A solidão dos intelectuais: entre a moralidade e o compromisso

Enviado por Edison Bariani


  1. Resumo
  2. Moralidade e compromisso
  3. Referências bibliográficas

"Ser conseqüente é a maior obrigação de um filósofo

 e a que mais raramente se encontra."

I. Kant (1994: 35)

Resumo:

A relação entre os homens de saber e a política sempre foi conflituosa ao longo da história. Na sociedade moderna, a exigência de escolhas, de estabelecimento de compromissos políticos, imbricou-se com a avaliação moral de tais opções, acentuando os conflitos vividos pelos intelectuais. Essa tensão dilacerante, somada à expectativa do desempenho de sua função, conduziu-os à solidão. 

Palavras-chave: Intelectuais. Política. Cultura. Compromisso. Moralidade. Solidão.

 

A relação entre os pensadores e a política tem sido marcadamente conflituosa, expressando-se por meio do fascínio e da recusa, sedução e o exílio, adesão e revolta, ação e resignação.

Na Antiguidade Clássica, entre pensadores os gregos, as posturas se diversificavam. Sócrates, com sua pedagogia pública, procurava levar aos indivíduos - cidadãos ou não - a possibilidade do conhecimento e, assim, a consciência da existência social e aspiração política; tornou-se dessa forma uma ameaça à democracia ateniense, uma "má influência aos jovens" e encontrou na morte a mesma motivação da vida: fez do magistério público seu martírio, fundou uma posição do homem de saber e deixou como herança o próprio infortúnio, a incompreensão do ato de pôr o saber a serviço da igualdade, de destroná-lo como apanágio de poucos e arma dos dominadores. Estava desvelada a periculosidade do saber em relação à política.

Com Platão, entretanto, o rei-filósofo – por suas habilidades – requisita seu lugar (elevado) na política:

Mas a vós outros pusemos nós no mundo para serdes chefes da colméia, reis de vós mesmos e do resto da cidade, melhor e mais completamente educados que aqueles e mais capazes, portanto, de participar dos assuntos públicos e da Filosofia. Tereis, pois, de descer cada um por seu turno à vivenda subterrânea dos demais e acostumar-vos a enxergar no escuro. Uma vez acostumados, vereis infinitamente melhor que os habitantes da caverna e conhecereis cada imagem e o que representa, porque já tereis visto o belo, o justo e o bom em sua verdadeira essência. E assim, nossa e vossa cidade viverá à luz do dia e não entre sonhos, como vive hoje a maior parte delas, onde os homens lutam uns com os outros por sombras sem substância ou se disputam o poder como se este fosse um grande bem. (PLATAO, [s.d.]: 157)

Assim, cabe ao filósofo descer aos subterrâneos e levar a luz do conhecimento aos ignaros, obra – ao mesmo tempo - de privilégio e abnegação, pois que o sacrifício de voltar ao encontro dos que habitam as trevas é imposto pelas responsabilidades (políticas) do saber. Todavia, tal missão do filósofo não deve lhe inspirar satisfação no domínio, mas ser desempenhada como obrigação, sob a pena de perderem o sentido dessa missão. "Ora, os que governam não devem ser amantes do poder, porque se o forem encontrarão amantes rivais e lutarão com eles." (PLATAO, [s.d.]: 157).

Entretanto, não deve ser esquecido que o mesmo Platão, que soprou vida ao rei-filósofo (e sua missão de levar o conhecimento), também fundou a Academia, local de formação e também fortaleza dos filósofos que ainda não galgaram o lugar pretendido no governo da cidade. Com Aristóteles, todavia, a academia, agora Liceu, de fortaleza torna-se refúgio. Na própria trajetória de Aristóteles a participação política, a aproximação do poder, de privilégio torna-se a própria desgraça, e o reconhecimento dá lugar ao exílio.

Entre os romanos, a proximidade do saber com os negócios públicos chegou ao ponto de a própria filosofia se confundir com a política e a retórica, o que trouxe, por um lado, uma atitude mais conseqüente à política e certo realismo político à filosofia, e, por outro, uma superficialidade do saber em relação às (outras) grandes questões da existência humana e a proposição de uma atitude cívica que – pretensamente – serviria de código universal de pensamento e conduta.

Na Idade Média, com a hegemonia da Cristandade, a posição dos pensadores evolui historicamente para a ampliação do distanciamento para com o povo por meio do sacerdócio, do claustro, da apologia da verdade revelada, da procura da graça em detrimento da experiência, da divisão social do trabalho, da criação da Universidade (a Academia e o Liceu hermeticamente protegidos), da assunção de um ofício específico e, sobretudo, da necessidade de pagamento para obtenção do conhecimento – a efetivação da mercantilização do saber. Mais tarde, os humanistas do final da Idade Média promovem um divórcio entre a razão e a fé, mas enlaçam-se com o poder ao servir ao poder nas cortes (LE GOFF, 1988).


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