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Tribunal do júri: a competência do tribunal do júri para o julgamento de crime diverso à vida (página 3)


Partes: 1, 2, 3

6.2. DA CONTINÊNCIA.

A competência pela continência está abarcada no artigo 77, do Código Penal, e diz,

Art. 77. A competência será determinada pela continência quando:

I - duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração;

II - no caso de infração cometida nas condições previstas nos arts. 51, § 1º, 53, segunda parte, e 54 do Código Penal.

Lecionando sobre o tema, Tourinho (2010, p. 362), explicando que a continência é;

Na continência, como o próprio nome está a indicar, uma causa contida na outra, não sendo possível a cisão. Como a continência se verifica na hipótese de concurso de pessoas (coautoria e participação) – e aí a causa pedendi é a mesma (continência por cumulação subjetiva) – e nos casos em que se aplique a regra contida na primeira parte do art. 70 do CP

art. 73, segunda parte e 74 (continência por cumulação objetiva).

Nesse mesmo sentido ensina Gomes (2009), a continência tem por definição a ocorrência de um fato criminoso que contenha outros crimes, o que impõe que o julgamento de todos seja realizado em conjunto.

Ainda, segundo o citado Doutrinador a continência se divide em objetiva e subjetiva;

a) Subjetiva: quando duas ou mais pessoas forem acusadas da mesma infração penal.

b) Objetiva: quando os crimes são cometidos na forma dos artigos 70, 73 e 74 do Código Penal, ou seja, em concurso formal, na aberratio ictus ou aberratio criminis.

De modo a facilitar o entendimento, permite-se dizer que a continência se verifica quando duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração penal, nos moldes do artigo 29, da lei 7.209/1984, ou cometida uma ação ou omissão com duplicidade de resultados, conforme artigo 77 do Código de Processo Penal. Ou melhor, o artigo 70, concurso formal, o artigo 73, na segunda parte, aberratio delicti, é o que ocorre quanto por acidente, ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, artigo 74, todos do Código Penal. Nestes dois últimos, quais sejam, os artigos 73 e 74, respectivamente, se faz necessário a ocorrência do concurso formal de delitos (continência por cumulação objetiva).

Em parecer no HC 101.542/SP, (FLS. 43 E 54), o Ministério Público se manifestou sobre a competência do Tribunal do Júri, dizendo;

Em primeiro lugar tem-se a Constituição Federal, em seu art. 5, inciso XXXVIII, d, diz ser o Tribunal do Júri o órgão competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Não se infere, daí, que tal órgão seja competente somente para eles. Não há, portanto, como bem entende a doutrina, qualquer vedação a que a legislação infraconstitucional amplie a competência atribuída ao Tribunal do Júri, tendo a Constituição Federal previsto apenas o mínimo.

Portanto, com base no artigo transcrito, como também nos preceitos Constitucionais, é possível deduzir que o Tribunal do Júri possui competência mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, mas também é possível que este julgue crimes diversos, desde que conexos, e que não abarcados pela competência da justiça eleitoral, do juízo de menores (Vara da Infância e juventude) ou sujeito à Justiça Militar.

Porém, deve-se atentar a alguns detalhes importantes sobre o tema, tal como a desclassificação, que se divide em própria e imprópria, e seu conceito, segundo Nucci (2012, P. 813) é;

A Desclassificação é a decisão interlocutória simples, modificadora da competência do juízo, não adentrando o mérito, nem tampouco fazendo cessar o processo.

6.3 DA DESCLASSIFICAÇAO PRÓPRIA;

A desclassificação própria encontra guarida no artigo 419, com redação dada pela Lei 11.689, de 2008, onde diz;

Art. 419.  Quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no § 1 do art. 74 deste Código e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja.  

Ou, mais especificamente, quando o Juiz de direito, ainda na primeira fase do Júri perceber que o crime não encontra respaldo para ser julgado pelos jurados, remeterá o processo para o juiz que o seja.

6.4 DA DESCLASSIFICAÇAO IMPRÓPRIA

Já a desclassificação imprópria ocorre quando o delito tem relação com o de competência do Júri, pela conexão ou continência, e caberá ao Juiz presidente proferir sentença. Não aos jurados, como se pode observar no artigo 74, parágrafo 3, do Código de Processo Penal;

Art. 74.  A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri.

§ 3o  Se o juiz da pronúncia desclassificar a infração para outra atribuída à competência de juiz singular, observar-se-á o disposto no art. 410; mas, se a desclassificação for feita pelo próprio Tribunal do Júri, a seu presidente caberá proferir a sentença.

Cumulativamente a isso o artigo 492, parágrafo 2, do supracitado diploma legal, com redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008, apregoando;

Art. 492.  Em seguida, o presidente proferirá sentença que:

§ 2o  Em caso de desclassificação, o crime conexo que não seja doloso contra a vida será julgado pelo juiz presidente do Tribunal do Júri, aplicando-se, no que couber, o disposto no § 1o deste artigo. 

Nesse sentido nos direciona o Professor Franco (2004, P. 748)

Havendo desclassificação do crime da competência do Júri, pelo corpo de jurados, para outro delito da competência do juiz singular, cessa a atração do Júri com relação aos crimes conexos, cabendo ao juiz-presidente julgar tanto o delito fruto da desclassificação quanto as infrações penais conexas.

Discorrendo sobre a matéria, Adriano Marrey anota:

Em se tratando de crimes conexos, um da competência do Júri e outros atraídos a ela pela regra do art. 78, I, da lei processual penal, se o Conselho de Sentença desclassificar a infração que seria originária de sua competência, o Juiz-Presidente suspenderá o julgamento dos demais delitos e passará a decidir pessoalmente a seu respeito.

É que o Júri somente poderia julgar o réu pelo crime doloso contra a vida. Se o quesito relativo à infração dessa natureza foi negado com a consequente desclassificação, ipso facto, para o delito de outra natureza (v.g., tentativa de homicídio negada, restando apenas a imputação da prática de lesões corporais graves ou leves) -, os demais crimes conexos (v.g., de rapto de estupro etc.) deixará de existir fundamento legal para serem conhecidos pelo Júri, a que adstritos pela regra da conexão já inexistente.

No mesmo sentido, o magistério de Aramis Nassif (2008, P. 409);

No atinente ainda aos delitos conexos, na desclassificação própria, se o Conselho de Sentença não é mais competente para julgar o delito prevalente, por óbvio não tem a mínima lógica que prossiga julgando crimes que jamais seriam de sua competência, e que só foram levados a sua apreciação por força da conexão. Se o delito que atrai a competência não mais subsiste, nada justifica que julgue os demais.

Como visto anteriormente, o Tribunal do Júri atualmente é competente para julgamento dos crimes dolosos contra a vida e os conexos a estes, e que na primeira fase do júri o Juiz de carreira não pode adentrar no mérito nem do crime contra a vida e nem do conexo a esse, visando evitar o comprometimento da imparcialidade dos julgadores, porém, caso perceba que o crime não é de competência originária do Júri, remeterá o processo para o juiz que o seja, em tendo relação, remeterá o crime doloso contra a vida aos jurados e julgará o crime conexo.

6.5. DO DESAFORAMENTO

Outro meio encontrado pelo legislador de 2008, com o advento da Lei nº 11.689, de 2008, foi o desaforamento, que ocorre em casos especificados pela própria Lei, assim trazendo;

Art. 427.  Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas. 

§ 1o  O pedido de desaforamento será distribuído imediatamente e terá preferência de julgamento na Câmara ou Turma competente. 

§ 2o  Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri. 

§ 3o  Será ouvido o juiz presidente, quando a medida não tiver sido por ele solicitada. 

§ 4o  Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo, nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de julgamento anulado. 

Art. 428.  O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. 

§ 1o  Para a contagem do prazo referido neste artigo, não se computará o tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa. 

§ 2o  Não havendo excesso de serviço ou existência de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri, nas reuniões periódicas previstas para o exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal que determine a imediata realização do julgamento.

O desaforamento é, segundo Gonçalves (2012, p. 226);

É tirar o processo do foro em que está para mandá-lo a outro. Trata-se, pois, do deslocamento do processo de um foro para outro, admitido no Processo Penal em quatro hipóteses: por interesse da ordem pública; em razão de dúvida sobre a imparcialidade do júri; em razão de dúvida sobre a segurança pessoal do réu; não realização do julgamento, no período de seis meses a contar da preclusão da pronúncia, em virtude de comprovado excesso de serviço. Por ser  medida excepcional, só terá lugar quando houver prova segura da existência de um dos motivos que o justificam.

Ainda, segundo o citado doutrinador (2012, p. 95), o desaforamento não fere o princípio do Juiz natural, como se pode observar;

No rito do Júri, o desaforamento do julgamento não fere o princípio do juiz natural, na medida em que a transferência do julgamento se dá por razões relevantes previamente estipuladas no texto legal (arts. 427 e 428 do CPP): dúvida sobre a imparcialidade do Júri, segurança do acusado, demora superior a 6 meses na realização do julgamento.

Importante frisar que o desaforamento é um dos institutos modificadores da competência, e, no entender do Tribunal de Justiça do Estado do Acre é cabível, além de outras hipóteses, quando houver dúvidas sobre a imparcialidade dos julgadores, conforme segue;

PROCESSUAL PENAL. DESAFORAMENTO DO JÚRI POPULAR. ALEGAÇAO DE DÚVIDA ACERCA DA IMPARCIALIDADE DOS JURADOS. RÉU INFLUENTE. INTEGRANTE DE FACÇAO CRIMINOSA. INFORMAÇÕES DO JUIZ PRESIDENTE DO JÚRI APOIADOS EM DADOS CONCRETOS E IDONEOS. PEDIDO DE DESAFORAMENTO DEFERIDO. 1. É cabível o desaforamento quando houver dúvidas sobre a imparcialidade do Conselho de Sentença, em razão de se tratar de réu influente na comarca, capaz de influir no ânimo dos jurados, mercê de eventual represália, na hipótese de condenação. 2. Pedido de desaforamento deferido.

(TJ-AC - Desaforamento de Julgamento: 01018966320158010000 AC 0101896-63.2015.8.01.0000, Relator: Des. Francisco Djalma, Data de Julgamento: 15/12/2015, Câmara Criminal, Data de Publicação: 16/12/2015.

7. A COMPETÊNCIA DO JÚRI NOS CRIMES COM RESULTADO MORTE

Embora o Tribunal popular seja competente para o julgamento dos crimes contra a vida, não o é para os crimes com o resultado morte, como exemplo o latrocínio, conforme se constata da Súmula 603, do Supremo Tribunal Federal, onde apregoa que a competencia para processar e julgar o latrocínio é do Juiz singular e não do Tribunal do Júri.

Pode-se notar a insensibilidade do legislador pátrio ao deixar de incluir na competência do Tribunal do Júri os crimes dolosos com resultado morte, haja vista ter atribuído a competencia privativa para os julgamentos dos crimes dolosos contra a vida.

Ficou caracterizado a total irrazoabilidade do Legislador, por não incluir a competencia do Júri para todos os delitos intecionais que levam a vítima a morte, dando-se mais importancia ao patrimônio, no caso do Latrocínio, do que a própria vida.

Embora seja plenamente possivel a ampliação da competeencia originária do Tribunal do Júri, como se viu anteriormente, ficou caracterizado, num primeiro momento, o desprezo pelo bem jurídico vida quando este é violado após a ofensa a bem jurídico diverso, no caso, o patrimônio, que vai para a alçada do Juiz singular.

7.1. CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA COMETIDOS POR DEPUTADOS ESTADUAIS

A competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida cometidos por parlamentares dos Estados e do Distrito Federal, no exercício das suas atividades legislativas, durante muito tempo foi objeto de discussão, pois a súmula 721, do Supremo Tribunal Federal veda o foro por prerrogativa de função estabelecida exclusivamente nas Constituições Estaduais, contudo o Superior Tribunal de Justiça, por intermédio do informativo no 0457 entendeu que;

COMPETÊNCIA. CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA. DEPUTADO ESTADUAL. Cuida-se de conflito de competência cuja essência é saber a quem cabe julgar os crimes dolosos contra a vida quando praticados por deputado estadual, isto é, se a prerrogativa de função desses parlamentares está inserida na própria Constituição Federal ou apenas na Constituição do estado. A Seção, por maioria, entendeu que as constituições locais, ao estabelecer para os deputados estaduais idêntica garantia prevista para os STJ - Informativo de Jurisprudência Página 4 de 13 congressistas, refletem a própria Constituição Federal, não se podendo, portanto, afirmar que a referida prerrogativa encontra-se prevista, exclusivamente, na Constituição estadual. Assim, deve prevalecer a teoria do paralelismo constitucional, referente à integração de várias categorias de princípios que atuam de forma conjunta, sem hierarquia, irradiando as diretrizes constitucionais para os demais diplomas legais do estado. Consignou-se que a adoção de um critério fundado na aplicação de regras simétricas reforça a relevância da função pública protegida pela norma do foro privativo. Ademais, a própria Carta da República institui, em seu art. 25, o princípio da simetria, dispondo que os estados organizam-se e se regem pelas constituições e leis que adotarem, observando-se, contudo, os princípios por ela adotados. Diante desses fundamentos, por maioria, conheceu-se do conflito e se declarou competente para o julgamento do feito o TJ. CC 105.227-TO, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 24/11/2010.

Por esse entendimento, pode-se afirmar que o foro por prerrogativa de função assistido aos membros do Legislativo Estatual e Distrital junto aos Tribunais de Justiça e determinado pelas Constituições Estaduais e Lei Orgânica Distrital não fere a Súmula 721 do STF, onde apregoa que "a competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual", ainda o art. 27, § 1.º, da Constituição da República Federativa do Brasil determina que aos deputados estaduais se apliquem as regras da Constituição Federal sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas. Ora, ainda que esse dispositivo não estenda aos deputados estaduais as normas relativas à prerrogativa de função atinentes aos deputados federais, o Superior Tribunal de Justiça, interpretando-o, consolidou o entendimento de que, para os deputados estaduais, não incidem os termos da Súmula 721 do Supremo Tribunal Federal.

Portanto, em cometendo crimes dolosos contra a Vida, os Parlamentares dos Estados e do Distrito Federal, se previsto nas Respectivas Constituições, não estarão sujeitos ao Tribunal do Júri, mas serão julgados perante o Tribunal de Justiça do respectivo Estado.

8. TRIBUNAL DO JÚRI BRASILEIRO COMPARADO AO NORTE-AMERICANO

Embora o Brasil se espelhe em grande parte do seu sistema de justiça no modelo Norte-Americano, existem algumas diferenças peculiares no que tange aos julgamentos, principalmente quanto ao Tribunal do Júri.

O Brasil espelhou o seu sistema jurídico em grande parte no dos Estados Unidos da América, dentre isso a imparcialidade dos jurados, como trazido no artigo 6, adicionado por emenda à Constituição dos Estados Unidos da América, conforme .

Artigo VI.

Em todos os procedimentos criminais, o acusado terá o direito a um julgamento público e rápido, por um júri imparcial do Estado e do distrito onde o crime teria sido cometido, distrito que terá sido previamente determinado por lei, e de ser informado da natureza e da causa da acusação; de ser confrontado com as testemunhas da acusação; de fazer citar por todas as vias legais testemunhas a seu favor, e de ter assistência de um advogado para sua defesa.

Observou-se em outro capítulo que no ordenamento jurídico pátrio o conselho do júri é competente para o julgamento dos crimes contra a vida, e se observa agora que o sistema adotado para isso é o Civil Law, onde os julgados são embasados na Lei em sentido estrito, pois não é possível condenar alguém sem uma norma legislativa autorizadora, isso se deve ao princípio da reserva legal, que embora se confunda com o da legalidade, não é a mesma coisa, mas isso é assunto para outro trabalho acadêmico, não para esta monografia de conclusão de curso.

Nos Estados Unidos da América vigora a Common Law, ou, em miúdos, os julgamentos são espelhados principalmente nos costumes, sendo que a população participa efetivamente dos interesses dos Estados parte a qual pertencem, e de acordo com cada caso especificado, conforme ensinamentos de Barbosa, (1950, P. 28);

A instituição do Júri norte-americano desenvolveu-se, historicamente, de forma coerente com o espírito e os princípios da common law, que é uma tradição jurídica que possibilitou as condições e o contexto adequados para o aparente sucesso do júri. Nos Estados Unidos, o realismo sociológico definiu o estatuto teórico que tornou aceitável o sistema da common law, com o seu governo pelos juízes e através do povo, em que direito e sociedade estão cotidianamente renovando sua seiva e alimentando-se mutuamente. Já as características da tradição política do povo americano possibilitaram o surgimento de um espírito cívico e de uma consciência jurídica comum que tornam materialmente exequível o júri como regra e não a exceção.

Ainda sobre o tema, nos ensina o Ministro Luiz Inácio Lucena Adams (2011, P 12) que,

Como sistema jurídico, o Common Law se baseia firmemente nas decisões judiciais, as quais possuem a mesma força da lei escrita. Em geral, é comparado ao Civil Law, sendo ambos adotados pelo maior número de países no mundo. 1 No Civil Law, por sua vez, os tribunais devem aplicar a legislação escrita, pois estão a ela vinculados.

Outra característica que distingue o Tribunal do Júri em ambos os países é a competência para os julgamentos, enquanto aqui o júri julga apenas os crimes contra a vida, a ele é atribuída capacidade plena para os julgamentos de todas as espécies de delitos, desde pequenos furtos até os mais violentos, como roubos e homicídios, isso porque para a sociedade americana a participação na justiça de seu país é a forma mais genuína de demostrar o seu patriotismo.

Ademais, somente o corpo formado por cidadãos pode decidir, de acordo com a Constituição Americana, sobre a aplicação das penalidades mais severas, como se pode observar no artigo 5, da Constituição dos Estados Unidos da América;

Artigo V Ninguém será chamado a responder por um crime capital, ou infamante, a menos que sob denúncia ou indiciamento oriundo de um grande júri, excepto em casos que se apresentem nas forças terrestres e navais, ou na milícia, quando chamadas a serviço activo em tempo de guerra ou perigo público; ninguém poderá ser acusado duas vezes pelo mesmo crime com risco de perder a vida ou parte do corpo; ninguém será obrigado, em qualquer caso criminal, a testemunhar contra si mesmo, nem ser privado da vida, liberdade ou propriedade, sem o devido procedimento legal; nenhuma propriedade 12 privada será tomada para um uso público sem uma justa compensação.

Isso demonstra a soberania popular e a democracia, pressupostos precisos para aquela sociedade, podendo-se afirmar, inclusive, que a participação do cidadão e seu patriotismo se comparado a outros países é bastante elevado.

O sistema americano de justiça é, essencialmente, um processo em que há um confronto. Como explica Sèroussi (2001, p. 98-99),

O sistema se baseia na crença de que a verdade tem maior probabilidade de aparecer quando os dois lados a defesa e a acusação, podem apresentar a sua causa de forma veemente a um júri, em conformidade com normas imparciais que regem as provas, perante um juiz isento. O caráter meramente diretivo da atuação do juiz no processo pelo júri nos EUA. É um traço característico daquele sistema, já o advogado do júri é um ícone de massa, um herói da América.

Cabe às partes produzir as provas, convocar e preparar as testemunhas, contratar os peritos (quando necessário) e arrecadar as provas que lhes possam ser favoráveis. Durante a sessão do júri cabe ao juiz zelar pela justiça dos procedimentos, aplicando um conjunto de normas costumeiras e legais que rege a admissibilidade e relevância das provas oferecidas à apreciação do tribunal. Segundo o princípio da apreciação compacta, os procedimentos devem ser fluentes, sendo resolvidas de plano pelo juiz eventuais controvérsias de direito, porém, não há oposição de que uma questão de direito seja esgotavelmente discutida, visto que a má aplicação da law of evidence pode ensejar uma nulidade.

Outra característica marcante que difere o Júri Americano é em relação à forma de julgamento, ode existe a reunião do conselho de sentença, ou seja, os jurados que proferirão a decisão se reúnem em busca da verdade, debatendo o caso entre si.

8.1 A seleção dos Jurados nos Estados Unidos da América

Como ocorre no Brasil, a seleção de jurados nos Estados Unidos é um processo aleatório, conforme leciona Marques (2002, P. 191- 196);

A seleção de um júri de pessoas comuns é, a rigor, um processo aleatório. Os escriturários dos sistemas de tribunais norte-americanos compilam nomes a partir de uma série de listas, incluindo, mas não se limitando, listas de títulos de eleitores, ao licenciamento de veículos, às carteiras de motoristas entre outras.

Segundo a legislação norte-americana, qualquer pessoa que tenha pelo menos 18 anos de idade, atendendo aos requisitos genéricos concernentes ao gozo dos direitos de cidadania, à alfabetização e à inserção em uma certa faixa de idade e não tenha sido condenado por nenhum crime pode ser membro de um júri, e deve se apresentar no fórum, em um determinado dia, como parte de um corpo de jurados.

Alguns estados exigem que as pessoas que façam parte do corpo de jurados retornem todos os dias por um certo período de tempo; outros usam o sistema de "um dia ou um julgamento", após o qual o cidadão fica isento da obrigação de prestar serviços como jurado. Em qualquer um dos casos, geralmente passam-se anos até que uma pessoa seja procurada.

Pelo exposto, é possível observarmos que existem divergências importantes do Júri Brasileiro para o Americano, a começar pela competência para os julgamentos, que nos Estados Unidos abarca todas as espécies de delitos, o processo é instruído perante os jurados.

O interrogatório do réu e a inquirição das testemunhas são procedidos diretamente pelas partes. Os jurados não respondem a quesitos. Decidem apenas se o réu é ou não culpado. Se o réu quiser renunciar ao direito de ser julgado pelo Júri, basta antecipar-se ao veredicto, confessando sua culpa, em audiência prévia. Somente nesse caso é que será julgado pelo juiz. Não ha incomunicabilidade entre os jurados e não se admite decisão por maioria.

CONCLUSAO

Conclui-se com o posicionamento de que a Instituição do Júri na atual ordem Constitucional é um mecanismo que possibilita a integração do Estado com os seus cidadãos, que previamente alistados na qualidade de jurados julgam crimes contra a vida. Sendo que a Lei Maior atribuiu competência mínima originária, podendo esta ser ampliada para alçar crimes diversos aos originariamente atribuídos pelo Constituinte, como ocorre em outros Países.

Tendo também em vista que a citada Instituição é competente para crimes tão gravosos quanto os contra a vida, seria plenamente possível vir a julgar crimes de outras espécies, tão graves quanto como o Latrocínio ou de médio e pequeno potencial ofensivo.

Como visto anteriormente, o procedimento do júri é especial, bifásico ou escalonado, sendo que na primeira etapa compete ao Juiz de Direito decidir sobre os indícios de autoria e materialidade do delito, podendo declarar nulidade, desclassificar o delito, absolver sumariamente o acusado, pronunciar ou impronunciar o acusado.

Na segunda parte também é possível dizer que é escalonado, pois aos jurados compete o julgamento, e ao Juiz, aqui denominado Presidente, sentenciar.

Na sentença o juiz não pode adentrar no mérito da decisão, pois esta cabe exclusivamente ao Júri apreciar.

Sendo que na sentença o Juiz Presidente balizará o grau máximo ou mínimo das penas impostas ao Réu, sem adentrar no julgamento realizado em plenário.

Ainda que exista recurso para instância superior, o judiciário não pode reformar o julgamento, podendo apenas reformar a sentença, e apreciar os requisitos formais do processo, pois o mérito é examinado exclusivamente pelo Plenário.

Sendo assim, é correto afirmar que o julgamento só pode ser refeito por novo plenário de julgamento, composto por novos jurados, em casos bem especificados na legislação processual.

Porém, quando se olha para a legislação Norte-americana, por exemplo, fica mais fácil de compreender que é plenamente possível que o Júri brasileiro venha a julgar outras modalidades de crimes, exigindo-se, todavia, que se altere a legislação quanto aos recursos, mesmo que julgados por novo plenário de julgamento.

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TOURINHO, Fernando da Costa Filho, Processo Penal Comentado, 33. ed. São Paulo: Saraiva S.A., 2011.

AGRADECIMENTOS

Num primeiro momento, agradeço ao Deus criador de todas as coisas, por ter estado ao meu lado, em todos os momentos, nesse árduo caminho. Rogo a Ele, com a mesma intensidade, que me dê discernimento na distinção do direito e da justiça, pois, quem não é capaz de sentir a justiça não conhecerá o direito, sempre com respeito aos meus semelhantes, e ajudando a todos os que necessitem, sejam eles bons ou maus.

Posteriormente, posso dizer que este momento, desenrolando-se no mundo naturalístico, um dia fora mero sonho, e sei que aqui é apenas o começo da caminhada, no vasto mundo jurídico.

Passadas as considerações preliminares, agradeço à minha família e, de igual forma, aos meus orientadores Karime Buchedid Esteves e Roberto José Daher, como também a todo o corpo docente da Faculdade de Paulínia.

Pela correção, e por valiosas lições, agradeço ao Fernando Leonel Rodrigues e à Professora Adriana Bottaro Costa Terra Nasciutti 

De forma especial, agradeço à minha irmã Valquiria Kelly Carvalho Santos, à amiga irmã Karina Mu Kuer Tshin por todas as palavras de amizade e incentivo no transcorrer da presente monografia.

Por derradeiro, agradeço do fundo do meu coração, a todos os amigos que participaram, direta ou indiretamente da minha formação acadêmica nesses cinco anos de curso.

 

Autor:

Vladmir Oséias De Carvalho Santos

vladmir_oseias[arroba]outlook.com.br

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito pela Faculdade de Paulínia, sob a orientação da Profa. Especialista Karime Buchedid Esteves, com participação na banca examinadora do Excelentíssimo Prof. Mestre Roberto José Daher.

Faculdade De Paulínia-Facp

Faculdade De Direito De Paulínia

Paulínia

2016

Partes: 1, 2, 3


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