O profissionalismo político: considerações históricas e teóricas

Enviado por Adriano Codato


Monografias.com

[William Gropper, The Senate, c.1940]

Simon Schwartzman concluiu que na década de 1920 a política, para os paulistas, "era uma forma de melhorar seus negócios; para quase todos os outros [agentes políticos], a política era seu negócio"[1].

Quando a atividade política tornou-se, para a elite de São Paulo, um negócio como outro qualquer, naquele sentido sugerido tradicionalmente por Joseph Schumpeter? A resposta a essa pergunta depende de como se considere o mundo político. Sua autonomia ou heteronomia em relação ao mundo social define o objetivo da investigação; e a heteronomia ou autonomia dos agentes políticos e dos interesses que eles defendem em relação aos agentes sociais aos quais estão ligados (de várias maneiras) e que, teoricamente, representam, decide o objeto da investigação. Caso se perceba o mundo político como um "reflexo" de fatores extrapolíticos, isso determina, de saída, o objetivo do estudo (que só pode ser "compreender os efeitos do mundo social sobre o mundo político"), bem como o objeto do estudo, que nunca podem ser "os políticos" e o seu mundo. Não se vai estudar a prática dos políticos em si mesma, justamente porque não se acredita que ela seja determinada por si mesma.

O "empreendimento político", para falar como Max Weber, é em primeiro lugar um efeito das leis internas do campo político. O que esse princípio significa, exatamente?

O campo político (tal qual o campo burocrático, o campo ideológico etc.) deve ser entendido, com toda prudência que essa declaração de princípios exige, como um microcosmo, como "um pequeno mundo social relativamente autônomo dentro do grande mundo social". Essa autonomia, se levada ao pé da letra, isto é, etimologicamente, indica que, mais freqüentemente do que se imagina ou se está disposto a aceitar, esse campo trabalha "de acordo com sua própria lei, seu próprio nomos; [isto é], ele possui em si mesmo o princípio e a regra do seu funcionamento"[2]. Bourdieu vai ainda mais longe nesse assunto e sustenta que, em qualquer caso, "seria um erro subestimar a autonomia e a eficácia específica de tudo o que acontece no campo político, reduzindo a história propriamente política a uma espécie de manifestação epifenomênica das forças econômicas e sociais"[3].

Não foi preciso esperar pelas descobertas da Ciência Política da segunda metade do século XX para afirmar que "interesses políticos" não são – sempre e em todos os casos – a conversão, em outra esfera, de "interesses sociais". Assim como há uma profissão política, com seus códigos próprios, há interesses especificamente políticos, sendo ambos a confissão da autonomia do político (i.e., o espaço social), da política (a prática social) e da sócio-lógica política que governa e dirige essa prática. Joseph Schumpeter reprovou com ironia a ingenuidade dos analistas que teimavam em não levar a sério a verdade contida na frase pronunciada por um político eminente: "O que os empresários não compreendem é que, exatamente como eles negociam com petróleo, eu negocio com votos". O próprio Weber já havia observado que os políticos são fundamentalmente "especuladores" de votos e cargos[4]. Esse fato explicita tanto o que Schumpeter irá chamar de "interesse profissional distinto", que está na base das ações dos políticos de carreira, quanto o "interesse distinto do grupo na profissão política enquanto tal"[5]. Como o assunto é muito complicado para ser decidido com base numa declaração, farei uma brevíssima divagação em torno.

O próprio Marx considerou tanto uma idéia como outra – o fechamento do universo político sobre si próprio (sua autonomia) e, principalmente, a disparidade e a dessemelhança entre um grupo social (classes, frações de classe, camadas sociais) e um grupo exclusivamente político – em termos bem familiares. O primeiro sintoma da dissociação entre o "mundo político" (a expressão é dele) e o mundo social seria resultado de uma moléstia ideológica que afetava todos os políticos indistintamente, chamada "cretinismo parlamentar". Volto a comentar esse ponto mais adiante, já que essa fórmula designa mais que uma ilusão de consciência. O segundo fenômeno que estava na base, ou melhor, supunha a existência em separado daqueles que "falavam e escreviam" em nome da classe, foi pensado em função da existência concreta de um grupo desligado (mas não independente) da classe que eles deveriam representar: os "representantes políticos e literários de uma classe", "seus políticos e homens de letras" etc.[6].


Página seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.