ascenderá assim a cerca de 15-20 euros, não se obtendo assim qualquer mais valia para o produtor, uma vez que o mercado é o das bebidas espirituosas em geral onde abundam bebidas substitutas e alternativas, assentes em campanhas de marketing e promoção agressivas, importadas e produzidas na Comunidade, a preços mais acessíveis e que decorrem de produções em escala industrial, podendo assim suportar todos os curtos directos e indirectos, o que não acontece nem se aplica para com a aguardente de medronho.

Uma observação mais atenta verificará assim que se deverá aplicar de forma idêntica a esta região, e à sua aguardente de medronho, o que se observa para os arquipélagos dos Açores e da Madeira e que consiste no seguinte:

"da análise dos dados relativos aos preços de venda das bebidas espirituosas vendidas nas referidas regiões, decorre que uma redução da taxa do imposto especial de consumo da ordem dos 75% da taxa nacional portuguesa normal aplicável ao álcool etílico deverá permitir alinhar os preços das bebidas espirituosas produzidas na Madeira e nos Açores pelos das bebidas semelhantes importadas ou fornecidas a partir do resto da Comunidade. Esta medida deverá permitir assegurar a sobrevivência da indústria existente e a sua eventual expansão."

Trata-se, assim de, através de uma redução da taxa do imposto na ordem dos 75%, se permitir também um alinhamento do preço da aguardente de medronho produzida no Algarve pelo das bebidas semelhantes importadas ou fornecidas a partir do resto da Comunidade, sendo esta uma questão de equidade e do mesmo tratamento fiscal face a uma região que apresenta as mesmas características estruturais de produção reconhecidas pelo Conselho da UE.

Propomos, assim:

1. Uma efectiva recuperação das áreas de medronhal tendo em conta o seu potencial ecológico e pelo facto de ser um recurso para a sustentabilidade florestal e das produção artesanal em meio rural.

2. O enquadramento desta produção na definição de produtos artesanais e de quinta com recurso a tecnologia caseira.

3. Uma redução do imposto na ordem dos 75% à taxa nacional portuguesa normal, a que se aplicará a redução do montante obtido para os 50% decorrentes do regime da pequena destilaria será, assim, a medida que melhor se ajustará à viabilidade desta produção na serra algarvia, para produções superiores a 300 l /ano até 2000 l/ano, não só pelas razões expostas como pelas que decorrem da necessidade de se viabilizar a recuperação das áreas de medronhal ardidas recentemente.

Referências documentais:

. Tapum, Joaquim António Marques (1985) - Breves Notas sobre a Cultura do Medronheiro na Serra Algarvia. Passado, presente e futuro, in Revista do Instituto Geográfico e Cadastral, Lisboa.

. Carvalho, J. H. Brito de (1992) - Taxionomia dos "Produtos de Tecnologia Caseira", Faro, 30 de Junho de 1992.

Monchique, 26 de Maio de 2008

A Direcção da

Apagarbe-Associação dos Produtores de Aguardente de

Medronho do Barlavento Algarvio,

Documento n.º 3

Anexos

1.

Tapum, Joaquim António Marques (1985) - Breves Notas sobre a Cultura do Medronheiro na Serra Algarvia. Passado, presente e futuro, in Revista do Instituto Geográfico e Cadastral, Lisboa.

2.

Carvalho, J. H. Brito de (1992) - Taxionomia dos "Produtos de Tecnologia Caseira", Faro, 30 de Junho de 1992.

3.

Estatuto da Produção Artesanal

4.

Exposição apresentada ao Director da Alfândega de Faro

pela Associação IN LOCO

5.

Comunicações apresentadas ao XI Congresso do Algarve:

- Por uma protecção aos produtos tradicionais de qualidade do Algarve.

O caso da produção de aguardente de medronho face ao quadro legal actual.

Comunicação apresentada por José Paulo Duarte Nunes, presidente da Direcção da APAGARBE-Associação dos Produtores de Aguardente de Medronho do Barlavento Algarvio

- Conservar o medronheiro na serra algarvia – elementos para a definição de uma protecção integrada.

Comunicação apresentada por Américo Telo, em representação do Centro de Estudos e de Ensino Costa Goodolphim ( Monchique )

Apagarbe-associação dos produtores de aguardente de medronho do Barlavento Algarvio

Monchique

 

Autor:

Americo Gil Duarte Telo

atelo[arroba]confagri.pt



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