Estado, desenho institucional e política econômica no Brasil: 1964-1985 (Módulo IV. Políticas governamentais e finanças)



  1. Resumo
  2. Introdução
  3. A organização do aparelho do estado e as agências de política econômica
  4. O super-conselho de política econômica
  5. Referências bibliográficas

RESUMO

Este paper discute os diferentes desenhos institucionais de política econômica no Brasil pós-64. Tomando como objeto de análise uma agência específica — o Conselho de Desenvolvimento Econômico (CDE) —, procura entender as razões que levaram o governo Geisel (1974-1979) a armar uma estrutura burocrática capaz de processar, com relativa autonomia, as múltiplas demandas colocadas sobre o Estado ditatorial. O crescimento "desordenado" do aparelho do Estado e do setor público descentralizado no Brasil pós-64, sua fragmentação em múltiplas esferas burocráticas, várias delas gozando de autonomia decisória e/ou financeira, e a transformação das agências do Estado capitalista em arenas políticas e centros de agregação e representação de interesses burgueses, encontram-se na origem das transformações institucionais aqui discutidas, cujo traço mais marcante foi a concentração do poder real em um centro decisório único situado na cúpula do sistema estatal e bastante fechado às pressões e influências "externas" (i.e., sociais). Sustenta-se que a análise detida da trajetória institucional do CDE permite ver alguns dos principais dilemas político-burocráticos enfrentados pelo Estado ditatorial.

INTRODUÇÃO

Na análise do Estado, assumo explicitamente que como e onde se decide tem um impacto positivo sobre o que se decide e, ademais, sobre quem se beneficia preferencialmente de uma determinada decisão de política econômica. Nesse sentido, a função de mediação que o aparelho do Estado desempenha, através de suas atividades administrativas e burocráticas rotineiras, adquire, nessa perspectiva, uma importância estratégica para a determinação seja do sentido dos outputs, seja do seu papel mais amplo como organizador político dos interesses econômicos do "bloco no poder". Numa palavra: a análise (da "morfologia" e da "fisiologia") do sistema estatal — isto é, o exame da configuração interna, dos níveis decisórios e das diversas funções que os diferentes centros de poder cumprem, segundo uma certa "divisão do trabalho" estabelecida previamente ("legalmente") no interior da "organização", — deve, nesta perspectiva, preceder e informar os estudos a respeito do conteúdo da política estatal. Logo, a determinação do caráter "de classe" dos processos de dominação política não pode se referir, exclusivamente, aos "resultados da política estatal — que estão ligados à questão, analiticamente distinta, porém empiricamente muito próxima, do poder estatal —, mas [antes] à forma e ao conteúdo intrínseco" assumidos pelo sistema estatal numa conjuntura concreta (Therborn, 1989: 37; grifos meus). Ou, como afirmou Poulantzas: o aparelho do Estado "não se esgota no poder do Estado" (Poulantzas, 1985: 17). Embora a dominação política esteja "inscrita na materialidade do Estado", é essencialmente através dessa materialidade institucional que ela se realiza concretamente.

Resulta daí que a análise do sistema estatal seja um capítulo decisivo do estudo mais amplo das relações entre "Estado e sociedade".

Penso que esse tem sido, em particular, um problema relativamente negligenciado pelos estudos de Ciência Política (em maior medida) e de História Econômica (em menos medida) entre nós. O foco usual dos trabalhos mais recentes ilumina ora os mecanismos de recrutamento e seleção dos agentes do aparelho do Estado (a "burocracia", pensada freqüentemente como uma "elite estratégica"), com ênfase especial nos seus "projetos" e nos processos de circulação pelas agências mais importantes do setor produtivo estatal, ora o resultado final das ações e decisões dessa categoria social específica, cujo exemplo mais destacado são os prestigiosos estudos de "políticas públicas", ficando a "ossatura material do aparelho do Estado", na expressão de Sônia Draibe (1985), sob responsabilidade quase exclusiva dos manuais de Direito Constitucional ou de História Administrativa. No caso, as análises (quando existem) pecam pelo formalismo inerente à abordagem e o resultado final é uma visão despolitizada das relações entre os aparelhos e ramos do sistema estatal. Este texto pretende tomar estas questões ao refletir sobre a instituição de um aparelho específico de política econômica no governo Geisel (1974-1979) no Brasil: o Conselho de Desenvolvimento Econômico.

I. A ORGANIZAÇÃO DO APARELHO DO ESTADO E AS AGÊNCIAS DE POLÍTICA ECONÓMICA


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