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Rumo à sustentabilidade: o planeamento urbano participativo (página 2)

José Alberto Afonso Alexandre
Partes: 1, 2, 3

2. Discussão temática

Numerosos autores são da opinião que, actualmente, os territórios enfrentam uma série de mutações aceleradas e novos desafios, nomeadamente as cidades de média dimensão, que enfrentam o problema relacionado com a crescente polarização territorial e concentração das actividades económicas, levando ao abandono das áreas mais periféricas e ao crescimento das grandes cidades. Tais mutações estão relacionadas com o fenómeno da globalização, que acentua a concorrência entre territórios, conduzindo à sua integração ou marginalização.

Além disso, a consideração da dimensão espaço-temporal na análise urbana e a concepção reticular e dinâmica do território, alterou a sua concepção de "cidades médias" para "cidades intermédias" (ou intermediárias) [GAULT 1989]. Tal mudança de concepção significa a passagem de uma posição estática para uma posição dinâmica (funcionando como intermediárias entre territórios), valorizando-se a capacidade de se relacionarem com outros territórios situados em dimensões distintas [FERRÃO 1992], em detrimento da dimensão demográfica; e da sua capacidade de elaborarem uma estratégia de futuro, fazendo escolhas e definindo prioridades [GAULT 1989]. Neste sentido, o conceito de cidade intermédia/intermediária pressupõe a adopção de uma filosofia prospectiva, onde se crê na hipótese de reinventar o futuro a cada momento, contrariar previsões, superar o imobilismo, apostar na iniciativa e evitar a passividade.

Atendendo às fragilidades estruturais das cidades de média dimensão localizadas em áreas em declínio, muitos autores defendem políticas de desenvolvimento pró-activas, uma vez que os recursos e as oportunidades são escassos [S. GONZÁLEZ et al. 2001], promovendo-se como centros de afirmação regional, ao animarem o tecido económico e centros de concertação interurbana para enfrentarem a competitividade [FIGUEIREDO 1995]. Para outros, a sua atractividade está dependente do dinamismo da sua base económica, baseada na originalidade, na criatividade e na inovação, na flexibilidade, na capacidade de investigação, na propensão para a cooperação entre o sector público e o sector privado, na sua acessibilidade e na capacidade de afirmação de modelos e instrumentos de planeamento estratégico territorial [SENN & MARTINI 1994; FERRÃO et al. 1994; NETO 1999], sem esquecer o seu papel dinamizador da economia local, nomeadamente ao integrarem as áreas rurais circundantes na economia globalizada. Este último aspecto é particularmente importante para as cidades de média dimensão localizadas em áreas periféricas, requerendo uma articulação com o desenvolvimento rural (nomeadamente, a dinamização do sector agro-industrial e transformação de produtos silvícolas, ou a aposta no sector do turismo), adoptando uma filosofia de desenvolvimento regional integrado. Assim, segundo KAISERGRUBER [2001: 19], num mundo globalizado, as cidades devem ter uma atitude inovadora, pró-activa, mas também reactiva: "nada está já mais adquirido para uma cidade, e a inovação deve ser permanente, mesmo para a cidade cuja imagem de modernidade seja evidente".

Em suma, as cidades de média dimensão devem: (1) consolidar-se como locais inovadores e crescentemente competitivos (adoptando estratégias ofensivas e defensivas) e simbioticamente integradores do território regional envolvente; (2) adoptar um espírito de oportunidade e cultura simultaneamente adaptativa, reactiva e pró-activa – adaptar-se, reagir às mudanças e actuar para provocar as mudanças desejadas; (3) apostar num modelo de desenvolvimento coordenado e sustentável; (4) ser capazes de conceber, implementar e renovar instrumentos de planeamento estratégico territorial, com vista à execução do modelo de desenvolvimento desejado.

De facto, a constatação da existência de um ambiente instável, imprevisível, concorrencial e dificilmente controlável, e a consideração do espaço como entidade dinâmica e sempre a construir, conduziram, nos últimos anos a argumentar-se que os instrumentos de planeamento tradicionais se tornaram incapazes de controlar e de prever as actuações dos agentes no território e de se adaptarem às mudanças, pois os planos físicos estáticos perderam eficácia, dado que não respondem a ocorrências imprevistas. Assim têm surgido novas correntes de pensamento que responsabilizam os actores locais pelo seu próprio processo de desenvolvimento, de forma que sejam capazes de preparar convenientemente o seu futuro, adoptando uma visão estratégica de médio a longo prazos e, simultaneamente, conceber instrumentos operacionais para serem capazes de reagir rapidamente às dificuldades e oportunidades que continuamente forem surgindo, mas sem perder a visão de longo prazo. Referimo-nos em concreto ao planeamento estratégico urbano que visa desenvolver os territórios de forma sistémica, integrada e pró-activa.

Este tipo de planeamento vem complementar o planeamento urbano tradicional, uma vez que os planos urbanísticos continuam a fornecer, fundamentalmente, o quadro legal para a localização e uso do solo urbano ou urbanizável, enquanto que a finalidade última do planeamento estratégico é alcançar uma maior competitividade económica e uma melhor qualidade de vida. Este tipo de planeamento ao buscar modelos de desenvolvimento, ultrapassa a dimensão linear do planeamento físico e ao considerar a complexidade sócio-económica e política, minimiza as contradições e as fracturas operativas do planeamento sectorial, fornecendo um quadro de acção para o planeamento físico [FALUDI 2000] e a orientação das acções que procedem de uma estratégia global de desenvolvimento [BRYSON 1999a].

O planeamento estratégico é apresentado como um instrumento capaz de enfrentar os desafios contemporâneos da globalização e da pós-modernidade e o seus fundamentos são:

(1) Está mais orientado para a acção do que para o controlo – atitude pró-activa;

(2) Abordagem negociada, participada, colaborativa e mobilizadora, de carácter mais amplo e diversificado; com uma ênfase no processo de construção de consensos, envolvendo tentativas deliberadas para envolver os actores-chave na articulação e implementação de políticas, o reconhecimento do interesse legítimo de um vasto conjunto de stakeholders, cada um deles com a sua própria base de poder e orientação estratégica distintiva [LLOYD 2000], o reconhecimento da importância do diálogo para construir o consenso em vez de exacerbar conflitos, uma ênfase na coordenação entre diferentes actores, a capacidade de aproveitar e construir a capacidade institucional. Um planeamento que respeita o conhecimento e cultura locais e que seja baseado em posições fundamentadas [SANDERCOCK 1998];

(3) Abordagem holística, multissectorial e integrada; coordenada e articulada [HEALEY 1995; DOHERTY & HORNE 2002];

(4) Análises prospectivas e de reavaliação constante e interactiva [POISTER & STREIB 1997; ASCHER 1996] – enquadrando a cidade através da análise dos contextos interno e externo, adoptando um comportamento competitivo;

(5) Não é legalmente compulsivo, mas sim indicativo e informal ("projecto de cidade"); O planeamento é visto como um processo de tomada de decisões, por isso, o plano estratégico é indicativo e serve como um quadro de referência para negociações em interacções contínuas [FALUDI 2000], contendo as decisões que funcionam como um quadro de acção para os decisores operacionais.

(6) Menos exaustivo, com carácter selectivo [BRYSON 1999a], centrando-se na resolução dos problemas prioritários e valorizando as especificidades de cada território, que são definidos e discutidos conjuntamente por uma pluralidade de actores económicos e sociais. Como tal, baseia-se em procedimentos de negociação, visando encontrar compromissos entre interesses divergentes [ASCHER 1996].

(7) Busca um equilíbrio entre componentes racionais e exercícios conduzidos pela vontade e intuição.

Em suma, o planeamento estratégico urbano é um processo: (1) sistémico (interactivo e contínuo), orientado para o processo em vez de ser orientado para os resultados – o "planeamento enquanto processo" – por isso, exige a organização de um sistema eficiente de acompanhamento e monitorização; (2) flexível (adaptado a cada situação) e contingente, requerendo uma reacção rápida às dificuldades e oportunidades que forem surgindo dada a imprevisibilidade do ambiente (com carácter de prontidão).

Neste sentido o ‘planeamento’ converte-se em ‘programação’ [MÄNTYSALO 2000]. Num ambiente turbulento as fases de planeamento e implementação são integradas num único processo [RIDER 1999: 55]. Deste modo, relacionando o planeamento estratégico e a implementação de forma efectiva produz-se o que é frequentemente referido por gestão estratégica [BRYSON 1999a]. A gestão estratégica refere-se a um processo mais amplo e englobante numa base contínua, que inclui a implementação de estratégias e a avaliação do desempenho, bem como a monitorização de tendências e a identificação das questões emergentes que requerem respostas estratégicas num ambiente turbulento e em mudança rápida. Neste sentido, o planeamento e a gestão estratégica entendem-se como práticas indivisíveis de um mesmo processo de construção de políticas de alcance integrador, de carácter participativo e de enfoque estratégico, onde os planos sejam desenvolvidos e actualizados periodicamente. O planeamento assume, assim, uma orientação activa com vista ao desenvolvimento do território, onde a elaboração do plano é somente uma fase do ciclo estratégico que engloba também as actividades de implementação, de acompanhamento e de avaliação.

Para tal requer as seguintes condições: aprendizagem e descobertas reflexivas de todos os actores; liderança política apoiante; inovação de carácter organizacional, ultrapassando (ou complementando) os princípios burocráticos baseados na uniformidade, hierarquia e funcionalismo, descentralizando competências (geograficamente e funcionalmente), envolvendo, para tal, outras organizações locais e valorizando as questões imateriais; soluções de parceria entre actores públicos, privados e do terceiro sector.

Na prática, o processo de planeamento estratégico varia amplamente. Desde um processo perfeitamente estruturado envolvendo numerosas comissões apoiadas por um trabalho de apoio técnico substancial, desenvolvido faseadamente durante vários meses ou ultrapassando um ano (a abordagem mais defendida). Outras vezes, os planos estratégicos com sucesso são menos complexos, resultando de algumas reuniões levadas a cabo em poucas semanas. O alcance do processo também varia: desde planos estratégicos para toda a cidade ou eixos urbanos, que incluem, ou são acompanhados por planos estratégicos ao nível de departamento ou de programa sectorial. Noutros casos, estes planos podem ser desenvolvidos por alguns departamentos a partir da sua própria iniciativa sem qualquer plano estratégico unificador. Além disso, o processo de planeamento estratégico tanto pode ser amplamente participado, envolvendo actores de diferentes áreas, de diferentes níveis, internos ou externos, como ser formulado por uma equipa de topo restrita, solicitando ou não contributos externos. Normalmente uma menor participação justifica-se nos locais onde tenham sido desenvolvidos processos de planeamento estratégico anteriores com um cariz mais plural e englobante e esteja cimentada uma cultura que favoreça a comunicação.

Assim, a metodologia de planeamento estratégico deve (ser): ecléctica – adaptando de forma coerente as melhores características das várias metodologias; contingente – deve ser adaptada ao contexto ou situação específica de cada lugar [POISTER & STREIB 1997]; haver interacção entre o processo analítico (formulação de decisões) e o processo decisório (tomada de decisões); combinar soluções de natureza cooperativa com soluções regulamentares ou jurídicas.

Em suma, o planeamento estratégico pode entender-se como um processo sistémico, prospectivo, participado, negociado, contínuo e flexível, capaz de gerir oportunidades e mudanças, de contrariar estrangulamentos e fragilidades, com vista a tirar partido das potencialidades existentes, assumindo um papel mais interventivo e pró-activo perante a realidade. Sendo concebido como um instrumento de ajuda à tomada de decisões, é um processo de inovação e mudança que, ao introduzir novos participantes, permite desenvolver associações significativas entre o sector público e a iniciativa privada e promover a coordenação entre os vários níveis da administração pública, reconhecendo a importância do diálogo no desenvolvimento da compreensão mútua e no fortalecimento do tecido social, identificando problemas, desenvolvendo ideias estratégicas e propostas que valorizem a construção do consenso em vez de exacerbar os conflitos, combinando soluções de natureza cooperativa com soluções regulamentares ou jurídicas. Além disso, oferece uma visão global e inter-sectorial do sistema urbano a longo prazo, formula objectivos prioritários e concentra recursos limitados em áreas e temas críticos.

3. Estudo de caso: planeamento estratégico participativo em cidades de média dimensão

Após ter examinado um dos instrumentos de desenvolvimento adaptados a cidades de média dimensão – o planeamento estratégico urbano –, neste capítulo tentam-se compreender os processos de planeamento estratégico implementados em algumas cidades da Região Centro de Portugal, com o objectivo de responder à seguinte questão central: se ocorreu uma transformação das práticas e paradigmas de planeamento, designadamente se atendendo às oportunidades entretanto criadas, estas cidades aproveitaram a disponibilização de fundos provenientes da administração central, complementando investimentos públicos com iniciativas privadas e, deste modo, se se justifica a hipótese da transição de um modelo hierárquico e burocratizado de planeamento para outro modelo mais participado, flexível e estratégico de gerir e planear as cidades; ou se, pelo contrário, os antigos métodos continuam a prevalecer nas práticas de planeamento e desenvolvimento urbano.

Como tal, pretende-se confrontar as várias experiências de planeamento estratégico, analisando as condições de realização dos planos, atendendo aos produtos de planeamento (os planos) e aos processos de planeamento (nomeadamente as estruturas e formas de concertação e participação). Por último, tentam-se encontrar as causas de ordem organizativa, institucional e sócio-cultural que influenciaram o desempenho dos processos de planeamento estratégico.

Assim, seleccionaram-se quatro cidades da Região Centro de Portugal (Aveiro, Castelo Branco, Guarda, Viseu) e o eixo urbano de Leiria-Marinha Grande (região urbana polinucleada constituída por vários centros urbanos geograficamente próximos e entre os quais se estabelecem relações funcionais), com características distintivas, quer em termos de dinamismo económico e institucional, quer em termos de dimensão demográfica (Figura 1).

Figura 1

3.1. Enquadramento

3.1.1. Aspectos geográficos e institucionais do surgimento dos planos

Nas últimas décadas, o território continental português tem sofrido simultaneamente três tendências principais: (1) polarização centrada nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto; (2) litoralização crescente da distribuição demográfica e das actividades económicas – principalmente na faixa litoral a norte do rio Sado –; como consequência o interior do país vai ficando despovoado, devido à quebra da natalidade e aos movimentos migratórios de sinal negativo; (3) reforço da capacidade de atracção e fixação de população dos centros urbanos de média dimensão localizados no interior, nomeadamente das capitais de distrito.

Como consequência, de uma forma geral, o território português, caracteriza-se por acentuadas assimetrias regionais (litoral congestionado e interior despovoado) e uma bi-macrocefalia urbana (materializada no contraste entre as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e o restante território). Além disso, o povoamento no interior é mais polarizado e concentrado nas sedes de concelho e nas CMD, enquanto que no litoral é mais difuso.

Figura 2 - Importância relativa da população residente na Região Centro de 1864 a 2001 (em relação a Portugal Continental) (%). Fonte: CCRC (1994) e INE (2001).

Durante muitas décadas estas CMD funcionaram quase exclusivamente como sedes administrativas regionais (sedes de distrito), no entanto, recentemente têm aumentado a sua dimensão física e demográfica devido à polarização da sua área de influência, atendendo a mudanças estruturais ao nível das economias regionais (declínio da agricultura, terciarização e incipiente industrialização).

As mutações foram mais drásticas e mais aceleradas nas cidades localizadas no litoral atlântico (nomeadamente Aveiro e Leiria), uma vez que estão situadas naquela faixa de povoamento denso atrás referida e melhor colocadas em relação aos eixos de desenvolvimento (na área intermédia entre as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto), por isso, apresentam um maior dinamismo económico e demográfico. No entanto, também revelam alguns problemas, directa ou indirectamente relacionados com aquelas mutações, pois, como o crescimento foi mais acelerado, desordenado e difuso, revelam problemas de ordenamento do território e do ambiente (devido à ausência ou ineficácia dos instrumentos de planeamento). Por isso, as questões mais prementes que se lhe apresentam são a regulação da sua expansão desordenada, de forma coerente, dar-lhe um sentido para evitar estrangulamentos e combater a ideologia enraizada do "laissez faire", coordenando as intervenções.

Por outro lado, as cidades localizadas no interior (e.g., Guarda e Castelo Branco), embora tenham sofrido um dinamismo positivo, nomeadamente devido ao êxodo da população rural jovem das áreas envolventes, estão localizadas em áreas periféricas (em relação ao território português), com debilidades económicas e demográficas. Por isso, aquele fraco dinamismo poderá mais não ser do que uma fase transitória, podendo periclitar a prazo. Assim, o maior desafio para estas cidades é, pró-activamente, fortalecer a sua base económica local e dinamizar as áreas rurais da sua influência imediata.

Todavia, embora haja alguma diversidade de situações, como atrás se salientou, atendendo às diferenças em termos de estrutura económica, demográfica e institucional, estas cidades apresentam as seguintes tendências (a nível micro-urbano): crescimento rápido e desordenado das periferias (periurbanização), com a localização das principais actividades económicas nos principais eixos viários suburbanos, com o consequente despovoamento, abandono e ruína das áreas centrais e urbanização indisciplinada e com tendências dispersivas; debilidades institucionais, directamente relacionadas com a sua debilidade demográfica; debilidade da administração pública local – faltando-lhe recursos financeiros e competências formais; debilidade da sua estrutura económica, nomeadamente devido ao predomínio de micro empresas e de uma industrialização dependente, dado que o controlo do investimento é feito no exterior; ameaças relacionadas com o aumento do desemprego e problemas sociais inerentes; deficiências e insuficiências nas infra-estruturas, nos equipamentos e nos espaços públicos urbanos; deficiente fiscalidade urbanística, favorecendo a tendência para a especulação imobiliária; falta de articulação dos planos urbanos entre municípios vizinhos. Tais tendências tanto podem constituir handicaps ao seu desenvolvimento como considerações a ter em conta na concepção das intervenções.

3.1.2. O PROSIURB como instrumento despoletador da introdução do planeamento estratégico em cidades de média dimensão

Como foi explicitado anteriormente, no início da década de 1990 assistia-se com preocupação ao agravamento das assimetrias territoriais (nomeadamente às ameaças do despovoamento e envelhecimento da população das regiões do interior) e ao fenómeno da macrocefalia urbana e reforço da litoralização. Por isso, era urgente implementar uma política que visasse um desenvolvimento mais integrado do território e um sistema urbano mais equilibrado, por forma a travar a tendência de despovoamento do espaço rural e aliviar a pressão e o congestionamento das grandes cidades, reduzindo as assimetrias. Como tal, visava-se um processo de modernização ancorado em centros dinâmicos, activos, multidimensionais e multifuncionais, que optimizassem os recursos dispersos no território, polarizando o desenvolvimento.

Por isso, em complemento a outros programas de financiamento existentes, o Ministério do Planeamento e Administração do Território (MPAT), em 1994, instituiu o Programa de Consolidação do Sistema Urbano Nacional e Apoio à Execução dos Planos Directores Municipais (PROSIURB), vigorando até final de 2001 [G. C. PROSIURB, 2000a], tinha como objectivo principal a promoção do desenvolvimento dos centros urbanos localizados fora das duas áreas metropolitanas (e das Regiões Autónomas). Constituído por dois subprogramas, o seu subprograma 1 tinha como objectivo reforçar o papel das cidades de média dimensão no sistema urbano português, garantindo um modelo de desenvolvimento territorialmente equilibrado e polinucleado, onde as cidades de média dimensão funcionassem como "âncoras" de desenvolvimento das áreas do território menos dotadas, atenuando, desta forma, as citadas assimetrias. Para tal, visava incentivar o crescimento e o desenvolvimento das cidades do interior através de um esforço de equipamento e de infra-estruturação urbana, bem como a criação de novas fórmulas de criação de emprego e de revitalização económica e social, capazes de reter e atrair população, com vista a aumentar a atractividade desses centros urbanos e permitir um desenvolvimento mais integrado do território; e conter a ocupação desordenada das cidades do litoral, elevando-lhe os padrões de ambiente urbano (G.C. PROSIURB, 1995).

Deste modo, foram seleccionadas 43 cidades elegíveis pelo disposto no Despacho MPAT 55/94 e estabelecidas algumas exigências de candidatura aos fundos financeiros do seu subprograma 1 ("Valorização de cidades de média dimensão"):

(1) Como algumas cidades tomadas isoladamente não possuíam os limiares mínimos ou as massas críticas suficientes era proposto que se auto-organizassem e constituíssem sistemas ou eixos urbanos (aplicável àquelas geograficamente próximas), para poderem concorrer num espaço globalizado e permitir uma maior coordenação territorial.

(2) Com vista a criar mecanismos de concertação das acções, bem como processos de colaboração, negociação e contratualização entre diferentes instituições foi exigida a constituição de um organismo de natureza consultiva tendo funções de acompanhamento da elaboração, aprovação e monitorização do processo de planeamento (Gabinete de Cidade).

(3) Com vista a promover complementaridades e sinergias entre as diversas instituições e agentes e melhorar a eficácia das medidas na organização do território e promover a cooperação entre os vários níveis institucionais, foi exigida a celebração de um contrato de cidade (entre departamentos do MPAT, autoridades locais, outras instituições sem fins lucrativos e outros ministérios).

(4) Além disso, como os instrumentos formais de planeamento (Planos Municipais de Ordenamento do Território: Plano Director Municipal, Plano de Pormenor, Plano de Urbanização) – constituintes do sistema de planeamento – eram demasiado rígidos, centralizados e reguladores, restringidos ao zonamento da ocupação e uso do solo sem uma componente de desenvolvimento económico e social de cariz estratégico, o financiamento das intervenções estava dependente da concepção de documentos de estratégia (os planos estratégicos) mais flexíveis e adaptáveis com carácter operativo que complementassem os planos directores existentes, com vista a operacionalizar a sua execução e permitir uma racionalização das propostas e a sua integração num projecto de cidade.

Deste modo, o planeamento estratégico vem desafiar a cultura de gestão do governo local existente, exigindo-se o desenvolvimento do território de uma forma pró-activa e integrada, bem como a justificação de uma melhor aplicação dos fundos de financiamento oriundos do Estado central e da União Europeia.

Assim, este programa ao exigir o cumprimento daquelas condições, por forma a beneficiarem dos fundos, constituiu um instrumento inovador, pois propendia para: (1) a introdução da metodologia da negociação e contratualização público-privado; (2) a definição de uma política urbana coerente a médio e longo prazos; (3) a colaboração institucional intermunicipal e interurbana; (4) a divulgação de metodologias do planeamento estratégico urbano, dotando o planeamento de um carácter mais pragmático e operativo.

3.2. O processo de planeamento estratégico em cidades de média dimensão

3.2.1. A formulação dos planos estratégicos

Embora este tipo de plano fosse bastante inovador no sistema de planeamento português, a legislação mais relevante, nomeadamente os Despachos MPAT 6/94, 7/94 e 55/94, eram lacónicos no respeitante à metodologia a ser adoptada na sua formulação, definindo somente as suas directrizes gerais. Deixando deste modo, campo aberto para haver alguma flexibilidade e adaptabilidade a cada caso.

A legislação determinava que a sua preparação era da responsabilidade dos municípios (ou associações de municípios) e que devia definir "um quadro coerente de intervenções que [viabilizassem] uma estratégia de desenvolvimento de médio e longo prazos" [Despacho 7/94]. Ou seja, cada plano deveria incidir no papel que cada cidade poderia vir a desempenhar no desenvolvimento regional. Para tal, deveria identificar "vulnerabilidades e estrangulamentos e as potencialidades e possibilidades de desenvolvimento do centro urbano" e propor as opções estratégicas, identificando, de forma articulada através de um processo participativo, os projectos e acções.

Deste modo, foram documentos da iniciativa dos municípios. Estes definiram a metodologia a aplicar atendendo às directrizes gerais emanadas do MPAT. Como tal, foi a obrigação imposta pelo PROSIURB que despoletou a realização de planos estratégicos nas cidades de média dimensão. No entanto, enquanto que algumas autarquias encararam o plano estratégico como um requisito para obterem fundos, outras encaram-no de forma a consolidarem uma estratégia de desenvolvimento, com vista a enquadrarem as suas actividades operacionais e auxiliar na negociação de programas e financiamentos junto das entidades públicas e privadas. Para estas, mais do que a resposta a um imperativo legal, a autarquia estava interessada em aproveitar a oportunidade de relançar a cidade ao despertar iniciativas adormecidas.

 

Como as equipas técnicas envolvidas na realização dos planos foi em número restrito, e como tiveram que aplicar os princípios metodológicos gerais emanados da legislação, não houve uma grande diversidade de métodos e estruturas organizativas. Pequenas diferenças se encontram, somente no respeitante à intensidade e na calendarização da participação dos agentes locais, dando lugar à elaboração de documentos prévios como: Diagnóstico, Matriz preliminar, Projecto de plano, Plano estratégico (e.g., Aveiro, Guarda e Castelo Branco). No entanto, mesmo havendo ligeiras diferenças na metodologia de elaboração dos planos estratégicos, que dificulta uma análise comum, procedeu-se à elaboração de uma estrutura que, com pequenas variações, as enquadre e permita a sua análise. Por isso, grosso-modo, o processo de planeamento estratégico decorreu durante um período de 10 a 12 meses, segundo as etapas que a seguir se discriminam.

Partes: 1, 2, 3


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