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Iniciativas locais de desenvolvimento: o caso dos municípios de São Paulo e do ABCD (página 3)
Partes: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8


Fonte: Vázquez Barquero (1993) apud Cabugueira (2000: 126)

Uma das prioridades da estratégia actual de Desenvolvimento Regional e Local é, portanto, o desenvolvimento de territórios com capacidade competitiva num ambiente em que a incerteza e a turbulência são grandes. Desta forma, é necessário fomentar a inovação, a capacidade empreendedora, a qualidade do capital humano e a flexibilidade do sistema produtivo. No capítulo IV da presente dissertação apresentaremos um conjunto de iniciativas locais, que julgamos enquadrarem-se nesta perspectiva e que contribuem para o Desenvolvimento da área em análise.

Quadro 2 – Mudanças na Política de Desenvolvimento Regional e Local

Política tradicional

Políticas novas

Estratégia dominante

Desenvolvimento polarizado

Visão funcional

Desenvolvimento difuso

Visão territorial

Objectivos

Crescimento quantitativo

Grandes projectos

Inovação, qualidade, flexibilidade

Espírito empreendedor

Projectos numerosos

Mecanismos

Redistribuição

Mobilidade de capital e do trabalho

Mobilização do potencial endógeno

Utilização dos recursos locais e externos

Organização

Gestão Centralizada

Financiamento a empresas

Administração publica dos recursos

Gestão local do desenvolvimento

Prestação de serviços

Organizações intermédias

Fonte: Vásquez Barquero (1993) apud Cabugueira (2000: 118)

A questão central passou a ser a do "Desenvolvimento Endógeno", que pressupõe o controle territorial das economias regionais visando o aumento da eficiência de todos os factores produtivos, com a sua estratégia a basear-se na utilização de PME"s, que devem surgir por iniciativa de agentes locais, de modo a possibilitar a retenção do valor acrescentado. Na opinião de Vázquez Barquero «el desarrollo endógeno se puede conceptualizar como un proceso, cuyo nacimiento, desarrollo y maduración se apoya en una combinación de causas que van desde el estado de necesidad hasta la disponibilidad de recursos naturales y locacionales, con fuerte demanda en el mercado. Todos estos procesos contienen, al menos, dos dimensiones: una económica (...); otras, sociocultural (...)» (Vázquez Barquero, 2002: 103)

Conforme Santos (2002b), a teoria do desenvolvimento de base territorial e endógena procurou responder ao paradigma funcional até então dominante, cujos pressupostos eram:

  • 1 a subalternização dos aspectos estruturais do desenvolvimento, como os políticos, sociais e ambientais;

  • 2 uma visão economicista do desenvolvimento, assentada em processos de acumulação concentrada de capital;

  • 3 a prioridade à mobilidade espacial de capitais;

  • 4 a preferência por investimentos em infra-estruturas pesadas, sem atender aos aspectos qualitativos dos mercados locais de emprego;

  • 5 uma grande aposta nos sistemas de grande escala e altamente consumidores de energia;

  • 6 o recurso a estratégias exógenas às economias locais para definição dos recursos a explorar;

  • 7 a imposição de mecanismos de decisão centralizados.

De facto, o novo paradigma conceptual do Desenvolvimento Regional, de base territorialista e endógena, pressupõe que o desenvolvimento só será alcançado pela mobilização integral dos recursos dos diferentes territórios para a satisfação prioritária das necessidades das respectivas populações. O seu argumento central é que o poder económico funcional, sem um controle de um ente territorial, tende a acentuar as disparidades sociais e económicas características do desenvolvimento polarizado.

Quadro 3 – Principais Características do Desenvolvimento Endógeno

Características

Implicações

Primazia do particular e do específico

Reconhecimento de que cada região, cada colectividade, tem potencialidades e problemas próprios.

Definição do desenvolvimento como processo múltiplo vindo "de baixo", e não como resultado de políticas centralizadas e uniformes.

Perspectiva do desenvolvimento como um processo que se baseia na acção dos actores locais e na valorização dos recursos das colectividades.

Predominância da acção e da auto-organização dos actores locais

Valorização dos actores locais mais do que dos instrumentos e das políticas.

Reforço das estratégias de informação, de formação e de comunicação.

Importância da coordenação entre as iniciativas e projectos dos actores locais, numa perspectiva de interacção e sinergia.

Promoção de estratégias de auto-organização dos actores em torno de iniciativas, empreendimentos e projectos comuns ou convergentes.

Tónica na valorização dos recursos qualitativos locais

Estímulo prioritário à qualificação profissional, à investigação (ligação às Universidades locais/regionais) e à inovação.

Valorização da empresa e do espírito de empreendimento, de risco, de experimentação, de avaliação e de acompanhamento das acções e iniciativas.

Ênfase nas relações interactivas (redes, comunicações, informação).

Perspectiva do desenvolvimento como um processo participado e negociado

Transferência de poder do nível central para os níveis local e regional.

Aumento da capacidade de iniciativa, de organização e de representação da colectividade face aos poderes públicos.

Criação de hábitos e práticas de partenariado, ou seja, de cooperação contratual entre os parceiros locais em torno de projectos comuns.

Fonte: Nóvoa et al. (1992) apud Cabugueira (2000: 119)

O "Desenvolvimento Endógeno" corresponde à endogeneização do progresso técnico, entendido como o aumento da eficiência na utilização dos factores convencionais de produção, assentando a sua base conceptual na consideração do aumento do stock de conhecimentos como sendo o verdadeiro motor do crescimento, prioritariamente à acumulação de capital físico ou humano. «Na problemática da competição global, a capacidade de inovação e a capacidade de gerar conhecimentos e competências susceptíveis de fazer evoluir o sistema territorial de produção são essenciais. Trata-se, portanto, de dar atenção ao processo de inovação e não simplesmente à organização dos recursos produtivos» (Maillat, 2002: 14)

O conhecimento é um bem público: portanto, apresenta as características de não rivalidade – o seu consumo por um agente não afecta a quantidade disponível para os outros agentes, e - da não exclusão – nenhum agente pode excluir os demais de consumi-lo ao mesmo tempo. De facto, «la información en general, y el conocimiento en particular, son bienes de carácter intangible y público» (Muñiz Olivera, 2002: 115).

A característica da não rivalidade associada ao conhecimento, torna-o uma potencial fonte de rendimentos crescentes à escala: «Imagine-se que um dado produtor afecta uma dada quantidade de recursos à produção de conhecimento novo, tendo em vista a produção de um dado bem. Para produzir uma dada quantidade deste último, ele necessitará, para além dos recursos gastos a produzir o conhecimento novo, de dadas quantidades de outros inputs (trabalho, capital, etc.). Se agora considera-se que, num momento subsequente, N produtores terão acesso gratuito ao conhecimento criado pelo produtor pioneiro, então a produção poderá ser multiplicada por N apenas multiplicando por esse mesmo factor N as quantidades utilizadas de capital, trabalho, etc., mas sem necessidade de se afectar recursos adicionais a criar novos conhecimentos. Este resultado decorre potencialmente do carácter não rival do conhecimento mas exige ainda que ele, conhecimento, apresente tendencialmente a característica da não exclusão, a fim de poder ser utilizado por outros produtores que não o pioneiro» (Silva e Silva, 2002: 178).

Nos modelos de "Desenvolvimento Endógeno", o conhecimento é visto como objecto de uma difusão instantânea por todos os agentes de um sistema económico, desde quando não existam barreiras jurídicas, a exemplo da propriedade intelectual e de patentes. Apesar de reconhecer-se o conhecimento como o motor do aumento da eficiência e do crescimento económico, a sua difusão, no entanto, ainda não é um processo automático e democrático. Dessa forma, as condições existentes que possibilitam uma efectiva apropriação de conhecimento novo por um número cada vez maior de agentes económicos passam a ser uma parte relevante da explicação do diferenciado - e desigual - nível de crescimento económico de países e regiões.

A partir da década de 80, intimamente relacionado com a teoria do crescimento endógeno, desenvolveu-se a teoria do capital social.

Segundo Kliksberg (1999), o Banco Mundial considera a existência de quatro formas básicas de capital:

  • 1 o capital natural, constituído pela dotação de recursos naturais de um país ou região;

  • 2 o capital construído, aquele gerado pelo ser humano, incluindo as infra-estruturas, os bens de capital, os capitais financeiro e comercial, etc.;

  • 3 o capital humano, determinado pelos níveis de nutrição, saúde e educação da população; e

  • 4 o capital social, recentemente "descoberto", que pode vir a constituir-se em valiosa ferramenta de análise do crescimento e do desenvolvimento de base local ou regional.

«Alguns estudiosos atribuem às duas últimas formas de capital [humano e social] uma participação maioritária no desenvolvimento económico das nações verificado em fins do século XX, indicando que nelas existem chaves decisivas para o progresso tecnológico, a competitividade, o crescimento sustentado, o bom governo e a estabilidade democrática» (Kliksberg, 1999: 87).

Não existe ainda, segundo Kliksberg, uma definição consensual sobre o conceito recente de capital social. Apesar das actuais imprecisões, os estudiosos das teorias do desenvolvimento consideram que, ao investigar-se o capital social, incorpora-se ao espectro de conhecimentos dessas teorias, um número de importantes variáveis que até o momento não tinham sido objecto de enquadramento no âmbito convencional das referidas teorias, «el capital social es impescindible para el mantenimiento y mejora de los bienes públicos, pêro su propia naturaleza implica que solo pueda ser suministrado mediante mecanismos de cooperación y confianza. (.) Una característica central del Capital Social es que está arraigado a la historia de cada localidad. No se construye en un solo dia, sino que requiere el paso del tiempo, el cumplimiento continuado del código adoptado» (Muñiz Olivera, 2002: 124)

Uma das características específicas do capital social, entendido como confiança, normas e cadeias de relações sociais, é que ele geralmente surge como um bem público – tal como o conhecimento na teoria do crescimento endógeno –, ao contrário do capital "convencional" que é tipicamente de carácter privado.

Deste modo, o objectivo das Políticas de Desenvolvimento Regional passou a ser o da mobilização colectiva da comunidade local, dando vida aos processos de difusão do conhecimento e inovação. Assim, «a política regional não se vai interessar mais pelas empresas enquanto tais, mas pelo sistema territorial de produção e pelos mecanismos endógenos susceptíveis de criar sinergia e pelas inter-relações entre os actores com vista a estimular as suas capacidades de inovação e de adaptação.» (Maillat, 1995: 21).

De facto o aspecto diferencial do paradigma de "Desenvolvimento Endógeno" está no fato de que a definição do referido modelo de desenvolvimento passa a ser estruturada a partir dos próprios actores locais, «e não mais pelo planejamento centralizado; essa estruturação é realizada por meio de um processo já definido por Boisier (1988) como organização social regional, e que tem como característica marcante a ampliação da base de decisões autônomas por parte dos atores locais.» (Amaral Filho, 1996: 37-38).

Neste sentido, a participação democrática dos actores locais nessa nova concepção de desenvolvimento resulta da "Governância" da actividade produtiva e, cabe à gestão pública, a construção das infra-estruturas organizacionais e físicas para a cooperação nesse processo, ou seja, nas relações de poder que ocorrem ao longo das cadeias de produção e distribuição de mercadorias. (Lopes e Silva, s.d: 7-8).

Os defensores dos "clusters" ou "Distritos Industriais" defendem que as regiões só são competitivas no mercado global se apostarem não na produção em massa, mas no "capitalismo molecular". Para Becattini (1994), uma política de crescimento económica só será bem sucedida se as relações técnico-económicas não ignorarem as relações socio-culturais e institucionais. Os "Distritos Industriais" são de formação lenta e complexa, cuja especificidade deve ser reconhecida, conservada e fortalecida.

Michael Porter, professor na Universidade de Harvard e "guru" da gestão de renome mundial, trouxe um novo dinamismo às questões da competitividade territorial, lembrando que a concentração geográfica reforça a vantagem competitiva.

Porter (1993) desenvolveu o modelo do "diamante" (Figura 3) para definir as quatro "pontas" que é preciso analisar para definir e avaliar a competitividade de uma região:

  • As condições dos factores ou dotação da região em recursos físicos (clima, minérios, solo arável), humanos, de infra-estruturas, de capital, de conhecimento.

  • As condições da procura, baseadas preferencialmente na existência de um mercado local de consumidores sofisticados, que incentivam as empresas a manterem um elevado nível de inovação e a lançar no mercado produtos de alta qualidade.

  • Os sectores conexos e de apoio, isto é, a existência de empresas correlacionadas, capazes de criar redes de empresas que trabalham em conjunto.

  • A estratégia, estrutura e rivalidade entre as empresas, isto é, um tecido empresarial denso, constituído por empresas em permanente concorrência mas que, quando necessário (contratos de grande dimensão, campanhas publicitárias junto de mercados externos) conseguem cooperar.

Porter considera que existe uma quinta e uma sexta ponta do diamante, referentes respectivamente às políticas públicas e à história do território. Porter também defende o papel do "acaso", ou da história na formação da competitividade dos territórios.

As vantagens competitivas, conforme enunciadas por Porter, são vantagens construídas, do ponto de vista social e económico, e não as vantagens comparativas, "naturais", definidas por David Ricardo. Nestes tempos inexoráveis da globalização, os recursos fundamentais para a competitividade baseiam-se em «historically accumulated social and political structures» (Scott, 1998: 35) e em elementos de natureza imaterial como as "economias de vizinhança" ou "proximidade", o know-how, a informação, a cultura regional e as relações que se estabelecem entre os actores económicos e sociais que operam no território.

Na perspectiva de Jair do Amaral Filho, «como diz Porter (1991), ao contrário dos fatores tradicionais, geradores de vantagens (comparativas) estáticas, os novos fatores são responsáveis pelas vantagens (competitivas) dinâmicas; isto é, fatores que permitem a geração de diferenciações realmente competitivas e, principalmente, permitem à região ou à economia local o desenvolvimento endógeno de inovações pioneiras e rápidas, o que permite, segundo Schumpeter (1982), a apropriação dos bons resultados do ineditismo inerentes à autoria de uma inovação.» (Amaral Filho, 1996: 62)

Segundo Porter (1999: 21), na era da globalização, as vantagens competitivas são dinâmicas: devemos partir «da premissa de que a competição é dinâmica e evolui».

Figura 3 – "Diamante" da Competitividade de Porter

Monografias.com

Fonte: Porter (1993).

Frequentemente, os factores de localização de um determinado sector ou de uma determinada empresa estão relacionados com alguma situação ou acidente histórico. Desta forma, a explicação para a especialização regional pode não residir necessariamente na dotação actual em factores produtivos (capital, trabalho, recursos humanos, etc.), mas sim em situações ou acontecimentos passados e até, tantas vezes, de ordem exclusivamente pessoal.

Paul Krugman (1991: 35 apud Salvador, 1999: 141-142) apresenta o seguinte exemplo: «Em 1895, uma adolescente de nome Catherine Evans vivendo na pequena cidade de Dalton, na Geórgia, fez uma coberta como prenda para um casamento. Tratava-se de uma coberta original para a época, pois era acolchoada; a arte dos acolchoados tinha-se vulgarizado nos séculos XVIII e inícios do século XIX, mas tinha caído em desuso à época. Consequência directa dessa prenda de casamento, Dalton emergiu, depois da 2ª. Guerra Mundial, como o principal centro de alcatifas dos EUA. Seis das vinte maiores empresas de alcatifas do país localizamse em Dalton; as restantes, localizam-se nos arredores; e o sector das alcatifas, em Dalton e vizinhança, emprega mais de 19.000 trabalhadores».

Como é óbvio, o factor inicial que presidiu à instalação de uma determinada indústria pode desaparecer, o que interessa é a natureza do processo cumulativo que permitiu que tais "episódios históricos" tivessem efeitos tão duradouros. E, na linha iniciada por Marshall, para quem a abundância de mãodeobra e a oferta de "inputs" são os factores fundamentais para a especialização produtiva, a maioria dos autores considera que os recursos produtivos, a tecnologia e as externalidades são determinantes.

2.2.4. Paradigma Inter-Territorialista

No final da década de 80 acentuam-se as tendências de globalização da economia mundial. Perante este novo enquadramento, as regiões valorizam-se, não apenas pelos seus recursos, pelas suas capacidades produtivas, mas principalmente pelas suas capacidades de inovação e de inserção no mercado global. O paradigma inter-territorialista «(...) não levantando obstáculo à crescente internacionalização da economia, elege como instrumento estratégico a inovação, nessa primeira fase ainda com uma vertente marcadamente tecnológica. Neste novo quadro competitivo argumenta-se que as regiões que estarão melhor colocadas na batalha pela sobrevivência, numa época em que as mudanças estruturais se processam a ritmos vertiginosos e são cada vez mais imprevisíveis, serão as que puderem compensar a retracção dos mercados tradicionais pela conquista de novos mercados devido quer à introdução de modificações tecnológicas nos respectivos processos produtivos, quer à fabricação de novas gamas de produtos» (Santos, 2002b: 223).

Nos anos 90, a relevância da temática do Desenvolvimento Local e das políticas descentralizadas cresceu em função da estratégia europeia de reforço dos programas de descentralização para as regiões, do aumento da competição entre elas e das próprias dificuldades dos sistemas económicos locais.

Deste modo considera-se que os principais factores que concorreram para a mudança são:

«- o aprofundamento do processo de globalização capitalista e a incorporação da produção flexível, provenientes das grandes empresas multinacionais, que impuseram novos desafios ao modelo de desenvolvimento endógeno dos distritos industriais;

- a política regional europeia, que procurou estimular o desenvolvimento local não mais como resgate de situações históricas bem-sucedidas, mas como o resultado da adoção de novas orientações de políticas públicas e de arranjos institucionais e de interação estratégica entre o público e o privado;

- o surgimento de problemas de saturação no interior dos distritos industriais ligados a questões ambientais, ao aumento do individualismo em detrimento de estratégias coletivas, à necessidade de desenhar estratégias inovadoras ante os impactos da globalização e das grandes empresas multinacionais no território.» (Tapia, 2005: 132)

Com a globalização «o que importa não é apenas o bom funcionamento interno do sistema territorial de produção, mas as suas relações com o exterior, a sua capacidade de perceber as transformações do seu ambiente tecnológico e de mercado, mas também e sobretudo a evolução dos outros sistemas territoriais de produção.» (Maillat, 1995: 25). Neste sentido, a articulação entre dois níveis espaciais da economia: - o global e o local –, levou à criação do neologismo "glocalização", por parte do geógrafo francês Georges Benko (1999), para designar esta articulação dos territórios locais à escala mundial. Segundo as palavras do autor, «a "glocalização", neologismo forjado para designar a articulação expandida dos territórios locais em relação à economia mundial, sublinha a persistência de uma inscrição espacial dos fenómenos económicos, sociais e culturais. Contrariamente aos mais sombrios prognósticos, os territórios – com as suas especificidades – não foram apagados sob os fluxos económicos da mundialização» (Benko, 2001: 9)

Com o desenvolvimento dos processos de globalização económica e financeira e a consequente necessidade de reequacionar as teorias de Desenvolvimento Regional surge um novo paradigma, com uma concepção mais abrangente do território, o Paradigma Inter-Territorialista. De facto, os paradigmas anteriores eram mais "limitados" porque analisavam o território de uma forma menos abrangente:

  • 1 como um espaço físico de suporte às actividades empresariais, no caso da perspectiva funcionalista;

  • 2 como um território possuidor de recursos materiais e imateriais, capaz de por si só gerar uma dinâmica de desenvolvimento, no caso da perspectiva territorialista.

No quadro das mais recentes teorias de Desenvolvimento Regional, a "riqueza das regiões" é em grande parte medida pelos recursos do seu território. Referimo-nos não apenas aos recursos naturais, mas também a sua população, empresas e instituições, ou, numa acepção mais lata, ao capital social. É pois neste sistema complexo de recursos e das suas inter-relações que se forma a diferenciação territorial.

Desta forma o necessário combate às disparidades territoriais já não pode assentar numa lógica ultrapassada de busca do equilíbrio ou uniformidade entre regiões, mas sim numa lógica de equidade e coesão social e territorial. A diferenciação territorial passa pela exploração das oportunidades que a complementaridade entre territórios oferece.

Os territórios devem passar a ser vistos de uma forma integrada e não parcelar. Um dos aspectos essenciais a esta nova visão do território é a da articulação em rede de cada território e dos conjuntos de territórios numa perspectiva global, ou numa "sociedade em rede" conforme enunciado por Castells (2003). Desta forma, uma das soluções para o fomento do Desenvolvimento radica na exploração das especificidades internas de cada território e, numa escala superior, na integração numa perspectiva inter-territorial, explorando essas mesmas especificidades.

Desta forma, um dos elementos-chave da perspectiva inter-territorialista é o conceito de "rede". Conceito este aplicável a vários níveis e várias escalas: actualmente, falar de Desenvolvimento implica, necessariamente, falar de rede urbana, rede de conhecimentos, rede empresarial, rede de comunicações, rede de infra-estruturas e rede de territórios.

Alguns autores defendem que existe uma pluralidade de organizações territoriais adaptadas à globalização e que o "Distrito Industrial" "tradicional" não permite por si só ultrapassar a crise do sistema de produção fordista. Isto porque o sucesso do "Distrito Industrial" se baseou na flexibilidade das PME"s mas, cada vez mais, as grandes empresas transnacionais conseguiram também elas tornar-se flexíveis, graças à subcontratação, transformando-se em empresas organizadas em rede à semelhança das pequenas empresas.

O aspecto que permite a diferenciação entre o "Distrito Industrial marshalliano" e os novos modelos de organização territorial é o facto de que, nestes últimos, as economias externas não só são dinâmicas como são provocadas conscientemente por uma acção conjunta ou de parceria da comunidade local. Por outras palavras, os novos modelos de organização territorial reivindicam a representatividade do novo paradigma de Desenvolvimento Endógeno.

Além do funcionamento em rede, a capacidade de inovação regional é fundamental. De facto, se até à década de 80 as questões ligadas à tecnologia e à inovação ocuparam um papel significativo na explicação das diferenças de crescimento entre as diferentes regiões, nesta década a inovação, ao nível dos produtos e dos processos produtivos, constitui-se como um factor determinante para o êxito dos territórios.

Desta forma, o carácter cumulativo dos processos de inovação justifica-se pelas economias externas e pelos efeitos expansivos da mão-de-obra qualificada e dos conhecimentos dentro de uma determinada área que possibilitam uma dinâmica inovadora mais acentuada. Assim, e conforme Julião (2001), seria possível classificar as regiões em função da sua capacidade inovadora:

  • 1 «Regiões inovadoras. São as regiões centrais, onde o fácil acesso à informação, à mão-de-obra qualificada, aos conhecimentos tecnológicos e científicos e a uma procura potencial elevada, permitem um dinâmica inovadora.

  • 2 Regiões adaptativas. São áreas onde se verifica uma adaptação das tecnologias em função das características próprias da estrutura industrial local. A fusão dos melhores elementos tecnológicos com as práticas industriais locais garante um processo de desenvolvimento sustentado.

  • 3 Regiões dependentes. Estas regiões têm acesso à inovação através das sucursais de empresas exteriores que se instalam no território. Não se verifica uma integração da tecnologia com os processos produtivos tradicionais, pelo que a dependência nas decisões, na técnica e nas práticas produtivas, pode ser insustentável a prazo.» (2001: 56)

Uma das teorias mais interessantes acerca do papel da inovação no Desenvolvimento Regional é a teoria do "Meio Inovador" ou "Milieux Innovateurs", desenvolvida pelo grupo de trabalho "Groupe de Recherches sur les Milieux lnnovateurs" (GREMI), fundado por Aydalot em 1986. A linha de pesquisa deste grupo orientou-se na procura da aptidão diferenciada dos meios para fazer nascer e difundir a inovação. Neste sentido emergem as noções de "Regiões Inteligentes" e de "Sistemas Regionais de Inovação".

Aparecem nesse cenário, como instrumentos de desenvolvimento regional, os tecnopólos, os parques de ciência e tecnologia, os centros de excelência, entre outros. Os objectivos principais referem-se ao fomento da inovação tecnológica através do reforço dos mecanismos de difusão da informação e à promoção da dinamização das áreas periféricas. Ricardo Méndez salvaguarda que «no obstante, antes de abordar su estudio debe señalarse la existência de una cierta confusión terminológica en la que conceptos como medio innovador, tecnópolis, tecnopolo, parque tecnológico, etc., se utilizan con significados no siempre coincidentes, lo que dificulta también el establecimiento de una tipología de espacios innovadores a partir de criterios precisos» (2004: 169).

É importante salientar que as políticas regionais não deverão voltar-se única e exclusivamente para o surgimento e dinamização de novas tecnologias mas, também, direccionarem-se para uma actuação sobre as indústrias tradicionais no sentido de apoiar os seus processos de reestruturação operacional que visem dotá-las de modernos factores de competitividade.

A teoria do "Meio Inovador", à semelhança da teoria do Desenvolvimento Endógeno, parte da ideia de que o Desenvolvimento tem uma origem local. Ocorre em regiões específicas, em virtude de um complexo sistema de factores e relações que se manifestam no seu interior. Esta teoria destaca-se pela atenção que dá aos processos de inovação, para além dos outros factores de eficiência das economias locais, enquanto veículo fundamental para catalisar o processo de desenvolvimento.

Podemos definir "Meio Inovador" como «um conjunto territorializado dotado de uma forte densidade de fluxos de transacções multilaterais (redes de contactos mais ou menos institucionalizadas), de uma diversificação de competências e experiências profissionais e de uma rede de instituições de forte componente informacional, criativa e de inovação» (Becattini, 1992 apud Domingues, 1996: 40).

O conceito de "Meio Inovador", segundo Maillat et al. (1993) apud Santos (2002c), refere-se a um capital relacional que agrupa coerentemente um sistema de produção, uma cultura técnica e um conjunto de actores que não constitui um universo fechado mas, pelo contrário, está em interacção permanente com o seu ambiente circundante, dando lugar a processos de aprendizagem colectiva. O "meio" é um «conjunto sócio-territorial reticularmente integrado de recursos materiais e imateriais, dominado por uma cultura historicamente sedimentada, vector de saber e de saber-fazer, que repousa sobre um sistema relacional do tipo cooperação-concorrência dos actores locais» (LeCoq, 1991 apud Santos, 2002c: 294).

O "meio" pode ser considerado como um activo intangível para a empresa, de acordo com Maillat «já que os territórios lhes fornecem o apoio logístico essencial para o seu desenvolvimento (externalidades, efeitos de proximidade, etc.), as empresas têm todo o interesse em participar no jogo da integração e do enriquecimento do seu "meio"» (Maillat, 1992, apud Polèse, 1998: 233).

Conforme Maillat et al. (1993) apud Santos (2002c), os elementos constitutivos do "meio" são:

  • 1 uma envolvente espacial, enquadrada por uma certa homogeneidade de comportamento dos actores sociais e uma mesma cultura técnica, não se confundindo, porém, com o conceito de região, nem possuindo fronteiras físicas pré-determinadas;

  • 2 um conjunto de actores, dotados de autonomia de decisão e fortemente ancorados na realidade socioeconómica local (empresas, instituições de formação, centros de [P&D], etc.);

  • 3 elementos materiais (as empresas, os equipamentos, as infra-estruturas) e elementos imateriais (as normas e valores, os fluxos de informação, o saber-fazer), bem como elementos institucionais (as formas de organização do poder público e da sociedade civil);

  • 4 uma lógica de interacção, ou seja, um capital relacional regulador do comportamento dos actores e promotor de dinâmicas locais de valorização dos recursos existentes;

  • 5 uma lógica de aprendizagem, capacitando os actores para redefinirem e reconfigurarem os seus comportamentos, ajustando-os à medida que se transforma a envolvente externa, nomeadamente ao nível dos mercados e da tecnologia. (Maillat et al., 1993 apud Santos, 2002c: 294).

Na opinião de Olivier Crevoisier, «os meios inovadores articulam-se ao redor de três eixos particularmente importantes do ponto de vista das transformações actuais: a dinâmica tecnológica, a transformação dos territórios e as mudanças organizacionais. (.) Nesse sentido, o meio inovador é um conceito integrador, uma ferramenta sintética de análise e compreensão das transformações económicas actuais. A articulação do geográfico, do técnico-económico e do organizacional, não provém de uma disciplina académica particular, mas de uma axionomia original» (Crevoisier, 2003: 16-17)

A diferença existente entre os conceitos de "Meio Inovador" e de "Sistema Produtivo Local" fundamenta-se na dimensão-chave da intangibilidade: «o meio não é uma categoria particular de sistema produtivo local mas uma unidade cognitiva de que depende o funcionamento do próprio sistema» (Courlet, 1988, apud Santos, 2002c: 294), constituindo, assim, uma matriz organizacional através da qual se projecta o potencial de autonomia e de iniciativa dos sistemas de produção localizados.

Com o objectivo então, de descrever os comportamentos inovadores no seio dos sistemas produtivos locais, os investigadores do GREMI criaram o conceito de "Meio Inovador". Um Sistema Produtivo Local, desde que dotado de propriedades emergentes, pode evoluir para um patamar superior de organização, correspondente a um "Meio Inovador", pela criação, gestão eficaz e constante renovação de recursos, principalmente de natureza imaterial (saber, "saber-fazer", processos de aprendizagem colectiva, conexões reticulares de cooperação, canais de informação, etc.). Nessas circunstâncias, em certos meios podem gerar-se, sistematicamente, «(...) externalidades positivas específicas que asseguram uma vantagem comparativa aos actores locais na prossecução de um processo cumulativo de inovação competitiva, (...) desenvolvendo uma convenção territorial de inovação (...) [correspondente ao estágio de "meio inovador"] (Planque e Gaussier, 1998, apud Santos, 2002c: 295).

Portanto, um "meio" constitui-se em "Meio Inovador", «quando desenvolve a capacidade de apreender as transformações do seu ambiente tecnológico e de mercado, bem como a evolução dos outros sistemas territoriais de produção, ligando-se às dinâmicas internacionais mais significativas, mas conservando a sua coerência global e a sua identidade» (Matteaccioli, 1998, apud Santos, 2002c: 296).

Desse modo, consegue-se processar recombinações técnico-produtivas dos recursos endógenos existentes, de modo a garantir configurações produtivas inovadoras valorizadas pelos mercados.

Os "Meios Inovadores" são diferentes dos ambientes cognitivos próprios dos "Distritos Industriais". Nos meios inovadores, a inovação decorre de um arranjo organizacional e de uma coordenação institucional ex-ante; já nos "Distritos Industriais", ela surge mais ligadas a aspectos casuais e menos formais.

Ao participar em redes de interacção, uma empresa contribui para reforçar a sinergia do meio. Essas redes ultrapassam as transacções mediadas pelo mercado, estendendo-se a uma ampla gama de relacionamentos envolvendo sistemas de formação e educação, administrações públicas, instituições financeiras, organizações sindicais, entre outros. Cria-se, dessa forma, um ambiente que maximiza as oportunidades de interacção e de inovação dos agentes económicos. «A rede de inovação constitui assim uma dimensão organizacional necessária para a complexidade da deflagração da inovação. (.) O meio inovador participa da constituição de redes de inovação e intervém no seu dinamismo» (Maillat, 2002: 14)

Existe uma clara e directa correspondência entre as capacidades de inovação e de desenvolvimento das empresas e as externalidades positivas que o ambiente lhes oferece, aumentando suas possibilidades de êxito. Perrin (1991) apud Polèse (1998) faz menção a ambientes de inovação, "millieu d"innovation" ou a tecnópolos. Num ambiente dinâmico desta natureza, os custos de informação e de transacção são mais baixos, há mais facilidade para as comunicações inter-pessoais e uma maior confiança entre os seus diversos actores, «definido desta maneira, o conceito de millieu (que pode corresponder ao inglês community) inclui noções como "tecido social e sociedade": é o conjunto dos valores e das relações que dão a um território uma cultura local, uma identidade, uma cultura de empresa e uma cultura técnica que lhe são próprias» (Polèse, 1998: 234).

Esta lógica de comportamento, que privilegia interesses sectorizados, acaba por criar uma teia de relações institucionais que se torna um factor estrutural subjacente a iniciativas que requerem um acentuado sentido de parceria, integração, coesão, associativismo e cooperativismo, a exemplo geral do "Meio Inovador".

As redes de interacção e de inovação, para terem condições de sucesso, precisam de ter objectivos e mecanismos de acção vinculados à lógica de funcionamento dos empreendimentos privados:

  • 1 esquemas financeiros para partilhar e diversificar riscos;

  • 2 instituições comuns de formação profissional;

  • 3 organizações e associações profissionais para reduzir os custos de difusão da informação;

  • 4 projectos conjuntos de I&D contemplando a protecção dos direitos de exploração dos resultados;

  • 5 redes de compras, de distribuição e de colocação no mercado;

  • 6 infra-estruturas comuns como rede de distribuição de gás ou combustíveis, parques industriais, etc.;

  • 7 negociações em grupo, patronato-sindicatos, contratos colectivos de trabalho ou outros acordos.

Na maioria dos exemplos acima referidos, trata-se da institucionalização das economias de escala próprias de uma indústria, ou das economias de localização. Quando se refere aos tecnopólos ou aos complexos industriais a participação motora dos poderes públicos está na base da sua implementação, podendo envolver a disponibilização de uma área ou até mesmo de um parque tecnológico e, inclusive, actividades de promoção.

Ou seja, para se poder "criar" um "Meio Inovador" é necessária a conjugação de uma série de factores num quadro de proximidade geográfica e de homogeneidade económica, social e cultural que diferenciam um território.

Os factores principais são, sobretudo, a existência de economias externas que permitem reduzir os custos e melhorar os processos de inovação para as empresas locais; as economias de proximidade que reforçam os efeitos anteriores, através da redução dos custos de transacção, designadamente, em termos da circulação de informação e de contactos pessoais; e a capacidade de gerar sinergias locais. «Esta perspectiva considera a inovação como o resultado de processos interactivos de aprendizagem colectiva. Nesta concepção, é tão importante conhecer as características de cada organização como as do meio envolvente, tanto imediato (externalidades de proximidade) como distante. (.) Em muitos casos, uma parte significativa da produção de novos conhecimentos beneficia da existência de externalidades positivas de proximidade: economias de aglomeração, acumulação de competências técnicas específicas ao nível local, implantação de actividades complementares, etc.» (Ferrão, 2002: 19)

Em resumo, a teoria dos "meios inovadores" «propõe uma visão geral do desenvolvimento económico territorializado que se caracteriza por: uma concorrência pela inovação e não pelos custos de produção; uma organização do sistema produtivo em redes e não sobre mecanismos de mercado ou hierárquicos; a concorrência entre territórios e não entre empresas» (Crevoisier, 2003: 19)

Por outro lado, o conceito de "Região Inteligente" reforça e amplia o alcance da análise de teor organizacional-institucional que marca os estudos do GREMI, adequando o mesmo ao novo paradigma produtivo emergente fundamentado nas tecnologias de informação, telecomunicações e computação, bem como aos desafios da economia do conhecimento.

Foi Richard Florida (1995) apud Santos (2002c) quem primeiro sugeriu o conceito de "região inteligente" para caracterizar aqueles territórios capazes de funcionarem como colectores e repositórios de conhecimentos e ideias e de proporcionarem o ambiente a as infra-estruturas facilitadoras dos fluxos de conhecimento e de aprendizagem. Essas regiões constituem contextos territoriais privilegiados de interacção, aprendizagem e inovação, já que consubstanciam quadros aglomerativos e plataformas cognitivas favoráveis à existência de espaços relacionais entre actores que se interceptam e conectam por afinidades culturais e económicas.

Este novo conceito, conforme referido por João Ferrão (1997) apud Santos (2002c: 301), «(...) atribui uma centralidade ainda maior à capacidade colectiva e permanente de aprendizagem e adaptação (defensiva e ofensiva), como estratégia-chave de desenvolvimento regional (...)».

Por um lado, existe a percepção de que o conceito de "Região Inteligente" é ainda muito vago e abstracto, necessitando amadurecer o seu corpo conceptual e instrumental para se afirmar e se diferenciar de outros conceitos próximos, principalmente o de "Meio Inovador". Por outro lado, o conceito de "Região Inteligente" oferece uma perspectiva de maior adequação ao novo paradigma téorico-produtivo baseado na utilização das modernas tecnologias da informação e comunicação e da informática, o qual condiciona toda a estrutura e funcionamento da "nova economia", abrindo oportunidades inéditas de competição e inovação.

As "Regiões Inteligentes" correspondem basicamente a um patamar superior de transformação dos "Sistemas Produtivos Locais", dotando-os de capacidades reforçadas para competir eficaz e sustentadamente à escala internacional.

A noção de "região inteligente" apresenta quatro aspectos relevantes para o aprofundamento da relação entre inovação e desenvolvimento territorial:

  • 1 centra o debate em torno das condições territoriais de desenvolvimento, complementando as visões que valorizam a óptica dos impactos territoriais;

  • 2 cria uma matriz que permite integrar grande parte do património recente das diversas teorias de desenvolvimento regional, assegurando uma coerência e uma finalidade claras;

  • 3  defende uma análise preocupada em entender, de forma sistémica, as práticas dos diversos actores (individuais e colectivos) no quadro de comunidades territoriais específicas;

  • 4 fornece argumentos favoráveis ao reforço da importância das políticas de base territorial. (Ferrão, 1996, apud Santos, 2002c: 303-304).

A competitividade e a sustentabilidade regionais de longo prazo têm menos a ver com a eficiência de custos e mais a ver com a capacidade das empresas e instituições para inovar, isto é, para incrementar a respectiva base de conhecimentos. Assim, a inovação é ditada pela boa gestão e eficiente utilização dos fluxos estratégicos de informação e criação de conhecimento.

Segundo Santos (2002c), a palavra-chave do conceito de sistema regional de inovação parece ser "interacção" ou "networking" entre empresas, entre empresas e instituições da envolvente de apoio, entre estas próprias instituições. Subjacente à noção de sistema regional de inovação está a ideia de que a indução de padrões empresariais mais inovadores, qualificados e competitivos, é função dos arranjos organizacionais e institucionais que estruturam um determinado território numa entidade de coordenação policêntrica.

Distinguem-se, analítica e politicamente, dois tipos de "Sistemas Regionais de Inovação": um que é resultante da regionalização do sistema nacional de inovação, e outro que decorre da existência de uma abordagem mais endógena e territorializada da promoção de uma política de inovação regional. Neste sentido, Asheim e Isaksen (1997), sugerem que: «(...) por um lado, encontramos sistemas de inovação que são partes de um sistema nacional de inovação regionalizado, ou seja, partes da base produtiva e da infra-estrutura institucional localizadas na região, mas funcionalmente integradas em, ou equivalentes a, sistemas nacionais (ou internacionais) de inovação, que são baseados numa abordagem centralista e no modelo linear de inovação; por outro lado, podemos identificar sistemas de inovação constituídos por partes do tecido produtivo e da esfera institucional que se encontram verdadeiramente ancorados e integrados numa determinada região, derivando, portanto, de uma abordagem territorialista de desenvolvimento e de um modelo interactivo de fomento da inovação. Cremos que, no âmbito terminológico, pelas razões já aduzidas, se pode passar a distinguir um do outro, denominando o primeiro de sistema regionalizado de inovação e o segundo de, esse sim, sistema regional de inovação ou sistema territorial de inovação» (Asheim e Isaksen, 1997, apud Santos, 2002c: 306-307).

Actualmente, e cada vez mais, o conceito de "Sistema Regional de Inovação" assume um papel eminentemente instrumental, muito associado às políticas de inovação e à implementação de estratégias regionais de inovação, diferenciando-se, por essa dimensão operativa, das abordagens anteriores de modelos de Crescimento e Desenvolvimento regional. O objectivo principal deste modelo, segundo Santos (2002c), é reforçar os patamares territoriais de competitividade, tornando os "meios" mais "inovadores" e as "regiões" mais "inteligentes".

O quadro seguinte apresenta uma comparação entre as principais características dos modelos de "Distrito Industrial", "Meio Inovador" ou "Região Inteligente" e "Sistema Regional de Inovação".

Quadro 4 – Síntese comparativa entre os modelos de "Distrito Industrial", "Meio Inovador" ou "Região Inteligente" e "Sistema Regional de Inovação"

Distrito Industrial

Meio inovador / região inteligente

Sistema regional de inovação

Surgimento

Espontâneo; como sistema produtivo local

Espontâneo/induzido; como entidade cognitiva

Induzido; como entidade organizacional

Clima predominante

Atmosfera industrial

Cultura empresarial

Cultura empresarial e científica

Sistema produtivo

Industrial; especialização produtiva numa óptica de divisão sectorial do trabalho; PME; verticalmente desintegrado; autocentrado

Industrial e terciário; diversificação produtiva numa óptica de divisão intra-sectorial do trabalho; grandes e PME; integração quase-vertical; aberto

Industrial e terciário; diversificação produtiva numa óptica de divisão intra-sectorial do trabalho; grandes e PME; integração quase-vertical; aberto

Relações não mercantis entre as empresas

Intensidade das relações extra-produção; redes inter-pessoais informais de circulação de informação; forte mobilidade horizontal e vertical da mão-de-obra

Intensidade das relações extra-produção; importância e diversidade das relações não-mercantis formalizadas (redes de cooperação, parcerias estratégicas, etc.)

Intensidade das relações extra-produção; importância e diversidade das relações não-mercantis formalizadas (redes de cooperação, parcerias estratégicas, etc.)

Relações das empresas com a envolvente institucional de apoio especializado

Baixa intensidade de contactos; casuísticas

Elevada intensidade de contactos; estratégicas

Elevada intensidade de contactos; estratégicas

Relações com o exterior

Abertura ao exterior via fornecedores e clientes

Forte abertura ao exterior; inserção nos circuitos internacionais de transferência de informação e conhecimento

Forte abertura ao exterior; inserção nos circuitos internacionaisde transferência de informação e conhecimento

Estruturas reticulares

Compactas; redes sem centro estratégico

Compactas, com empresa-líder ou com empresa-pivot

Como empresa-pivot ou instituição-pivot (universidade, centro tecnológico, etc.)

Lógica

Comunitária; de sobrevivência; evitar que as respectivas economias se restrinjam a meros locais de inscrição de movimentos exógenos de integração organizados completamento do exterior

De parceria; criação de mecanismos colectivos de aprendizagem como motor da renovação competitiva da base produtiva; fomento do potencial de inovação

De parceria; arquitectura institucional como alavanca da competitividade empresarial e territorial; fomento do potencial de inovação; afirmação de uma estratégia regional de inovação

Formas dominantes de conhecimento

Tácito; contextual

Codificado; global

Codificado; global

Formas dominantes de aprendizagem

By doing, by using, by interacting

By doing, by interacting, by networking

By searching, by networking

Modalidades dominantes de inovação

Incremental; adaptativa; do produto e do processo

Incremental e radical – first of its kind; do produto, do processo e organizacionais

Incremental e radical – first of its kind; do produto, do processo e organizacionais

Dinâmica de crescimento

Concorrência-emulação-cooperação; assente numa mobilização social alargada; risco empresarial amparado socialmente

Concorrência-cooperação; induzida pela activação dos circuitos de difusão de informação e conhecimento; risco empresarial amparada institucionalmente

Fertilização cruzada; fortemente induzida pelo universo institucional de apoio; ajustamento dinâmico entre as esferas empresarial e institucional; risco empresarial amparado institucionalmente

Riscos potenciais

Lock-in sócio-tecnológico; barreiras à entrada e à informação; crescimento dos fenómenos de hierarquização empresarial; comportamentos desviantes

Locks-in relacional e tecnológico; barreiras à saída

Locks-in relacional e tecnológico; barreiras à saída; esclerose institucional; estatização das redes de cooperação

Fonte: Santos (2002c: 312-313)

2.3. EMPREENDORISMO TERRITORIAL E NOVA GESTAO DO TERRITÓRIO

Várias maneiras têm sido encontradas pelos territórios de forma a conciliar a concorrência territorial pela atracção de capitais públicos e privados, com os ideais da democracia (crescentemente) participativa e do desenvolvimento humano das comunidades.

Face ao temos referido ao longo do presente capítulo, actualmente considera-se que as Autarquias Locais têm vantagens comparativas em relação ao Estado Central no que se refere à criação de condições favoráveis à produtividade e competitividade das empresas. De facto, «as Câmaras Municipais tendem a ser cada vez mais vistas como agências que podem intervir para levar os municípios na trilha do desenvolvimento sustentável (económico, social, ambiental e político).» (Salvador, 2006: 327)

De facto, se considerarmos que as edilidades têm uma maior flexibilidade institucional, quando comparada com o governo central, e uma maior capacidade de representação e legitimidade política, os municípios podem ser mais eficientes na atracção e dinamização de actividades económicas no seu território, pelo que «el gobierno local capaz de dar respuesta a los actuales desafios urbanos y de construtir un proyecto de ciudad y liderarlo debe ser un gobierno promotor» (Borja e Castells, 1997: 151)

Deste modo, desde os anos 90 que o poder local, um pouco por todo o mundo, tem assumido o "protagonismo" ao nível do crescimento económico (infra-estruturas, desburocratização, participação crescente do sector privado e racionalidade empresarial na gestão pública, busca de consensos em torno de prioridades "estratégicas", etc.), «levando autores a defender que se estaria a criar um novo tipo de gestão do território, designado por Archer de "empreendorismo urbano", por Harvey de "gestão pública urbana", por LeGalès de "governação urbana" ou ainda por Fainstein de "mercantilismo local".» (Salvador, 2006: 327)

Neste aspecto e conforme tivemos oportunidade de referir anteriormente, surge como extremamente importante o conceito de "Governância", entendida como a gestão dos assuntos públicos, em articulação com associações de cidadãos e as suas organizações, numa perspectiva abrangente de convergência entre os interesses do Estado e dos seus cidadãos, vistos nesta perspectiva como "accionistas" de uma empresa, «(.) estamos convencidos de que un gobierno local promotor no puede funcionar según las formas de gestión y de contratación próprias de la administración tradicional.» (Borja e Castells, 1997: 162-163)

O "discurso" do empreendorismo vem deste modo justificar novas práticas políticas e relações sociais, bem como uma agenda determinada pela competitividade urbana e pela exigência de uma máquina administrativa, crescentemente, eficiente.

Por outro lado, face à dispersão geográfica das Empresas Transnacionais e ao aumento dos fluxos comerciais e de capitais, as funções de gestão, controlo e inovação tendem a concentrar-se nas grandes cidades, «a globalização – com abertura de mercados, tendência para o comércio livre a nível mundial, revolução tecnológica e nos transportes – veio trazer uma nova tensão entre o global e o local. Um traço fundamental desta tensão é o fenómeno da "metropolização" (.).» (Salvador, 2006: 327)

Deste modo surgem as "Cidades Globais" como pontos nucleares da organização espacial e da articulação dos mercados. Estas cidades desempenham funções diferenciadas na nova Divisão Internacional do Trabalho, constituindo-se como centros financeiros, centros de Investigação & Desenvolvimento, sedes de instituições internacionais, centros de negócios, nós de transportes, entre outras (Sassen, 1991).

Na perspectiva de Manuel Castells (2003) o aumento de importância destas cidades deve-se ao novo modelo de sociedade em rede, em que o principal elemento da produtividade se baseia no conhecimento e na velocidade e tratamento da informação.

Para Saskia Sassen (1991) o processo de dispersão das actividades produtivas e de concentração dos processos de tomada de decisão deve-se ao facto de que as funções terciárias de nível superior tendem a concentrar-se nas "cidades globais".

A perspectiva vai no sentido de que a crise do Estados-Nação conduzirá à criação de uma rede internacional de governos locais interdependentes e interligados. (Borja e Castells, 1997). Nesta linha de raciocínio, a Globalização surge como resultado de uma reestruturação internacional liderada pelos países desenvolvidos, que passaram a aceitar uma disciplina comum e que a impõem também aos países em desenvolvimento.

Os Estados-Nação são pois, simultaneamente, demasiado "grandes" para resolver os problemas locais e demasiado "pequenos" para resolver os "novos" problemas económicos e sociais resultantes do processo de Globalização. Nas palavras de Jordi Borga e Manuel Castells, «sus competências no son suficientes para controlar los flujos globales y su organización suele ser demasiado rígida para adptarse a los cambios constantes del sistema mundial» (Borja e Castells, 1997: 31)

Não obstante, os Estados-Nação deverão continuar a existir, nem que seja por uma questão de "economias de escala", e a garantir os serviços públicos que pelo seu custo ou pela sua complexidade técnica (forças armadas, justiça, diplomacia, etc.), superam os meios financeiros e políticos das Autarquias Locais.

Deste modo, assume-se que os Estados-Nação deverão manter com os governos locais uma relação de carácter mais descentralizado, mais contratual, menos hierárquico, «la reconstrucción de un estado flexible y dinâmico, articulado entre sus diferentes niveles, parece la única posibilidad histórica de superar las tendencias disolventes de la sociedad de la información inscritas en la dicotomia entre los flujos de poder y el particularismo de la experiencia, al introducir una nueva perspectiva en la gestión de las ciudades.» (Borja e Castells, 1997: 31).

Não obstante esta perspectiva, não devemos também deixar de considerar que todo este papel de reestruturação do Estado-Nação representa uma desregulamentação, no sentido de libertar os governos centrais de boa parte das suas competências e responsabilidades sociais, transferindo-as para os municípios.

Conforme tivemos oportunidade de explanar ao longo do presente capítulo, desde a década de 70, com a dinamização dos "Sistemas Produtivos Locais", os "Clusters" ou "Distritos Industriais", entre outros, que a componente "local" tem vindo em vindo a ganhar uma crescente importância em termos de desenvolvimento económico, «as cidades são a "riqueza das nações", cuja competitividade deve ser potenciada. [Tem] havido uma transferência de arena onde os conflitos sociais se [desenvolvem] – o território das nações – para o território das cidades. Assim as cidades seriam não apenas centros da economia mundial, mas também os novos protagonistas políticos.» (Salvador, 2006: 330)

Uma das vantagens desta componente "local" relaciona-se com o facto de que a capacidade de inovação depende não só de um sistema educativo adequado às necessidades, mas também da existência de determinados equipamentos, centros de pesquisa e serviços urbanos ligados a questões como a habitação, a cultura, o ambiente e a saúde, capazes de atrair a necessária mão-de-obra qualificada.

Deste modo, desde o fim da década de 70, início da década de 80, têm surgido novos instrumentos metodológicos como é o caso do Planeamento Estratégico, do Marketing Territorial, das Agências de Desenvolvimento, das Parcerias Públicos-Privadas, entre outros, e que se podem configurar naquilo a que se tem chamado de "Nova Gestão do Território".

Não sendo de longe o objectivo desta dissertação estudar profundamente estas "novas" formas de intervenção no território, não podemos deixar de apresentar uma breve apresentação e definição dos mesmos, nomeadamente se consideramos que muitos dos projectos e iniciativas desenvolvidos na área em estudo, que iremos apresentar no capítulo IV, se enquadram nestas tipologias.

O Planeamento Estratégico surgiu nos anos 60 como uma ferramenta do sector empresarial destinada a melhorar a organização interna e o funcionamento das empresas.

Na década de 80, nos Estados Unidos, várias cidades (São Francisco, Filadélfia, Mênfis) e Estados (Califórnia, Ohio, Winscosin) começaram a elaboram planos estratégicos com vista à atracção de investimento, promoção do crescimento económico ou reabilitação urbana, criando o Planeamento Estratégico Territorial, reproduzindo a lógica do planeamento estratégico empresarial, «strategic planning is the most appropriate approach for all communities. This is a future-oriented approach that builds a local economy on the basis of local needs. (.) The strategic style of planning thus boils down to doing the everyday business of local government with one additional long-term objective firmly in mind: economic development.» (Blakely e Bradshaw, 2002: 93-94)

A aplicação do Planeamento Estratégico às Cidades e às Regiões consubstancia um esforço ordenado para produzir decisões e acções fundamentais que levem uma determinada "organização" territorial (Municípios, Regiões, Países) a alcançar os objectivos previamente propostos.

De facto, «perante o novo contexto de planeamento, um dos desafios que se coloca no processo de planeamento é a integração das dimensões das mudanças sócio-territoriais num quadro de referência estratégico e a tradução de princípios estratégicos em critérios de decisão adequados (.). A formulação de trajectórias de desenvolvimento do território requer um esforço de cooperação multidisciplinar e de construção de consensos em torno das ideias chave do projecto de desenvolvimento (.).» (Fernandes, 2006: 43)

A ênfase colocada na "acção" advém da preocupação de evitar a incongruência entre objectivos e meios de operacionalização verificada frequentemente no planeamento tradicional. O "carácter participativo e interactivo" procura incorporar um amplo espectro de actores no processo decisório, de forma a congregar esforços e atingir consensos.

A relevância atribuída à participação dos actores, mais do que relacionado com razões éticas, surge do pressuposto de que o poder é, efectivamente, partilhado entre actores com estratégias próprias que convém compatibilizar.

Ascher (1995) considera que as cidades têm grandes semelhanças com as empresas:

  • 1 Enfrentam a concorrência internacional;

  • 2 O seu desenvolvimento depende de factores económicos;

  • 3 O edil é, cada vez mais, um gestor e não o "proprietário" da cidade.

O Marketing Territorial pode ser considerado como uma abordagem ao Desenvolvimento Regional e Local, baseada num conjunto de técnicas de marketing e comunicação que visam a criação de uma "Marca", estabelecer o posicionamento no "mercado" de determinada entidade territorial e a promoção publicitária dos factores económicos, sociais ou ambientais, capazes de atrair turistas, investidores ou novos habitantes, «(.) "Vender a cidade converteu-se numa das funções básicas dos governos locais e num dos principais campos de negociação público-privada". Trata-se pois de um conjunto integrado de políticas destinadas a impulsionar o crescimento económico, que englobam a totalidade da agenda pública voltada para a competitividade dos territórios.» (Salvador, 2007: 336)

O Marketing Territorial pode ser usado para:

  • 1 Melhorar a imagem e a atractividade de um local;

  • 2 Desenvolver o seu tecido económico;

  • 3 Construir e dinamizar uma rede de actores locais numa lógica de desenvolvimento integrado e sustentado.

O Marketing Territorial integra acções de investigação e pesquisa sobre o território a promover, nomeadamente os desejos, as motivações e as necessidades dos seus habitantes e dos investidores, podendo também integrar operações de dinamização das redes e negócios dos actores económicos locais. Não obstante, «(.) o marketing territorial não se mede à luz de critérios quantitativos, como sejam as quotas de mercado. Com efeito, o marketing territorial está submetido a critérios qualitativos, como a satisfação dos residentes ou a atractivamente do território. (.) Por outro lado, o marketing territorial é sensivelmente diferente do marketing político. Este último procura convencer os eleitores, num determinado momento. Pelo contrário, o marketing territorial dirige-se tanto ao público existente como ao público potencial (.). É conveniente distinguir o marketing territorial do marketing das colectividades territoriais. De facto, o marketing das colectividades territoriais respeita apenas a um actor, institucional, enquanto que o marketing territorial implica a intervenção de actores privados e/ou públicos, cujas acções visa coordenar.» (Benko, 2006: 12)

A crescente necessidade do Marketing Territorial decorre do facto de todos os territórios competirem entre si pela atracção de investimentos e de capital humano qualificado, para tal necessitam de desenvolver acções de promoção sobre algo que tenham para "oferecer", único e apelativo. Pelo que «marketing a community is very much like marketing a product. Product and market research are employed to determine what type of assets a community has to offer, in what markets, and to what type(s) of clients» (Blakely e Bradshaw, 2002: 292)

Uma Agência de Desenvolvimento Regional/Local é uma estrutura operativa que procura a identificação dos problemas de desenvolvimento territorial ou sectorial existentes em determinada região, socorre-se de um conjunto de medidas com vista à concretização de projectos adaptados às especificidades próprias de cada território.

Podemos considerar as «agências de desenvolvimento como sendo organizações de mediação entre o Estado, o mercado e a sociedade, através das quais se instrumentaliza a estratégia de desenvolvimento local. (.) As agências de desenvolvimento podem realizar várias funções, nomeadamente: prestar assessoria pontual aos gestores locais na tomada de decisões; os seus técnicos podem diagnosticar o estado da situação dos projectos e propor medidas para os ajustar aos objectivos que as organizações locais pretendem; podem promover, impulsionar e coordenar a realização de investimentos em matéria de transportes e comunicações; podem estabelecer mecanismos que permitam a reestruturação produtiva de carácter selectivo, necessária para fortalecer a competitividade local.» (Cabugueira, 2000: 132)

De facto, os programas de Desenvolvimento Regional e Local organizados por governos centrais, nem sempre apresentam modelos compatíveis com as realidades locais, uma vez que baseiam-se em estratégias políticas próprias e, normalmente, não levam em consideração os interesses da comunidade local. Neste ponto de vista, considera-se que o desenvolvimento ideal visa a integração da comunidade local em processos de desenvolvimento económico e social sustentado, com vista a adequar as suas capacidades produtivas às tendências do mercado.

Neste processo a acção empresarial individual não pode agir isolada, sendo necessário a formação de grupos de trabalho, envolvendo os actores públicos e privados locais de forma concertada, com vista à criação de novos modelos de produção, comércio e serviços. Surge, nesse momento, o "embrião" da Agência de Desenvolvimento Local, «development corporations, or "joint power" organizations, that involve government as well as business and community are the most used form of organization because such organizations continue to enjoy government and private support. In some instances, however, the organziation is given too little power or responsibility from either the private sector or government agencies.» (Blakely e Bradshaw, 2002: 347)

Em certos casos, são as Parcerias Público-Privadas (PPP"s) que se apresentam como a metodologia mais eficiente de promoção do Desenvolvimento Local. De facto, «une attention particulière doit être portée à la dimension "locale" des projets conduisant à des partenariats public-privé. D"abord, la plupart de projets partenariaux public-privé ont dans les faits une dimension territoriale três marquée. Ils mettent souvent en oeuvre des collectivités territoriales; leurs effets s"inscrivent dans des espaces géographiques circonscrits; c"est meme dans le nombre de cas cet effet géographiqement sélectif qui est recherché (projets dits de "développement local".» (Gilbert, 2002: 191)

As PPP"s caracterizam-se por instituir uma relação de longo-prazo entre entidades públicas e privadas com vista a instituir um determinado serviço, podendo, ou não, exigir a concepção, financiamento e construção de infra-estruturas públicas para esse efeito, «la notion de partenariat public-privé recèle en effect une idée nouvelle, par rapport aux institutions que l"on vient d"évoquer, celle d"une association et d"une solidarité entre les associés. En ce sens, elle s"oppose à la représentation traditionelle que donnent les doctrines liberals des rapports entre l"État et l"économie, et qui est fondée sur l"idée de leur séparation.» (Marcou, 2002: 14)

Sendo uma relação de longo-prazo, permite ao parceiro público transferir para o parceiro privado o risco de concepção do projecto, uma vez que competirá ao parceiro privado garantir a provisão do serviço contratado por todo o prazo da parceria. Pelo que «la première fonction du PPP est donc d"établir une interdependence et une solidarité entre l"engagement de la puissance publique et celui du secteur prive. Cette solidarité est le support d"une mutualisation des risques.» (Marcou, 2002: 37)

Esta transferência de riscos para o parceiro privado implica que o parceiro público não pode sempre definir os requisitos necessários ao desenvolvimento do projecto, sendo o seu papel centrado apenas na definição dos resultados a alcançar e do nível de qualidade pretendido.

Uma parceria só será justificável se os ganhos de eficiência conseguidos forem suficientemente amplos para compensarem os custos financeiros. A obtenção desses ganhos de eficiência implica o estabelecimento de uma parceria que permita conceber e implementar o projecto de forma eficiente, livre de restrições que não as estritamente necessárias para a satisfação do interesse público. Para avaliar a justificação de uma parceria é assim indispensável o desenvolvimento de um modelo financeiro que permita a obtenção de um custo público comparável, «the hallmark of the U.S. experience in local economic development – whether in government or in the neighbourhood – is the combination of the resources of the public and private sector in just the correct balance to attain objectives neither could attain alone.» (Blakely e Bradshaw, 2002: 97)

Os projectos passíveis de serem enquadrados em PPP"s são extremamente diversos: gestão de equipamentos, prestação de serviços colectivos, planeamento estratégico, marketing territorial, contratos-programas (cooperação com o governo central), projectos de urbanismo (em substituição do tradicional conjunto legal e urbanístico de gestão do território e da regulação sobre uso e ocupação do solo). De facto, nalguns casos as PPP"s «(.) tornaram-se a base da política urbana: os incentivos fiscais de base local às actividades privadas em construção – empréstimos públicos, isenções fiscais, financiamento em leasing - aumentaram exponencialmente. Também se divulgaram as práticas de contrapartidas em terrenos ou infraestruturas.» (Salvador, 2007: 329)

No fundo a perspectiva vai no sentido de que «(.) el gobierno local tenga competencia y medios – en colaboración com otros actores públicos y privados pêro com iniciativa propia – para desarrollar zonas de actividades empresariales, para crear bancos com líneas de capital-riesgo, para promover empresas públicas y mixtas competitivas com el sector privado (.).» (Borja e Castells, 1997: 157).

2.4. RESUMO

Independentemente das diferentes reflexões teóricas sobre o papel da concentração geográfica no Desenvolvimento Regional – "Sistemas Produtivos Locais" para Becattini e Garofoli, "Clusters" para Porter, "Milieux Innovateur" para Castells e a GREMI, "Learning Regions", etc. – é de notar que os diferentes autores recuperam sempre alguns aspectos da investigação de Alfred Marshall sobre as questões da localização, «according to an old saying of regional economist, there are only three important variables in regional growth: location, location and location!» (Blakely e Bradshaw, 2002: 62)

«In regional science different theoretical frameworks are used to study the formation of networks in geographical space. Some refer to old theoretical approaches like the Marshallian industrial district and externalities (Becattine 1989), and some refer to more recent developments like the innovative millieu approach (Aydalot and Keeble 1988; Maillat 1991), the "New Industrial Spaces" (NIS) aproach (Scott and Storper 1992; Storper 1997), the network aproach of innovation (Lundvall 1992; Gregersen and Johnson 1997; Morgan 1997). Despite the distinct theoretical starting points, there is general agreement on the importance of geographical space for innovation among these authors (...)» (Oerlemans et al., 2001: 340)

Não obstante toda esta "panóplia" de designações e perspectivas, mais ou menos, diferenciadas entre si, «muitas controvérsias foram se misturando ao debate desencadeado pelos pioneiros estudos italianos. (.) E os resultados dessa vasta produção científica ainda não explicam satisfatoriamente as razões do maior ou menor dinamismo económico de cada território, dificultando muito qualquer tentativa de síntese» (Veiga, 2002: 8).

O importante é que as vantagens competitivas regionais e a especificidade dos territórios deverão continuar a ser determinantes no futuro. A dúvida consiste em saber até que ponto a inovação, a especialização flexível e o funcionamento em rede, poderão manter o funcionamento dos "novos" (e "velhos") "Distritos Industriais", independentemente das novas designações ou "roupagens" teóricas que venham recuperar as ideias de Marshall. A dúvida consiste em saber até que ponto os "Distritos Industriais" constituem mesmo a estrutura territorial melhor adaptada aos desafios da globalização.

Desta forma, para "sobreviverem" e se afirmarem na globalização as regiões necessitam de (re)descobrir novas formas de vantagens competitivas, baseadas não só nos aspectos puramente económicos mas também na interacção entre o social, o histórico, o cultural e o económico. Não esquecendo que «(.) the new economy, like the old one, has losers as well as winners. Whereas some sectors, communities, and populations have benefited, many others have been left behind.» (Blakely e Bradshaw, 2002: 9)

Assim, é de supor que a região do ABCD, como uma das mais antigas e a mais importante área industrial do Brasil, possa constituir, pelo menos parcialmente, um "Mega-Distrito Industrial", ou "Mega-Cluster", conforme teremos oportunidade de dissertar no presente trabalho.

Neste sentido devemos considerar o "Mega Cluster" como «um conjunto de actividades distintas, mas cujos bens ou serviços satisfazem a procura de uma mesma grande Área Funcional da Procura Final, recorrendo a competências básicas complementares e podendo explorar vantagens de interligação e articulação em rede, entre si e com outras entidades, nomeadamente as que permitem a acumulação do "capital imaterial" para o conjunto das empresas envolvidas.» (Chorincas, Marques e Ribeiro, 2001: 46)

Não obstante não devemos esquecer que «el concepto de distrito industrial no deja de ser un modelo ideal surgido a partir del estúdio inicial de Marshall y actualizado por la experiencia más reciente de la Tercera Itália, que después se há intentado generalizar para describir e interpretar formas de organización industrial existentes en territórios muy distintos bajo la denominación genérica de sistemas productivos locales. Pero esa misma difusión, unida a su indudable éxito, ha favorecido una utilización a veces abusiva del concepto, aplicado ahora a áreas de pequeñas empresas más o menos especializadas (...), cuyas características socioculturales, junto con la escasa o nula integración entre las empresas existentes, resultan poco compatibles con los supuestos originarios» (Méndez e Caravaca, 1999: 222)

Por outro lado, como teremos oportunidade de ver no capítulo seguinte, os Municípios de São Paulo e do ABCD caracterizam-se por ter uma série de problemas, nomeadamente relacionados como a pobreza, a exclusão social e com um urbanismo e um parque habitacional desadequados, que têm sido agravados pelo processo de reestruturação industrial que a região tem vindo a conhecer nos últimos vinte a trinta anos. Neste sentido, no capítulo IV, apresentaremos um conjunto de projectos e de iniciativas relevantes para o desenvolvimento e para a melhoria geral das condições de vida da população da região, que podem ser enquadrados nas metodologias descritas no ponto 2.3. -Empreendorismo Territorial e Nova Gestão do Território.

III. Enquadramento Sócio-Económico-Territorial dos Municípios de São Paulo e do ABCD

3.1. O PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇAO DO BRASIL E A AFIRMAÇAO DE SAO COMO PRINCIPAL PÓLO ECONÓMICO DO PAÍS

3.1.1. De 1500 a 1930

3.1.1.1 O Período Pré-Industrial

O centro-motor da economia do território brasileiro variou ao longo dos vários séculos da sua história (ver figura 4). Assim, nas primeiras etapas de afirmação de um núcleo produtivo autónomo, teve particular importância a região do Nordeste, onde se instalaram os "senhores de engenho" e que desencadearam o ciclo da cana-de-açúcar. Posteriormente, com o ganho de importância das produções de café e cacau, as regiões do Sudeste Brasileiro começam um processo de afirmação no contexto global da economia do país.

Em pleno século XX, as várias etapas de industrialização, em particular a que correspondeu à consolidação de um importante sector industrial ligado aos sectores da maquinaria e do material de transporte, localizado maioritariamente na Região Metropolitana de São Paulo e com destaque para o ABCD, conduzem a um padrão territorial de desenvolvimento marcado pelo desequilíbrio. Às regiões Norte e Nordeste com menores índices de desenvolvimento, em particular industrial e de serviços, opõem-se os Estados do Sudeste, com especial destaque para São Paulo, em que o modelo económico garante a formação de níveis elevados de produto e uma maior diversidade de ramos competitivos.

Figura 4 – Evolução histórico-geográfica dos ciclos económicos no Brasil (1500-1930)

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Adaptado de: Addas (2002: 52)

Usando uma metáfora podemos dizer que houve uma transferência de poder do "Senhor do Engenho" para o "Capitão da Indústria". Deste modo a reconfiguração da estrutura produtiva do país levou igualmente a profundas mudanças numa sociedade, em que a formação da riqueza repousava estritamente no sector agrícola, para um modelo de economia nacional baseado na indústria transformadora.

3.1.1.2. Os primórdios do processo de industrialização

A actividade industrial, ainda que incipiente, nos principais países da América Latina (Argentina, Brasil, Chile e México) iniciou-se antes do "choque" resultante da "Grande Depressão" de 1929 e mesmo antes da I Guerra Mundial.

A implantação das primeiras indústrias viradas para a produção interna de bens de consumo (agro-alimentar, têxteis, vestuário, calçado, etc.) iniciou-se no último quartil do século XIX, num período de crescente integração das economias latino-americanas num esquema de Divisão Internacional do Trabalho imposta pelos países capitalistas "centrais", com a Grã-Bretanha "vitoriana" à cabeça. Por outro lado, «alguns dos autores que interpretam o desenvolvimento brasileiro como inerentemente dependente exageraram o papel da economia internacional. Na verdade, seria possível argumentar que o problema do século XIX era eminentemente falta, e não excesso, de integração internacional» (Fishlow, 2004: 24).

Partes: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8


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