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Substituição do milho pela casca de café ou de soja em dietas para vacas leiteiras (página 2)

André Soares de Oliveira

Material e Métodos

O experimento foi conduzido na Unidade de Ensino, Pesquisa e Extensão em Gado de Leite (UEPE-GL) do Departamento de Zootecnia (DZO) da Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Viçosa-MG, durante o período de junho a setembro de 2003.

Foram utilizadas 12 vacas holandesas, puras e mestiças, distribuídas em três quadrados latinos 4 x 4, balanceados de acordo com o período de lactação. O experimento foi constituído de quatro períodos de 19 dias (os 12 primeiros de adaptação às dietas e os demais para coleta de amostras).

Os animais foram alimentados com quatro dietas. A dieta controle (SiMi) foi constituída de silagem de milho (Zea mays, híbrido AG-1051) com 40% de concentrado, com base na MS, e as dietas à base de cana-de-açúcar (Saccharum officinarum, L; variedade RB 73-9735) foram compostas de 60% de concentrado, com base na MS, de modo que os percentuais de substituição do milho foram 0% (CMi), 25% com casca de café (CCC) ou 50% com casca de soja (CCS), com base na MS total da dieta. Às dietas à base de cana-de-açúcar, adicionou-se 1% da mistura de nove partes de uréia e uma parte de sulfato de amônio, com base na matéria natural, e, aos concentrados foram misturados bicarbonato de sódio e óxido de magnésio na proporção de 2:1 (Tabela 1). As dietas foram formuladas para serem isonitrogenadas, com 14% de PB, de modo a atender às exigências nutricionais de uma vaca com 580 kg de peso corporal produzindo 20 kg/dia de leite com 3,5% de gordura (NRC, 2001). Os procedimentos de preparo e análise das amostras de alimentos e sobras e a composição químico-bromatológica das dietas (Tabela 2) experimentais foram descritos por Oliveira et al. (2007).

 No 17º dia de cada período experimental, os animais foram submetidos à observação visual para avaliação do comportamento ingestivo. Os animais foram observados a cada dez minutos, durante 24 horas, para determinação do tempo despendido em alimentação, ruminação e ócio. No dia seguinte, foi realizada a contagem do número de mastigações merícicas e do tempo despendido na ruminação de cada bolo ruminal com a utilização de cronômetro digital. Para essa avaliação, foram feitas observações de três bolos ruminais em três períodos diferentes do dia (10 -12h; 14-16h e 19-21h), calculando-se a média do número de mastigações merícicas e o tempo gasto por bolo ruminal. Essa observação foi feita em todos os animais do experimento. Durante a observação noturna, o ambiente foi mantido com iluminação artificial.

As eficiências de alimentação (EAL) e ruminação (ERU), o número de bolos ruminais por dia (NBR), o tempo de mastigação total por dia (TMT) e o número de mastigações merícicas por dia (NMMnd) foram obtidos segundo metodologia descrita por Büger et al. (2000).

O líquido ruminal foi coletado utilizando-se sonda esofágica, segundo Ortolani (1981), para determinação do pH e da concentração dos compostos nitrogenados amonicais (N-NH3), nos tempos 0 (zero), antes da alimentação, e 3 horas após a alimentação matinal do 19º dia de cada período experimental.

As amostras de leite foram coletadas no 16º dia de cada período experimental, nas ordenhas da manhã e da tarde, para as análises de compostos nitrogenados totais, alantoína e uréia. Os procedimentos para análise dos compostos nitrogenados totais do leite foram descritos por Oliveira et al. (2007). Parte da amostra composta de leite foi desproteinizada com ácido tricloroacético a 25%, filtrada em papel-filtro e armazenada a -15ºC para análises de uréia e alantoína no filtrado.

Amostras spot de urina foram obtidas de todas as vacas no 16º dia de cada período experimental, 4 horas após a alimentação matinal, durante micção estimulada por massagem na vulva. A urina foi filtrada e alíquotas de 10 mL foram retiradas e diluídas imediatamente em 40 mL de ácido sulfúrico a 0,036 N para evitar destruição bacteriana dos derivados de purinas e precipitação do ácido úrico. Em seguida, as alíquotas foram armazenadas a -15ºC para análises de nitrogênio total, uréia, alantoína, ácido úrico e creatinina.

O balanço de compostos nitrogenados (BN) foi obtido pela diferença entre o total de nitrogênio ingerido (N-total) e o total de nitrogênio excretado nas fezes (N-fezes), na urina (N-urina) e no leite (N-leite). A determinação do nitrogênio total nas fezes e na urina foi feita segundo metodologia descrita por Silva & Queiroz (2002).

Foram coletadas amostras de sangue de todas as vacas no 16º dia de cada período experimental, 4 horas após a alimentação matinal, utilizando-se EDTA como anticoagulante. Logo após a coleta, as amostras foram centrifugadas (2.236 xg por 15 minutos) e o plasma sangüíneo foi acondicionado em recipientes de vidro e congelado a -15ºC para posteriores análises das concentrações de uréia.

As análises de alantoína na urina e no leite foram feitas pelo método colorimétrico, segundo Fujihara et al. (1987), descrito por Chen & Gomes (1992). As determinações de creatinina, ácido úrico e uréia foram realizadas utilizando-se kits comerciais (Labtest).

O volume urinário total diário foi estimado dividindo-se as excreções urinárias diárias de creatinina pelos valores da concentração de creatinina na urina, segundo Valadares Filho & Valadares (2001), a partir da proposição de 24,05 mg/kg de PV de creatinina (Chizzotti, 2004).

A excreção total de DP foi calculada pela soma das quantidades de alantoína e ácido úrico excretados na urina e da quantidade de alantoína excretada no leite, expressas em mmol/dia.

As purinas absorvidas (X, mmol/dia) foram calculadas a partir da excreção de DP (Y, mmol/dia), por meio da equação Y = 0,85X+0,385 PV0,75, em que 0,85 é a recuperação de purinas absorvidas como derivados de purinas e 0,385 PV0,75, a contribuição endógena para excreção de purinas (Verbic et al., 1990).

A síntese de compostos nitrogenados microbianos no rúmen (Y, g N/dia) foi calculada em função das purinas absorvidas (X, mmol/dia), por meio da equação Y= (70X)/(0,83x0,116x1000), em que 70 representa o conteúdo de N nas purinas (mg N/mmol); 0,83, a digestibilidade das purinas microbianas e 0,116, a relação N-purina:N total nas bactérias (Chen & Gomes, 1992).

Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância e ao teste de média (Tukey), a 5% de significância, utilizando-se o programa SAEG, versão 7.0 (UFV, 1997).

Resultados e Discussão

Os tempos médios despendidos em alimentação e ruminação para a dieta com silagem de milho (SiMi) foram maiores (P<0,05) que os obtidos com as dietas à base de cana-de-açúcar, que não diferiram (P>0,05) significativamente (Tabela 3). Contrariamente, quando alimentados com a dieta à base de silagem de milho, os animais mantiveram-se por menos (P<0,05) tempo em ócio.

Os tempos gastos com alimentação e ruminação apresentaram correlação positiva com o teor e consumo de FDN (Dado & Allen, 1995). Assim, os menores (P<0,05) tempos observados com alimentação e ruminação para as dietas à base de cana-de-açúcar sem casca (CMi) e com 25% de substituição do milho por casca de café (CCC), em relação à dieta com silagem de milho (SiMi), podem estar relacionados aos menores teores e consumos de FDN.

Entretanto, a mesma explicação não é válida para a dieta à base de cana-de-açúcar com 50% de susbtituição do milho por casca de soja (CCS), pois, embora o consumo de FDN desta dieta não tenha diferido (P>0,05) em relação à dieta SiMi, os tempos em alimentação e ruminação foram menores (P<0,05) (Tabela 4). Fatores intrínsecos à casca de soja, como a rápida taxa de digestão da parede celular e pequeno tamanho de partícula com alta capacidade de hidratação (Ipharraguerre & Clark, 2003), podem ter reduzido os tempos totais para ingestão de MS e ruminação do bolo alimentar.

Na Tabela 4 constam as médias e os coeficientes de variação obtidos para as características do comportamento ingestivo dos animais alimentados com as diferentes dietas experimentais.

As dietas SiMi e CCC não diferiram (P>0,05) quanto à eficiência de alimentação da MS, todavia, a EAL foi maior (P<0,05) para as dietas CMi e CCS, que não diferiram (P>0,05) entre si. Como o consumo de MS não foi influenciado (P>0,05) pelas dietas, a menor (P<0,05) eficiência para dieta SiMi foi atribuída ao maior tempo gasto com alimentação. O maior teor de umidade da dieta SiMi alterou o comportamento alimentar dos animais, que aumentaram o tempo de alimentação para compensar o menor teor de MS por bocado.

O tempo gasto em alimentação não diferiu (P>0,05) entre os animais alimentados com as dietas CCC e CMi, mas apresentou tendência de aumento, o que explica o menor consumo de MS por unidade de tempo.

A eficiência de alimentação da FDN foi maior (P<0,05) para a dieta CCS, enquanto as demais não diferiram (P>0,05) entre si. O maior consumo de FDN no mesmo tempo de ruminação explica as diferenças da dieta CCS em relação àquelas à base de cana-de-açúcar. O menor tempo de ruminação da dieta CCS, com mesmo consumo de FDN, explica a maior eficiência de alimentação da FDN da dieta SiMi.

A eficiência de ruminação da MS foi menor (P<0,05) para a dieta SiMi, enquanto as dietas CMi não diferiram (P>0,05). O maior (P<0,05) tempo gasto com ruminação, mas com o mesmo consumo em relação às demais dietas, explica a menor quantidade de MS ingerida da dieta SiMi por unidade de tempo.

A dieta CCS promoveu maior eficiência de ruminação da FDN (P<0,05), não sendo observadas diferenças entre as demais. As caraterísticas favoráveis da parede celular da casca de soja permitiram maior consumo de FDN e mesmo tempo de ruminação em comparação às demais dietas.

O tempo total de mastigação, o número de bolos ruminais e o número de mastigações merícicas foram maiores (P<0,05) para a dieta SiMi, enquanto aquelas à base de cana-de-açúcar não diferiram (P>0,05) quanto a essas variáveis, que se correlacionaram positivamente com os tempos gastos em alimentação e ruminação (Dado & Allen, 1995). Os resultados observados para a dieta SiMi podem estar relacionados aos maiores tempos gastos com alimentação e ruminação em comparação às dietas à base de cana-de-açúcar.

O número de mastigações merícicas por bolo ruminal e o tempo de ruminação por bolo ruminal não foram influenciados (P>0,05) pelas dietas. O maior tempo (P<0,05) despendido com ruminação para a dieta SiMi se relacionou mais ao número diário de bolos ruminais necessários para a ruminação que ao número de mastigações merícicas e ao tempo de ruminação por unidade de bolo ruminal.

Na Tabela 5 constam os valores de pH e a concentração de amônia do líquido ruminal nos tempos 0 e 3 horas após a alimentação. Apesar do maior nível de concentrado (60% da MS) nas dietas à base de cana-de-açúcar, o pH ruminal não diferiu (P>0,05) entre os tempos de coleta e manteve-se na faixa considerada ideal para máximo crescimento microbiano (Van Soest, 1994).

O pH do líquido ruminal de animais consumindo dietas à base de cana-de-açúcar normalmente é alto e estável, variando de 6,8 a 7,3 como resultado da alta taxa de fluxo salivar decorrente do tempo considerável de mastigação dessas dietas (Leng & Preston, 1976) e da ação regulatória dos protozoários sobre a disponibilidade de carboidratos solúveis (Minor et al., 1971, citados por Oliveira, 1999; Souza, 2003).

Contrariamente, foi observado menor tempo despendido com mastigação para as dietas à base de cana-de-açúcar em comparação àquela com silagem de milho. Contudo, esse menor tempo não foi suficiente para comprometer a secreção salivar e o tamponamento ruminal, provavelmente em virtude da maior taxa de absorção de ácidos graxos voláteis (AGV) das dietas com cana-de-açúcar, compensando a maior produção de AGV, e dos efeitos tamponante do bicabornato de sódio e alcalinizante do óxido de magnésio e da amônia proveniente da uréia dietética.

A substituição de grãos de cereais ricos em carboidratos rapidamente fermentáveis por alimentos ricos em carboidratos estruturais de alta digestão, como a casca de soja, tem sido utilizada para prevenir distúrbios no funcionamento ruminal (Ipharraguerre & Clark, 2003), pois a fermentação ruminal dos carboidratos estruturais não produz ácidos capazes de reduzir o pH ruminal (Hall, 2001). No entanto, não foi observada melhora no ambiente ruminal (pH) com a substituição de 50% do milho pela casca de soja na dieta à base de cana-de-açúcar, o que está de acordo com as observações de Cunningham et al. (1993) e Elliott et al. (1995). A ausência de diferenças nos tempos despendidos com mastigação, quando o milho foi substituído pela casca de soja, pode explicar o resultado obtido, pois o tempo de mastigação correlaciona-se positivamente à secreção de saliva e, conseqüentemente, ao tamponamento ruminal (Mertens, 2001).

No tempo zero não houve diferença (P>0,05) para a concentração de amônia ruminal. Entretanto, três horas após a alimentação, a dieta CCC promoveu menor (P<0,05) concentração de amônia ruminal em relação às dietas SiMi e CCS, não diferindo (P>0,05) da dieta CMi. As elevadas concentrações de compostos nitrogenados presentes na fração fibrosa da casca de café na forma de NIDN e NIDA (Oliveira et al., 2007), considerados de baixa disponibilidade para os microrganismos do rúmen (Licitra et al., 1996), associadas ao maior teor de polifenóis totais (Orskov, 1992), podem ter sido a causa da menor degradabilidade ruminal da proteína da dieta e, conseqüentemente, da menor concentração de amônia ruminal.

As concentrações de amônia ruminal 3 horas após a alimentação, obtidas para todas as dietas, foram superiores ao mínimo de 5 mg/dL sugerido por Satter & Slyter (1974) para o maximar o crescimento microbiano in vitro, mas inferiores ao mínimo de 15 mg/dL sugerido por Leng & Nolan (1984). No entanto, a concentração ruminal representa uma medida de excesso e, necessariamente, não reflete a eficiência de crescimento de todos os microrganismos ruminais (Morrison & Mackie, 1996). A exigência de amônia ruminal como fonte de nitrogênio para síntese microbiana não é homogênea, sendo de 100% do nitrogênio total para os microrganismos que degradam carboidratos fibrosos e de 34% para aqueles que degradam CNF (Russell et al., 1992). Como as dietas apresentaram elevado teor de CNF, os valores observados de amônia ruminal possivelmente não comprometeram o crescimento microbiano.

Os níveis de excreção de uréia pela urina (EU-urina), as concentrações de nitrogênio uréico no leite (NUL) e no plasma (NUP) e a relação NUL/NUP obtidos para as dietas são apresentados na Tabela 6. Não foram observadas diferenças (P>0,05) para EU-urina, NUL e relação NUL/NUP entre as dietas experimentais. No entanto, o nível de NUP foi menor (P<0,05) na dieta SiMi em relação àquelas com cana-de-açúcar, à exceção da dieta CCC. Entre as dietas à base de cana-de-açúcar, a CCC apresentou menor (P<0,05) concentração de NUP em relação à CMi, mas não diferiu (P>0,05) da dieta CCS.

A concentração de NUP correlaciona-se positivamente aos teores dietéticos de PB (Broderick & Clayton, 1997; Jonker et al., 1998; Chizzotti, 2004; Nousiaine et al., 2004) e PDR (Oliveira et al., 2001; Chizzotti, 2004). Assim, o menor valor de NUP obtido para a dieta SiMi pode ser atribuído ao menor consumo de PB (2,54 kg/dia) em relação às dietas CMi (2,81 kg/dia) e CCS (2,86 kg/dia), como verificado por Oliveira et al. (2007). Embora o consumo de PB não tenha diferido (P>0,05) entre as dietas à base de cana-de-açúcar, o menor valor de NUP para a dieta CCC pode ter sido ocasionado pela menor degradabilidade ruminal da proteína.

A relação NUL/NUP média encontrada para as dietas (0,98) reflete alta correlação entre as duas variáveis observada em diversos trabalhos (Broderick & Clayton, 1997; Jonker et al., 1998; Chizzotti, 2004). Broderick & Clayton (1997), utilizando dados de 482 vacas holandesas, recomendaram a seguinte equação para estimar NUP a partir do NUL: NUP = 1,021NUL + 0,399 (r2 = 0,918), que superestimou em apenas 5, 1, 6 e 2% o NUP observado nas dietas SiMi, CMi, CCC e CCS, respectivamente. Apesar da alta correlação e da mesma tendência de resultados, os valores de NUL não diferiram (P>0,05) entre as dietas, ao contrário do NUP, o que pode ser explicado pelo maior coeficiente de variação (CV) observado nos resultados de NUL em relação aos de NUP.

O valor médio observado para a concentração de NUL (12,59 mg/dL) está na faixa de balanceamento de energia e proteína considerada adequada, de 10 a 17 mg/dL (Broderick, 1995; Harris, 1996; Moore & Varga, 1996; Jonker et al., 1998; Ferguson, 2001; Machado & Cassoli, 2002) e abaixo do limite máximo de 19 mg/dL sugerido por Butler et al. (1995) a partir do qual ocorreria redução na eficiência reprodutiva.

Os valores médios e os coeficientes de variação para os consumos de compostos nitrogenados totais (NT), a excreção de compostos nitrogenados nas fezes (N-fecal), na urina (N-urina) e no leite (N-leite), o balanço de nitrogênio (BN) e as médias das excreções ou secreções em relação ao NT obtidas para as dietas são apresentados na Tabela 7.

A excreção de N-fecal, em g/dia e em % do NT, da dieta CCC foi maior (P<0,05) que a da dieta SiMi, que, por sua vez, não diferiu (P>0,05), em % do NDT, das dietas CMi e CCS. Embora não tenham sido observadas diferenças (P>0,05) entre as dietas à base de cana-de-açúcar, os valores de N-fecal para as dietas CCC e CCS foram numericamente maiores que os da dieta CMi, provavelmente em razão da maior presença de compostos nitrogenados nas formas de NIDN e NIDA da casca de café e de NIDN da casca de soja em relação ao milho (Oliveira et al., 2007), de menor degradabilidade ruminal e digestão intestinal.

A excreção de N-urina, em g/dia e em %do NT, não foi afetada (P>0,05) pelas dietas. Alguns trabalhos foram desenvolvidos para estimar a excreção de nitrogênio na urina a partir dos níveis de nitrogênio uréico no leite (NUL) como forma de monitorar o balanceamento protéico da dieta (Jonker et al., 1998; Chizzotti, 2004). Jonker et al. (1998) desenvolveram a equação: N-urina (g/dia) = 12,54*NUL (mg/dL), que superestimou em 29,7% o valor médio observado das dietas (121,75g/dia). Chizzotti (2004), por sua vez, propôs as equações: N-urina (g/dia) = 0,0135*NUL (mg/dL)*PV(kg) (r2 = 0,69) e N-urina (g/dia) = 0,0151*NUP(mg/dL)*PV(kg) (r2 = 0,69), que subestimaram em 18,6 e 9,0% o valor médio observado de N-urina.

A secreção de nitrogênio no leite (N-leite), expressa em g/dia, não diferiu (P>0,05) entre as dietas. Broderick & Clayton (1997) desenvolveram uma equação que correlaciona a eficiência de utilização do nitrogênio aos teores de NUL: Eficiência de N (N-leite/NT) = -0,004NUL (mg/dL) + 0,309 (r2 = 0,626). Considerando o valor médio de NUL de 12,59 mg/dL das dietas (Tabela 6), a equação subestimou em apenas 2,1% o valor médio observado de eficiência das dietas de 0,2643 (26,43% de N-leite/N-total).

O balanço de nitrogênio (BN) em g/dia foi menor (P<0,05) para a dieta CCC que para as demais, exceto CCS. As dietas CMi e CCS não diferiram (P>0,05) da dieta SiMi quanto ao BN em g/dia. O menor valor de BN para a dieta CCC pode ser atribuído ao maior valor de excreção de N-fecal. Mesmo assim, independentemente da dieta, não houve valor negativo para o BN, indicando que o consumo de proteína atendeu às exigências protéicas das vacas.

Na Tabela 8 são apresentadas as excreções de alantoína na urina (ALU) e no leite (ALL), de ácido úrico na urina (ACU) e de purinas totais (PT) e absorvidas (PA), a síntese de compostos nitrogenados microbianos (Nmic) e a eficiência microbiana (Emic) obtidas para as dietas.

Nenhuma dessas variáveis foi influenciada (P>0,05) pelas dietas, o que está de acordo com as observações de Costa et al. (2005), que não encontrou diferenças na síntese de nitrogênio microbiano e na eficiência microbiana em vacas leiteiras com produção diária de 20 kg alimentadas com dietas à base de cana-de-açúcar com 60% de concentrado, em relação à dieta silagem de milho e 40% de concentrado. Os valores médios de Nmic e de Emic encontrados neste trabalho (273 g/dia e 130,08 g PBmic/kg de NDT) foram próximos aos observados por Costa et al. (2005), de 268,54 e 126,4, respectivamente.

Avaliando os resultados obtidos, pode-se considerar que as dietas não diferiram quanto ao suprimento de energia, proteína e outros nutrientes essenciais para a síntese de proteína microbiana, principal fonte de aminoácidos para vacas em lactação (Valadares Filho & Valadares, 2001). O valor médio de eficiência microbiana obtido para as dietas (de 130,08 gPBmic/kg de NDT) foi similar ao valor médio sugerido pelo NRC (2001), de130 g PBmic/kg de NDT.

Conclusões

A substituição do milho pela casca de café ou pela casca de soja nos níveis de 25% ou 50%, com base na MS da dieta, respectivamente, não promove aumento na atividade mastigatória e na melhora do ambiente ruminal de vacas de leite recebendo dietas com cana-de-açúcar e 60% de concentrado.

O milho pode ser substituído por casca de café ou casca de soja em níveis de 25 ou 50%, com base na MS da dieta, respectivamente, sem comprometer a eficiência de utilização dos compostos nitrogenados, a síntese de compostos nitrogenados microbianos ruminais e a eficiência microbiana ruminal de vacas com produção diária de 20 kg de leite alimentadas com dietas com cana-de-açúcar e 60% de concentrado.

Literatura Citada

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André Soares de OliveiraI;

andresoli@uol.com.br

José Maurício de Souza CamposII;

Sebastião de Campos Valadares FilhoII;

Anderson Jorge de AssisIII;

Rafael Monteiro Araújo TeixeiraIV;

Luciana Navajas RennóV;

Douglas dos Santos PinaIV;

Gustavo Soares de OliveiraVI

IDoutorando do DZO/UFV. Bolsista do CNPq
IIDepartamento de Zootecnia/UFV
IIIDoutor em Zootecnia (Nutrição e Produção de Ruminantes) pela UFV
IVDoutorando do DZO/UFV
VUNIPAC, Juiz de Fora - MG
VIGraduando em Zootecnia/UFV

Revista Brasileira de Zootecnia v.36 n.1 Viçosa jan./fev. 2007



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