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A parceria entre fonoaudiólogo e família na educação especial (página 2)


Partes: 1, 2, 3

O material bibliográfico contido em livros, revistas, artigos, páginas da web e em outras fontes compõe um referencial teórico bastante abrangente e, aliado ao estudo de campo, fornecerá dados relevantes para a elaboração deste estudo.

O problema investigado será abordado em uma pesquisa de campo em 4 escolas especiais dentre um Universo de 12 instituições especializadas no Município de Fortaleza, através de entrevistas com os pais de alunos com deficiência atendidos por terapeutas da fala – Fonoaudiólogos.

O presente estudo tem como objetivo promover uma reflexão sobre a importância da família no sucesso da terapia fonoaudiológica na escola especial. Com o intuito de oferecer uma melhor compreensão do trabalho, o mesmo será dividido em três capítulos a seguir discriminados:

O primeiro capítulo apresenta a Fonoaudiologia no contexto da escola especial, abrangendo definição, histórico, regulamentação da profissão e áreas de atuação, com ênfase na educação especial (definição, parâmetros legais), bem como as atribuições do fonoaudiólogo nesse contexto.

No segundo capítulo, aborda-se o tema em questão - a parceria entre fonoaudiólogo e a família no cotidiano da educação especial -, através de conceitos e teorias existentes em vasta literatura disposta sobre essa temática. Contempla, ainda, o papel da família no contexto histórico–social, sua importância na escola especial, dada a sua estreita relação com o aluno com necessidades educacionais especiais, e o processo de envolvimento desse sistema na evolução das terapias fonoaudiológicas.

No terceiro capítulo – metodologia e pesquisa – serão apresentadas a aplicação da pesquisa, a metodologia utilizada e o universo pesquisado.

O quarto capítulo – análise e discussão dos resultados - expõe os resultados obtidos com a aplicação do questionário, analisando cada um deles.

Finalizando, nas Considerações Finais será apresentado o processo geral de relacionamento entre a família e o fonoaudiólogo, avaliando o conhecimento dos familiares acerca do fazer fonoaudiológico, a compreensão do problema que afeta seus filhos, e sua grande responsabilidade na busca de meios para auxiliá-los. Serão sugeridas, ainda, alternativas para o desenvolvimento de ações colaborativas na área educacional, envolvendo o terapeuta da linguagem e os pais/responsáveis dos alunos com necessidades educacionais especiais.

CAPÍTULO 1

A FONOAUDIOLOGIA

Linguagem, para Rocha (2001, p. 376), "é o conjunto de sons articulados com o qual o homem expressa o que pensa e sente". É o meio pelo qual se estabelece a comunicação entre os homens. Através dela, são transmitidos nossos pensamentos e sentimentos. Está presente em todas as atividades humanas sociais ou particulares.

Todo o processo da evolução humana é permeado pela linguagem em suas diversas modalidades: oral, escrita, gestual, libras, enfim, por qualquer meio de propagação da linguagem através do qual se processe e se realize a comunicação.

É por meio da linguagem, também, que o ser humano interage com outras pessoas próximas ou distantes, informando-as, esclarecendo ou defendendo seu ponto de vista. É pela linguagem que é expressa toda a ideologia, sentimentos e pensamentos que emanam dos indivíduos.

No mundo em que se vive, a linguagem perpassa cada uma das ações humanas, individuais e coletivas, verbais, não verbais. São diversas linguagens que se cruzam, se completam e se modificam incessantemente, acompanhando o movimento de transformação do ser humano e suas formas de organização social.

Segundo Zorzi (1993, p. 7), "a linguagem é um dos aspectos importantes do desenvolvimento (...) e sua aquisição mantém íntima relação com múltiplos fatores, entre os quais destacam-se o biológico, o afetivo e o social". Por ser um atributo relevante para o desenvolvimento humano no seu aspecto social, qualquer distúrbio de ordem patológica que cause atraso na sua aquisição ou necessite de intervenção terapêutica, requer a adoção tempestiva de procedimentos visando ao pronto restabelecimento de sua função.

Isso posto, a busca de soluções para os distúrbios da linguagem ou da comunicação, presentes no meio social, torna-se cada vez mais importante, gerando a necessidade de uma relação de troca de informações entre as áreas da saúde, educação e sociologia, no sentido de inserir o sujeito portador de tais distúrbios no meio social, através da aquisição ou reabilitação da linguagem.

Para Rodriguez (2004, p. 2), "uma alteração da comunicação não é uma "entidade patológica" explicável sob a perspectiva de uma única disciplina, implica a análise integral de todas as esferas do desenvolvimento humano": dessa forma, a interdisciplinaridade ou o entrelace das distintas áreas se faz presente na solução dos problemas de ordem comunicativa.

Nesse contexto, advinda da área da saúde, destaca-se a Fonoaudiologia - ciência que estuda e pesquisa os métodos e técnicas de prevenção e terapia realizadas na comunicação oral e escrita - que vem em contribuição aos trabalhos voltados à prevenção e tratamento dos distúrbios da comunicação.

  • Fonoaudiologia: um breve histórico

A história do desenvolvimento da fonoaudiologia tem início na Europa e Estados Unidos, nas primeiras décadas do século XX, quando, segundo Guedes (In BEFI, 1997, p. 119), "(...) as professoras tornam-se responsáveis pelo tratamento daquelas crianças que apresentavam (sic) alterações na comunicação". Portadoras de diversos tipos de distúrbios da linguagem, elas eram atendidas nas escolas em salas especiais, conforme a necessidade, por profissionais que, à época, desempenhavam o papel hoje atribuído ao fonoaudiólogo.

Conforme Guedes (In FERREIRA, 1999, p. 81), "nos Estados Unidos (...) no início deste século já havia uma certa preocupação com as alterações de fala de crianças matriculadas em escola pública", de forma que a incursão do fonoaudiólogo rumo à detecção de problemas patológicos relacionados à comunicação tem origem bastante anterior à sua legalização.

Em 1945, os Estados Unidos reconheceram a prática fonoaudiológica: no decurso das décadas que se seguiram, se estabeleceu em todo o território norte-americano a regulamentação da profissão e a obrigatoriedade legal do terapeuta da linguagem no âmbito escolar, onde leis federais asseguram às crianças com alterações na aquisição e desenvolvimento da linguagem, atendimento especializado.

No contexto nacional, segundo Cavalheiro (In LAGROTTA E CÉSAR, 1997, p. 81), "a história da Fonoaudiologia no Brasil não se diferencia da educação especial". Sua origem se vincula ao segmento educacional, e seu enfoque na reabilitação remonta à fundação do Colégio Nacional, no Rio de Janeiro, em 1855, e se volta ao ensino de indivíduos portadores de deficiência auditiva.

Nos anos 20, teve início a difusão dos trabalhos fonoaudiológicos em São Paulo e na Capital Federal (RJ), tendo suas primeiras atividades realizadas no contexto escolar, no tratamento dos desvios da comunicação causados pela influência prosódica estrangeira.

No período de 1930 a 1950, a prática desses profissionais na escola, promovendo ações no sentido de diagnosticar os distúrbios e reabilitar a linguagem, foi gradativamente se incorporando à área da saúde, de forma a conferir-lhe um caráter terapêutico.

Entretanto, a institucionalização da Fonoaudiologia teve seu marco inicial somente na década de 60 (CAVALHEIRO, In LAGROTTA E CÉSAR, 1997, p. 81), quando da implantação dos primeiros cursos de ensino dessa prática no Brasil, em 1961, na Universidade de São Paulo, associados à Clínica de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em 1962, através do Instituto de Psicologia.

Os referidos cursos, uma vez concluídos, conferiam ao profissional reconhecimento técnico; a grade curricular dos mesmos foi regulamentada pela Resolução nº 54/76, do Conselho Federal de Educação. (Idem).

Ao longo de sua atuação, a Fonoaudiologia foi desenvolvendo uma relação de proximidade com diversas disciplinas da área de humanidades, de maneira que, no final dos anos 60, sua prática andava às voltas com a Psicologia e com a Educação. Em relação a esta última, o fonoaudiólogo teve maior destaque na educação especial.

Na década de 70, em resposta às inúmeras mobilizações no intuito de sensibilizar o governo para regulamentar a profissão, surgiu o primeiro passo nesse sentido, permitindo a criação dos cursos de bacharelado e nível universitário da Universidade de São Paulo, em 1977, embora fosse somente na década de 80, mais precisamente em 09 de dezembro de 1981, que o presidente em exercício – João Batista Figueiredo – tenha regularizado a profissão de fonoaudiólogo, através da Lei nº 6965/81, com a criação do Código de Ética, que determinou, também, o âmbito da competência deste profissional[1]

De acordo com o artigo 4º da referida lei[2]este profissional atua em pesquisa, prevenção, avaliação e terapia fonoaudiológica, nas áreas de comunicação oral e escrita, voz e audição e aperfeiçoamento dos padrões de fala e voz.

Também foram criados os Conselhos Federal e Regional de Fonoaudiologia – que funcionam desde 1983 – cuja finalidade precípua é fiscalizar o exercício da profissão. Vale ressaltar que, em 1995, em virtude do redimensionamento do campo de ação do fonoaudiólogo e de uma profunda pressão da categoria, os conselhos deram início ao trabalho de revisão da legislação, elaborando um novo código de ética e, atualmente, estão buscando também – através das comissões de educação em conjunto com os 31 cursos de Fonoaudiologia do Brasil – elaborar uma nova grade curricular a fim de promover uma formação condizente com a realidade atual[3]

A definição de Fonoaudiologia presente no Código de Ética do Conselho Regional de Fonoaudiologia - 5a Região (ANEXO 2) descreve

A Fonoaudiologia (como) (...) a ciência que tem como objeto de estudo a comunicação humana, no que se refere ao desenvolvimento, aperfeiçoamento, distúrbios e diferenças, em relação aos aspectos envolvidos na função auditiva periférica e central, na função cognitiva, na linguagem escrita, na fala, na fluência, na voz, nas funções orofaciais e na deglutição (CRFa 5a Região, 2004, p. 1).

É uma disciplina profissional da área da saúde, que estuda o fenômeno da comunicação humana e suas alterações. Etimologicamente, significa o estudo da linguagem da criança, porém, segundo J. Peña-Casanova[4](1997, s.p.), "supera em muito a noção de ortofonia (produção articulatória correta), e não se restringe, evidentemente, à infância", mas sim, a todos os sujeitos que carreguem algum tipo de patologia da linguagem ou alterações da fala ou comunicação.

Dessa forma, a Fonoaudiologia, enquanto ciência, terá um papel bem mais amplo do que a mera correção dos padrões de articulação: sendo seu objeto de estudo a comunicação humana, se estende a todos os indivíduos que apresentem distúrbios na linguagem independente de faixa etária. Tem relação com outros tantos setores das relações humanas, como o social, a saúde, a educação, trazendo para seu campo de observação outras áreas como a Lingüística, Pedagogia e Psicologia.

Segundo os parâmetros legais (Código de Ética do Conselho Federal de Fonoaudiologia, in CRF, 2004, p.8) que definem a Fonoaudiologia, ela está voltada "à pesquisa, prevenção, avaliação e terapia fonoaudiológica na área da comunicação oral e escrita, voz e audição, bem como em aperfeiçoamento dos padrões de fala e de voz". É esse caráter de pesquisa, que lhe assegura a lei, que vem consolidando a Fonoaudiologia como uma nova ciência. Na realidade, é o avanço da pesquisa associado à prática clínica que lhe confere o caráter científico.

Segundo o Conselho Federal de Fonoaudiologia (CFFa, 2004), o fonoaudiólogo é um profissional da saúde que pode atuar nos setores público e privado, sendo responsável pela promoção da saúde, avaliação e diagnóstico, orientação, terapia (habilitação e reabilitação) e aperfeiçoamento dos aspectos fonoaudiológicos da função auditiva periférica e central, função vestibular, linguagem oral e escrita, voz, fluência, articulação da fala, sistema miofuncional orofacial, cervical e deglutição. Zorzi (1999, p. 4) sintetiza afirmando que "o fonoaudiólogo é o único profissional reconhecida e legalmente habilitado para trabalhar com os distúrbios da linguagem de modo geral".

Conforme Rodriguez (2004, p. 3), "o terapeuta da linguagem, ou fonoaudiólogo, no passado, partia de um enfoque disciplinar isolado, para descrever e determinar todo e qualquer problema". Tal medida era utilizada em todos os casos de transtornos ou distúrbios da linguagem e, a partir desse enfoque, se delimitaria o seu caráter distintivo.

Em seguida, o profissional realizava um diagnóstico do problema mediante o resultado de exames apropriados, propunha uma terapia que julgasse adequada e "intentava" predizer seus resultados.

Porém, na atualidade, ainda segundo Rodriguez (2004), o indivíduo que apresenta uma alteração comunicativa, deve ver-se como a somatória de uma complexidade de fatores psicossociais, neurolingüísticos, passados, presentes, futuros. O autor afirma também que os fatores fisiológicos e genéticos devem ser adicionados a esta visão do sujeito, e considerados sob uma perspectiva global e integrada.

A Fonoaudiologia é uma ciência de conhecimento que procura pesquisar e, dentro do possível, atuar nas dificuldades que ocorrem em nível de comunicação, linguagem oral e/ou gráfica, voz e audiologia (...) o campo de atuação do fonoaudiólogo é bastante vasto, podendo abranger: clínicas, instituições, hospitais, indústrias, escolas e artes cênicas (cinema, teatro e TV) (MACHADO et al, in PICCOLOTTO FERREIRA, 2001, p. 61).

A Fonoaudiologia dispõe de atividades específicas em cada campo de atuação ao qual se destina, seja na audiologia, educação, estética vocal, organizacional, saúde pública ou área clínica.

O terapeuta da linguagem possui habilitação para atuar em áreas como distúrbios da comunicação e audiologia. Durante o curso de graduação, ambas as áreas têm a mesma importância no que se refere à carga horária, entretanto, "na prática" o que se observa é que um número consideravelmente grande de fonoaudiólogos atua na área de terapia fonoaudiológica, preferencialmente em clínicas particulares ou multi-profissionais, em geral associadas a otorrinolaringologistas, psicólogos e dentistas[5]

Com relação ao campo da audiologia, a legislação brasileira beneficiou o logopedista quando passou a exigir que indústrias e empresas que produzem alto grau de ruídos realizassem exames admissionais, periódicos e demissionais, os quais são de responsabilidade do fonoaudiólogo.

De forma que esse setor reclama a presença desse terapeuta em seu quadro funcional. Em clínicas especializadas, consultórios e hospitais, o fonoaudiólogo está apto a desenvolver programas de conservação auditiva, selecionando e adaptando aparelhos auditivos que as empresas desenvolvem e comercializam.

Na área da motricidade oral, realiza o trabalho de prevenção e reabilitação das alterações do sistema estomatognático (respiração, deglutição, sucção, mastigação e fala), desenvolvendo suas atividades em hospitais, clínicas – como componente de equipes interdisciplinares, juntamente com otorrinolaringologistas, cirurgiões dentistas, neurologistas – e em clínicas de estética facial.

Ainda como fazer fonoaudiológico na área da voz há a Fonoaudiologia estética (vocal), que engloba terapias com os profissionais da comunicação, que têm na voz sua ferramenta de trabalho – artistas, locutores, atores, cantores – e atua na aplicação de técnicas específicas para o aprimoramento da linguagem oral através da impostação vocal.

Conhecida como Fonoaudiologia organizacional, esse campo de atuação encontra-se em franca ascensão e tem como tarefa dar suporte às empresas no aperfeiçoamento da competência comunicativa dos seus funcionários, desenvolvendo as habilidades em voz, fala, linguagem, audição, direcionando seus esforços no ato da comunicação verbal profissional junto à equipe de marketing, recepção de pessoal e outras funções.

O terapeuta da linguagem diversificou seu campo de atuação, podendo ser encontrado na realização de tarefas na área da saúde pública, onde é membro da equipe interprofissional e desenvolve um trabalho de prevenção. Nesse contexto, cabe lembrar que o fonoaudiólogo tem seu papel legitimado pela Constituição Federal de 1988, que define as diretrizes de municipalização dos serviços de saúde. Atua, também, na prevenção e tratamento dos distúrbios da linguagem causados por diversos fatores patológicos, em hospitais, postos de saúde e ambulatórios da rede pública, além de trabalhar na elaboração de projetos para a promoção da saúde nos diversos fatores sociais.

Na chamada fonoaudiologia clínica, realiza trabalhos em pesquisa, avaliação, diagnóstico e tratamento dos distúrbios da linguagem. Desempenha seu papel em clínicas especializadas e instituições voltadas ao atendimento das pessoas que apresentam algum tipo de deficiência que comprometa a comunicação verbal.

O reconhecimento profissional do terapeuta da linguagem legitimou suas atividades no contexto escolar, as quais são definidas pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia. Segundo Cavalheiro (in LAGROTTA e CÉSAR, 1997, p. 83), "o CRF - 2ª região divulgou um parecer sobre a atuação do fonoaudiólogo na escola, descartando a possibilidade de realizar-se atendimento clínico neste contexto (CRF, 2004)".

A ocorrência do atendimento clínico na escola regular caracteriza uma distorção nos objetivos pedagógicos da mesma. De acordo com Zorzi (1999, p. 1), "(...) no caso de haver atendimento em seu interior (...) alocando um espaço físico dentro da escola para o atendimento, a posição do Conselho é contrária". Dentre os argumentos que embasam a proibição, podem ser destacados:

O encaminhamento da criança a um Fonoaudiólogo 'da escola' retira do próprio Fonoaudiólogo a autonomia necessária para julgar o papel de possíveis inadequações pedagógicas que podem estar determinando as dificuldades de aprendizagem, uma vez que existe uma relação financeira entre as partes: fonoaudiólogo/escola (Idem, p. 2).

O encaminhamento da criança a um Fonoaudiólogo 'da escola' retira da família a liberdade de escolha profissional (...) restringir a opção de encaminhamento pode significar uma reserva de mercado, com eventuais benefícios de ordem financeira (Idem, p.2).

O objetivo explícito legal de tais escolas de ensino regular não é oferecer tratamentos para problemas, mas sim promover o ensino. A diferença entre ensinar (educar) e tratar é muito grande (...) (ZORZI, 1999, p. 1).

Dessa forma, caso o fonoaudiólogo realize o papel clínico/terapêutico dentro da escola regular, estará ferindo o Código de Ética de sua profissão e os objetivos precípuos da escola em questão.

O fonoaudiólogo pode desempenhar, dentro da escola, as funções de consultor, assessor, na qualidade de membro da equipe técnica, auxiliando no desenvolvimento da criança, no que diz respeito à expressão verbal, tarefa que pode se estender ao corpo docente, promovendo ações que englobem a linguagem, a audição, fala e escrita.

No âmbito educacional, seu trabalho abrange a escola pública (ensino fundamental e médio) e privada, escolas especiais públicas, conveniadas e particulares, além de poder lecionar nas universidades – nos cursos de Fonoaudiologia – na graduação e pós-graduação.

Este profissional, uma vez inserido na educação, deverá atuar junto à equipe técnica, núcleo gestor e corpo docente, seja prevenindo, orientando ou tratando o sujeito acometido de distúrbios da linguagem, de acordo com as necessidades e atividades de cada estabelecimento de ensino.

Embora o fonoaudiólogo possa atuar nas diversas áreas relacionadas acima, o presente trabalho faz um recorte nessa realidade, limitando-se ao fazer fonoaudiológico educacional, precisamente na educação especial.

1.2 A Escola Especial

Uma análise da educação brasileira só pode ser empreendida situando-se no contexto sócio-educacional do país. Tal contexto se caracteriza, principalmente, pela exclusão de uma significativa parcela da população do sistema escolar. (MAGALHAES, 2000, p. 19).

Para Magalhães (2000, p.19), a história da educação especial no Brasil está inserta no contexto sócio-educacional da nação. E traz em seu bojo o registro perverso da exclusão e da segregação. Entretanto, as ações de exclusão são tão antigas quanto as iniciativas precursoras da "inclusão" de pessoas portadoras de necessidades educacionais especiais, cujos registros datam de meados do século XIX, quando foi fundado o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, no Rio de Janeiro, a 12 de outubro de 1854, por D. Pedro II.

Em 1942, já havia no país 40 escolas públicas regulares que prestavam algum tipo de atendimento aos deficientes mentais, e 14 que atendiam alunos com outras deficiências.

Pouco a pouco, graças a ONG´s como a Sociedade Pestalozzi, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) e outras, a questão da deficiência foi saindo do âmbito da saúde para o âmbito da educação.

Nos anos 70, a necessidade de uma política de educação especial foi se delineando, quando o Ministério da Educação e Cultura (MEC) assumiu que a clientela da educação especial é a que requer "cuidados especiais" na família, na escola e na sociedade.

De forma lenta, porém gradual, a inclusão como prática educativa começa a se estabelecer na tentativa de substituir as práticas antigas de educação caracterizadas pela exclusão e segregação institucional, pautada no objetivo precípuo da educação inclusiva - que é uma sociedade para todos –, e tem embasamento nos seguintes princípios: "a aceitação das diferenças individuais, a valorização de cada pessoa, a convivência dentro da diversidade humana, a aprendizagem através da cooperação", ou seja, está associada à aceitação das diferenças individuais e à valorização pessoal do sujeito social. (SASSAKI, 1999, p. 42 apud FREITAS & CASTRO, 2004, p. 2).

Em 1986, a expressão "alunos excepcionais" foi substituída por "alunos portadores de necessidades especiais". Em 1990, o Brasil participa da Conferência Mundial Sobre Educação Para Todos, em Jomtien, Tailândia – de 5 a 9 de março daquele ano -, na qual foi aprovado o plano de ação para satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem. Com tal participação, o Brasil assume o compromisso de organizar e pôr em ação uma política para a educação inclusiva.[6]

Segundo os arquivos do Fundo das Nações Unidas (UNICEF), a Conferência em questão teve cerca de 1500 participantes de 155 países, cujos representantes, ao final do exame do texto que tinha como conteúdo os principais requisitos da educação para todos, aprovaram, em 09 de março de 1990, a Declaração Mundial Sobre Educação Para Todos. Suas premissas são:

Artigo 1 – Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem.

  • 1. Cada pessoa – criança, jovem ou adulto – deve estar em condições de aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem. Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, expressão oral, o cálculo, a solução de problemas), quanto os conteúdos básicos da aprendizagem (conhecimentos, habilidades, valores e atitudes), necessários para que os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas potencialidades, viver e trabalhar com dignidade, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas. A amplitude das necessidades básicas de aprendizagem e a maneira de satisfazê-las segundo cada país e cada cultura, e, inevitavelmente, mudam com o decorrer do tempo.

  • 2. A satisfação dessas necessidades confere aos membros de uma sociedade a possibilidade de tempo, a responsabilidade de respeitar e desenvolver sua herança cultural, lingüística e espiritual, de promover a educação de outros, de defender a causa da justiça social, de proteger o meio-ambiente e de ser tolerante com os sistemas sociais, políticos e religiosos que difiram dos seus, assegurando respeito aos valores humanistas e aos direitos humanos comumente aceitos, bem como de trabalhar pela paz e pela solidariedade internacionais em um mundo interdependente.

3. Outro objetivo, não menos fundamental, do desenvolvimento da educação, é o enriquecimento de valores culturais e morais comuns. É nesses valores que os indivíduos e a sociedade encontram sua identidade e sua dignidade.

4. A educação básica é mais do que uma finalidade em si mesma. Ela é a base para a aprendizagem e o desenvolvimento humano permanentes, sobre a qual os países podem construir, sistematicamente, níveis e tipos mais adiantados de educação e capacitação (UNICEF: Conferência Mundial sobre Educação para TodosJomtien, Tailândia - 5 a 9 de março de 1990, pp. 2-3). [7]

Seis anos depois de firmado o compromisso de implementação da educação para todos em Joimtien, o Brasil dá outro passo importante no sentido de promover a educação especial com o estabelecimento da Lei nº 9.394/96, que dispõe sobre as Diretrizes e Bases da Educação nacional, cujo capítulo V reza sobre a educação especial.

Segundo Aguiar e Martins (2003, p. 128), adota-se uma postura de inclusão

do educando com necessidades especiais ao meio educacional e social em geral, assegurando condições de estudo específicas, profissionais habilitados, terminalidade especial, conforme as possibilidades de cada educando, e preparação adequada para o mundo do trabalho.

Ainda segundo a mesma fonte, a lei preceitua o seguinte:

  • a) Currículos e metodologias do ensino devem ser adequados às características dos usuários desta modalidade de ensino;

  • b) O apoio técnico e financeiro do poder público pode ser direcionado para as entidades privadas sem fins lucrativos, ou seja, poderão continuar a receber recursos públicos quando seus objetivos forem educacionais;

  • c) Apoio técnico especializado deve ser dado à escola regular que atende às pessoas com necessidades educacionais especiais, sempre que necessário;

  • d) Professores especialistas (em nível médio ou superior), para atendimento especializado, e professores capacitados para realizar a inclusão do aluno com necessidade educacional especial na rede regular devem ser formados visando à consecução das práticas inclusivas na escola;

  • e) Ampliação de espaços na rede pública de ensino para a educação especial, independentemente dos subsídios direcionados para a rede privada.

Em 2001, o Conselho Nacional de Educação (CNE) empreende ações no intuito de formar um corpo de diretrizes nacionais para a educação especial. Então, o parecer CNE/CEB nº 17/2001, de 03 de julho de 2001 e a resolução CNE/CEB nº02, de 11 de setembro de 2001 determinam ser obrigação dos sistemas de ensino matricular os educandos com necessidades educacionais especiais (BRASIL, 2001, p. 3).

Para que se saiba quem, no processo educacional, constitui um educando portador de necessidades educacionais especiais, o Parecer CNE/CEB nº 17/2001 "define os educandos com necessidades educacionais especiais como sendo os que apresentam dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares vinculadas" (BRASIL, 2001, p. 2).

O Brasil avançou bastante no que diz respeito ao sistema escolar, garantindo constitucionalmente o direito de todos à educação, sem qualquer distinção de credo, raça ou classe social. Segundo Martins (2004, p. 2), garantiu ainda o seguinte: "(...) o acesso ao ensino fundamental, para educandos em idade escolar, sejam normais ou especiais, passa a ser, a partir de 1988 um direito público e subjetivo, isto é, inalienável".

Alunos e escolas são adjetivados de comuns ou especiais e em referência a uns e outros são definidas necessidades comuns ou especiais a partir de critérios arbitrariamente construídos por abstração, atendendo muitas vezes, a deleites pessoais de "experts" ou até mesmo de "espertos". Alertemo-nos, também, para os grandes equívocos que cometemos quando generalizamos nosso entendimento sobre uma situação particular (MAZZOTA, 2003, p. 11).

Segundo Garcez e Sacaloski (2004), o estabelecimento da educação inclusiva retrata a urgência em dispor novos espaços, menos restritivos, da educação para todos, e que cada estado, cidade e município se empenhe na tarefa de desenvolver sistemas educacionais conforme suas necessidades específicas e que a educação inclusiva redimensione sua visão em relação a todos os excluídos do processo sócio-educacional.

  • A Fonoaudiologia na Escola Especial

Todo esse processo de legitimação da educação especial - tanto nas escolas de ensino regular, como nas escolas especiais -, permitiu a inserção do fonoaudiólogo na escola especial, devido a sua formação acadêmica que é basicamente clínica, tornando-o apto a dar diagnósticos e a planejar terapias adequadas aos alunos acometidos por distúrbios da comunicação. Conferiu-lhe também uma maior freqüência nos quadros admissionais das escolas comuns.

Quando a escola está constituída como uma instituição voltada para o atendimento educacional e clínico de pessoas portadoras de necessidades especiais, o trabalho do fonoaudiólogo, inclusive em termos de atendimento clínico, é considerado como uma atividade pertinente aos objetivos e propostas da instituição (...). (ZORZI, 1999, p. 1).

Para Zorzi (1999, s.p.), a Fonoaudiologia "veio em resposta a uma necessidade de atendimento ao sujeito portador de diversas dificuldades relacionadas à comunicação", quem quer que seja esse portador ou quaisquer que sejam as suas dificuldades, de forma que atua em qualquer campo no qual seus conhecimentos teóricos e práticos sejam solicitados.

Martins (In GIROTO, 2001, p. 119) corrobora a visão de Zorzi quando afirma que "(...) acreditamos que o fonoaudiólogo enquanto profissional que atua nas áreas de comunicação oral e escrita, fala, voz e audição, tem muito a oferecer tanto para as crianças deficientes quanto para as crianças não deficientes (...)".

O diagnóstico diferencial é a chave da resolução dos problemas, porque indivíduos com atraso simples de linguagem, dispraxia da fala, desordem pragmático-semântico, agnosia auditiva, falhas na discriminação ou no processamento auditivo ou a inadequada estimulação no lar e ainda com retardo mental ou hiperatividade, não podem ser confundidos nas suas características. Dessa forma, necessitam de uma análise mais global e integrada dos sintomas ou distúrbios, por parte do fonoaudiólogo, auxiliando na definição do diagnóstico correto e terapia mais adequada.

Embora o profissional atue em ambos os campos, estes divergem entre si na prática fonoaudiológica. O fonoaudiólogo precisa fazer uma distinção entre as escolas especiais, que são voltadas para o atendimento clínico de pessoas com deficiências e as escolas comuns (regulares) que possuem objetivos unicamente pedagógicos.

Nas escolas especiais, o fonoaudiólogo faz parte de uma equipe técnica e atua de acordo com a proposta da instituição, junto a alunos com limitações ou distúrbios na comunicação, sejam estas de origem orgânica, genética ou funcional.

Nesse contexto, agem em caráter multifuncional, prevenindo e tratando terapeuticamente os alunos dessas instituições.

Na escola, o fonoaudiólogo se apresenta como um parceiro que pode compartilhar as diferentes práticas que levem a um melhor desenvolvimento de linguagem e conseqüentemente, um melhor desempenho escolar, garantindo ao educador o controle do espaço e do processo educativo. O aluno antes tido como doente pode ser compreendido e descoberto (CAVALHEIRO apud GIROTO, 2001, p.16).

O terapeuta convive, quase que diariamente, com pessoas que apresentam déficit no desenvolvimento da linguagem, podendo orientar seu trabalho de acordo com a tendência atual da fonoaudiologia que é olhar o "sujeito" como um todo, observando os aspectos lingüísticos e neurológicos, ou seja, pode realizar seu diagnóstico conforme os aspectos psicológicos, neurológicos, lingüísticos, sócio-culturais.

O fonoaudiólogo pode contribuir de forma ampla no processo de interação professor – aluno, elaborando planos que favoreçam o desenvolvimento da linguagem oral e escrita, de prevenção das disfunções da linguagem através da detecção precoce das mesmas.

O corpo docente, através da orientação do fonoaudiólogo, poderá reconhecer os sintomas básicos de alguns distúrbios da comunicação mais recorrentes, e, a partir da sua detecção, comunicar ao terapeuta o qual, por sua vez, fará uma avaliação pormenorizada desses fatores, promovendo a ação clínica dentro da escola.

Para G. A. H. Martins (apud GIROTO, 2001, p.113), "o fonoaudiólogo deve estar atento para diferenciar os problemas de ordem intelectual dos problemas de ordem pedagógica e/ou ambiental e, a partir disso, adotar condutas preventivas direcionadas à orientação do professor em relação ao desenvolvimento global da criança (...)". O fonoaudiólogo fará uma descrição dos aspectos emocionais, fala, linguagem, psicomotricidade, ressaltando as habilidades do aluno para que estas sejam estimuladas, também possibilitando um diagnóstico precoce, caracterizando um trabalho de prevenção.

Do ponto de vista de Bosch e Del Río (in PEÑA-CASANOVA, 1997, p. 224), "a presença de um fonoaudiólogo na escola também deve servir para detectar nos níveis pré-escolar, possíveis disfunções, que com uma intervenção específica, normalmente por parte do próprio professor, podem ser reconduzidas com facilidade aos níveis esperados (...)". Este processo de detecção precoce auxiliará diretamente no trabalho da linguagem oral em sala de aula, potencializando os níveis de expressão lingüística, o que trará um melhor rendimento nas áreas de aprendizagem escolar.

A parceria entre fonoaudiólogo/professor pode beneficiar a toda a comunidade escolar sob vários aspectos, principalmente porque é o professor que está em contato direto com o aluno, de forma que percebe melhor suas limitações, através da observação do seu comportamento em sala de aula.

Essa interação professor/fonoaudiólogo é um fator de relevância no processo terapêutico, uma vez que o aluno, na escola regular ou na escola especial, interage diretamente com esses dois profissionais, de forma que o educador pode observar o progresso da ação terapêutica e garantir a manutenção da mesma.

Assim, torna-se necessário que professor e fonoaudiólogo desenvolvam um trabalho irmanados em uma relação recíproca, haja vista que ambos os profissionais atuam de forma específica e detêm experiência na área educacional.

Dessa forma, ambos os profissionais, de posse da compreensão dos benefícios dessa realidade, podem seguir esse trabalho, auxiliando-se mutuamente, respeitando as limitações e particularidades de cada profissional, tendo em mente o objetivo em comum: o progresso do desenvolvimento cognitivo do aluno.

CAPÍTULO 2

AS CONTRIBUIÇÕES DA FAMÍLIA NO FAZER FONOAUDIOLÓGICO NA ESCOLA ESPECIAL

Para Carvalho et al (In LAGROTA E CÉSAR, 1997, p. 53), "A família pode ser considerada como a primeira instituição social de qualquer ser, tendo um papel fundamental para a aquisição e o desenvolvimento da linguagem".

Dada a sua importância no desenvolvimento do filho e da própria sociedade – já que, muitas vezes, é ela a responsável pela percepção precoce do problema, o que favorece um melhor resultado terapêutico pela intervenção fonoaudiológica no menor prazo possível -, merece que se lance um olhar sobre a evolução de seu papel ao longo da história da civilização.

Por ser o homem um ser egrário por natureza, a família existe desde as mais remotas civilizações. Entretanto, o papel que ela representa tem sofrido diversas transformações, fruto da constituição das sociedades ao longo da evolução da humanidade.

Durante a idade média, o objetivo da família era "assegurar a transmissão da vida, dos bens e dos nomes" (ARIÉS, 1978, p. 275), ou seja, o seu papel era unicamente conservar os bens e lutar pela sobrevivência. Os casamentos eram contratos firmados de acordo com as conveniências dos chefes das famílias envolvidas. As relações afetivas não eram priorizadas, assim como a educação e os laços afetivos entre os pais e filhos, porque as crianças aos 6 ou 7 anos, após o desmame tardio, participavam das atividades dos adultos, compartilhavam com eles o trabalho no campo e nos domicílios.

Nesse período, a criança era educada em outra casa que não a de seus próprios pais. Através do serviço doméstico, ela adquiria o conhecimento, a experiência e a prática dos valores sociais. Tinha participação ativa na vida adulta. A noção de educação nesse momento histórico – social diferia amplamente do conceito atual.

Para Ariés (1978. p. 231) "A família não podia, portanto, nessa época, alimentar um sentimento existencial profundo entre pais e filhos". Apesar de existir o afeto, o que contava na realidade era o que essa criança viria a proporcionar futuramente. O papel que a família representava era moral e social, de forma que o lado sentimental não tinha representatividade.

Entretanto, a partir do século XV, tem início uma mudança no contexto familiar de forma bastante sutil e constante: com a chegada dos séculos XVI e XVII, uma nova postura sentimental se instala no núcleo familiar. "A família transformou-se profundamente na medida em que modificou suas relações internas com a criança" (ARIÉS, 1978, p.225).

Já em meados do século XVII o lugar da criança dentro da família é muito relevante, tornando-se elemento fundamental nesse contexto. Os pais, por sua vez, passam a priorizar a saúde e a educação dos filhos. Uma das características dessa mudança é a igualdade de direitos filiais.

A idade moderna estabelece o modelo sentimental que a família apresentará á posteridade. Agora, a família nuclear se destaca (pai, mãe e filhos), e todos os esforços do grupo são direcionados à projeção das crianças, cada uma com suas particularidades, abolindo de vez o costume medieval da primogenia, constituindo, assim, a igualdade disposta no Código Civil.

O retorno da criança ao lar, permite, então, aos pais priorizar a educação e valorizar a presença dos filhos, vendo-os de maneira emotiva, tendo-os como "objeto" de valor inestimável, portadores das características maternas e paternas e receptáculo dos sonhos, projetos e aspirações pessoais de seus genitores.

Atualmente, o papel da família e da relação entre seus membros foi redimensionado e, o que no passado era uma relação interna sem vínculos afetivos, não priorizando o afeto e tendo nos filhos o meio de manutenção e renovação dos bens, inverteu-se, passando a ser competência dos pais garantir a sobrevivência e a formação moral e espiritual dos seus membros. Dito de outro modo, houve uma transformação na função da família: de transmissora de bens e nomes, a família assumiu a função educadora, de formar os "corpos e as almas dos filhos" preparando-os para a vida (ARIÉS, 1978, p. 277).

Diante dessas transformações, a família assume um papel preponderante no desenvolvimento dos indivíduos, como efeito dessa nova visão de educação, passando a desenvolver-se, em seu seio, uma relação de afetividade, com o estabelecimento de uma maior intimidade e identidade. Nesse momento,

(...) a família representa a célula da sociedade organizada onde o gérmen da própria vida se alberga. A obra dos homens tem uma duração relativa. As de alguns gênios perduram, mas só, verdadeiramente a humanidade é que transcende e se perpetua (...) porque os filhos dos filhos e seus descendentes continuarão amando (...) e aprendendo a aperfeiçoar sua capacidade afetiva, geração após geração (KNOBEL, 1992, p.20).

A função primordial da família é dar condições para que a espécie se perpetue, garantindo a alimentação e promovendo o desenvolvimento e a educação de seus membros. No seu seio, o indivíduo terá acesso às primeiras noções de afeto, de carinho, de proteção. Entretanto, será ela, também, palco das primeiras conquistas, alegrias, frustrações, medos e ansiedades. Independente da sua constituição, é ela que fornece as bases afetivas e principalmente os meios necessários ao desenvolvimento e bem-estar dos seus componentes. É no seu interior que os valores éticos se desenvolvem (KALOUSTIAN, 1988, apud PEQUENO, 2004, p. 3).

Assim, no contexto das relações familiares é que a criança formará sua personalidade, desenvolvendo os aspectos mentais, emocionais, intelectuais e sociais. Nela é que se encontra a formação da estrutura da primeira identidade social dos indivíduos. É no seu interior que se constrói a estrutura psíquica onde as experiências são regidas por padrões emocionais.

A família é o centro social, é o primeiro grupo ao qual se pertence, independente da sociedade na qual está inserida; é o primeiro degrau de importância que se galga rumo à socialização do ser humano.

Segundo Gokhale (1980, Apud PEQUENO, 2004, p. 3), "a família tem sido, é, e será a influência mais poderosa para o desenvolvimento da personalidade e do caráter das pessoas". Ela é a origem de toda a cultura e o alicerce da sociedade, o núcleo da vida social. É a educação no seio familiar que formará o indivíduo adulto, seu caráter, influenciando de forma definitiva a personalidade de seus membros, ensinando-os o que lhes é necessário para que se beneficiem do futuro.

O ambiente familiar dará as bases para o desenvolvimento de um indivíduo seguro, auto-confiante, maduro e estável emocionalmente, bem relacionado com os demais membros da família e da sociedade. O sujeito trará nas suas atitudes, no seu comportamento, o reflexo da sua convivência familiar, os efeitos da sua criação, da sua relação com seus pais. Ele sofre influência do meio no qual desenvolve seu potencial humano, ainda que a herança genética determine sua extensão e essa hereditariedade recaia sobre todos os membros da família de forma singular, seja física, intelectual, de aprendizagem.

Para Ackerman (1986, p. 60), "não há hereditariedade sem ambiente; não há ambiente sem hereditariedade". Há uma estreita relação entre estes dois aspectos para o desenvolvimento global da criança que, uma vez criada num ambiente sem conflitos, com muita harmonia e amor, seu grau de dificuldade de aprendizagem será minimizado, já que tais dificuldades podem ser oriundas de desordens emocionais no seio familiar. Dito de outro modo, as relações afetivas entre os membros da família, promovem na criança o ritmo da aprendizagem.

Assim, a família, tal como a constituímos, tal como a sociedade a absorve, pai, mãe e filhos (ou responsáveis diretos por sua formação), formam o núcleo, o sistema no qual seus membros interagem, promovendo não só a perpetuação da espécie, mas também o desenvolvimento emocional e intelectual dos indivíduos que formam as sociedades.

Comprovado o papel decisivo da família na nova ordem social, tem-se ainda a fundamentação legal do seu dever no processo de desenvolvimento sócio-educativo do aluno estabelecido na legislação nacional (Constituição Federal) cujo art 227 reza o seguinte:

Art. 227 – é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar á criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito á vida, á saúde, á alimentação, á educação, ao lazer, á profissionalização, á cultura, á dignidade, ao respeito, á liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988, p. 137).

Nesse artigo da carta magna, fica claro o reconhecimento do Estado ao importante papel que a família representa na e para sociedade e sua co-participação junto do Estado na preservação da vida, da saúde e do bem-estar dos seus descendentes.

Elencadas as bases formais da relação família/desenvolvimento infantil, é imprescindível destacar alguns pontos: a necessidade de reconhecer que a família - independente de sua formação -, pode se apresentar como espaço seguro e afetuoso, mas também, como lugar onde se constitui o preconceito, a rejeição, e, por vezes, a violência. Lembrando que, de forma negativa ou positiva, o ambiente familiar influenciará decisivamente no desenvolvimento do individuo.

A família é reconhecidamente peça fundamental no desenvolvimento do individuo, em virtude de funcionar como o centro do universo infantil. Em consonância com essa realidade, qualquer alteração no cotidiano desse sistema afeta direta ou indiretamente todos os membros. O nascimento de um portador de necessidades educacionais especiais abala essa estrutura, inclusive porque gera a necessidade da inserção de especialistas nesse sistema como, por exemplo, o fonoaudiólogo.

Portanto, é perfeitamente compreensível a resistência de algumas famílias com relação à orientação das intervenções, porque é uma nova realidade com a qual toda a família terá de adaptar-se e interagir. A partir da aceitação do diagnóstico, essa mesma família se preocupará em buscar soluções.

(...) apesar da condição fragilizada, esses pais devem assumir o mais breve possível esse filho, pois são eles que têm o maior acesso às condições ambientais determinantes do seu desenvolvimento, por passarem um tempo maior que os especialistas junto ao filho deficiente (...) os pais tornam-se um fator decisivo para que este se desenvolva, desde que se envolvam ativa e efetivamente em todos os procedimentos que são necessários empreender (S.L.FERREIRA, 1999, p 42).

Diversos autores discorrem sobre a expectativa da gestação de um filho, e dos riscos e transformações que acarreta a presença de crianças com necessidades especiais no seio familiar, como Brazelton (1992), Murphy (1995), Smith (1985). Revelam que este fato exige um determinado tempo para que a família trabalhe sua aceitação, para que expresse seus sentimentos, suas dúvidas, em relação a esta nova situação permanente. Uma criança portadora de alguma patologia afeta a estabilidade familiar e requer um período de adaptação para os familiares (PEREZ, 1998).

Passados os primeiros momentos, os impactos da realidade que se apresenta, os pais, cientes da função de provedores desse novo membro da família, podem iniciar o trabalho de "reconhecimento" do filho. No sentido de auxiliar os pais na aceitação da nova realidade, os profissionais e especialistas da área podem, por meio de conselhos, e esclarecimentos acerca da problemática do filho, orientá-los quanto aos meios disponíveis, quanto aos procedimentos cabíveis para que o desenvolvimento dessa criança se dê com a participação ampla e irrestrita dos mesmos.

Um trabalho focalizado na família impõe aos profissionais a aceitação da opinião dos familiares, que observem as queixas e dúvidas dos mesmos, que priorizem as necessidades da família, mesmo quando essas opiniões e sugestões não estejam em consonância com as convicções do terapeuta.

A importância da família também é registrada no âmbito educacional, através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação - Lei 9394/96 -, em seu capítulo V, que estabelece como uma de suas diretrizes gerais:

(...) adotar mecanismos que oportunize a participação efetiva da família no desenvolvimento global do aluno, e ainda, conscientizar e comprometer os segmentos sociais, a comunidade escolar, a família e o próprio portador de necessidades especiais na defesa de seus direitos e deveres (AGUIAR & MARTINS, 2003, p. 126.).

A família é o primeiro grupo social onde o indivíduo aprende a desenvolver-se, e a escola é basicamente o segundo sistema no qual o sujeito se insere, dando continuidade ao seu processo de aprendizagem e socialização. A partir daí, ambos acabam por tornar-se supostamente indissociáveis. "De uma forma ou de outra, onipresente ou discreta, agradável ou ameaçadora, a escola faz parte da vida cotidiana da família" (MONTANDON E PERRENOUD, 1987, p.7, apud FARIA FILHO, 2000, p.1).

Segundo Faria Filho (2000, p. 2), "no Brasil, ao longo do século XIX, a instituição escolar vai lenta, mas inexoravelmente, se fortalecendo como o locus fundamental e privilegiado de formação das novas gerações (...)". De forma que foi ganhando espaço e desenvolvendo como instituição o papel legal de "educar" o individuo de certa forma, aos poucos, afastando a família desse processo.

Entretanto, no século XX, tem início as transformações desse conceito dentro das instituições escolares, passando as mesmas a buscar o estabelecimento efetivo de uma estreita relação entre a família e a escola.

Durante a década de 80, há um processo de democratização dos diversos setores sociais, incluindo uma preocupação crescente de uma maior participação da família na educação, para que ela se faça presente nas reuniões, nas discussões das políticas públicas educacionais, e não apenas nas festividades ou momentos solenes[8]

As transformações sócio-econômicas trazidas nos anos 90 – a reorganização dos papéis dos pais dentro da família, a presença cada vez mais constante da mulher no mercado de trabalho vem afetando diretamente na efetivação da família no contexto-escolar.[9]

Essa preocupação tomou contornos legais, colocando a família como co-participante da formação educacional do individuo; a esse respeito, a lei 9394/96 anuncia o seguinte:

Art 2º - A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRZEZINSKI, 1998, p. 218).

Art.29 - A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade. (IDEM, p. 225).

Em resumo, a lei preconiza o envolvimento da família e da comunidade no processo de desenvolvimento da personalidade do educando, reconhecendo a importância das mesmas na socialização da criança no contexto escolar, e desse sistema para a sociedade como um todo.

É importante, pois, que o setor educacional aceite concretamente a participação da família no processo de ensino e aprendizagem, estimulando-a a cooperar na conscientização dos demais setores sociais e na promoção do desenvolvimento emocional e social do sujeito na comunidade escolar.

2.1 A Parceria Fonoaudiólogo-Família

Há muitas investigações que destacam o efetivo de promover uma significativa relação entre o fonoaudiólogo e a família, em ações colaborativas em todos os setores de atuação do terapeuta da linguagem. A presente análise deter-se-á à escola especial, que é o campo de atuação para o qual este trabalho está sendo direcionado.

Alguns autores como Zorzi (1993), Franco (1992), Maia (1996), destacam a importância da família no desenvolvimento infantil e sugerem sua participação incondicional nas terapias, para que estas obtenham o resultado desejado. Segundo esses mesmos autores, a família deve participar de todo o processo terapêutico (HALLER, 1998, pp. 9-11)

Os pais estão intrinsecamente ligados á experiência da deficiência de linguagem, tanto por causa da natureza familiar de várias das dificuldades, quanto, também, pelo fato de ser para eles que os profissionais voltam-se em seu processo de pesquisa e na intervenção (CROWLEY, 2001, p.75).

A família representa um papel preponderante na vida da criança, de forma que todo procedimento terapêutico terá os pais como meio para a intervenção. "Sem o envolvimento dos pais, pouco se consegue (sic) em termos de progresso" (CROWLEY, 2001, p. 76). Cabe, portanto, ao fonoaudiólogo, esclarecer a família sobre a importância da sua colaboração no desenvolvimento da terapia.

Para isso, o fonoaudiólogo deve atentar para os aspectos relevantes sobre o impacto que causa a presença de um portador de necessidades educacionais especiais na dinâmica familiar, o real acervo de informações que a família possui sobre a deficiência de seu filho, e a visão que os demais membros têm a respeito do problema.

O trabalho do terapeuta, sob estes aspectos, está intrinsecamente ligado ás relações existentes na família. O vínculo dos familiares é fundamental para a abordagem terapêutica.

A colaboração dos pais no processo de reabilitação permite resultados mais rápidos; quanto maior o grau de envolvimento familiar no programa terapêutico, maior será o número de respostas positivas que o individuo apresentará. Na concretização desse quadro, urge a resposta ás dúvidas que os pais trazem consigo sobre a possibilidade real da reabilitação dos filhos, bem como o conhecimento - por parte do terapeuta -, das dificuldades, medos e ansiedades dos mesmos.

É importante reconhecer que há uma variação no grau de desenvolvimento de um individuo a outro, que as etapas essenciais que compreendem esse processo variam conforme os valores, convicções, modo de criação familiar, devendo-se, portanto, na elaboração dos procedimentos de atendimentos, considerar todos esses aspectos. Sobre isso, Martins (In GIROTO, 2001, pp. 116-117) propõe que o fonoaudiólogo deve analisar o contexto em que a criança está inserida, o qual, em determinados casos, pode vir a justificar as dificuldades que as crianças apresentam, devendo distinguir os problemas intelectuais dos pedagógicos ou ambientais, a fim de prevenir possíveis alterações e estimular as potencialidades da criança.

Segundo Rio e Bosch (In PEÑA-CASANOVA, 1997), as etapas iniciais do desenvolvimento da linguagem costumam ocorrer no contexto familiar sob a influência das relações cotidianas, na fase onde a linguagem está se formando, se delineando, para em seguida desenvolver-se simultaneamente em outro espaço de características distintas chamado escola.

A escola, por ser a instituição reconhecida legalmente para gerar e gerir o conhecimento e a aprendizagem, responde pela apreensão desses aspectos, devendo colaborar de todas as formas possíveis para sua realização.

Com relação a essa instituição Peña-Casanova (1997, p.324) coloca o seguinte:

(....) A escola é também um local em que são detectados, ás vezes gerados e ocasionalmente tratados, vários distúrbios da linguagem, de causas e gravidades diversas. A escola e o fonoaudiólogo compartilham, juntamente com a família, a responsabilidade de assentar as bases para que as alterações da comunicação e da linguagem, que estão se desenvolvendo e evidenciando na instituição escolar, sejam detectadas a tempo e sejam dados os primeiros passos para sua possível solução (...).

O fonoaudiólogo é o profissional apto e legalmente reconhecido para dar assistência e promover intervenções terapêuticas nos distúrbios da linguagem.

Dessa forma, família, escola e fonoaudiólogo legitimam uma atuação no sentido de colaborar na eliminação ou diminuição dos distúrbios da linguagem – sejam eles leves ou acentuados.

A interação entre o fonoaudiólogo e a família pode obter melhores resultados a partir da observação de situações e experiências cotidianas que favoreçam e contribuam para o desenvolvimento infantil, numa relação que respeita as individualidades do terapeuta, da criança e da família, onde o fonoaudiólogo auxiliará a família a desempenhar sua função de família "sem torná-la 'terapeutas de plantão'" (PEREZ, 1998, p. 253).

A relação entre o terapeuta e os pais do indivíduo com necessidades especiais deve gerar um conhecimento recíproco com o intuito de garantir ao aluno uma parceria no tratamento fonoaudiológico, uma vez que é no ambiente familiar que o individuo passa a maior parte do seu tempo: o lar pode ser considerado a extensão do atendimento clínico.

Para Cavalheiro (In GIROTO, 2001, p.16),

O fonoaudiólogo deve valorizar a participação dos pais em seu trabalho. Atendendo-os individualmente ou, preferencialmente em grupos, os encontros devem enfatizar o papel que estes desempenham em todo processo de desenvolvimento de seus filhos.

É um trabalho voltado á realização de um intercambio de opiniões, de impressões entre o fonoaudiólogo e a família, buscando reorganizar-se num objetivo comum, expondo suas dificuldades, porque ambos estão propensos a ter dúvidas e incertezas.

O fazer fonoaudiológico auxiliado pela família do aluno na escola especial será positivo na medida em que a comunicação seja franca, direcionada á solução do problema, às dificuldades que os pais apresentam no tratamento do filho, a partir da conversão do fonoaudiólogo em alguém de confiança e empatia da família. Ele tem de estar ciente do histórico familiar do aluno, em que contexto social o aluno e a família estão inseridos, o que representa para ela a necessidade especial do seu filho, sob que ótica o problema é visto, quais as expectativas de solução sobre a terapia aplicada. (ZORZI, 1999).

Para que essa situação seja recorrente, faz-se necessário que o terapeuta conheça bem o aluno e sua família, quais suas dúvidas, ansiedades, o grau de conhecimento acerca da patologia que afeta seu filho, que os pais reconheçam a importância do seu papel no centro familiar. Reconheçam-se como elemento fundamental na evolução das terapias, tenham confiança no sucesso da intervenção e no terapeuta.

A família é a responsável pela promoção do bem-estar dos seus membros, conseqüentemente, agente na busca das soluções dos possíveis problemas que os alcancem. Dentre os procedimentos realizados pelos pais, está a busca de um caminho terapêutico que melhor se apresente para a reabilitação de seu filho. É necessário que os pais voltem o olhar para a criança, buscando perceber, alcançar seu sofrimento, para ajudá-la a superar suas dificuldades. É importante, também, transparecer confiança no seu desenvolvimento, ter atitudes positivas em relação ao tratamento escolhido e abrir-se à orientação do especialista.

Cabe ao fonoaudiólogo, dentro das suas funções na escola especial, orientar as famílias, ajudando-as a compreender, aceitar e tratar de forma correta as dificuldades e problemas advindos das necessidades especiais das quais seus filhos ou parentes são portadores, bem como ajudá-las a operacionalizar o tempo no cotidiano dos seus lares para a realização das terapias, estimulando a extensão da terapia e a continuidade da mesma.

Para Zorzi (1993, pp.78-80), no início, o fonoaudiólogo tinha a orientação como algo diretivo, com o predomínio de regras de conduta que os pais deveriam seguir. O terapeuta orientava a família sob o prisma técnico, direcionando as ações, atribuindo papéis de forma ditatorial, indicando de que maneira deveria ser conduzida a terapia, visto que esses pais deveriam saber exatamente o que o fonoaudiólogo representa e o que caberia a eles, pais, realizar.

A orientação das intervenções está mudando ao longo dos anos, de forma que, atualmente, a situação de diretiva passou a ser compreensiva, propiciada por momentos de escuta. "Da mesma forma que fomos aprendendo a ouvir nossos pacientes, fomos aprendendo também a ouvir suas famílias" (ZORZI,.2002, p.97).

Hoje o termo "orientação" tem uma semântica mais abrangente e procura inserir os atores do processo numa relação de reciprocidade, de troca, de informação, onde o fonoaudiólogo escuta o que a família tem a colocar, e vice-versa.

Distúrbios da comunicação, em geral, e especialmente os mais graves, envolvendo problemas evolutivos, vêm (...) acompanhados de ansiedade, tensão, angústia, dúvidas e preocupações que, muitas vezes, determinam formas 'estranhas' de relação entre a família e o paciente (ZORZI, 1993, p. 79).

Diante desse quadro, cabe ao terapeuta conduzir a orientação de forma compreensiva, transformando o caráter diretivo em pessoal, permitindo um "desabafo" dos familiares, escutando as queixas e, de acordo com o "material" que lhe foi confiado, trabalhar essas angústias e dúvidas causadas pela realidade de ter um portador de necessidades especiais no seio familiar.

Segundo Zorzi (1993), de acordo com cada caso, a freqüência de encontros com a família pode tornar-se um momento de reflexão, de questionamentos a fim de que os fonoaudiólogos tenham uma melhor compreensão da complexa relação familiar e para que a família possa compreender a importância do entrosamento terapeuta/família. A partir de um trabalho centrado na conscientização da família quanto ao problema do aluno, é possível que esta venha a participas de forma mais coesa como auxiliar no tratamento, objetivando o sucesso da reabilitação do sujeito.

É importante que os pais tenham amplo conhecimento da realidade, da disfunção que atinge o membro da família e que os demais familiares conscientizem-se desse quadro, porque a estimulação do P.N.E.E. começa no seio familiar. A reabilitação física e emocional tem origem na família, para depois se estender além desse sistema, integrando a escola, onde terá ajuda profissional.

Segundo Carvalho et al (Apud LAGROTA e CÉSAR, 1997, p. 81), "cabe, portanto, ao fonoaudiólogo a conscientização da participação familiar no processo terapêutico", de forma a motivar a família a integrar o programa de intervenções elaborado pelo fonoaudiólogo, promovendo com isso uma maior integração do aluno. Também é fundamental que a família estimule a prática de tudo o que a criança assimila.

Entretanto, estamos cientes de que a eficácia da orientação se dará de acordo com a observação das características de cada família, ou seja, dependerá da dinâmica familiar. Em outras palavras, algumas estão abertas à orientação, enquanto outras são por demais resistentes - o que pode acarretar um processo mais lento de evolução terapêutica (ZORZI, 2002, p. 98).

A interação do fonoaudiólogo com a família pode resultar no sucesso das intervenções a partir da utilização de uma metodologia que satisfaça os objetivos do terapeuta e atenda as expectativas dos familiares, promovendo o desenvolvimento das capacidades cognitivas, lingüísticas, afetivas e sociais do P.N.E.E (Portador de Necessidades Educacionais Especiais).

O papel da parceria entre o fonoaudiólogo e a família é de grande importância no contexto das terapias. O terapeuta da linguagem pode contribuir sensivelmente no sentido de promover uma reflexão a respeito do significado da mesma para o filho e para sociedade – é a família que muitas vezes percebe o problema logo que ele se apresenta -, portanto, cabe aos pais essa observação e a responsabilidade de levar seus filhos ao fonoaudiólogo. É importante lembrar que um diagnóstico precoce favorece um melhor resultado da terapia.

O fonoaudiólogo será um intermediário entre o portador e sua família através das intervenções e das orientações prestadas, favorecendo a compreensão de ambas as partes do problema. A família, de posse das informações necessárias sobre a patologia e a probabilidade de recuperação, terá uma melhor postura diante da vida, que refletirá na criança, favorecendo a evolução da terapia, que se dará também pelo fato da confiança dos pais na reabilitação dos filhos.

A colaboração da família no fazer fonoaudiológico dará margens à reflexão sobre as ações relacionadas a reabilitação dos distúrbios de linguagem, e alterações na comunicação, e sobre o progresso das terapias.

CAPÍTULO 3

METODOLOGIA E PESQUISA

A fonoaudiologia, ciência que tem por objeto de estudo a linguagem nos seus aspectos patológicos, vem ampliando suas ações no contexto educacional, seja através de ações preventivas, concernentes à eliminação de fatores que interferem na aquisição e evolução dos padrões da fala, linguagem e audição, seja em intervenções terapêuticas dirigidas ás alterações de ordem patológica nos aspectos gerais da comunicação.

A prática fonoaudiológica de caráter clínico na área da educação, segundo as normas do Conselho Federal de Fonoaudiologia, deve ser realizada apenas na escola especial, onde, objetivando a promoção da saúde nesse ambiente, realiza atividades que vêm restabelecendo o caráter social do terapeuta.

No exercício de suas atividades na escola especial, o terapeuta da linguagem encontra-se envolvido com outro sistema de grande importância no desenvolvimento cognitivo do sujeito que apresenta disfunções na linguagem: a família, que vem interligando-se à escola pela responsabilidade social que o papel de ambas representa.

Na busca da excelência no atendimento terapêutico às pessoas com necessidades educacionais especiais, surge a necessidade de verificar o grau de conhecimento que os familiares têm da função fonoaudiológica e a possibilidade real e efetiva dessa parceria.

3.1 Definição da metodologia.

A promoção da reflexão efetiva de uma atividade por parte de um público específico propõe uma atividade de investigação sistêmica e científica, da prática fundadora do tema abordado, a fim de relacionar a teoria e prática na apreensão da realidade.

A análise de uma investigação - a fim de que seus resultados possibilitem uma intervenção do real -, está fundamentada na quantidade e, mais detidamente, na qualidade das informações prestadas e registradas pelos sujeitos responsáveis pela referida investigação.

Dentre as diversas opções de apreensão dos dados, a pesquisa é um instrumento utilizado em larga escala, por ser um método ao qual é conferido um alto grau de eficiência.

Minayo (2000, p. 17), sobre a pesquisa, declara ser "a atividade básica da Ciência na sua indagação e construção da realidade (...) A pesquisa vincula pensamento à ação".

Outros autores comungam da mesma opinião sobre o tema. Para Severino (1999, apud MATOS e VIEIRA, 2002, p. 22), "(...) só se aprende, só se ensina pesquisando; só se presta serviços á comunidade, se tais serviços nascerem e se nutrirem da pesquisa (...)". Matos e Vieira (2002. p. 21) a identificam como "(...) a atividade principal da ciência que nos permite a aproximação e o entendimento da realidade que investigamos (...)".

A opinião dos autores quanto à conceituação da pesquisa são confrontantes, entretanto defendem um ponto em comum, que é a sua finalidade como instrumento de resposta a questionamentos de toda sorte.

Essa diversidade se entende á definição dos tipos de pesquisa existentes devido ao vasto universo de variáveis que interferem na formação de cada um deles. No entanto, a confiabilidade dos resultados a obter, depende, fundamentalmente do planejamento da metodologia a ser abordada, da extensão da população e do meio da coleta de dados escolhido.

Kaplan, citado por Castro (1978, p. 33) preconiza que:

o objetivo da metodologia é o de convidar a ciência a especular e o de convidar a filosofia a interessar-se pelos problemas práticos. Em resumo o objetivo da metodologia é o de ajudar-nos a compreender, nos mais amplos termos, não os produtos da pesquisa, mas o próprio processo (KAPLAN, apud CASTRO, 1978, p. 33).

Para o alcance dos objetivos propostos neste trabalho, foi adotada a metodologia a seguir relacionada.

3.1.1 Tipo de pesquisa

A metodologia a ser utilizada na execução do presente trabalho está fundamentada em duas técnicas de investigação: uma incursão bibliográfica e uma pesquisa de campo.

A pesquisa bibliográfica é realizada conforme levantamento de material já publicado a respeito da temática - sobre a fonoaudiologia, seu campo de atuação, com ênfase na educação especial, o papel do fonoaudiólogo na escola especial, a família e sua importância no desenvolvimento da criança, bem como a relevância da parceria entre o fonoaudiólogo e a família, demonstrando a necessidade de um estudo que busque um conhecimento mais detalhado dos seus processos de funcionamento, o que pode ser melhor verificado com a pesquisa de campo.

Para o estudo em referência, foi adotada a pesquisa exploratória, porque o tipo em questão:

...visa prover o pesquisador de um maior conhecimento sobre o tema ou problema da pesquisa em perspectiva, (...) por isso, é apropriada para os primeiros estágios da investigação quando a familiaridade, o conhecimento e a compreensão do fenômeno por parte do pesquisador são, geralmente, insuficientes ou inexistentes (MATTAR, 1997, p. 60).

3.1.2 Método de coleta de dados

Para a obtenção dos dados referentes á pesquisa, com o propósito de alcançar determinados resultados, procedeu-se á utilização dos seguintes recursos:

a) Levantamento em fontes secundárias – livros, artigos, páginas de web site, dentre outros – no intuito de compor um referencial teórico abrangente sobre o tema em estudo.

b) Levantamento de informações através de entrevistas individuais (ANEXO I) com membros da família responsáveis pelas crianças com necessidades educacionais especiais, buscando identificar o grau de importância atribuído por cada um desses representantes à parceria entre a família e o fonoaudiólogo.

Devido ao aspecto exploratório da pesquisa, optou-se por utilizar o método da comunicação que consiste "no questionamento, verbal ou escrito, dos respondentes, para obtenção do dado desejado, que será fornecido por declaração, verbal ou escrita, do próprio" (MATTAR, 1997, p.160).

Foi elaborado um roteiro não-estruturado e não disfarçado, com perguntas elaboradas do tipo abertas.

Amostragem, para Mattar (1997, p. 260), "é o processo de colher amostras de uma população". E Minayo (1992, Apud MINAYO, 2000, p. 43) especifica que a boa amostragem "é aquela que possibilita abranger a totalidade do problema investigado em suas múltiplas dimensões".

Mattar (1997, p. 267), acrescenta, ainda, que a escolha do processo de amostragem a ser utilizado em uma pesquisa: "é uma decisão que cabe exclusivamente ao pesquisador", devendo ser levados em consideração os diversos aspectos que a permeiam, tais como o tipo de pesquisa que se pretende realizar, o tempo que levará para ser concluída, os recursos que se têm à disposição e outros tantos fatores que merecem atenção.

No estudo em questão, considerando o aspecto exploratório da pesquisa, foi adotada uma amostragem aleatória dentre as treze escolas especiais do Município de Fortaleza, envolvendo 30% desses estabelecimentos, por conveniência do pesquisador.

A entrevista, em anexo, foi aplicada com os pais (ou responsáveis) dos alunos com necessidades educacionais especiais, alunos dessas escolas conveniadas em funcionamento na área metropolitana de Fortaleza.

Os estabelecimentos, em número de 4 (quatro), foram escolhidos de forma aleatória dentre o universo de escolas mencionadas. Visando resguardar o sigilo das informações prestadas, bem como a identificação dos estabelecimentos, optou-se por utilizar as letras A, B, C e D para a sua designação.

Foram entrevistadas 80 pessoas, sendo 20 respondentes em cada uma das quatro escolas escolhidas, cujo critério de seleção foi o grau de parentesco e envolvimento destes com o aluno com necessidades educacionais especiais.

Os questionários, pela sua estrutura simples e objetiva, demandaram algo em torno de 20 minutos para terem seu conteúdo apreendido e, posteriormente, respondido. Não houve resistência ou recusa por parte dos respondentes.

3.1.3 Definição das variáveis

Foram tomadas como objeto de estudo as variáveis abaixo relacionadas que identificarão as categorias de análise das entrevistas aplicadas:

  • Conhecimento dos pais sobre a fonoaudiologia;

  • A prática fonoaudiológica na área educacional, com ênfase na escola especial;

  • A relevância da parceria entre o fonoaudiólogo e a família quanto à sua prática efetiva;

  • A importância da família, como parceira, no desenvolvimento da criança com necessidades educacionais especiais;

  • Ocorrência de dificuldades no acompanhamento da terapia fonoaudiológica das crianças.

Estes aspectos possibilitam as expectativas dos pais sobre a escola especial e sua ação educacional, bem como a efetiva parceria entre a fonoaudiologia e a família sob o prisma dos familiares.

Para que haja uma melhor visualização dos resultados, serão utilizados gráficos para sua apresentação.

CAPÍTULO 4

ANÁLISE E DISCUSSAO DOS RESULTADOS

Foram entrevistadas 80 pessoas, sendo 20 respondentes em cada uma das quatro escolas escolhidas, cujo critério de seleção foi o grau de parentesco e envolvimento destes com o aluno com necessidades educacionais especiais.

Os dados obtidos, ao serem transformados em percentuais, resultaram em números fracionários. Para uma melhor visualização, optou-se por "arredondar" as referidas frações, obtendo, assim, percentuais inteiros, por aproximação.

4.1. Conhecimento dos pais sobre a fonoaudiologia;

De acordo com o Gráfico 1, questionados a respeito do seu conhecimento teórico sobre a fonoaudiologia 9% dos respondentes declararam que a ciência referida cuida da voz e da fala, 10% afirmaram que a fonoaudiologia cuida da pessoa gaga, 18% colocaram que não sabiam responder à pergunta, 29% disseram que a supracitada ciência cuida da fala e 35% entendem que é uma ciência que cuida da voz..

Gráfico 1

Monografias.com

Os dados obtidos revelam que a Fonoaudiologia, como ciência, embora já seja bastante conhecida, tem sido vinculada, ao longo de sua história, à área da saúde, o que torna compreensível a pouca divulgação das atividades do profissional no âmbito educacional. Assim, de maneira geral, a visão que a família tem a seu respeito está associada à equipe técnica e a cada caso particular, isto é, cada família retém informações do profissional baseada no serviço que este oferece àquele indivíduo com necessidades educacionais especiais e não na verdadeira dimensão de sua atuação.

Embora todas as respostas dadas pelos entrevistados correspondam às atividades relacionadas à fonoaudiologia, a falta de informações substanciais e coesas sobre a abrangência dessa disciplina reflete de forma negativa, retardando a efetivação do processo de construção da parceria entre o fonoaudiólogo e a família.

A compreensão do papel desempenhado por esta disciplina no contexto educacional favorece a conexão entre os referidos parceiros fornecendo aos familiares um panorama das possíveis contribuições que esse trabalho em conjunto pode trazer em nível sócio-educacional para o indivíduo com necessidades educacionais especiais.

  • A prática fonoaudiológica na área educacional, com ênfase na escola especial;

O Gráfico 2 mostra que, ao serem interrogados quanto ao fazer fonoaudiológico na educação, 4% dos familiares responderam que o fonoaudiólogo é um colaborador do professor na tarefa de cuidar dos alunos, 33% consideram que a função do terapeuta é ensinar o aluno a falar de forma correta, 42% relacionaram o trabalho desse profissional à execução de exercícios orofaciais com os alunos e 21% referiram não saber responder.

Gráfico 2

Partes: 1, 2, 3


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