A situação do marxismo no Brasil

Enviado por Sergio Lessa


  1. O quadro mais geral
  2. O movimento guerrilheiro nos anos 1960-70
  3. O marxismo brasileiro nos anos 80-90
  4. O debate contemporâneo entre os marxistas brasileiros
  5. O impacto do fim da URSS

O quadro mais geral

O desenvolvimento histórico brasileiro se diferencia tanto do padrão de evolução do capitalismo europeu, norte-americano ou japonês, como também do modelo típico de desenvolvimento dos países do Terceiro Mundo. Até a década de 1930, o Brasil ainda mantinha uma economia agrário-exportadora, com forte herança colonial. A estrutura social, basicamente oligárquica, era marcada pela ausência da classe operária e pela presença muito reduzida das camadas médias urbanas, que se restringiam quase exclusivamente ao funcionalismo público (meros serviçais, assalariados pelo Estado, dos poderes oligárquicos locais).

Este quadro se alterou profundamente em poucas décadas. Entre 1940 e 1980 o Brasil se industrializou, recebeu um enorme aporte de recursos externos, expropriou pequenos e médios proprietários rurais e os expulsou para os centros urbanos (notadamente São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte), promoveu a eletrificação generalizada e a construção de uma malha de transportes e comunicação que abarca todo o país.

A modernização, contudo, ao invés de liquidar o poder da antiga oligarquia, terminou, em um processo de modo algum linear, por consolidálo.

A mediação decisiva desta consolidação foi a pactuada divisão do poder entre a oligarquia e o grande capital nacional e estrangeiro, forjada e desenvolvida durante os anos da ditadura militar (1964-1985). O «processo de redemocratização» do país, entre os anos 1978-85, não passou de uma transição negociada «pelo alto» que alterou apenas a forma, e não a substância, da dominação. A atual «democracia» brasileira cumpre a função histórica de manter no poder, com poucas mudanças, a mesma coalizão das classes proprietárias dominante desde 1964.

Para um rápido panorama do marxismo no Brasil, o que nos importa é que a evolução histórica do país resultou, em plena década de 1990, em uma formação social que padece da incompletude de suas classes sociais decisivas. Com exceção da velha oligarquia rural, cujo poder ainda se mantém como um dos pilares do conservadorismo, as classes urbanas carecem de amadurecimento histórico. A burguesia brasileira, além de recente, aceitou de bom grado o seu papel de sócio menor da exploração do país pelas multinacionais, e longe está de se elevar a uma classe para-si, na acepção marxiana do termo. Sua gênese e desenvolvimento não foram acompanhadas por um movimento de renovação cultural que superasse os pressupostos tradicionais-conservadores da ideologia oligárquica. Nada semelhante ao Renascimento ou ao Iluminismo pode ser encontrado, sequer

em germe, na nossa história.

As classes médias urbanas e a classe operária são marcadas por um fenômeno semelhante. Tanto as primeiras como os trabalhadores das grandes indústrias são fortemente influenciados na sua concepção de mundo, pelo paternalismo e servilismo típico das camadas camponeses. O

conservadorismo «mendigo» nada mais é senão a contrapartida do conservadorismo oligárquico. Para ser breve, os traços de modernização que marcam a sociedade brasileira atual foram estruturados a partir de uma Weltanschauung oligárquico-conservadora: uma base das piores para o

desenvolvimento do marxismo.

Esta é a razão fundamental para que o marxismo no Brasil não apenas fosse assimilado tardiamente3, como ainda se aculturasse ás concepções dominantes.

Uma das aculturações mais interessantes é a simbiose entre o rígido centralismo e verticalidade do stalinismo com o paternalismo e o autoritarismo característicos da cultura oligárquica. A figura, tão tradicional na cultura oligárquica, de um líder carismático, paternal, portador de uma autoridade inquestionável, adentra, pelo amálgama com o centralismo stalinista, á prática e á concepção política dos comunistas brasileiros. Um outro elemento do stalinismo que é potencializado pela cultura local é seu apego ao nacional e ao patriotismo de caserna. Na luta contra o imperialismo norte-americano, ao invés dos comunistas se colocarem como internacionalistas, eles se concebiam como os verdadeiros patriotas, acompanhando de perto o desenvolvimento do nacionalismo soviético nos anos finais de Stalin.

No início da década de 1960 já se faziam perceptíveis várias das carências estruturais que marcam até hoje o marxismo brasileiro. Em primeiro lugar, no plano teórico mais geral, uma concepção filosófica, mera corruptela do pior stalinismo, que concebia a dialética como mero jogo lógico de contrários -- e como instrumento retórico para justificar as rápidas mudanças de posição política requeridas pelo «taticismo» dominante.

Em segundo lugar, o desconhecimento da realidade brasileira e a

quase completa ausência de investigações da particularidade do nosso desenvolvimento. O desconhecimento das peculiaridades do desenvolvimento brasileiro levou o Partido Comunista ao absurdo de afirmar ser o Brasil um «país dual»: feudal no campo e capitalista nas grandes cidades. Neste contexto, o Partido Comunista postulava uma estratégia de «etapas» que afirmava a inevitabilidade da «revolução burguesa» no Brasil e, para isso, propunha um leque de alianças que atrelava a luta dos trabalhadores á burguesia nacional. Com o golpe de 1964, a falência do projeto de desenvolvimento de um capitalismo nacional autônomo resultou, também, no declínio da influência política do PC.


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