A autonomia financeira do Ministério Público

Enviado por Emerson Garcia


  1. Introdução
  2. Da posição do Ministério Público no cenário jurídico
  3. A autonomia financeira do Ministério Público e seu alicerce normativo
  4. A projeção da autonomia financeira na elaboração da lei orçamentária
  5. A autonomia financeira na execução da lei orçamentária
  6. A autonomia financeira e a lei de responsabilidade fiscal
  7. Síntese conclusiva

I. Introdução

O evolver da dogmática jurídica, a exemplo do que se verifica em qualquer seara do saber, pressupõe que as teorias da argumentação sejam impregnadas por uma visão prospectiva, distanciando-se do passado na medida em que o tempo e a mutação social o exijam. Fato, norma e valor - isto para utilizarmos a conhecida Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale1 - devem evoluir juntos, desprendendo-se de concepções sedimentadas sob a égide de realidade distinta e informadas por circunstáncias diversas, o que terminará por evitar a própria estagnação da ciência jurídica. Antigos conceitos não são aptos a explicar concepções atuais, quando muito, auxiliam no processo de interpretação; nunca como elementos limitadores, mas, sim, como indicativos da melhor solução a ser alcançada.

Delinear o presente e projetar o futuro ignorando o influxo temporal que medeia entre um e outro é o mesmo que buscar paralisar a mutação do grupamento, a produção normativa e os respectivos valores que os informam. O mal se agrava nos casos em que, constatada a sedimentação da própria evolução, a qual perde o seu elemento prospectivo e passa a constituir a realidade do presente, busca o agente involuir em um verdadeiro exercício de arqueologia jurídica, revivendo o que há muito fora morto e sepultado.

O Ministério Público, Instituição mais que centenária no cenário mundial e pátrio, ainda hoje luta pela densificação de sua identidade jurídica. Não obstante a consagração normativa de seu novo perfil, fazendo que ascendesse a um plano de indiscutível destaque com a Carta promulgada em 1988, ainda hoje, aqui e acolá, são ouvidas vozes de alguns que assim não pensam. Muitos teimam em não se desprender do passado, em ignorar o presente e comprometer o futuro.

Dentre os múltiplos caminhos que poderiam ser trilhados, na senda do que acabamos de afirmar, optamos por realizar uma breve análise daquilo que se convencionou chamar de autonomia financeira do Ministério Público, fato consumado em muitas plagas, mera esperança em outras tantas.

II. Da posição do Ministério Público no cenário jurídico

Na França, há muito está sedimentado o entendimento de que os membros do Ministério Público compõem uma magistratura especial2 , cabendo-lhes, a um só tempo, defender o interesse público e determinados interesses específicos do governo perante os tribunais, em especial aqueles relacionados à política de segurança pública. Além disto, de forma correlata à sua independência funcional, é divisada uma relação hierárquica com o Governo. Como observa Michèle-Laure Rassat3 , essa relação funcional e hierárquica se manifesta em três pontos de vista. Quanto ao desenvolvimento de sua carreira, os membros do Ministério Público são, em princípio, nomeados, exonerados e punidos livremente pelo Ministro da Justiça (Garde des seaux)4 . Quanto à sua organização, cada um assume, em uma hierarquia escrupulosamente garantida, um lugar bem definido. Quanto à sua atividade, mesmo judiciária, enfim, os membros do Ministério Público são, em uma certa medida ao menos, submetidos aos seus superiores hierárquicos e, em última instáncia, ao Ministro da Justiça, de quem deverão executar as ordens.

Como se vê, na estrutura organizacional do Ministério Público francês, não obstante possuir a Instituição características existenciais próprias, é grande a ingerência realizada pelo Governo. Esta situação, no entanto, mesmo na França possui opositores. Ainda segundo Michèle-Laure Rassat5 , "diz-se, também, que a doutrina manifesta a mesma dificuldade que os redatores dos textos napoleônicos em conciliar as antigas idéias e os princípios novos. Ela não se preocupa em criticar a posição tomada e compreender a situação bizarra conferida aos oficiais do Ministério Público ao declarar que eles são, ao mesmo tempo, funcionários, o que explica a subordinação (ao Executivo) e magistrados, o que lhes permite uma certa independência." Por certo, independência e subordinação são noções difíceis de serem conciliadas e que certamente hurlent de se trouver ensemble.

Tratando-se de Instituição dotada de independência funcional, mas que se encontra inserida na estrutura do Poder Judiciário6 e que deve observar determinadas instruções do Governo, daí decorrem conseqüências outras além daquelas referidas pela abalizada doutrinadora. Com efeito, tendo o Ministério Público a sua carreira, a sua organização e a sua própria atividade vinculadas a outros órgãos, tem-se uma conseqüência inevitável: a Instituição não goza de total autonomia financeira e orçamentária.


Página seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.