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Entre o justo e o solidário: os dilemas dos direitos de cidadania no Brasil e nos EUA (página 2)

Luís Roberto Cardoso de Oliveira

Os direitos do indivíduo e a consideração à pessoa no Brasil e nos Estados Unidos

A dialéctica entre as noções de indivíduo e pessoa tem inspirado comparações interessantes entre o Brasil e os EUA, inclusive no que concerne ao lugar da cidadania nos dois países (DaMatta 1979; 1991), objeto de reflexão do presente ensaio. Acredito que os principais esforços comparativos nesta direção, que toma como foco a dimensão cultural do problema, tenham sido desenvolvidos por Roberto DaMatta e são amplamente conhecidos na comunidade de cientistas sociais. Entretanto, não posso deixar de mencionar algumas de suas contribuições para contextualizar melhor meu próprio empreendimento.

Na interpretação de DaMatta o Brasil é definido como uma sociedade relacional, em oposição ao caráter nitidamente individualista da sociedade americana. Neste sentido, a lógica moderna e universalista do indivíduo, predominante nos EUA, conviveria no Brasil com a lógica tradicional que privilegia a relação e enfatiza a preeminência do todo sobre as partes; indicando, portanto, a grande importância atribuída à hierarquia no contexto brasileiro. Segundo o autor, enquanto a lógica universalista se vincularia ao espaço público da rua, das leis e das relações impessoais, a lógica tradicional teria como referencial o espaço privado da casa, da família e das relações pessoalizadas. No primeiro caso, trata-se da lógica do indivíduo-cidadão, de caráter nivelador, cuja essência estaria nas idéias ou valores de autonomia, independência e igualdade. Já a lógica tradicional valorizaria mais os contrastes, as gradações e as complementaridades.

Ainda de acordo com DaMatta, a articulação das duas lógicas no Brasil, sob a predominância da perspectiva relacional, teria como conseqüência uma visão negativa da cidadania, entendida aqui como mediadora dos deveres e obrigações para com o Estado. Da mesma forma, as leis também seriam vistas com desconfiança, sendo percebidas como instrumentos de controle do Estado ou de manipulação de poder, e não representariam garantia de liberdade ou de acesso aos direitos de cidadania. Contudo, talvez a principal contribuição de DaMatta para o argumento aqui desenvolvido seria a idéia de que a noção de cidadania brasileira engendraria desvios para cima e para baixo. Isto é, enquanto a experiência no mundo da rua refletiria um estado de subcidadania, a experiência cotidiana no universo da casa e da família refletiria uma situação de supercidadania (DaMatta 1991:100). Embora concorde com Neves (1994: 262 e 269-70) que a dicotomia subcidadão/sobrecidadão talvez seja mais apropriada para indicar o acesso diferencial a privilégios "no mundo da rua", os quais estariam quase totalmente restritos à minoria de cidadãos sobreintegrados na sociedade brasileira, o equacionamento proposto por DaMatta tem a vantagem de chamar a atenção para a motivação cultural preferencial em relação a obtenção de privilégios, e que também orientaria a prática social dos cidadãos subintegrados na terminologia de Neves.

Como observei em outro lugar, tal quadro indica que, mesmo que não discordemos das considerações de Neves, "a sujeição a deveres, num caso, [estaria] sendo compensada [simbolicamente] pelo acesso a privilégios no outro" (L. Cardoso de Oliveira 1992:4).

Sugeri então, que a articulação da lógica da casa com a lógica da rua tinha como conseqüência "a nossa tendência de transformar direitos em privilégios através de uma orientação sistemática em direção à privatização do espaço público", e da motivação para inverter, sempre que possível, a condição de subcidadania, —em relação a qual nos sentimos ameaçados quando nos expomos ao arbítrio das leis impessoais—, transformando-a em seu oposto. Penso que esta situação seria um bom exemplo de desequilíbrio entre os princípios de justiça e solidariedade, onde a falta de respeito aos direitos do indivíduo ou do cidadão comum é contrastada com a propensão ao favorecimento daquelas pessoas que se mostram especialmente dignas de consideração. Ou seja, uma situação onde se tem muito pouca justiça no acesso aos direitos, mas onde sobra solidariedade, ainda que excessivamente circusncrita e bem localizada, na consideração da pessoa do cidadão que merece reconhecimento. Sugerindo inclusive uma concepção de dignidade fortemente contaminada pela perspectiva da honra, nos termos indicados por Taylor.6 Desta maneira, o drama da situação não está só na "quantidade", eventualmente excessiva, da atitude de solidariedade ou de consideração à pessoa dos atores, mas também na dificuldade de universalizá-la. Ou melhor, na dificuldade de articulá-la adequadamente com o equacionamento dos direitos e/ou interesses das partes envolvidas nas diversas situações de interação social que caracterizam a vida em sociedade.

É interessante notar que apesar da grande dose de perversidade desta situação no que concerne aos ideais de justiça social, visto que, neste caso, o desequilíbrio entre os princípios mencionados acima tem como implicação necessária a usurpação dos direitos da maioria, os valores que dão sustentação as práticas sociais geradoras desta situação de iniqüidade são amplamente compartilhados em todos os estratos sociais da sociedade brasileira. Não quero dizer com isto que não haja oposição às tentativas de transformação de direitos em privilégios ou aos processos de privatização do espaço público. Muito pelo contrário. Uma vez que estes atos tenham sido classificados como tais a cobrança para que as providências devidas sejam tomadas é imediata, ainda que raramente, como no caso das freqüentes acusações de corrupção ou nepotismo, os infratores sejam efetivamente punidos.7 O problema é que boa parte das situações passíveis de serem identificadas como exemplos de tais atos são suficientemente ambíguas para evitar uma percepção negativa de seu significado.

Aliás, a intensidade da indignação popular frente a prática destes atos só é comparável a extensão do universo social onde estas práticas ocorrem. Aqui não estou me referindo apenas aquelas práticas de privatização do espaço público ou às tentativas de transformação de direitos em privilégios cujo conteúdo é nitidamente ilegal, mas também a todos aqueles atos ou práticas sociais onde a demanda por privilégios, afinada com a lógica da distinção, prevalece em prejuízo dos interesses legítimos de outrem. Isto é, ao lado dos crimes de corrupção e nepotismo, não se pode deixar de reconhecer nas diversas práticas (legais) de clientelismo, na cartorialização da nossa economia,8 no corporativismo dos sindicatos, ou na concessão de subsídios mal justificados, algo do mesmo fenômeno.

No contexto desta orientação em direção à transformação de direitos em privilégios, os excessos cometidos na concessão de indenizações ou pensões vitalícias a jornalistas perseguidos durante a ditadura é apenas o caso mais recente e talvez o mais escandaloso.9 Alguns processos de reintegração de professores universitários são quase idênticos ao caso dos jornalistas no que concerne a estes excessos. Da mesma forma, alguns professores de Universidades Federais se aproveitam da necessidade da assinatura de um novo contrato de trabalho quando são aprovados em concursos para professor titular, e se aposentam no contrato antigo, passando a ter "direito" ou o privilégio de receber dois salários.10 Esta manipulação, que permite a transformação de progressão funcional em "nova" entrada na carreira, é particularmente interessante para o argumento aqui desenvolvido no caso dos Departamentos que passaram por duas ou mais experiências deste tipo dentro de um curto espaço de tempo. Pois, dada a impossibilidade de esconder a estratégia utilizada no âmbito do Departamento, tais experiências só parecem ser passíveis de compreensão se supusermos o apoio ou mesmo o estímulo dos colegas à estratégia manipulativa dos professores beneficiados. A qual seria, assim, sancionada positivamente no universo doméstico do Departamento! Os exemplos poderiam ser quase que infinitamente multiplicados, abrangendo inclusive práticas cotidianas sem maior conseqüência como o desrespeito à filas de uma maneira geral. Mas este não é o meu objetivo aqui. Gostaria apenas de destacar duas características do nepotismo, e de mencionar um último exemplo, para concluir minhas reflexões sobre as conseqüências para a cidadania do desequilíbrio entre os princípios de justiça e solidariedade no caso do Brasil.

Num dos poucos trabalhos sobre nepotismo em que o autor procura desvendar a lógica interna desta prática, através da comparação com práticas similares que são sancionadas positivamente pela sociedade, Laraia (s.d.) chama a atenção para dois aspectos centrais do nepotismo aos quais nem sempre se dá a devida importância. O primeiro deles se refere à lógica das relações de reciprocidade estabelecidas no âmbito doméstico, familiar, e à estrutura de lealdades a elas subjacente, as quais legitimariam a demanda por favores àquele que está em condições de ajudar. Como argumenta o autor, além destas solicitações estarem calcadas nos preceitos característicos da sociedade relacional, assim como definidos por DaMatta, muitas vezes elas seriam vistas pelos parentes "como um retorno de seus investimentos e de suas expectativas", como um reconhecimento da contribuição dos solicitantes para o sucesso da trajetória do político em pauta. Embora Laraia não faça referências explícitas à situações similares na esfera privada, acredito que as demandas dos parentes dos políticos não sejam muito diferentes daquelas feitas pelos familiares de empresários bem sucedidos.11 O segundo aspecto mencionado por Laraia diz respeito a abrangência do nepotismo, que deveria incluir também a prática de contratação de amigos a partir da mesma lógica de reciprocidades acionada no caso dos parentes. Na mesma direção, o autor também sugere alguma identidade entre este tipo de nepotismo e aquele que se manifesta em contextos mais paroquiais, onde a distribuição de cargos reproduziria a mesma lógica de reciprocidades e lealdades mencionada acima, e teria como objetivo precípuo a satisfação dos anseios da comunidade, no que concerne ao acesso de seus membros ao que talvez se pudesse chamar de mercado político de empregos.12 Finalmente, o exemplo que eu queria mencionar antes de introduzir a discussão sobre os dilemas da cidadania nos EUA é o da reivindicação de institucionalização da paridade nas Universidades, tanto no que concerne a eleição de seus dirigentes como em relação a composição dos seus orgãos colegiados com função deliberativa sobre a política universitária. Neste contexto, gostaria apenas de apontar duas ou três características que marcam a radicalidade do exemplo, na medida em que a despeito de suas conseqüências claramente "privatistas" e da confusão entre as noções de direito e privilégio que vem à tona na articulação da reivindicação, o movimento é apresentado como defensor da democracia e da justiça social.13 Basicamente, o grande problema dos argumentos em defesa da paridade está em não dar a devida atenção à especificidade da Universidade, no que concerne ao seu papel na sociedade. Isto é, ao considerar, equivocadamente, que a chamada "comunidade universitária" representa a sociedade em miniatura, os defensores da paridade reivindicam para os processos decisórios que têm lugar no interior das Universidades os mesmos direitos de participação política compartilhados por todos os cidadãos no âmbito da sociedade mais ampla. Sintomáticamente, entretanto, ao invés de reivindicar a institucionalização do voto universal para os membros da "comunidade", o movimento pela paridade privilegia a defesa dos direitos e/ou dos interesses dos segmentos representados na "comunidade": professores, estudantes e funcionários.

Acontece que, como a Universidade tem uma função social e presta serviços para a sociedade mais ampla, —através da produção de conhecimento e da formação de profissionais/técnicos competentes—, a definição da política acadêmica tem que contemplar, minimamente, a satisfação dos interesses da sociedade em relação à qualidade dos serviços prestados pela instituição. Neste sentido, qualquer proposta de política acadêmica ou de gestão universitária que não esteja subordinada ao bom andamento das atividadesfim da Universidade estará desconsiderando os interesses da maioria. No caso da proposta de paridade trata-se mesmo de uma inversão de prioridades, na medida em que os interesses dos segmentos são colocados na frente dos interesses da população externa, que mantem a instituição, caracterizando uma tentativa de privatização do espaço público e a transformação do status das reivindicações, que perdem o significado de direitos para se constituírem em privilégios. Para tentar escapar deste diagnóstico, a proposta de paridade teria que, pelo menos, enfrentar aquela discussão básica na qual seus proponentes sempre se recusaram a se engajar. Qual seja, a da avaliação da contribuição potencial de cada segmento da "comunidade universitária" para o bom desenvolvimento das atividades-fim da instituição.

Além de reforçar a caracterização da tendência à privatização do espaço público e da propensão à confusões semânticas entre os significados das noções de direito e privilégio no Brasil, sendo esta última derivada da grande área de interseção existente entre os campos semânticos do público e do privado em nosso universo socio-cultural, o caso da paridade enfatiza um outro aspecto importante do problema que contrasta bem com os dilemas da condição de cidadão nos EUA. Qual seja, a facilidade dos atores de se identificarem com totalidades determinadas, ainda que circunscritas, —caracterizando a força do princípio de solidariedade no contexto brasileiro—, se percebendo como parte integrante de comunidades onde compartilham redes de relações intersubjetivas de reconhecimento mútuo. O interessante aqui é que, à esta facilidade, parece corresponder uma dificuldade maior no que concerne ao reconhecimento de interlocutores pertencentes à comunidades mais inclusivas, onde a identidade comum seria considerada, em princípio, muito abstrata. É possível que a importância excessiva atribuída à dimensão substantiva da solidariedade, assim como se faz presente nestes casos, tenha como implicação necessária a dificuldade de se reconhecer (ou de se atentar para) os direitos de cidadania, que em princípio são sempre universais ou universalizáveis, daqueles que nos são mais distantes.

De resto, seria interessante ressaltar pelo menos duas características das interações sociais no Brasil, as quais parecem colaborar com esta facilidade de totalizar as relações e de expressar a comunhão de identidades entre interlocutores, ou o que tenho chamado de dimensão substantiva da solidariedade. Me refiro (1) à valorização da simpatia (empatia) nas relações face a face, indicando a existência de um verdadeiro "culto" a sociabilidade, e (2) à ambigüidade do grau de comprometimento expresso pelos atores nestas relações. Isto é, ainda que a manifestação de empatia seja genuinamente cultivada durante a interação, ela não significa, por si só, a existência de qualquer compromisso entre as partes ou destas com relação às mensagens trocadas no momento.

Como procurar-se-á argumentar na discussão que se segue, o desequilíbrio entre os princípios de justiça e solidariedade nos EUA parece apontar para um déficit de cidadania na direção oposta. Isto é, na dificuldade de reconhecimento de certos direitos que demandam uma atuação mais forte do princípio de solidariedade, ainda que a ideologia individualista, universalista e igualitária (no que concerne ao acesso aos direitos do indivíduo), dominante no pais, facilite o respeito aos direitos do cidadão genérico e permita que as desigualdades sociais, em sentido amplo, sejam bem menores do que no Brasil.

*****

Na comparação com o Brasil o individualismo da sociedade americana salta aos olhos e, embora a ideologia vigente contemporaneamente nos EUA acentue excessivamente os valores de autonomia e independência (Bellah et al. 1985), a compreensão dos problemas dai advindos para o exercício da cidadania naquele país demanda um mínimo de contextualização desta visão.

Além de uma maior formalização das relações face a face nos EUA, a existência de uma grande área de interseção entre o público e o privado no Brasil tem como contrapartida nos EUA uma separação radical entre estes dois domínios. Tal situação seria bem marcada na ideologia individualista dominante nos EUA a qual, segundo Bellah et al. (1985:27-51), teria origem em quatro tradições: (1) a Bíblica, (2) a Republicana [ou Cívica], (3) a Utilitarista, e (4) a Expressivista. Se é verdade que as quatro tradições enfatizam a importância do indivíduo na sociedade, cada uma delas o faz a sua maneira. Assim, a tradição Bíblica investe na idéia de "liberdade moral", no seio de uma comunidade ética; a tradição Republicana insiste no princípio da "igualdade política", no contexto de uma sociedade democrática; enquanto a tradição Utilitarista se concentra na idéia de que o indivíduo deve perseguir com afinco o seu interesse próprio/material; e a tradição Expressivista estimularia o cultivo do espírito e da identidade profunda do indivíduo.

Embora as quatro tradições, em suas versões originais, se preocupassem com a inserção do indivíduo na sociedade e apostassem na constituição de um determinado tipo de sociedade, apenas as duas primeiras, onde esta preocupação sempre foi mais forte, teriam conseguido manter a articulação entre indivíduo e sociedade em perspectiva. Ou seja, as tradições Utilitarista e Expressivista teriam sido internalizadas exclusivamente em relação aos aspectos que valorizam os interesses particulares do indivíduo, tendo contribuído para a difusão e consolidação de concepções que têm como referência ou ideal um indivíduo descontextualizado e totalmente independente das relações sociais, —que no limite seria mesmo não portador de cultura e/ou não socializado—, o assim chamado "unencumbered self" (Idem: 80).

Ainda segundo Bellah et. al, na nossa contemporaneidade as tradições Utilitarista ( na esfera pública) e Expressivista (na esfera privada) teriam se tornado predominantes, fazendo com que os americanos desenvolvessem uma dificuldade particularmente aguda na articulação de um discurso coerente sobre o seu compromisso com o social ("social commitment"). Isto é, fazendo com que não conseguissem articular um discurso que justifique suas opções de ordem moral (que tematizam suas relações com os outros), ou que defenda sua identidade com certos valores e não com outros, ou ainda que permita a sintonização destes valores com projetos que pretendam contemplar interesses sociais mais amplos.

Bellah e seus colaboradores se utilizam de exemplos dos mais variados contextos e estratos sociais da sociedade americana para caracterizar a abrangência desta dificuldade discursiva, que os autores atribuem às limitações do que chamam de "primeira língua" do individualismo americano, com sua ênfase quase absoluta na idéia de auto-suficiência ("self-reliance"). Apesar de indicarem a existência de "línguas secundárias" que a maioria dos americanos também teria a sua disposição, as quais permitiriam um melhor equacionamento dos valores e da inserção do indivíduo na sociedade, a subordinação destas línguas à "primeira língua" do individualismo, compartilhada por todos, inibiria a elaboração de um discurso satisfatório sobre aqueles temas.

A propósito, o exemplo de Brian Palmer, um dos informantes de Bellah et al., é particularmente ilustrativo. Brian é um executivo profissionalmete muito bem sucedido, cuja preocupação com o sucesso e a independência financeira fez com que tivesse passado os primeiros 15 anos de sua carreira inteiramente dedicado ao trabalho, sem dar muita atenção a esposa e filhos. Em relação aos quais, aparentemente apenas cumpria a função de provedor. Até que um dia ao chegar em casa, após ter recebido uma oferta por sua casa, que estava a venda, sua esposa o avisa que: "uma vez que tenhamos vendido esta casa, viveremos em casas diferentes". Neste momento, descobre que a esposa andava tendo um caso já a algum tempo e, com cerca de quarenta anos, faz uma série de reflexões para entender o que estava acontecendo, com o objetivo de reestruturar sua vida. Brian acaba se casando de novo com uma mulher de sua idade, que também tem uma carreira profissional e filhos do primeiro casamento. A oportunidade de cuidar dos filhos, que pouco tempo após a separação resolvem morar com ele, faz com que Brian aprenda a cultivar as relações familiares, e fique estimulado a estruturar o novo casamento em outras bases. Agora Brian já não trabalha o mesmo número de horas na empresa, divide com a esposa parte das atividades domésticas, investe na sociabilidade familiar, e dá várias indicações de que se sente muito mais feliz com este novo estilo de vida.

Não obstante, quando instigado a justificar as mudanças em seu estilo de vida, se limita a identificar uma alteração em suas preferências que, em si mesmas, não seriam melhores nem piores que as anteriores. Neste contexto, os autores chamam a atenção que, embora o novo estilo de vida de Brian seja moralmente melhor equacionado, permitindolhe o engajamento em relações mais ricas, densas e profundas, ele não é capaz de defendêlo, "objetivamente", na comparação com seu estilo de vida anterior.

"...Moralmente, sua vida aparece muito mais coerente do que quando ele estava dominado pelo carreirismo, mas, ao ouvi-lo falar, mesmo seus impulsos mais profundos de ligação com os outros são tão mal fundamentados quanto seus desejos de momento. Ele não tem uma língua/linguagem para explicar o que parecem ser os compromissos reais que definem sua vida e, desta forma, os compromissos são em si mesmo precários." (Bellah et al. 1985:8).

É importante reter o final da citação, onde os autores assinalam que, sem conseguir explicitar e/ou justificar o que seriam os compromissos reais em sua vida, e portanto sem percebe-los adequadamente, Brian tem como conseqüência o enfraquecimento destes mesmos compromissos que ele preza tanto. De certa forma, é como se este enfraquecimento se desse a revelia dos objetivos ou das intenções do ator. O problema se repete nas mais diversas situações e contextos sociais, incluindo mesmo casos como o do ativista político que, não obstante sua dedicação à causa que mobiliza todos os seus esforços, não é capaz de articular um discurso convincente sobre os projetos que orientam seu engajamento (Bellah et al. 1985:17-20).

Embora o livro de Bellah et al. contenha exemplos de cidadãos que realizam um melhor balizamento de seus valores e compromissos ético-morais, ainda que dentro das limitações impostas pela predominância da "primeira língua do individualismo",14 o caso de Brian mostra bem a essência da dificuldade ou do dilema americano, assim como apontado pelos autores. Como gostaria de argumentar, tal quadro tem como implicação necessária não apenas o enfraquecimento dos compromissos aludidos acima, mas também o desrespeito a direitos cujo sancionamento demanda o reconhecimento explícito da dignidade da pessoa do cidadão, e/ou a manifestação do componente solidário da cidadania.

Farei agora uma breve exposição sobre as sessões de mediação no âmbito dos Juizados de Pequenas Causas nos EUA, onde o desrespeito àqueles direitos diretamente associados ao reconhecimento da dignidade do interlocutor seria particularmente aparente, para concluir minhas reflexões comparativas sobre os dilemas do respeito aos direitos de cidadania no Brasil e nos EUA.

Deve-se dizer que uma das razões pelas quais as sessões de mediação são especialmente interessantes para a discussão da dificuldade do reconhecimento de certos direitos, enquanto tais, nos EUA, é exatamente o fato delas propiciarem a explicitação de demandas que não encontram qualquer espaço para verbalização no âmbito das audiências judiciais. Como procurei mostrar em minha etnografia sobre pequenas causas em Cambridge, Massachusetts, (L.Cardoso de Oliveira 1989:298-339), as audiências judiciais são fortemente marcadas pelo "modo judicial de se avaliar a responsabilidade legal", o qual impõe um processo de filtragem das causas que inibe a manifestação de quaisquer argumentos que não estejam diretamente associados a parâmetros contratuais ou de responsabilidade civil ("tort") legalmente reconhecidos. Além disto, a cobrança da articulação de um raciocínio lógico-dedutivo ao narrar os eventos que ensejaram o litígio, incluindo aí a apresentação de evidências, seria uma dificuldade a mais para as partes exporem suas causas nas audiências judiciais (O'Barr & Conley 1985). Neste sentido, o problema das sessões de mediação não está na limitação dos argumentos e/ou assuntos que podem ser introduzidos no processo de negociação, mas na maneira de conduzir a discussão e de enfrentar certo tipo de questão.

Apesar do processo de mediação estar profundamente marcado por uma preocupação com questões de eqüidade ("fairness"), estas são excessivamente dissociadas da idéia de justiça, fazendo com que o desvelamento das razões ou motivos que deram origem ao conflito sejam colocadas em segundo plano, inviabilizando um balizamento mais objetivo da diferença entre o equânime e o não-equânime, para além da opinião expressa pelas partes no momento. Deste modo, ao mesmo tempo que os mediadores, —e até certo ponto os juízes também—, acreditam que este procedimento permite uma melhor compreensão de determinadas disputas, e a definição de uma solução mais satisfatória para as partes em muitas causas, rejeitam a idéia de que as sessões de mediação viabilizariam um melhor equacionamento do mérito jurídico das causas ou dos direitos nelas envolvidos.

Isto é, a mediação privilegia uma visão prospectiva, mais voltada para a satisfação dos interesses dos litigantes em vista da situação na qual se encontram no momento, do que para a avaliação dos direitos eventualmente agredidos ao longo do conflito ou disputa.

Esta visão é fundamentada no "bestseller" de Fisher & Ury, "Getting to Yes: Negotiating Agreement Without Giving In" (GTY), —o qual parece ter se tornado um referencial importante para as mais diversas práticas de negociação nos EUA—, e que orienta o trabalho dos mediadores.15 Assim como no caso dos informantes de Bellah et al. (1985), os autores do livro e seus seguidores (como os mediadores) têm grande dificuldade de justificar os direitos e/ou os valores que dão sustentação aos interesses negociados no processo. Aqui, é interessante notar que se, por um lado, os mediadores criticam os constrangimentos formais que inviabilizam uma apresentação (e a respectiva compreensão) adequada das pequenas causas no contexto das audiências judiciais, —reconhecida como a instância devidamente comprometida com o equacionamento da justiça—, por outro, uma vez que abrem espaço para a discussão das contingências e especificidades substantivas das causas nas sessões de mediação, se vêm obrigados a abrir mão da avaliação dos direitos das partes ou da correção normativa de suas ações. A situação apresentada por Fisher & Ury em GTY como exemplo paradigmático para a orientação do equacionamento ou negociação dos conflitos traz à tona, num só tempo, o potencial e as limitações da perspectiva:

"Considere a estória de dois homens discutindo numa biblioteca. Um quer que a janela fique aberta e o outro quer que ela fique fechada. Eles discutem acaloradamente o quanto a janela deve ficar aberta: uma fresta, meia janela, três-quartos de janela. Nenhuma solução satisfaz a ambos.

"Entra a bibliotecária. Ela pergunta ao primeiro porque ele quer a janela aberta: 'Para entrar ar fresco'. Então, pergunta ao outro porque ele quer a janela fechada: 'Para evitar a corrente de ar'. Depois de pensar por um minuto, ela abre totalmente uma janela na sala ao lado, trazendo para o ambiente ar fresco sem a corrente de ar." (1985:41).

Apesar de ser indubitavelmente mais simples do que a maioria das disputas mediadas no âmbito das pequenas causas, o exemplo tem a qualidade de ser excepcionalmente claro quanto aos procedimentos adotados e aos objetivos da negociação.

Inicialmente, o exemplo chama a atenção para as vantagens de se priorizar os interesses "objetivos" das partes, e de se realizar uma negociação orientada por princípios, na medida em que a solução encontrada produz uma situação mais satisfatória para as partes do que qualquer outra que se centrasse na negociação das posições e/ou das "razões" (direitos) das partes. Pois, mesmo que os dois homens na biblioteca tivessem chegado a uma solução de compromisso, na qual se dispusessem a ceder na mesma proporção e ficasse estipulado que a vidraça da janela permaneceria aberta até a metade, eles ainda assim ficariam sujeitos a, respectivamente, alguma corrente de ar e (provavelmente) menos ar fresco do que a solução sugerida pela bibliotecária (baseada exclusivamente nos interesses das partes) permitiria. Contudo, o outro lado da moeda, também presente no exemplo, é a separação, freqüentemente enrijecida, entre direitos e interesses. Como a maioria das disputas mediadas com sucesso no âmbito das pequenas causas indica, esta falta de recursos para lidar com o equacionamento dos direitos pode se constituir numa limitação significativa para a confecção de acordos equânimes. Isto é, acordos nos quais as partes se sentem plenamente contempladas em suas demandas pela reparação dos direitos eventualmente agredidos (L.Cardoso de Oliveira 1989:399-440 e 1995:15-23).

Neste sentido, uma das principais características de boa parte das disputas que desembocam nos Juizados de Pequenas Causas é a resistência à dissociação entre as dimensões moral e legal dos conflitos que as geraram. Com freqüência as partes demandam não apenas a indenização monetária, a qual teriam legalmente direito quando ganham a causa, mas também o reconhecimento e a recriminação do abuso moral a que teriam se submetido no momento de erupção da disputa.16 De certa forma, poder-se-ia dizer que além da preocupação com a definição do valor em dinheiro expresso na sentença do juiz, ou no acordo mediado, o Autor da causa gostaria de contar com o arrependimento ou com a repreensão moral do Querelado, sempre que este fosse de fato responsável pelas agressões (morais) que aquele teria sofrido. Embora esta característica constitua um padrão, ela é particularmente acentuada nos casos em que o valor da indenização reivindicada não justificaria a formalização da causa, como nas disputas de 30 ou 40 dólares, onde o custo total do Autor dificilmente ficaria muito abaixo disso.

Acontece que esta reparação moral não pode ser adequadamente discutida ou encaminhada sem que a origem da disputa, assim como o equacionamento dos direitos e das responsabilidades, sejam devidamente enfrentados. Caso contrario, se este enfrentamento é visto como contaminador da avaliação "objetiva" dos interesses das partes, a discussão das alegações de agressão não encontra a receptividade necessária e as demandas de reparação não são nem articuladas. Embora tenha enfatizado acima que a perspectiva adotada pelos mediadores insiste na separação entre direitos e interesses, dando prioridade aos últimos, devo dizer que na prática da mediação esta separação acaba sendo um pouco relativizada, ainda que não o bastante para propiciar um reconhecimento mais freqüente daqueles direitos diretamente associados a dignidade do cidadão.

Por outro lado, é importante observar que a maneira mais utilizada para descaracterizar as demandas dos atores, relativas ao reconhecimento destes direitos, é identificá-las como expressão de um comportamento ou atitude emocional. Pois, sem conseguir articular um discurso moral substantivo e/ou fundamentar os valores que motivam a percepção de agressão, e a respectiva demanda de reparação, os atores recorrem a uma categoria psicológica. Isto é, uma categoria ligada ao universo dos sentimentos, que encontra forte respaldo na tradição Expressivista do individualismo, mas que, ao situar-se dentro dos limites da esfera privada, não permite uma percepção adequada do comportamento desrespeitoso do oponente como um insulto aos direitos.17

É verdade que muitas vezes a categoria de comportamento emocional é acionada não apenas para evitar o que os mediadores consideram como discussão improdutiva, mas também para evitar o que eles vêem como a ameaça de criação de um impasse intransponível nas negociações. Pois, além destas demandas, identificadas como emocionais, serem normalmente verbalizadas com os ânimos exaltados, elas costumam tomar a forma e o tom de um revide. Ou seja, a cobrança de explicações esboçada pelo litigante alegadamente ofendido assume a forma de uma nova agressão ou quase isto.

Como, por exemplo, quando o cliente de uma lavanderia que teve cinco camisas perdidas no empreendimento, —exatamente na semana em que a lavanderia estava mudando de proprietário—, reclama que só alguém irresponsável, e sem consideração para com o público, teria agido como o sobrinho (e empregado) do Querelado (o atual dono da lavanderia) ao dizer para ele, o Autor da causa, que as camisas já deviam ter sido entregues pelo ex-proprietário da lavanderia, tentando se esquivar do problema. Ou, quando uma exco- inquilina de um apartamento alugado juntamente com um casal, se irrita com o homem do casal, —o Autor da causa contra ela—, ao acusá-la de ter agido de má-fé e de ter inventado mentiras para justificar o não cumprimento do acordo de permanecer no apartamento por mais um mês, até que o novo co-inquilino do casal pudesse ocupar seu lugar no apartamento. Nestes momentos, os mediadores costumam interromper a sessão para reunir-se com cada uma das partes separadamente, com o objetivo de acalmar os ânimos e buscar novos recursos para retomar as negociações tendo como foco os interesses das partes e não o equacionamento das responsabilidades sobre atos e atitudes trocados durante a disputa.

De qualquer forma, é importante observar que em todos estes casos, inclusive naqueles onde a utilização da categoria de comportamento ou atitude emocional não é provocada pela "necessidade" de acalmar os ânimos das partes, —apesar de ter a mesma conseqüência de inibir a discussão de certas demandas—, os direitos excluídos da pauta das negociações são os que exigem, para que sejam reconhecidos, uma manifestação explícita de consideração à pessoa do indivíduo/cidadão. Quer dizer, uma manifestação de reconhecimento de sua dignidade, enquanto membro de uma comunidade/sociedade inclusiva e minimamente solidária, onde a identidade dos cidadãos tenha um mínimo de substância que lhes garanta um tratamento que não seja estritamente formal e coisificador.

Na realidade, o que está por traz da reclamação do cliente da lavanderia, assim como da irritação da ex-co-inquilina, ou mesmo das acusações do homem do casal que ficou no apartamento, é a dificuldade que todos eles têm de admitir a pretensão de razoabilidade da desconsideração que teriam sofrido de seus interlocutores, os quais teriam agido sistematicamente de maneira unilateral para com eles. Neste sentido, o exemplo mais impressionante é o do Autor de uma causa, que chega a formalizar uma demanda relativa a estes direitos disfarçada sob a roupagem de uma reivindicação estritamente econômica.18

Apesar de chegar a explicitar a motivação central de sua demanda em termos da falta de atenção a sua pessoa por parte do Querelado, o Autor acaba assumindo que, em última instância, o que estava em jogo era um desconforto de ordem emocional.

Como já foi dito acima, o grande problema com este tipo de encaminhamento das negociações é o não equacionamento dos direitos eventualmente agredidos que ficam, assim, sem reparação. Nos poucos exemplos de acordos equânimes, quando estes direitos são equacionados satisfatoriamente, as respectivas demandas são sancionadas, de uma maneira ou de outra, em comum acordo pelas partes e o mediador ao longo do processo.

Finalmente, gostaria de fazer três observações à guisa de conclusão. Em primeiro lugar, esta falta de consideração à pessoa ou à dignidade do cidadão, e o conseqüente desrespeito a certos direitos, não é vivida com pesar e contrariedade pelos americanos apenas no universo dos Juizados de Pequenas Causas. Ela aparece também com alguma freqüência, ainda que com menos dramaticidade, em muitas situações que fazem parte da vida cotidiana da população. Gostaria de recorrer aqui à categoria de comportamento "business-like", a qual, apesar de se referir a uma prática sancionada positivamente na esfera pública, é acionada de maneira critica em certas circunstâncias, isto é, para identificar instâncias onde ego se sente agredido por interlocutores que, ao agirem de maneira estritamente formal, não conseguem reconhecer em ego um sujeito com identidade própria.19 E, portanto, não conseguem estabelecer com ele a sintonia necessária para o bom desenvolvimento da interação. Embora aqui também se repita a dificuldade de articular a crítica ao comportamento business-like com a defesa dos direitos do cidadão, esta categoria é especialmente relevante e iluminadora porque ela identifica, neste tipo de comportamento, uma dimensão de insensibilidade percebida como uma contundente falta de consideração para com a pessoa do cidadão.

Se, por um lado, o déficit de cidadania dai advindo é relativamente pequeno quando comparado ao déficit decorrente da dificuldade de se respeitar os direitos do indivíduo no Brasil, por outro, tal quadro sugere que a universalização dos direitos de cidadania não deve ter, como implicação, a institucionalização da noção de indivíduo genérico e sem identidade, o chamado "unencumbered self". Pois, ainda que esta noção pudesse representar mais do que uma "ideologia" e refletisse plenamente a experiência dos atores, sua vigência significaria a usurpação dos direitos de cidadania vinculados à necessidade de reconhecimento da dignidade, ou da manifestação de consideração à pessoa, do cidadão.

Na mesma direção, se, como disse na introdução, a noção de direitos é uma categoria relacional, a noção de dignidade é uma categoria cuja atualidade nas interações sociais supõe o reconhecimento recíproco entre as partes, ou a existência de uma situação de mutualidade entre elas.

Vale a pena ressaltar ainda que o desequilíbrio entre os princípios de justiça e solidariedade, causador dos respectivos déficits de cidadania no Brasil e nos EUA, é motivado em grande medida por fatores de ordem cultural, indicando a necessidade de um maior investimento de pesquisas nesta área, para viabilizar uma melhor compreensão dos dilemas da cidadania e da democracia na nossa contemporaneidade.

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Notas

1. Uma versão preliminar deste trabalho foi apresentada na mesa redonda "A cidadania no pós-socialismo: aspectos teóricos e filosóficos", durante a realização do XVII Encontro Anual da ANPOCS, em outubro de 1993, no Hotel Glória em Caxambú.

2. Recentemente, chamei atenção para o fato de que esta conjunção entre interação e contexto faz com que o caráter relacional da categoria "direitos" tenha duas dimensões. Em primeiro lugar, a categoria remete à tematização de relações sociais e/ou relações de interesses. Em segundo lugar, demanda que o equacionamento das interações em pauta seja balizado com relação aos valores que lhes dão sentido (L.Cardoso de Oliveira 1993:15).

3. Num artigo recente, Sheyla Benhabib (1991) faz um mapeamento interessante deste debate, indicando os pontos de articulação da discussão que lhe parecem potencialmente mais fecundos.

4. Não quero dizer com isto que a ética-Discursiva se dedique a questões empíricas, ou mesmo que articule satisfatóriamente suas proposições teóricas com problemas empíricos.

5. O principal exemplo discutido por Taylor para ilustrar seu ponto de vista é a demanda "Quebecois" de que a província do Quebec seja considerada uma "sociedade distinta." 6. A propósito da importância da associação entre as categorias de honra e dignidade, assim como de suas relações com a contaminação do espaço público pelo privado no caso brasileiro, ver o interessante trabalho de Teixeira (1995) sobre a CPI do Orçamento e a noção de "decoro parlamentar".

7. O "impeachment" do ex-presidente Collor deve ser visto como uma excessão radical que, não obstante, confirma a regra.

8. Inclusive do mercado de trabalho, através da regulamentação de profissões cuja efetivação não representa um benefício para a população, mas, sobretudo, a satisfação dos interesses partucularistas daqueles que prestam os respectivos serviços (e.g., jornalismo).

9. Ver reportagem publicada na Revista Veja, em sua edição de 24 de maio de 1995 (pp. 98-100), onde um dos candidatos à indenização é apresentado como um profissional que começou a trabalhar em 1980, portanto após o fim da censura, mas que se julga no direito de ser indenizado, com o apoio do sindicato, porque o jornal onde trabalhava teve que fechar em 1986 devido aos prejuízos sofridos em decorrência da ditadura.

10. Como todos os candidatos a progressão funcional para professor titular, via concurso, têm que ser necessariamente professores adjuntos, e como no atual Regime Jurídico Único os aposentados recebem uma pensão equivalente ao salário da posição imediatamente superior, os docentes que conseguem este privilégio passam a receber dois salários de professor titular.

11. É claro que a satisfação das demandas nestes casos não configuraria uma situação de nepotismo e, desde que não resultasse na usurpação dos direitos de outros, tão pouco mereceria qualquer restrição.

12. Neste sentido, alguns trabalhos de antropólogos sobre estratégias de definição de voto e lealdade política em eleições no interior do país dão substância as colocações de Laraia, e chamam atenção para características interessantes do discurso nativo que justifica estas práticas (Palmeira & Herédia s.d; Chaves 1994 e Abreu 1993).

13. Para uma discussão detalhada da questão da paridade sob esta perspectiva, ver L. Cardoso de Oliveira (1992).

14. Em todos estes casos os atores fariam uso de "línguas secundárias", que enfatizariam a identidade com tradições e compromissos associados ao que os autores chamam de "communities of memory" (Bellah et al.

1985:154). É interessante notar que trata-se, em todas as circunstâncias, de universos localmente circunscritos e bem delimitados como, por exemplo, as comunidades étnicas e religiosas.

15. Aliás, os autores estavam entre os principais membros do "Harvard Negotiation Project", ao qual a maioria dos mediadores que atuavam no Juizado estavam associados, enquanto estudantes de Direito em Harvard.

16. Em minha experiência, ao longo de quase dois anos como Conselheiro "Para-Legal" (voluntário), no Serviço de Aconselhamento para Pequenas Causas de Cambridge, a grande maioria das pessoas que procuravam o serviço, normalmente os Autores das causas, não se satisfaziam com a orientação recebida e cobravam a solidariedade moral do Conselheiro.

17. Devo esclarecer que nos tribunais mais formais há uma categoria de demandas que se identifica, ao menos parcialmente, com a necessidade de reparação de agressões aos sentimentos dos indivíduos. Trata-se da categoria "pain and suffering", literalmente "dor e sofrimento", que é freqüentemente acionada por litigantes que tiveram grande prejuízo em decorrência da má-fé ou simplesmente de ilegalidades praticadas por terceiros. Entretanto, estas causas têm duas características que as distinguem das que estou discutindo aqui: (1) a categoria pain and suffering é sempre acionada como um agravante de outra ofensa legalmente fundamentada; e, (2) a caracterização deste tipo de agressão aos sentimentos exige o testemunho de especialistas que dão um parecer técnico sobre a extensão da "dor e do sofrimento", o que seria impensável no âmbito das pequenas causas em vista do custo destes testemunhos.

18. A demanda é apresentada como uma cobrança de juros sobre o valor do montante principal da causa, para cobrir os custos adicionais que o Autor teria tido em vista da falta de resposta/atenção do Querelado as suas reivindicações.

19. Embora a categoria business-like se refira prioritariamente a um comportamento formal e objetivo, acredito que em certos casos ela pudesse ser melhor traduzida pela idéia de comportamento instrumental.

Prof. Luís Roberto Cardoso de Oliveira
lcardoso[arroba]unb.br



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